29 de mar. de 2012

Locupletemo-nos todos.



Não sou ambientalista, mas compreendo os que reivindicam a preservação, e por não ser do contra, aceito suas teses. Todavia acredito que chegaríamos mais longe pela via obliqua da estética e da elegância que pela obtusa demagogia. Ninguém ama ninguém ou belo, talvez o esplendor erótico.
Todo esse nhenhenhém se deve ao fato de existir lei, já velha, que regulamenta o uso do solo às margens de rios, córregos e riachos. Não sei a quantos metros devem estar, as obras, do leito do rio. De orelhada sei que juntando a lei federal com a municipal chega a quase 100 metros. Entretanto o novíssimo condomínio Olhos d'Água, se avizinha ao olho d'água que corre rumo ao ribeirão Preto. Certo é que terraplenou à 25 centímetros dele, na verdade jogou terra no olho d'água, autorizados por duas placas, que plantadas no local, exibem alvarás e o que mais servir com álibi. Inútil espernear. Por isso adianto que a campanha publicitária na hora da venda louvará o verde, por meio de uma verde montagem, que do verde, saibam os amantes do verde, só os olhos rasos d'água!

27 de mar. de 2012

Flor de plástico


Teoria social da conspiração... é uma consequência da desaparição de Deus como ponto de referência, então fica a pergunta: Quem O há relevado? Karl Popper.


Por que o capitalismo é isso: feito da própria impossibilidade, seu eixo fundamental é: daquilo que há e querem que todos compremos, não dá para todos. Em suma o desejo de todos é a todos insaciável, não há iPad para todos, se todos o quiserem. Não há ruas para todos os carros, ainda que não exista carros para todos os que os desejam, não há leitos hospitalares para todos, ainda que os Planos de Saúde insistam em vendê-los. Um dos sintomas de nosso tempo é a fatal falta de verdades. Embora existam verdades em excesso e excessivas, difundidas em todo e qualquer suporte e forma, apesar disso, não as temos o quanto baste, e essas que temos, temo que se tornaram impronunciáveis. Declaro antes de mais nada, não ser adepto de qualquer teoria da conspiração, e este 'impronunciável' nada mais, ser, que a impossibilidade do interlocutor. Por que todos nos tornamos pastores, radiologistas, cozinheiros, artistas, médicos, críticos políticos, sociólogos, filósofos, ignorantes e substituímos o não crer em deus para acreditar em tudo. Assim defendemos os cães, mas não queremos subtrair deles os carrapatos gordos como feijões. Queremos encher o azul do céu de filhotes, como se fossemos sanhaços e que encontraremos, por todo o sempre, um papaia em qualquer parte. Queremos subir no mais metálico dos carros, por um estribo, e que este seja o mais distante possível do chão, e enquanto isso desejamos esquecer que haveremos de apear, e então ser o atropelável, por incauto, mas sempre furibundo.
Não há duvida que não existimos individualmente, senão que partindo da tribo ou sociedade na qual vivemos, assim o indivíduo é uma abstração ridícula. Isso não diz mais do que isso: somos parte do todo, que pode sim individualizar-se, mas sempre carregando consigo as marcas da sua tribo, que a cada dia não é outra senão a própria humanidade. Assim o cubano não é o cubano de outro planeta, mas o vizinho de Miami, e uns e outros necessários entre si. O que não quer dizer que não se possa suprimi-los. Mas a supressão de uns fará ausência aos outros, que por isso mudarão e mudaremos todos, e se nos individualizarmos depois da supressão de uns ou outros, seremos distintos do que seríamos se antes o fizéssemos.
Não cabemos no mundo da maneira que pensamos. Cada um por si, já que deus não revelou seu sucessor. Falta espaço e ouvimos “Quero uma casa no campo”, estamos assustados com a cidade e o multitudinário que isso implica. Um circense terá dito que lá em Piracicaba saltava de uma sarjeta a outra uma rua de treze metros! A resposta deve ser: aqui é Piracicaba, salte. Não há volta possível ao campo, à natureza ao bucolismo. Não entraremos nesse rio por segunda vez. Aqui é o campo e havemos de tocar muitas peças, aplanar arestas, chafurdar muita lama, jogar o palito do sorvete numa lixeira e o celofane do cigarro em outro, recolher a merda dos cães, assim como castrá-los junto aos gatos até quase sua extinção, saber muitas senhas, parar em muitos semáforos e ver muita TV ou Internet para que não tenhamos tempo de pensar no sentido disso tudo, para só então poder dormir com todo o ruido de fundo que sempre resta, como a torturante torneira a gotejar.
O 'não' poderia ter sido uma opção, mas já se extinguiu o tempo desta possibilidade, logo será obrigatório. A menos que insistamos na paranoia do ser Eleito entre milhões de enjeitados, somente para que permaneça a possibilidade, impossibilitada, que atende por esperança, essa loteria diuturnamente fraudada.
As vezes posamos de flor e rapidamente aparecem as abelhas, mas sabemos tratar-se de uma calêndula de plástico com umas gotas de água com açúcar.             

