Meu avô, imigrante
espanhol, subiu a Serra do Mar ouvindo mares de uma concha vazia,
trabalhou nos cafezais da região, fez tantos filhos quanto aguentou
dona Vicentina. As famílias eram de alguma forma, a pior, uma
empresa. Deixou a “colonia” com uma mão atrás a outra
segurando aquela, cabisbaixo virou tomateiro, e com ele, todos, nós
da família. No verão constrangidos, afogados, engasgados pela
rareza dos ventos de viração, - bochorno dizia o galego – e
alguém gritava “hora da boia” e dormíamos depois do almoço à
sombra ou nichos dela, donde fosse, esticados na sua profundeza virgem
e fresca, um tipo de morte ressuscitável.
Aqueles dias, faz mais de
trinta anos. Era menino, por tanto, fiz muita coisa secreta e
diabólica, mas como era católico, purguei tudo com avemarias e
padrenossos respectivos, sem nunca ter rezado o credo. Este deve ter
sido inventado para cristãos novos. Depois fui trabalhar em
Ribeirão, era office boy. Ia e voltava de Benelli em menos tempo que
hoje, e incrível que possa parecer, a estrada melhorou, os ônibus
melhoraram, a distância é a mesma, mas tardo mais.
A ideia de ir trabalhar
a Ribeirão não foi minha, era tempo de criança não expor ideias,
não me importando hoje de quem a teve, era para se ter uma vida
melhor, menos pó no sapato, menos sol na cabeça, mais asfalto,
datilografias em vez da enxada, dita caneta, duplicatas, ampliar
horizontes e banir as sombras e o “papo pro ar” nas horas
sagradas do descanso. Tudo quanto sacralizávamos o cigarro de palha,
o caldeirão de comida, embaixo feijão depois arroz, um ovo frito e
um naco de porco da conserva perdeu seu espaço. Andei terra, cruzei
mar e não vi e não vejo como obter melhores sonos e sonhos, que às
sombras de tamarindeiros, laranjeiras, mangueiras, ingazeiras e a
moringa de água fresca e o “ Acorda, vamos agarrar! ”
Nenhum comentário:
Postar um comentário