5 de out. de 2011

Ler.



De jovem, a literatura, ainda que rara, me estimulou e complementou. Talvez tenha ouvido mais canções que lido e ai foram parceiros: Chico, Caetano, principalmente. De velho abandonei absolutamente as canções, mas a ainda rara literatura  me salva. Cheguei a uma idade que há momentos que estou extremamente cansado de mim mesmo, dessa repetição, da obviedade mais obtusa que insiste em fazer alarido. A literatura acaba por ser uma porta que permite me divorciar  desse eu sofrego, despistado, um embornal cheio de renuncias, gostares confundidos com verdades,  quereres e suas negativas. Mas mesmo  sem  sair completamente de mim, que não sou Dalai Lama - tipo flutuar, flanar como outro - me descanso neste afazer. As vezes o que leio – novela, romance - me convida a ser um outro horas a fio, longe do maniqueu ordinário, fico a ver a coragem de Homero a fazer Aquiles arrastar Heitor morto diante da amuralhada Troia, sob o olhar lacrimoso de Príamo. Ou um poema que se me apresenta um certo desconhecido, eu, que vive aqui dentro e não o conhecia. Áporo sempre me renova, cavoucando meus túmulos sem epitáfios. Assim um dia desperto e minha personalidade esta embaraçada, ensimesmada. Problema? Nenhum, me meto dentro de um livro e saio outro, insuflado, influído, diluído, condensado como uma esponja. Ainda que temporariamente, e bom por isso também, me conduz um pouco e por vezes confesso que melhoro um tiquinho, como mínimo sinto algo diferente. Salvo, pode ser!

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