29 de abr. de 2016

Duplo assassinato no quarto vermelho de um motel..


    Não me recordo como cheguei aqui. Sei que é um quarto de motel pelo quadro de avisos e tarifas e as instruções em caso de incêndio pendurado na porta. Seguro na mão um copo com um pouco de bourbon, o deixo cair, e assisto aturdido como os cristais se esparramam como contas de um colar. Há uma janela aberta. O vento move sem vontade as cortinas vermelhas. Detrás das cortinas aparece um japonês da PF anão, sorri para mim e começa a dançar. Estala os dedos ao ritmo de uma música que não ouço, com sua voz gutural diz algo incompreensível: - “A gente assaz sina é pedreira, né.”
    Desvio o olhar do monstrengo e me
    sinto estranhamente turvado, é quando vejo Eliane Catanhede sentada discretamente numa poltrona num canto do quarto, sorri, mostrando duas filas simétricas de dentes alvíssimos e ajusta a saia sobre os joelhos num gesto ensaiado. O anão japonês da PF segue dançando sobre o piso de tabuleiro de xadrez do quarto vermelho.
    Da janela me chegam rumores de vozes roucas e discordantes. São agentes da PF, também, porque percebo claramente um “ Temos um duplo assassinato”. Logo as vozes são abafadas pelo ruído de sirenes e barulho de passo sobre pedras britadas. Estão rodeando o edifício, ao que parece o assassino se encontra ainda no motel.
    O anão japonês da PF já não dança, está imóvel, como uma caixinha de música sem corda.. Eliane Catanhede jaz sem ânimo sobre a poltrona. Agora entendo tudo. O anão japonês da PF, ou talvez Eliane, suspeito, colocaram alguma droga no bourbon que demorou a fazer efeito. Perdi muito tempo contemplando absorto um baile que só existia na minha cabeça. Um duplo crime. Está claro quem é o assassino, porque o trinco da porta do quarto está fechado por dentro, e Eliane e o anão japonês da PF estão mortos. Esmurram a porta. -- PF! Abra imediatamente.    

27 de abr. de 2016

Uma ponte para poucos.





Se queremos nos conhecer, a nós mesmos, devemos entender nossas trajetórias. Donde viemos até adonde vamos. E especialmente saber, se vamos para onde dissemos que iríamos, ou queríamos ir. As trajetórias são mais valiosas que a acumulação de experiências e tropeções pontuais, porque as trajetórias criam hábitos. Se não a avaliarmos não pode haver consciência do próximo passo. Que pode ser um desvio de rota, para o qual não há retorno. Como país, a rota democrática, sempre a interrompemos. A ponte que propõem nada mais é que um retorno ao passado mais cruel. A rota do aniquilamento da maior parte da população. Em qualquer momento haveremos de tentar novamente, e recomeçar do zero.

só vou te contar um segredo não nada,nada de mal nos alcança pois tendo você meu brinquedo nada machuca nem cansa

só vou te contar um segredo 
não nada,nada de mal nos alcança 
pois tendo você meu brinquedo 
nada machuca nem cansa.  fulgaz, Marina. 


Normalmente, contam-me coisas que já sei, mas as vezes no meio da conversa aparece um detalhe, novo, um perdigoto, um lapso de linguagem, um sem querer, que recolho com cuidado, como se fosse um coração pulsando fora do peito, carrego-o com carinho, até o novo dono. Não se pode desperdiçar nenhum detalhe das conversas, não desperdiço, porque não se sabe se se converterá, lá à frente numa ponta de um novelo que se pode ir puxando, puxando. As vezes, e isso é o mais desesperador, me contam coisas com a condição de que não as conte a ninguém. Sim, digo que sim. Ouço em silêncio. Me emociono. E calo. Para sempre. Normalmente, isso que tenho que guardar, é aquilo que daria verossimilhança e intensidade a um relato, e tem que ver, claro, coma as coisas humanas dos que compartilham com os demais humanos. Tenho o quintal cheio de buracos, nos quais enterrei meus segredos. Está se tornando um campo minado, mas a alguem tenho que dizer o que me calo, para que não me expluda.

22 de abr. de 2016

Velório de Nézin do Corote e Mel Gibson.



