9 de dez. de 2014

O Diabo e o gato de Ão.



Parto de uma carta de James Joyce a seu neto Stephen.


Ão é uma minúscula vila às margens do Ão. Ão é o rio mais comprido de Bonfina, pequeno estado ao sul de Ribeirânia. Ão é também o rio mais largo, pelo menos para Bonfina. Em Ão ele é tão largo que se você quisesse atravessar de uma margem a outra teria que dar no mínimo mil passos.
Muito tempo atrás o povo de Ão, quando queria atravessar, construía uma jangada de troncos de bananeiras, porque não havia ponte. Também não podiam construir uma ponte nem pagar para construir e ninguém para fazê-la. O que fizeram?
O Diabo que está sempre a ler o jornal de Ribeirnânia, A Vila, soube dessa triste situação de Ão, de modo que se vestiu e veio visitar o prefeito de Ão, que se chamava Gu de Ão e Ão, casado com La Pa de Tu Bele e Ão, Ão que veio do Prefeito. Esse prefeito também gostava muito de vestir-se … bem. Usava uma calça Lee boca de sino do tempo do mocassim, sempre com uma caxarrel escarlate, e uma pesada corrente de ouro no pescoço coberto pela caxarrel, ia assim vestido mesmo quando adormecido em sua cama com os joelhos na boca, em conchinha com La Pa de Tu Bele e Ão, Ão que veio do Prefeito.
O Diabo disse ao prefeito o que lera no A Vila e falou que podia fazer a melhor ponte que já fora feito e melhor que a de qualquer lugar e isso numa noite. E disse: “Nada de dinheiro, Gu de Ão e Ão !” e acrescentou: “Tudo que exijo é que a primeira pessoa a cruzar a ponte me pertença!”. “Bom” disse Gu de Ão e Ão marido de La Pa de Tu Bele e Ão, Ão que veio do Prefeito.
A noite desceu, todas as pessoas em Ão foram para a cama e dormiram. A manhã chegou. E quando puseram as cabeças fora de suas janelas gritaram:” Oh Ão, que linda ponte!”. Quando viram a fina ponte lançada através do largo rio.
Todas as pessoas correram para a cabeça da ponte e olharam para o outro lado. Lá estava o Diabo. Parado na outra cabeceira, esperando a primeira pessoa que a atravessaria. Ninguém se atrevia, pois viam que lá estava o Diabo dançando uma catira.
Houve um som de cornetas dos corneteiros do prefeito, e as pessoas ficaram caladas. E Gu de Ão e Ão com sua caxarrel escarlate, seu pesado colar de ouro em volta ao pescoço, sua fivela da queima do alho. Numa das mãos trazia um jarro de água, e debaixo do outro braço carregava um gato.
O Diabo parou de dançar, ao ver o escarlate do outro lado da ponte, tomou de seu longo binóculo e os instalou junto aos seus olhos rubis. As pessoas de Ão cochichavam, sibilavam seus hábitos seculares, além de olharem furtivamente de soslaio, de rabo de olho. O gato ergueu os olhos e encarou o prefeito nos olhos. Porque era permitido aos gatos encarar o prefeito, olho no olho. Quando cansou de encarar o prefeito, baixou o olhar, pois mesmo os gatos se cansam de encarar o prefeito com sua pesada corrente dourada e sua caxarrel escarlate e sua calça boca de sino e sua fivela da queima do alho, mas começou a brincar com a pesada corrente de ouro.
Quando o prefeito se aproximou da cabeça da ponte, todo homem sustou a respiração, e toda mulher sustou seus suaves silvos úmidos.
O prefeito Gu de Ão e Ão, colocou o gato no chão da ponte e mais rápido que o pensamento de um raio, splash! Jogou água do jarro sobre o gato. O gato entre o Diabo e o jarro de água, mais rápido que o pensamento do raio pensado pelo prefeito, com suas orelhas para trás correu para os braços do Diabo.
Zangado como ele mesmo, o Diabo se zangou e falou ao povo de Ão:
Homes i Dones” gritava o Diabo do outro lado da ponte. “Vosaltres no son pas les gentes més bonicas que n'hi ha al mundo mundial” “vosaltres gairibe ho son gates” então disse ao gato: 'vini aci, meu gatet, que teniu por, meu petit gat?” “teniu fred”?
vini pobret meu que el diable t' encarga” “Anem al infern per una mica de chafagor, hi ens calentarem”.
E lá se foi ele com o gato de Ão.

P.S. O Diabo geralmente fala a língua dele o “Linguadovovo”, que ele inventa quando anda por ai, mas quando fica zangado pode falar em Catalão muito ruim bastante bem, embora quem o ouviu diz que tem um forte sotaque caipira!

tradução não ortodoxa da carta ao neto Stephen, Roubada a James Joyce, já em domínio público.


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