19 de mar. de 2012

Uma impressão d'O Artista. O filme.


Estava lendo o conto Mensagem na Garrafa de E. A. Poe; lá pelas tantas e totalmente submergido naquele mundo sobrenatural, o barco do narrador sossobrava depois de engolfado por uma onda gigante e espumosa, naufragava de proa. Narrador e um velho sueco estavam 'a salvos' em lugar exato, mas ignorado por mim, todavia descrito por ele; desconhecia da exatidão, por simples desconhecimento dos nomes das 'coisas' de um barco, certo é que era na popa. Eu tinha esta imagem, na verdade estava dentro dela, eu vivia a cena que se completava assim: o movimento das ondas produz cristas e abismos, pois do barco estando no abismo podíamos ver um imenso navio singrando a crista da onda, sabia antes de ler que aquele navio baixaria ao abismo e tocaria justo na proa do nosso barco que afundava começando por ela e este movimento de alavanca nos arremessaria justo ao outro navio.
Até então a narrativa era angustiante, acelerada e cheia de socavões. Deste movimento em diante ganhou uma terrível suavidade. Os tripulantes do grande navio não nos viam, sim a mim e a Poe, pois o velho sueco, como já sabia antes mesmo dos acontecimentos fantásticos, por que o narrador nos dava a saber que aquele homem não sairia daquele barco, daí que não nos acompanhou. E eu ali a vê-lo e ele não me via, nem sequer me imaginava, mas tampouco era visto por aqueles velhos, tão velhos que até as rugas se haviam gastado. De imediado me metia em A Invenção de Morel, qual o personagem tampouco é visto pelos hologramas. Então, eu discutia que fim teríamos? Ao mesmo tempo que sabia que Poe viera antes de Bioy Casares. E que Bioy Casares tratava da parte luzente da vida, das indiferenças decorrentes, fortuitas e gratuitas enquanto Poe nos leva a lado oposto por imanência fosco e inexorável. A balada final é a imagem fatal. O barco a girar num remoinho sempre rumo ao centro, ao fim. Há muito disso tudo que se transformou em cenas eternas de Hollywood.
Hollywood não brinca. Usa todos os truques da literatura. Principalmente da Literatura. Todas as figuras e imagens da Literatura da sinédoque à metalinguagem, passando pela intertextualidade.
O Artista de Hazanavicius é pura metalinguagem. Ainda que não exatamente uma produção de Hollywood é Hollywood falando de si e para tanto é também intertextual. Muito do filme talvez só faça sentido não só para mim, por que todos já o tenhamos visto desde os seus pressupostos. Para mim desde antes que Roberto Nóbile – era o operador - me mostrou a cabine de reprodução no Cine São Roque em Bonfim Paulista como a coisa se passava, e seu desespero quando exibia o mesmo filme que algum cinema de Ribeirão Preto - que começara um rolo antes sua exibição - e se angustiava com a espera da chegada do segundo rolo, que por vezes atrasou e ficamos, por isso, a ver a tela completamente branca. Falo disso por que foi naquela época que nos entupimos de um Kino mais próximo a 'O Artista' de M. Hazanavicius, e um pouco de nostalgia, claro ninguém é de ferro, e é disso que se trata N' “O Artista”. Daí que a presença do cãozinho se torna obrigatória, e é intertextual, e o é, por se tratar de presença recorrente no cinema mudo, um arquétipo. A batata da perna desconhecida e a singela tela que oculta à sua dona o galã, e ela a este, que lhe é desconhecida, mas a nós não, nunca são, pois este cinema nos permite saber mais e adiantado, e por vezes de forma exasperante, o que vai acontecer, como que nos preparando, nos cozinhando para a lágrima da qual não se pode fugir, pois começamos a dirigir as cenas e acabamos vivendo; e nossa vida amorosa é sempre de chorar. O cinema mudo nos dá esta liberdade, e criamos os diálogos, que sabemos de cor e interpretamos todo o tempo a nós mesmos e choramos às bicas, pois sabemos o que vai acontecer. E choramos de arrependimento, quando nos toca na cena ser o malvado, ou por haver sofrido a malvadeza. O final feliz também nos faz chorar, talvez mais ainda, pois é exatamente o que queríamos que acontecesse conosco, o melhor dos Happy endes, menos que se acenda a luz!