No funeral do Nèzin do Corote o padre passou seu sermão, curto, falando de Mel Gibson. A câmara ardente estava cheia, muitos candidatos. Nèzin nunca teve uma relação estreita com Mel Gibson. Não teve nenhuma, na verdade. Mas o padre achou que tinha o zap, sete-copas e espadilha. O caso é que o tipo não havia começado mal o despacho: “vejam vocês, nessa vida não somos ninguém.
De um dia para outro um ser querido nos deixa, assim, inesperadamente. Repentinamente.” Ele sabia, mas não ia dizer nada, ali à frente da mãe e dos irmãos de Nèzin do Corote, sobre sua entrega a Allan, alambique; e continuou ...” bom como Nèzin que só tinha 50 anos, tampouco era uma criança...” Vendo que não podia falar muito da vida porca de Corote, decidiu falar de Mel Gibson. Desse sim, sabia muito. Deve ser por culpa do filme Paixão de Cristo.
Não creio que o padre tenha gostado ou visto o filme, mas dá no mesmo, é como se o tivesse visto. E se meteu com o cineasta como sempre fazemos, seja, direto no bolso. Esse Mel Gibson, tem mais dinheiro que estrelas no firmamento. Aquela metáfora, ou como quer que se chame esta hipérbole demente, me pareceu dum valor poético altíssimo e precioso, e um tanto acidental.

Recordei disso, não sei bem por quê, acho que foi com a história de um senhor do Adelino Simeone, um bairro da periferia de Ribeirão Preto, digamos, José, seu José, que morreu faz uns meses, numa casa cheia de lixo. José tinha síndrome de Diógenes. Tinha também uma bicicleta velha, que passeava pelas tardes. Ia de lixo em lixo, tomando os desperdícios como tesouros. Até um computador encontrou. No mundo real, José era um sujeito fodido, sem família nem trabalho, um louco de vida desgraçada e penosa. No mundo virtual, se transformava, como se transforma Clark Kent ao sair da cabine.



No Facebook, José se sentia Super-homem. Enfeitara seu perfil com fotos do rio Pardo, de poentes, e de amanheceres. Bendizia a paz, o amor, a esperança. Muitas crianças, cães e gatinhos. E tudo era curtir e amei. Não estava só. Tinha 700 amigos. Tinha mais amigos que estrelas o firmamento. Feliz. Naquele dia, que faz meses, abandonou a realidade de vez, aos 51 anos, emparedado pelo lixo, foi encontrado só, primeiro pelos urubus, depois pelos vizinhos, mera repetição, veio o Datena. E o padre, também becado, nem foi até lá, para falar mal de Mel Gibson. Acho que já virou pó, desse que se fazem estrelas, dessas que abundam no firmamento. .







Poeta e Ladrão, Nobre Deputado.

Poeta e Ladrão, nobre deputado.


Ao que me consta, ele advertiu numa entrevista: “...não creio que alguém possa viver de escrever poesias. Empresa romântica e quixotesca”. Mas ele vivia bem. O delegado Menezes o deteve no Hotel Asturias no Rio de Janeiro no verão de 1989. No momento que se aprontava para assistir à entrega do prêmio Machado de Assis de poesia, do qual dizia ao delegado ser jurado. Era o seu habitat. Concurso ao qual havia apresentado seu último livro: “Tanajuras, o vértice”. Levava consigo a arma incriminadora, a esferográfica. Não é que escrevesse tão mal que merecesse ir preso. Tinha uma certa fama, de fato. Ainda o encontramos na Amazon e no sitio Domínio Público do governo federal. Jaboti, Jaboticaba, fora publicado em 1985. O problema é que quando não fazia versos falsificava cheques. Ninguém suspeitaria desse maranhense de formas divertidas; Jusmari Negromonte poeta e romancista ganhador do premio Ribeirão das Letras de Literatura entre outros galardões e Sarnem, o Deputado, fossem a mesma pessoa que alimentava uma capivara, uma folha corrida delitiva mais extensa que seu corpus poético. Qualquer cronista da época citava uns versos de seu poema “ Pardeus, que Máscara!” , que rapidamente adquiriam um novo sentido.
Rasgue o seu disfarce,/
rasgue e pronto,/
o carnaval já terminou/
o carnaval se foi tonto” .
Dele foi retirada a máscara, e para ele a festa estava acabada; no entanto, não sofria pelos milhões de cruzados estafados, porque logo ao sair da prisão em 1996 foi preso novamente, depois de mais um golpe do colarinho branco, esse sim, deixou uns bancos cariocas com um buraco de milhão de dólares, toda uma fortuna. Se fizermos caso da crônica que assinava Julinho Chiavenato no A Cidade, o delegado que levava o caso, mostrou-se admirado. “Me deu muito trabalho, quer dizer, novamente me deu muito trabalho, senhor Sarnem. Cada vez o faz melhor e é difícil pegá-lo”. Continua Julinho, O poeta agradeceu o elogio “ Isso quer dizer que nós dois temos sido bons profissionais” .

