O
teatro comunal.
Os
papéis já distribuídos. Não existia sequer a moda essa da
reinvenção de si. Repaginar-se, não havia. Todos assumiam seu
personagem com a profissionalidade apaixonada
do circense. Paulin,
lhe chamaremos, Paulin ainda que o diminutivo fosse outro, havia
sorteado o bêbado. Era muito esforçado. Andava sempre a beber, e
então bêbado. Secundário, com poucos diálogos, e alguma cena
memorável: “Você não viu o sinal de pare? “ E lá estava o
par de policiais da baratinha
afiando sua caneta para lhe tascar uma multa, e ele não se deixava
impressionar. De fato, Paulin sempre se deparava com essa gente, eram
velhos conhecidos. Assim que foi sincero: “ O Pare! Putz! Como
não o vi... Porra! Amigos! Se
nem vocês os vi! As noites de festa, os “home” não se afastavam
da motoca
barulhenta de poucas
cilindradas do Paulin,
sempre estrategicamente estacionada. Ele botava a cabeça para fora
do bar, os via, e saia andando para outra direção, já se cansarão.
Gostava de inventar ditos populares, se bem que alguns tinham a
autoria muito disputada, como esse: se dá pra três, em dois comemos
como reis. Não importa
quem morreu, eu quero é chorar! E pedia um fernet. Era
de uma vila duma
época, onde se forjavam personalidades feitas da mistura de barro
do realismo mágico e sopro dos sonsos Trapalhões. “Não fui
batizado, cai no
ribeirão”.
Uma benzedeira calada, discreta, fazia o sinal da cruz. Sempre
pareceu velha, porque lhe mataram o homem na revolução, o
Galego anarquista,
dizia, e
enlutara
desde então. Da
fazenda Pau d'Alho ela
vinha sempre àquela vila. Andava uns quilômetros a pé, para levar
uns trocados para casa, tinha um filho pequeno. “Sim, sei que logo
ganhei má fama, mas vou ali benzer e...” Iludida. Alguém se
apiedou de sua ignorância. Faz
tempo que é a pomba
gira. Pomba gira?
Não entendia. Trocava os sapatos para chegar em casa, e
esconder o pó
da estrada.
Isso pensava. A intimidade é muito relativa, quando se vive numa
vila. Mas muito. As pessoas sabem coisas de você que nem você sabe.
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