16 de mar. de 2012

Liberdade de pensamento e expressão, segundo Albert Camus.



Lucidez; Ironia; Desobediência; obstinação.

Lucidez. A lucidez supõe a resistência ao culto do ódio e da ira e o culto da fatalidade.

Estupidez. Frente à maré crescente da estupidez, se faz necessário alguma desobediência, mais ou menos isto: por menos caráter que tenhamos, não podemos aceitar ser desonestos, ou ainda, rechaçar o que nenhuma força consegue nos obrigar; numa palavra: não servir à mentira.

Ironia. A ironia é uma arma sem precedentes contra os muito poderosos, pois completa a rebeldia, não só esculachando o que é falso, como também a miúde apontando o que é certo.

Obstinação. Uma certa obstinação para não se desanimar diante de certos obstáculos a citar: a constância na tontice, bobeira, a abulia organizada e a estupidez agressiva. Camus escreveu este manifesto há 73 anos, originalmente orientado à imprensa francesa, por ocasião da possível capitulação dos franceses frente aos avanços do terceiro Reich. 























15 de mar. de 2012

Pizza de Línguiça com Pimiento, morron, amarillo!


Errei ao publicar aqui, quis postar no Bistro Rural. Mas, quinze, quinze, já que tá que fique!!
Este era o brado dos torcedores do Nho Quim, como era conhecido o XV de Piracicaba, nos tempos em que o futebol do interior importava alguma coisa.
Uma boa linguiça fina de pernil. Pimentão amarelo assado no forno a lenha e pelado. Cebola roxa assada no forno a lenha e cortada em lágrimas. Mussarela. Uns raminhos de erva doce e forno.
estes fiapinhos que se vê são de erva doce.




11 de mar. de 2012

Deixar para lá um olhar de cachorro.