Moral da história, Sarnem roubava porque havia, ele próprio, que editar seus livros de poemas, e acima de tudo queria ser poeta, sem ter que se importar com o preço.  

19 de abr. de 2016

Por Deus! Pardelhas!

Topou 
com o muro da incredulidade
                                ateu
Levado na manada fanática,        à toa.
Fingiu 
isenta                                                                  distância dos extremos
ator.
Engolido                                      cru,                             por deus!       atum.
Espera
a próxima, 
até.



18 de abr. de 2016

Eu, O Monstro.

Eu, o Monstro.

Estou com minha miséria existencial até o pescoço. Há coisas para as quais não estou preparado. Hoje enfrento cara a cara a mais dilacerante de todas. Uma ferida que sangra sem remédio. Não é mortal, sei, mas levarei esta cruz pelo resto de minha vida. Minha filha, minha mais e única amada filha, meu tesouro, a luz dos meus olhos, gravou-me em minhas roncaduras. E os botou para que ouvisse. Os ouvi. Os ouvi junto com toda a família. E asseguram que esse estranho ser roncador  que dorme com minha querida Joana, sou eu. Dei um ultimato a minha querida filha: borre esses roncos de seu celular, ou que suporte as consequências... adotar uma filha.

13 de abr. de 2016

Resumidinho

Resumidinho.

 O país cresce. O cara fatura. Cria uma offshore. Transfere capital para ela. Vem a crise. Aquele capital não volta para investimentos. Em crise os bancos limitam crédito. Sobra como única forma de manter lucratividade  diminuir salários. Com um governo mais para a esquerda não é possível. Democraticamente a mudança não ocorreria nem em 2018. Em 2022 já estará formado Fernando Haddad. Solução: Golpe.

12 de abr. de 2016

Nasrudin Afanti


Introspecção. 
Nasrudin Afanti se dirige ao mercado para vender duas belas melancias de sua horta. Caminha com uma melancia em cada braço, quando vê em uma curva do caminho, outro homem adiante dele, vestido exatamente igual a ele e carregando duas melancias uma em cada braço.

  • Allahu Akbar! - exclama – Se esse não sou eu, não vejo quem possa ser!
    Aperta o passo por uns momentos, mas logo renuncia definitivamente alcançar-se:
  • Final de contas, se pergunta: Para que vou me alcançar?

Hóstia Consagrada.


Sabia que o dogma da presença real de Cristo na Hóstia consagrada data de 1215? Eu não sabia. Quer dizer, o IV Concilio de Letrão, foi quem decretou que a hóstia era o corpo de Cristo. Até então, por treze séculos era só um símbolo, não sua realíssima carne. Nem havia que se confessar. Nem sabia que foi depois disso que se esparramou pelo mundo, histórias de judeus, que de pois de engolir uma hóstia, eram acometidos de todos os tormentos da paixão. Em vez de dissolver, a hóstia sangrava e sangrava, até que o sangue denunciasse o malfeitor, e imediatamente era submetido a todos os castigos imagináveis e inimagináveis para purgar seu sacrilégio.

Á inocência não convém a Política.

A inocência não convém, em Política.
Num país longínquo derrubaram a presidenta da presidência. Não era improvável que sucedera, mas não queríamos crer, porque esse país tão longínquo, como qualquer outro país longínquo, está à porta de casa.
A história, longe de se comportar dialeticamente, se move a golpes e espasmos, e se faz notar novamente. A história, ainda que não nos goste acreditar, é, sobretudo, isso: O de repente.
Os rins da história são propensos às cólicas; é comum ao se expulsar a pedra, que se salpique de sangue. Esses sujeitos que expulsaram a presidenta, não os encontraremos nos ônibus que costumamos ir, mas são nossos vizinhos, perseguem o poder com bombas atômicas. Mas, nós aprendemos a pensar em outras coisas. Não que não damos a menor bola, porque, certamente, Dilma não seja uma pedra no rim, mas talvez nos tranquilize um pouco o bom aspecto desse nosso vizinho, que não viaja com a gente de ônibus.
Faz tempo que renunciamos a fazer política, exatamente desde que nos fizeram acreditar nas mãos limpas. Os grandes países têm interesses ideológicos para serem defendidos fora de suas casas; a países como o nosso só permitem ter interesses comerciais.
De fato, o país dessa presidenta deposta a golpes nos rins, é um país assim, que deveria se manter somente com seus interesses comerciais; e para defender interesses comerciais basta ter as mãos impolutas e assistir aos coquetéis que vai gente com muita grana ( a grana sempre cheira bem, ainda que proceda de bolsos tenebrosos).

