28 de ago. de 2012

O que cria a identidade, cria a diferença.


Em palavras poucas, e mitigadas, é a cultura que normatiza nossas ações, e a cultura sofre carga ideológica da sociedade em que vivemos, e do e no processo de globalização.
Aqui o interesse é entender como os sujeitos são definidos e marcados. Como nos vemos uns aos outros! Para tanto fazemos ou pode-se fazer uso de algumas ferramentas. Historicamente a primeira é fundada no Iluminismo.
Para o Iluminismo a identidade do sujeito pouco se desenvolve ao longo da vida, porque tem um núcleo que pouco pode ser alterado pelo que ocorre no mundo ao seu redor, seja o famoso “de nascença”. Isso foi retomado por Hegel na geração de história absoluta, onde o sujeito peregrina pela história, tendo desde sempre sua identidade bem marcada. No mundo real que é onde vivemos, pode-se ouvir de professores, que determinado sujeito nasceu com talento, 'esse vai longe', ou o contrário, daquele que ouve ' esse não vai a lugar algum', 'esse não tem remédio'.
Outra concepção amplamente usada é a sociológica, aqui também o sujeito tem um núcleo de identidade, a diferença é que aqui o sujeito está atado à 'geografia' sociocultural do seu entorno de modo permanente. Na concepção iluminista, onde quer que nasça o indivíduo, nasce com plenamente capacitado ou não, aqui é o entorno que determina a identidade do sujeito. Quer dizer que o sujeito não escapa da rede sociocultural.
“Educação é de berço”, “coisa de mulher”, “ passou da idade”, representam questões de classe social, gênero e faixa etária que fazem muito barulho na discussão da questão educacional.
Por último o sujeito pós-moderno, essa concepção diz respeito às condições em que vivemos, e cria novas formas de representar identidades muito diversas das anteriores, além de tais identidades se modificarem com constância, à medida que modificam-se ele e o meio.
O novo modelo societário não apresenta valores soberanos e únicos para todos, ora “de nascença”, ora “de berço”. Multiplicidade de sujeitos em disputa de poder em meio ao mundo de significação que cada um participa e anseia. Essa multiplicidade de identidades não se organiza em unidade estruturada que produza o 'eu', o 'self', o 'sujeito', pois o sujeito é contraditório e transitório, o mais, como a sociedade.
O sujeito ainda é composto de várias identidades: de gênero, de classe, de origem étnica, de religião, de música entre tantas outras, a depender do momento e da cultura na qual está inserido, e todas são móveis, ou podem ser, ou deveriam ser, do mesmo modo que o sujeito sofre os efeitos das culturas, globalmente móveis.
A identidade é fruto do discurso, portanto da linguagem, e por conta está frequentemente diante de processos que tentam fixá-la, torná-la a norma.
O que sempre se pretende ao se fixar a identidade do sujeito, e fixar lhe um modo de ser é um modo e não outro. O outro, estabelecido em cada grupo cultural é tido como a diferença. A identidade só pode ser compreendida, em sua conexão com a produção da diferença. Assim o processo de produção de identidade não se completa. Está sempre adiada, é sempre processo, ou em processo. Isso ocorre porque as identidades, a diferenças só podem ser concebidas dentro de um processo de diferenciação linguístico, que define seus significados e como foi dito antes o processo de significação é processo de lutas entre vontades de verdade, vontades de poder, de fixar as coisas que estão em jogo. Isso pode ser aprofundado em A vontade de poder de Nietzsche, que buscou pressupostos na teoria do Senhor e do Escravo de Hegel.
Sendo produzidas em um processo discursivo e simbólico, as identidades e a diferenças estão sujeitas as relações de poder, manifestas em ações que oprimem certos indivíduos e grupos, cujos efeitos acabam por silenciar suas vozes, seus desejos, seus anseios.
Tal processo nas relações sociais está incumbido de estabelecer limites entre um e outro, para se poder compreender a identidade, a norma, o correto e consequentemente a diferença, que é o outro, aquele que é marcado na sua negação.
Mas é exatamente essa luta por posições e sentidos que favorecem a ocorrência de processos mais sutis de poder, que acontece no campo da identidade e da diferença.
Essa discussão concentra as reivindicações sociais e politicas de certos grupos.
Quem pode obter benefícios culturais?
Quem não pode?
Quem é tido como a norma?
Quem deve ser normatizado, corrigido?
Fica claro que afirmar a identidade, marcar as diferenças, tem a ver com questões de poder.
A forma como a diferenciação é marcada implica em quem deve ser marcado, e marcado hierarquizado na sociedade, e quem detém o poder de marcar e hierarquizar é quem determina quês e porquês.
Mas fundamentalmente essa diferenciação e hierarquização se dá de modo binário, o bem e o mal, o craque e o perna de pau, homem e mulher, civilizado e o primitivo, heterossexual e homossexual, negro e branco etc. E em todos os casos há a valorização de um em detrimento do outro, uma relação de poder que determina quem está dentro e quem está fora do grupo de pertinência. Quem é válido está dentro e quem não serve, o inválido, está fora.
Assim pode-se dizer que essa diferenciação é contingência cultural.
Essa classificação simbólica se utiliza de certos adereços de consumo, que se pode carregar ou não, como celulares, carros, roupas, perfumes, vinhos, escolaridade, cursos, atividades físicas determinadas, academias, filmes, músicas, onde faz as compras, onde toma o chopp, etc. Esses símbolos constroem significados sobre as pessoas e identidades de quem os consome e participa deles. Isso quer dizer que a diferenciação está em luta pelos acessos ao simbólico da sociedade.
Assim grupos diferenciados de pessoas são formados, desde a diferenciação simbólica, quando na verdade há mais identidades que diferenças entre eles.
Desse modo a concepção de uma identidade, única, se constitui associada à diferença. Mas não é a percepção de características diferenciáveis, senão que a construção da exclusão do outro, na relação de nós versos eles.
Essa identidade se constrói de modo que o sujeito se percebe como não tendo nada em comum com a outra identidade, negando a validade do conjunto das características do outro, porque lhes são opostas, de modo que somente uma das identidades pode ser válida, correta.
Esses sujeitos que podem ser de uma mesma sala, classe escolar, tendo como objetivo comum concluir o segundo grau, por exemplo, mas por se frequentar uma igreja, ou não, gostar de rock, ou sertaneja, ou hip-hop, se vêm e se colocam em mundos opostos, mesmo estando na carteira ao lado, cinco dias da semana, comendo da mesma merenda, ouvindo o mesmo professor a explicar o que é sintaxe.
Há ainda dentro de cada diferenciação, diferenças consideradas mais importantes do que outras, que são as diferenças das diferenças, como disse Souza Santos.
Nisso se criam, se constroem os grupos de pertencimentos. Esses grupos têm seus ritos e símbolos. E a coisa é circular, pois o pertencimento cria a diferença do não pertencimento.
Ao mesmo tempo que as diferenças são marcadas, basicamente, por recursos materiais, gerando efeitos sobre a materialidade, conquanto o não pertencer ao grupo, gera a exclusão frente aos recursos materiais, trazendo desvantagens econômicas e materiais ao excluído. As desvantagens geradas pela sentidas de forma diferente entre o que está dentro e o que foi excluído.

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