Eu prefiro sangue no 'zóio' e coração peludo a olhar e ser olhado qual cão sem dono, como quem de dentro da animalidade, quer dizer, que a vida é coisa inútil, mais ainda, inglória. Ora, ora, ora! Se queremos paz. Há que se partir para o entendimento, e para tanto não posso me furtar a discussão de cada desarranjo meu ou do outro. Defender com clareza, até com fúria, se de fúria se tratar. De matreiro olhar de cachorro sem dono, já fui mordido algumas vezes, demorei a aprender, mas nunca mordi, não sem antes ensinar os dentes, rosnar ou mesmo latir. Verbos para cães e não gente nesta inversão fabular. Temo os olhos caídos, porque fazem com que abrandemos o coração, portanto direis; mas digo, não tem nada a ver com o coração, é a guarda que baixa, e não vigilantes: nhac!
No dia 'da mulher' – não me detive a discutir seu caráter contraditório, um dia especial, porque levaria a vida toda, não um dia – pois naquele dia o mundo se fez cor de rosa, alem de colorido, florido; em tudo quanto li, muitas homenagens, algumas picardias, como uma moça que comparava mulheres flores naturais com mulheres flores de plástico, mas aquilo era guerrinha interna, que sem mergulhar, bastava um escafandro, e se veria a nebulosa de veneno.
Não sou besta, loei, mecanicamente, aliás como todos, isso é um arquétipo comportamental, sei o nome da figura, mas nem sequer isso direi. Fico imaginando, se faço um texto com um mínimo de questionamento, toda essa gente afaimada sairia atrás de mim, como um exército brancaleônico, faminto e esfarrapado. Digo o mundo está lindo. A vida é bela. Irreparável. Se alguma reticencia... deixe pra lá, o tempo cuida de tudo, entretanto tome calmantes, sorria amarelo ou mesmo abaixe o olhar, murche as orelhas. Como dizia um louco de viola em punho, numa véspera de ano novo em Picinguaba: Tá ruim pá mim\ tá ruim pá ti\ vou fumar um...


9 de mar. de 2012

Urubus.



Tinha cinco anos de idade e morava em Pirassununga. A uma quadra de minha casa formou-se um ajuntamento de pessoas, porque um urubu andava tonto pelo chão, por haver trombado, segundo diziam todos, com o fio de alta-tensão. Especulava-se ainda que, devido sua maior massa, ele levava choque, coisa que não acontece aos pássaros menores. Óbvio que quem dizia isso, nem sequer tinha ideia de como ocorre o choque elétrico. Só vim a saber, numa aula de Artes e Música no colegial. Não devido à disciplina, mas pela indisciplina do Luiz. Luiz, japonês, segurando dois fios de cobre, enfiava um na tomada que havia na sala, enquanto o descuidado professor estava atento às pernas da Diva. O truque estava justamente em não introduzir ambos os fios, um em cada furo da tomada, mas tão somente um. Assim não formava o curto circuíto. Dá-se o mesmo com os pássaros que pousam nos fios de energia elétrica. A outra possibilidade é enfiar os fios em ambos os furos, mas estar isolado da terra, que é por onde se descarregaria a energia. Dessa maneira o urubu, ou qualquer outro pássaro leva choque.
Naquele momento, infantil, não estava preocupado com a história do choque; somente olhava para a imensidão do bicho, seu bico volteado e sua capacidade de se defender a bicadas, ainda que tonto, de todo aquele mundaréu de gentes que ali se juntara.
O que sei é que passei a ter sempre uma atenção especial para com os urubus. Uma admiração muito grande pelo seu voo. Sua capacidade irretocável de tomar as termas e subir. Esta é a parte bonita e que me interessa, ainda que saiba da maldade dos urubus, que o primeiro que fazem ao se depararem com sua presa, que ainda vive, por qualquer motivo imobilizada, atacam-na justo nos olhos. Numa palavra, os urubus cegam suas presas, quando vivas; só então começam a desfrutar do pasto, ainda que estejam vivas. Julgo que julguem uma falta de ética, comer a quem ainda pode vê-lo comendo-o. Li recentemente uma fábula, escrita por Ruben Alves, que não gostei. Ruben Alves chamava os urubus de seres naturalmente becados, fazendo analogia à beca de formatura, ou a indivíduos graduados. Na fábula, Ruben coloca os urubus querendo e estabelecendo cursos de canto. Penso que Ruben poderia ter escolhido qualquer outra ave. A galinha por exemplo, por indigna, mas os urubus não. Os urubus se isolaram deste mundo de grandezas, são silenciosos e tímidos e sabem que a vida só tem mesmo valor em estado putrefato. Portanto é justo o contrario do que pensamos, quando toda a grandeza se esvai é que o bicho descobre nela o grande valor nutritivo. Enquanto isso flana incansável. Seu voo é um jogo de paciência e disciplina. Ele sabe que a ordem é o aumento da entropia, a perda de informações importantes e o consequente caos e a deterioração, a plenitude é circunstancial. Coisas interessantes e embaraçosas acontecem, os aeroportos estão sempre muito próximos dos pontos de concentração de urubus. Tanto que vira e mexe há trombadas entre aviões e urubus, com perda total pare estes e parciais para aqueles. A diferença é que vamos para algum lugar desde o aeroporto, enquanto o urubu permanece a espreita dos que ficaram, é inexorável, não há fuga possível. Se se quiser traçar um paralelo, partimos como urubus e chegamos como carniça.      