Ouvirei esta noticia no domingo, voltando de algum passeio, talvez já a noitinha, porque à noite não se vê o que está alem do nariz, talvez me encante, nesta noite, contemplar o próprio nariz. 

Radialistocracia.

Da Democracia sempre se disse: é uma bosta mas é boa. Nunca encontrei, nem razoável, as condições de nossa democracia. Um exemplo besta: Um cara que fica diariamente usando de um microfone de rádio "falando mal do político de plantão", por fim se lança candidato, sem partido, sem programa (mínimo sequer) de governo, resulta que é conhecido demais, e recebe os votos, em troca daquele seu " descer o pau " no prefeito. Temos exemplos gritantes em Ribeirão Preto e Campinas, de radialistas eleitos, sem ter a mínima noção de "Urbanidade", e o pior, ao fim e ao cabo, nem tapar os buracos das ruas, essa coisa singela, conseguem

Impeachment é um estupro, mas foi ela quem provocou, dizem que.

Um disparate. Quase dois anos impedida de  governar, um estupro, mas foi ela que provocou, dizem que. Impedida de nomear ministro, numa clara interferência do Judiciário, aonde não lhe convém, na Política. Alguém pagará os pratos quebrados, trincados e sujos desta festa insana. Há dois anos, muito mais, concentrados em buscar um culpado pelo próprio fracasso empreendedor. De vaza em vaza vão amealhando milho para compor a foto final.
Para essa foto, que a Nobre imprensa redundará, muitos se ajoelharão ecumenicamente. E Hosana das alturas bendirá cada centavo a menos do teu soldo. Mamem!

10 de abr. de 2016

Deiscência.

Deiscência.
A deiscência é a ironia do limite. Aquele momento, em que um acontecimento se veste de domingo, de ver deus, é a primavera.
É coisa botânica. É a maturação natural de uma planta que liberta seu pólen, semente. Abertura espontânea para aquilo que estava trancado.
A deiscência é a alegria do que amadurece, para transbordar.
Eckhardt (1260-1327) dizia:” a natureza é um todo deiscente, aonde o imanente é o transcendente, e ao se escutar o fundo rumor germinal da terra se depreende a equivalência da Sexta da Paixão com a Ressurreição.” Foi declarado herético.
Neste momento deiscente digo que está com meus propósitos, está como sou. Amadurece algo em mim fechado, e que se cair ao solo, bendirei a árvore humana que me produziu, porque sempre escapo do que quer me prender.
Como em Êxodo (3,14): Serei o que serei. 

8 de abr. de 2016

Muitos Gemidos para um Rato ser Parido. .

Escrevia Horácio há 2000 anos : “parturiente montes, nascetur ridículus mus” ( as montanhas parem um rato ridículo). Fazia referência a outra fábula, escrita 7 séculos antes dele, por Esopo, (livre tradução)
Com vários gestos horrorosos,/
os montes ao parir deram sinais./
Consentiram os homens temerosos

ver nascer os abortos mais fatais./
Depois que com uivos espantosos/
infundiram pavor aos mortais,/
estes montes que ao mundo estremeceram/
um rato foi o que pariram”
Como se o tempo não passasse, a fábula, que fala do fato de que aqueles que mais ostentam, são os que menos fazem, volta a massacrar, com muita atualidade.
Pequeno recuo no tempo.. No portal do g1.globo.com de 27/10/2014, uma pequena manchete “Dilma nega divisão do país....” junto ao resultado das eleições.
Já em 27 de outubro de 2014 começava a se parir este rato, que vinha sendo engendrado há tempos, mas ali começa o grande barulho, o grande ruído, a manutenção das mentiras que já vinham sendo espalhadas, desde os campanários, nos últimos anos, sem pudor, doravante, sem pudor; se obviava a gestão de um nefasto golpe, impedindo o governo de governar.
Tenho claro cá comigo, que os níveis de corrupção generalizada e institucionalizada me são incompreensíveis para uma república democrática. Os políticos formaram bandos delitivos. Todos juntos, com seus roubos sistemáticos, uns uivam que são os outros, apoiados por instituições públicas e privadas, como se nada tivessem, ou têm feito. Mas que no meio desse barulho, o que está em jogo é o Estado de Bem Estar Social, que nunca tínhamos tangenciado, e como meteoro anunciado, passaremos ao largo do nosso planeta distributivo e social imaginário.

