Em palavras poucas, e
mitigadas, é a cultura que normatiza nossas ações, e a cultura
sofre carga ideológica da sociedade em que vivemos, e do e no
processo de globalização.
Aqui o interesse é
entender como os sujeitos são definidos e marcados. Como nos vemos
uns aos outros! Para tanto fazemos ou pode-se fazer uso de algumas
ferramentas. Historicamente a primeira é fundada no Iluminismo.
Para o Iluminismo a
identidade do sujeito pouco se desenvolve ao longo da vida, porque
tem um núcleo que pouco pode ser alterado pelo que ocorre no mundo
ao seu redor, seja o famoso “de nascença”. Isso foi retomado por
Hegel na geração de história absoluta, onde o sujeito peregrina
pela história, tendo desde sempre sua identidade bem marcada. No
mundo real que é onde vivemos, pode-se ouvir de professores, que
determinado sujeito nasceu com talento, 'esse vai longe', ou o
contrário, daquele que ouve ' esse não vai a lugar algum', 'esse
não tem remédio'.
Outra concepção
amplamente usada é a sociológica, aqui também o sujeito tem um
núcleo de identidade, a diferença é que aqui o sujeito está atado
à 'geografia' sociocultural do seu entorno de modo permanente. Na
concepção iluminista, onde quer que nasça o indivíduo, nasce com
plenamente capacitado ou não, aqui é o entorno que determina a
identidade do sujeito. Quer dizer que o sujeito não escapa da rede
sociocultural.
“Educação é de
berço”, “coisa de mulher”, “ passou da idade”,
representam questões de classe social, gênero e faixa etária que
fazem muito barulho na discussão da questão educacional.
Por último o sujeito
pós-moderno, essa concepção diz respeito às condições em que
vivemos, e cria novas formas de representar identidades muito
diversas das anteriores, além de tais identidades se modificarem com
constância, à medida que modificam-se ele e o meio.
O novo modelo
societário não apresenta valores soberanos e únicos para todos,
ora “de nascença”, ora “de berço”. Multiplicidade de
sujeitos em disputa de poder em meio ao mundo de significação que
cada um participa e anseia. Essa multiplicidade de identidades não
se organiza em unidade estruturada que produza o 'eu', o 'self', o
'sujeito', pois o sujeito é contraditório e transitório, o mais,
como a sociedade.
O sujeito ainda é
composto de várias identidades: de gênero, de classe, de origem
étnica, de religião, de música entre tantas outras, a depender do
momento e da cultura na qual está inserido, e todas são móveis, ou
podem ser, ou deveriam ser, do mesmo modo que o sujeito sofre os
efeitos das culturas, globalmente móveis.
A identidade é fruto
do discurso, portanto da linguagem, e por conta está frequentemente
diante de processos que tentam fixá-la, torná-la a norma.
O que sempre se
pretende ao se fixar a identidade do sujeito, e fixar lhe um modo
de ser é um modo e não outro. O outro, estabelecido em cada grupo
cultural é tido como a diferença. A identidade só pode ser
compreendida, em sua conexão com a produção da diferença. Assim o
processo de produção de identidade não se completa. Está sempre
adiada, é sempre processo, ou em processo. Isso ocorre porque as
identidades, a diferenças só podem ser concebidas dentro de um
processo de diferenciação linguístico, que define seus
significados e como foi dito antes o processo de significação é
processo de lutas entre vontades de verdade, vontades de poder, de
fixar as coisas que estão em jogo. Isso pode ser aprofundado em A
vontade de poder de Nietzsche, que buscou pressupostos na teoria do
Senhor e do Escravo de Hegel.
Sendo produzidas em um
processo discursivo e simbólico, as identidades e a diferenças
estão sujeitas as relações de poder, manifestas em ações que
oprimem certos indivíduos e grupos, cujos efeitos acabam por
silenciar suas vozes, seus desejos, seus anseios.
Tal processo nas
relações sociais está incumbido de estabelecer limites entre um e
outro, para se poder compreender a identidade, a norma, o correto
e consequentemente a diferença, que é o outro, aquele que é
marcado na sua negação.
Mas é exatamente essa
luta por posições e sentidos que favorecem a ocorrência de
processos mais sutis de poder, que acontece no campo da identidade e
da diferença.
Essa discussão
concentra as reivindicações sociais e politicas de certos grupos.
Quem pode obter
benefícios culturais?
Quem não pode?
Quem é tido como a
norma?
Quem
deve ser normatizado, corrigido?
Fica
claro que afirmar a identidade, marcar as diferenças, tem a ver com
questões de poder.
A
forma como a diferenciação é marcada implica em quem deve ser
marcado, e marcado hierarquizado na sociedade, e quem detém o
poder de marcar e hierarquizar é quem determina quês e porquês.
Mas
fundamentalmente essa diferenciação e hierarquização se dá de
modo binário, o bem e o mal, o craque e o perna de pau, homem e
mulher, civilizado e o primitivo, heterossexual e homossexual, negro
e branco etc. E em todos os casos há a valorização de um em
detrimento do outro, uma relação de poder que determina quem está
dentro e quem está fora do grupo de pertinência. Quem é válido
está dentro e quem não serve, o inválido, está fora.
Assim
pode-se dizer que essa diferenciação é contingência cultural.
Essa
classificação simbólica se utiliza de certos adereços de consumo,
que se pode carregar ou não, como celulares, carros, roupas,
perfumes, vinhos, escolaridade, cursos, atividades físicas
determinadas, academias, filmes, músicas, onde faz as compras, onde
toma o chopp, etc. Esses símbolos constroem significados sobre as
pessoas e identidades de quem os consome e participa deles. Isso quer
dizer que a diferenciação está em luta pelos acessos ao simbólico
da sociedade.
Assim
grupos diferenciados de pessoas são formados, desde a diferenciação
simbólica, quando na verdade há mais identidades que diferenças
entre eles.
Desse
modo a concepção de uma identidade, única, se constitui associada
à diferença. Mas não é a percepção de características
diferenciáveis, senão que a construção da exclusão do outro, na
relação de nós versos eles.
Essa
identidade se constrói de modo que o sujeito se percebe como não
tendo nada em comum com a outra identidade, negando a validade do
conjunto das características do outro, porque lhes são opostas, de
modo que somente uma das identidades pode ser válida, correta.
Esses
sujeitos que podem ser de uma mesma sala, classe escolar, tendo como
objetivo comum concluir o segundo grau, por exemplo, mas por se
frequentar uma igreja, ou não, gostar de rock, ou sertaneja, ou
hip-hop, se vêm e se colocam em mundos opostos, mesmo estando na
carteira ao lado, cinco dias da semana, comendo da mesma merenda,
ouvindo o mesmo professor a explicar o que é sintaxe.
Há
ainda dentro de cada diferenciação, diferenças consideradas mais
importantes do que outras, que são as diferenças das diferenças,
como disse Souza Santos.
Nisso se criam, se
constroem os grupos de pertencimentos. Esses grupos têm seus ritos e
símbolos. E a coisa é circular, pois o pertencimento cria a
diferença do não pertencimento.
Ao mesmo tempo que as
diferenças são marcadas, basicamente, por recursos materiais,
gerando efeitos sobre a materialidade, conquanto o não pertencer ao
grupo, gera a exclusão frente aos recursos materiais, trazendo
desvantagens econômicas e materiais ao excluído. As desvantagens
geradas pela sentidas de forma diferente entre o que está dentro e
o que foi excluído.
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