8 de mar. de 2012

À Mulher.




Verdadeiro o fato e, é certo também que existe a discriminação da mulher em nossa sociedade. São alarmantes as cifras anuais de violência sexual, e a situação de assedio sexual, nem sempre devidamente atendida pelas autoridades competentes. Persiste ainda as diferenças salariais entre homens e mulheres. E há testemunhos frequentes de diferenças no trato pessoal no trabalho, que as vezes se estendem além do grau de capacitação profissional exigível na prática, assim como as condições requeridas para ascender a postos de responsabilidade.
Além do mundo do trabalho, existe e persiste a desigualdade entre homens e mulheres na distribuição das tarefas domésticas. É real o sexismo na publicidade, onde a mulher é considerada, a miúde, um objeto sexual. São igualmente verdadeiras as atitudes paternalistas de alguns homens relativamente às mulheres, seja dentro o fora do trabalho, e muitos outros signos sociais de desigualdade ou de discriminação, que por vezes são denunciados, mas ainda timidamente.
Há uma crescente preocupação com o uso da linguagem, principalmente na Europa. Há instituições que afirmam que há comportamentos verbais sexistas. Sendo que a linguagem, pode ser usada com propósitos múltiplos, entre outras coisas: ordenar, descrever, perguntar, enaltecer ou insultar; assim e desde já também pode ser usado para discriminar pessoas ou grupos sociais.

Neste contexto existem numerosas instituições mundiais advogando pelo uso de uma linguagem não sexista.
Dizem estas instituições: É necessário estender a igualdade social de homens e mulheres e conseguir uma maior visibilidade da mulher, para além do sexismo. De tudo que li as palavras que se fizeram notar é: visibilidade, invisibilidade, visível e invisível. Isto é: tornar a mulher visível numa frase ou oração em que também participe uma mulher, grosso modo: João e Maria vivem “juntos”, nesse caso o advérbio faz referência masculina: Juntos. Estas instituições pedem, de forma exagerada, neste caso que se inclua a mulher.

Entretanto não se pode negar que esta frase é sexista: Até os acontecimentos mais importantes de nossa vida, como escolher nossa esposa ou nossa carreira, estão determinados por influencias inconscientes. É introdutória de uma perspectiva bem caracterizada do androcentrismo, como se fosse uma perspectiva geral dos seres humanos. Ou ainda: nós brasileiros preferimos café a chá, como preferimos loira a morena. Não se trata do uso de artigos ou possessivos como: todos nós, os que vivemos num grande centro.... Mas sim frases tolas como esta: Elas nos fazem de bananas! Querendo parecer um alisamento do ego feminino.
É certo que o uso 'genérico' do masculino para designar os dois sexos, tem raízes profundas no sistema gramatical de nossa língua, e é, pode-se dizer, que quase impossível no caso aplicar censura.
Leia isto: uma cientista depois de fazer um discurso favorável, quase panfletário defendendo a mulher, e a necessidade de se abolir a discriminação de toda sorte, assim termina: Nós 'os' cientistas temos a obrigação de fazer com que a difusão da ciência seja acessível... Acrescenta ainda: um aspecto importante para a participação da mulher no mundo profissional é que haja facilidades para o cuidado 'dos filhos...' e agradece ao final: … 'aos amigos' e seu apoio e amizade...
Este tipo de texto está em toda parte, e produzidos por mulheres jornalistas, escritoras, artistas e muitas das vezes comprometidas com a defesa dos direitos das mulheres.
De todas as maneiras o movimento existe, principalmente na Europa, muito nas línguas românicas, português, espanhol, italiano e francês; mas sem esquecer do alemão onde 'man' é 'um que, alguém' e que ainda se relaciona diretamente com 'Mann' “homem” exemplo: Das sagt man. Que quer dizer: É o que dizem (notadamente masculino). Ou como 'on' em francês, 'hom' catalão que tem origem no latim “hominem”. Mas tudo isso é fóssil. O importante é saber usar a linguagem para expressar exatamente o que se deseja, desenvolver-se intelectualmente, defender as próprias ideias, tê-las, realizar-se pessoal e profissionalmente, em plena igualdade. Ainda que supostamente.

