Parto
de uma carta de James Joyce a seu neto Stephen.
Ão
é uma minúscula vila às margens do Ão. Ão é o rio mais comprido
de Bonfina, pequeno estado ao sul de Ribeirânia. Ão é também o
rio mais largo, pelo menos para Bonfina. Em Ão ele é tão largo que
se você quisesse atravessar de uma margem a outra teria que dar no
mínimo mil passos.
Muito
tempo atrás o povo de Ão, quando queria atravessar, construía uma
jangada de troncos de bananeiras, porque não havia ponte. Também
não podiam construir uma ponte nem pagar para construir e ninguém
para fazê-la. O que fizeram?
O
Diabo que está sempre a ler o jornal de Ribeirnânia, A Vila, soube
dessa triste situação de Ão, de modo que se vestiu e veio visitar
o prefeito de Ão, que se chamava Gu
de Ão e Ão, casado com La Pa de Tu Bele e Ão, Ão que veio do
Prefeito. Esse prefeito
também gostava
muito de vestir-se … bem.
Usava uma calça Lee boca de sino do tempo do mocassim, sempre com
uma caxarrel escarlate, e uma pesada
corrente de ouro no pescoço coberto pela caxarrel, ia
assim vestido mesmo
quando adormecido em sua cama com os joelhos na boca, em conchinha
com La Pa de Tu Bele e
Ão, Ão que veio do Prefeito.
O
Diabo disse ao prefeito o que lera no A Vila e falou que podia fazer
a melhor ponte que já fora feito e
melhor que a de qualquer
lugar e isso numa noite.
E disse: “Nada de dinheiro, Gu
de Ão e Ão !” e
acrescentou: “Tudo que exijo é que a primeira pessoa a cruzar a
ponte me pertença!”. “Bom” disse Gu
de Ão e Ão marido de La Pa de Tu Bele e Ão, Ão que veio do
Prefeito.
A
noite desceu, todas as pessoas em Ão foram para a cama e dormiram. A
manhã chegou. E quando puseram as cabeças fora de suas janelas
gritaram:” Oh Ão, que linda ponte!”. Quando
viram a fina ponte lançada através do largo rio.
Todas
as pessoas correram para a cabeça da ponte e olharam para o outro
lado. Lá estava o Diabo. Parado na outra cabeceira, esperando a
primeira pessoa que a atravessaria. Ninguém se atrevia, pois viam
que lá estava o Diabo dançando uma catira.
Houve
um som de cornetas dos corneteiros do prefeito, e as pessoas ficaram
caladas. E Gu de Ão e Ão
com sua caxarrel
escarlate, seu pesado colar de ouro em volta ao pescoço, sua fivela
da queima do alho. Numa das mãos trazia um jarro de água, e debaixo
do outro braço carregava um gato.
O
Diabo parou de dançar, ao ver o escarlate do outro lado da ponte,
tomou de seu longo binóculo e os instalou junto aos seus olhos
rubis. As pessoas de Ão cochichavam, sibilavam seus hábitos
seculares, além de olharem furtivamente de soslaio, de rabo de olho.
O gato ergueu os olhos e encarou o prefeito nos olhos. Porque era
permitido aos gatos encarar o prefeito, olho no olho. Quando
cansou de encarar o prefeito, baixou o olhar, pois mesmo os gatos se
cansam de encarar o prefeito com sua pesada corrente dourada e sua
caxarrel escarlate e sua calça boca de sino e sua fivela da queima
do alho, mas começou a brincar com a pesada corrente de ouro.
Quando
o prefeito se aproximou da cabeça da ponte, todo homem sustou a
respiração, e toda mulher sustou seus suaves silvos úmidos.
O
prefeito Gu de Ão e Ão, colocou o gato no chão da ponte e mais
rápido que o pensamento de um raio, splash! Jogou água do jarro
sobre o gato. O gato entre o Diabo e o jarro de água, mais rápido
que o pensamento do raio pensado pelo prefeito, com suas orelhas para
trás correu para os braços do Diabo.
Zangado
como ele mesmo, o Diabo se zangou e falou ao povo de Ão:
“Homes
i Dones” gritava o Diabo do outro lado da ponte. “Vosaltres no
son pas les gentes més bonicas que n'hi ha al mundo mundial”
“vosaltres gairibe ho son gates” então disse ao gato:
'vini aci, meu gatet, que
teniu por, meu petit gat?”
“teniu fred”?
“vini
pobret
meu que el diable t' encarga” “Anem al infern per una mica de
chafagor, hi
ens calentarem”.
E
lá se foi ele com o gato de Ão.
P.S.
O Diabo geralmente fala a língua dele o “Linguadovovo”, que ele
inventa quando anda por ai, mas quando fica zangado pode falar em
Catalão muito ruim bastante bem, embora quem o ouviu diz que tem um
forte sotaque caipira!
tradução não ortodoxa da carta ao neto Stephen, Roubada a James Joyce, já em domínio público.
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