O Medo.
Tenho medo. Reconheço
que tenho medo. Digo em voz alta: Tenho medo! Tenho medo! Tenho medo!
Quer saber do que tenho tanto medo? A tudo. A mim mesmo. Do vizinho.
Do cachorro do vizinho. Do som do vizinho, que estraga minha sesta.
Tenho medo que morra meu gato. Tenho medo que morra a orquídea
que paguei caro. Tenho medo que a mulher do vizinho não
encontre trabalho. Tenho medo que o buraco em que se meteu este país
não tenha fundo. Tenho medo de que os políticos parem
de roubar e só sejam incompetentes. Tenho medo de que os
juízes não sejam melhores que os policiais. Que os
policiais não sejam melhores que os bandidos. Que os bandidos
não sejam melhores que eu. Tenho medo. Só não
tenho medo de quem chora. Deste tenho dó. Como diz a canção.
Tenho medo da canção que não conheço.
Tenho medo da Rita Lee. Tenho medo do Belchior. Tenho medo do Gabriel
pensador.
Mas o vizinho vendeu o
som do carro. Sua mulher arranjou emprego. O buraco do país é
mais embaixo. É túnel sem fim, sem luz. Os políticos
continuam roubando e incompetentes. Os juízes não são
melhores que os policiais, que não são melhores que os
bandidos, que não são melhores que eu, que não
sou melhor que ninguém. Não ouço mais canções.
Não ouço a Rita Lee, o Belchior. Gabriel pensador não
pensa. Grande é a merda. Tudo sei que é. Perdi o medo
de ter medo. Só sinto medo. Medo. Medo. Medo.
Nenhum comentário:
Postar um comentário