Refavela.



Havia até outro dia, tapume circular num dos 'coretinhos' da Pça das Bandeiras, ele era mequetrefe mal alinhavado, muito do malfeito. Pois não tardou a chegar a retroescavadeira e você, como eu, pode pensar que alguém antes desfez o malfeito! Tábua a tábua. Mas nem não sequer. À bruta, a retro, meteu seus dentes de máquina e estraçalhou, em uma dentada, sozinha, um pedaço do tapume. Eu vi. Vi os restos dos compensados estraçalhados em meio à terra, que a retroescavadeira, por andar 'de costas', não vê nada e vai quebrando e abrindo com furor a vala, descendo pela calçada da desdita praça. Neste seu refazer, nada se salva, nem um pedaço de calçamento. A construção civil, reis de geração de entulhos, públicos ou privados, persegue sua sina. Nem um isolamento caprichado. Só uma fita amarela de árvore em árvore, soltando os nós. Um refavelamento como cronologia inicial de uma engenharia. Claro que depois de tudo isso, a calçada na Visconde de Inhaúma ficará um remendado remendo. Os ladrilhos não coincidem jamais. Por isso os portugueses preferiam pedrinhas a ladrilhos regulares. Hoje é pó, tão só pó, para tudo que é lado. Deve ser uma equipe treinada em zelosas desocupações, nas desmanchações de barracos. Deve de ser!  

6 de mar. de 2012

Cortar os pulsos!



Ser poeta; pintor; músico; escultor; arquiteto; livre pensador ou simplesmente humano não é tomar de um caco de vidro, cortar os pulsos e verter-se em hemorragia. A vida deve seguir. E por dever de continuar, nenhuma obra de arte trará solução, nem sequer uma qualquer ideologia, se, se leva em conta que o difícil suicídio via o corte de pulso, no mais das vezes, tudo que faz é a teimosia em deixar aquela saliência que anos adiante se tentará ocultar com a pulseira do relógio.
Há entretanto, e por toda parte tais manifestações. Muito, corriqueiramente e, a miúde a fotografia é vitimada. Um exemplo é um menino negro africano de barriga grande disputando restos com urubus. É um corte no pulso com vidro, mas não é arte. Na música houve o caso recente da inglesa que fabricava queloides e por fim acabou por uma industria menos densa, ao compor a própria fuga em tons pasteis. Outro exemplo, mais remoto, é The Wall, uma tontura provocada pela perda de sangue, em lento derramamento, aonde a perda de sentido – lisérgico - se faz notar pelas vozes indecifráveis e quase fantasmagóricas. À época quem fumasse maconha não deveria ouvir, porque acontecia de ocasionar uma somatória de ondas que reverberavam, ou mesmo produzir ecos que se confundiam com as frases musicais que redundavam desde a primeira volta da agulha.
Por outro lado há outros tipos de sangue esguichando, mas de maneira regrada. A música sertaneja e neo sertaneja, como queiram. Dá para ver no rosto do ou da cantante o quebranto, as cólicas e a contorção das tripas, coisas que fazem do ser atrás do microfone exibir o calafrio, a febre e o suor mesclado com hemoglobinas. Como se o palco se tratasse de um monte - o Calvário - o microfone, a própria cruz, e na plateia: as marias e a madalena suportadas por apóstolos em estado de brandura. Não deixa de ser seita.

4 de mar. de 2012

Michel Teló: Uma vindicação.



