História da Omissão
A gente 'fomos'
omissos, durante tantos anos, cidadãos omissos. Nossa desdemocracia
é anterior, muito antes da ditadura, mas a ditadura aprimorou-nos
ainda mais na omissão. Os pobres, por isso mesmo, na luta pela
simples sobrevivência, numa relação de trabalho 'semi'
escravagista, não tinham e não faziam qualquer ideia a respeito de
liberdade de expressão, sequer saberiam se expressar. Outros tantos
se agarraram à ideia de um comunismo imediato, para tolerar ou
apoiar ditadores. E tudo que vinha do mundo político se engolia,
como verbalizou ainda recentemente Zagallo, a propósito dele mesmo,
'vocês vão ter que me engolir', e engolimos, da mesma forma
engoliu-se outros no âmbito do ludopédio nacional. Outro disse:
'Prefiro cheiro de cavalo...' . Era assim: na biblioteca do Otoniel,
uma bibliotecária com mais penduricalhos que uma árvore de natal,
me proibia escolher o que queria ler, por exemplo, dom quixote, por
nada, por determinação dela própria. No mesmo colegial, pensamos
exigir cortinas contra o inclemente sol, saímos em passeata pelo
pátio, a mim, me torceram o braço, um servente... voltamos à sala
de aula... e o professor Décio Setti que hoje admiro, considerou
exercícios resolvidos e explicados, na nossa ausência... caíram na
prova. Fazer greve se tornara coisa de vagabundos. E é nessa
condição de intocáveis que muitos políticos se mantêm. E há,
inclusivamente, alguns, que a massa hedionda, considera natural, por
direitos adquiridos, dessa idade média brasileira. Se você quiser
saber como era, basta ir a um conjunto habitacional – COHAB – e
verá que em cada esquina, se não morreu, mora uma família que foi
cabo eleitoral de algum ex-prefeito, porque em geral as esquinas
tinham terrenos maiores, porque as esquinas são bons pontos
comerciais, etc... Se um simples sorteio de moradias para miseráveis,
(muitos não eram, na verdade conseguiam sua segunda propriedade, ou
mais) era vilipendiado, pode-se imaginar o demais. História da
omissão.