Oliver Twist.
Charles Dickens,
Ruppert von Wyk |
Século 19, Inglaterra,
um órfão do interior que sofre nas garras das instituições do
governo para órfãos. Por querer mais comer é entregue ao coveiro,
como aprendiz. Foge para Londres e se junta a um bando de
trombadinhas, comandados pelo judeu Fagin, a ideia do judeu avaro é
velha, talvez tenha sido tão bem aceita na Alemanha do séc 20,
Fagin vive da exploração destes meninos que, a miúde, vivem a
roubar, furtar pelas ruas de Londres. Oliver não quer se corromper,
tampouco consegue fugir deste círculo de pobreza e criminalidade.
Com o correr da história é ajudado por uma família, qual afinal
pertence.
Trata-se da Inglaterra
injusta, sem estado social, do século 19, com um direito liberal,
feito para as classes dominantes, é deste substrato que parte
Dickens, para retratar as mazelas da justiça no estado inglês.
O estado liberal
transitava ao estado social, e portanto temos ainda um estado com
imensa desigualdade social, fins do séc 18 para o 19.
Há dois pontos chaves
do livro que se pode discutir, não é necessário traçar
paralelismos óbvios com a realidade nacional.
O primeiro é a
desigualdade social.
Outro é a exploração
do trabalhador, no livro o trabalho infantil.
Naquele momento havia
na Inglaterra, naquele momento, um aumento substancial da população
urbana, os livros, em particular Oliver Twist fora publicado em
capítulos, e Dickens tecnicamente utilizava o recurso de em cada
final de capítulo, que à Sherazade deixa a obra suspendida, é o
suspense, o que literariamente é o que nos prende ao final de cada
capítulo e é talento de Dickens. Charles Dickens deixa plasmada na
obra a sua crença moral entre o bom e o mau, o certo e o errado.
A vida boa, welfare
state, vem como necessidade do fracasso do liberalismo do estado
ausentado, rarefeito, da lei mantenedora do status quo.
No julgamento do menino
Jack, Raposo, ou Matreiro, que encontrou e apresentou Oliver para a
turma, pergunta no tribunal: Quem é você para me julgar?
Quem é você para me
dizer o que bom e o que é ruim?
Pergunta é feita ao Fiscal da Lei.
Fagin
é apresentado diante do fogo, com um garfo, é feio, esconde
dinheiro, a riqueza que tem a partir dos meninos ladrões, no entanto
é quem dá, se é que exista ali, certa dignidade aos meninos.
Comem, são respeitados, tanto é que por ocasião da prisão de
Raposo, Fagin tem esperança que este tena oportunidade de demonstrar
todas suas qualidades de ladrão.
Fagin
ainda no julgamento assume o discurso das classes que recebem o
tratamento diferenciado da justiça. Faz tese sobre o direito de
roubar: se você não rouba, alguém roubará, assim Oliver deveria
ocupar este espaço, Fagin.
Dickens
não está a insuflar o furto ou dele faça apologia, mas diante das
diferenças sociais tão gritantes, é quase a tese da desobediência
civil, legitima defesa, porque são furtos famélicos diante da
extrema injustiça social da Inglaterra vitoriana, a justiça a
serviço de Sua Majestade, de meninos a trabalhar em reformatórios,
tudo em nome de Sua Majestade.
Miséria
pouca é bobagem.
Dickens
faz critica direta ao Estado, ao sistema jurídico, do estado.
Rose
Fleming e Maylie ao salvarem Oliver Twist, ficam em dúvida, entregam
ou não o menino à justiça, mas decidem por não entregá-lo,
porque os frios funcionários da lei não iriam entender,
contextualizar.
Porque
o Estado Liberal é absenteísta, deixa acontecer, e o que se vê no
livro é a pouca diferença entre o que acontece com os meninos
ingleses e os escravos em outras paragens do mundo, então, porque as
leis, naquele momento, legitimavam a exploração dos garotos, para
que pagassem seu sustento, e o pecado de Oliver é ser órfão e
faminto.
Na
obra se percebe no entanto que havia o clamor para mudanças, na
direção de uma intervenção estatal no Estado ausente, portanto,
Liberal.
Oliver,
segundo o bedel Bumble, fica raivoso, por haver comido muita carne
dada por seu patrão. É a ideia de que quem dá emprego faz um
favor, mas a animosidade é a clara demonstração que a sociedade
busca por rupturas.
O
humor fica por conta do espanto dos ricos e gordos comilões ao se
depararem com a vontade de comer dos pobres, se o estado lhes tem
dado tanto para comer. Isso me lembra muito o episódio do Romanée
Conti e a cúpula do governo petista, que gerou tanta animosidade
dentro da classe média brasileira. Mas mais que isso, as classes
dominantes se espantam ao se depararem com uma classe de desgraçados,
mas que ainda quer viver.
Brownlow
é a justiça, o homem bom, a justiça do homem bom, por que o
judiciário não era confiável, por existir tão somente para
preservar o status quo. O judiciário aplica a norma posta, a lei não
quer saber de contexto.
O
final é redentor, de vida no campo, tranquila e feliz.