Não é costume meu, ser evasivo; porque nisso reside a arte, não tenho inclinação artística, senão que desejos. Entretanto como tentativa de me revitalizar como indivíduo, por vezes sou levado à falsidade, ao plágio e mesmo a reinventar minha própria biografia. Pode parecer o que for, desde já, mas tem o propósito último de ser a mim um passatempo de mim. Uma problematização metalinguística de mim mesmo que buscará solução em qualquer parte. Haverá aquele que entenderá como um ceticismo epistemológico, ainda que estime muito a religião e a filosofia, mas tão só no que tange valores estéticos, no que encerram de singularidade e de maravilha. O que poderia se chamar ou identificar como um ceticismo essencial. Não tenho nenhuma teoria do mundo, embora possa usar a metafisica como sistema, ou o materialismo como religião, mas isso não deve passar de um aproveitamento necessário à solução de problemas específicos. Não creio que o conhecimento seja possível. E se poderá dizer agnóstico de seu praticante. Como dizia H.G.Wells: intercalar doutrina nos pensamentos e escritos é deplorável. No específico das mundanidades fui levado a conhecer o que alguns poucos conhecem e desconhecer o que é de todos conhecido, quer dizer sou uma lacuna vergonhosa. Confesso que gostaria de ser facilmente localizado no platonismo, ou num panteísmo a la Espinosa, ou mesmo um niílico panteísta. Mas dada a minha admiração pela metafisica, sou mesmo é um caipira perdido na metafisica, que é uma terra fértil que não serve à cana-de-açúcar, e apesar de ser completamente incapaz de entendê-la é por meio dela que me ocorre de um tudo, urticárias ou bicho de pé ideológico, menos a fimose intelectual, que não passa de um aprisionamento de todo o pensamento por uma corrente ideológica, ou como já o disse antes, é a deplorável necessidade de intercalar doutrina por todas as partes do orbe.
Cada uma a sua maneira, certas canções, atingem um tipo de perfeição, e há estudos profundos ligados à linguística, mais precisamente à linguística generativa de Noam Chomsky que coloca no centro de tudo a sintaxe. Antes de Noam Chomsky se cria que a linguagem era, por completo, adquirida por associação e ou aprendizagem, o que digo para linguagem vale para qualquer destreza humana, a música por exemplo. Depois da publicação de 'Estruturas Sintáticas', que atacava os pressupostos básicos do estruturalismo e da psicologia condutivista, onde Chomsky postula a existência de um dispositivo inato, quase um 'órgão da linguagem', que permitiria aprender e usar a linguagem de um modo quase instintivo. Basicamente é assim, há os que pensam que o cérebro de um bebê é vazio e deve-se enchê-lo, já Chomsky pensa que o bebê nasce com todos os dispositivos no cérebro especializados e inatos.
Dessa maneira há canções, como todas, existiam antes, isto é: 'Ai se te pego', existia ou estava no limbo, como Michel Teló existia no limbo, e foi no limbo que Michel encontrou 'Ai se te pego' que eram a peça e o vazio ou espaço falto do quebra-cabeças. O grande valor de Michel Teló e vislumbrar o que existia, coisa que nós a maioria dos mortais não vemos. Vemos muito menos coisas do que as coisas todas que existem, e para disfarçar acreditamos em coisas inexistentes, afim de parecermos inteligentes, ou parecermos insatisfeitos com o mundo. Podemos explicar esta união cabalisticamente, sem necessariamente sermos especialista no Talmude, porque a Cabala é necessariamente precisa e justifica todos os acontecimentos do mundo, e suas necessidades últimas, onde os acontecimentos não se dão ao azar. Ou seja, a contingência do azar é zero. Veja você que o dito vai de encontro à famosa frase o poema mallarmaico: 'a coup de dés jamais n'abolira le hasard' que contraria toda a cabala, sendo que institui como mínimo uma possibilidade extra. O que levaria Borges a dizer que Mallarmé e seu poema está incluído, por conseguinte, em todos os acontecimentos do mundo, o abraço se fecha sobre tudo. Assim sendo 'Ai se te pego' e Michel Teló são tão necessários e não casuais como o faisão azul de bromotimol ou tornassoleado, como preferirem. Porque Michel é Mich (alemão eu) e el ( espanhol ele) então EuEle, e Teló é antes de tudo Tê-lo é 'tela' 'telon' espanhol e Teló 'tela catalão' e uma outra vez 'el' e 'elo' 'eloé' e recorda de pronto Telavive e 'ai se te pego' tem o ritmo marcado exato, melhor dito na melhor frequência para se 'fazer amor' muito parecido ao Bolero de Ravel.
E desta maneira sem conseguir uma linha de fuga, acabo por me agarrar a determinadas ideologias que não dirão nunca: matematicamente se poderia conseguir a conjunção: canção e cantor(voz) (veículo) perfeita e agrada a toda a gente, mas o que realmente não queremos, nem sequer parecer, quanto menos ser igual a toda a gente.   

2 de mar. de 2012

O Medo.





Resulta triste ver jovens,  ou não mais tão jovens, convertidos em conservadores quase xiitas, mais liberais que o liberalismo, e em suma: fundamentalistas rancorosos. De outro lado ver um nonagenário, ou quase, como Vicente Golfeto se transformar num intelectual quase progressista. O homem é de uma afabilidade cruel e de uma lucidez proada, fundamentada num discurso de corte clássico, ainda que atrelado às tradições e posições conservadoras. Entretanto este senhor, culto à europeia, acaba por ser vanguarda de ideias do futuro imediato, e o faz com comodidade de quem já viu tudo e que não espera nada de nada e de ninguém, e menos ainda dos jovens de hoje. Justo estes que têm – todas as gerações a tiveram - a pesada responsabilidade de desenhar uma sociedade melhor que a de hoje, mais justa e equitativa, pelo menos; o que era para ser uma quimera, que a cada momento se parece mais a uma necessidade.
É certo que mesmo os que advogaram por uma economia 'mais humana, mais solidária e capaz de contribuir ao desenvolvimento da dignidade dos povos ou das pessoas', sabem que depois dos referentes do homem como medida de todas as coisas – gregos – e – de Deus nos tempos medievais – que nos miramos no deus capital, desde o âmbito da revolução industrial até desembarcarmos no milagre das novíssimas tecnologias, sempre estão tentando responder às perguntas que questionam o modelo moral atual.
Se o dinheiro é o termômetro de todas as coisas, as reservas essenciais da pessoa se pervertem – felicidade, responsabilidade, justiça, equidade – até o ponto de se perder a perspectiva do coletivo e do social, e por extrapolação portanto, do planeta em que nos cabe viver.
Assim sendo, a chave de retorno, para combater o sistema se baseia, toda a vida, na liberdade. Sobretudo a liberdade de pensamento, que é o território onde a identidade individual pode realizar-se e vir a concretizar-se, primeiro modificando ou fazendo por isso, no seu círculo restrito. Porém esta liberdade, aliás, sempre está ligada a independência intelectual dos indivíduos, seja qual seja o meio que o acolhe, seja qual seja o meio que ele escolhe acolher; ela, a liberdade, resulta cada vez mais difícil frente aos planos dos meios de comunicação ( meios de persuasão nos diz Vicente Golfeto) do poder e do açambarcamento perene e continuado do medo como conceito de utilidade. Não se é um homem com medo, se é um cordeiro, que quando muito olha e ora pela sua sobrevivência, e, terror dos terrores, o faz com a alma lavada – consciência limpa – e pasme-se, quase que por instinto natural.
Entretanto e sem nos darmos conta, o medo é só um cenário, uma conjuntura, uma sombra que ameaça. Notem que cenário, conjuntura e sombra, todos tenebrosos, são vocábulos diários de meios de comunicação. Voltando, por que ameaçam? Ameaçam porque escondem seu conteúdo e pronto e basta. Enquanto as novas redes sociais e os 'novos espíritos' deveriam propor o contrário; não espalhar o medo, mas botar luz nessa impostura obscurantista. Desde Pitágoras sabemos que um raiozinho de luz pode iluminar a escuridão