Com suas vozes portentosas, com seu alto-falante global de campanário de igreja matriz, anunciam os crimes alheios, primeiro escondendo os próprios, mas escondendo acima de tudo o retrocesso, sem juízo, dos direitos das classes trabalhadoras. Na fábula, tanto barulho dá em vento, mas aqui, o que se vê são perdas inestimáveis. A começar pela própria democracia.

7 de abr. de 2016

Espelho no teto.

Dito, digo, Benedito manejava teoria estética que contrariava a ideia
dos estoicos. Para os estoicos a beleza era impactante por sua simetria. Seu discípulo, Manezinho Pernambuco, conta que Ditão, depois de provar com muitos sabichões, mais bichões que sábios, ficou fascinado com Antônio Saco, um homem que levava a vida levando sacas de café, na estação da Gironda e aprendeu com ele a amar, como busca eclética, a tal ponto, que abandonou Stoa para acompanhar Cido III, o Grande, na sua viagem á Pérsia, que tinha como finalidade, se familiarizar com os vedras. Não consegue, porque Cido III foi morto, e ele teve que se virar. O que acabou, por fim, por vingar, foi sua ideia da arte como espelho; o que pode perfeitamente servir de metáfora para traçar um paralelo com o re-design de nossas fantasias sexuais com espelho no teto.


O Sorriso dos Lábios de Cabra.

Renan teme chegar atrasado ao trabalho, faz cara de náufrago míope logo que vê terra firme, seu ônibus parado no ponto, B/J 315, famoso Lapa. Sai correndo até o ponto, quando de repente lhe corta o caminho, a miserável Berta, que empurra seu carrinho de supermercado lotado de latinhas e garrafas pets vazias. Renan bate a canela contra o metal, rasga a calça, e o sangue mancha de vermelho sua calça azul. A porta do B/J 315 se fecham com seu barulhinho de

despressurização e o ônibus se vai, deixando na sarjeta Renan, o furioso.
- Maldita Berta! Sua bruxa fedorenta, me fodi por tua culpa – grita Renan. A mulher do carrinho de supermercado o olha ameaçadoramente, com olhos carregados de exóticos segredos. Mostra o pai-de-todos da sua mão direita, com os demais encolhidos. E murmura algo incompreensível, dá uma escarrada, limpa na manga da blusa, e se vai empurrando seu carrinho. Renan se esquece dela imediatamente e fica ali no ponto, esperando o próximo B/J 315. À suas costas há um imponente anúncio de protetor solar, a colossal figura feminina se ajusta no biquíni com assombrosa despreocupação.
O tempo passou devagar. Por fim, com passo de tartaruga, um ônibus se anuncia longinquo. B/J 315. Parece ser. Sim, é um B/J315, segue sendo até uns metros antes dali; mas o B/J315 se converte em B/J351 ao se aproximar. O motorista ri ao passar e os que vão às janelas o olham comiserados. Nenhum olhar tem mais despeito que os lançados pelos que estão em ônibus, que não é o que o sujeito que está no ponto espera. - Juro pordeus que era B/J315 – juro, o motorista mudou, de última hora! Exclama Renan.
Outros números, outras combinações de números e letras, outros dizeres passam diante de seu nariz, fugindo dele, como se houvessem todos combinados numa pegadinha. Os nomes duvidosos, alguns sem letreiros, apagados, e logo mudam... sim, sim, sim é o Lapa, grita Renan e alça a mão. E quando passa é “puta que pariu”. E até a o próprio ônibus dá uma gargalhada. Então ouve uma voz suave às suas costas. “Lenan, tenho a lesposta”. Renan se vira, bem ali ao lado tem uma pastelaria e na porta um homem vestido de guerreiro de Xian do Imperador Qin, por motivos provavelmente publicitários, mas a armadura não é de terracota, sim de plástico. O falso guerreiro, olha disfarçadamente para o interior da pastelaria e diz a Renan em tom confidencial: “Agora que o dono não me olha, falarei normal. Essa mulher que empurra esse carrinho com latinhas é uma bruxa, indígena, e te jogou uma praga, eu já vi ela fazer isso outras vezes. Por isso os ônibus parecem mudar o letreiro, mudar o número. Pura magia, urbana. Não mata, mas fode, enche o saco.” e acrescentou, no fundo da pastelaria o chinês vende amuletos contra essas magias”. - Ah! Vá pro caralho, você também! Eu não acredito nessas merdas! Responde Renan meio transtornado... Acho que vou de Metrô, pensou... Ainda sentindo sua perna latejar pela ferida, Renan desce as escadas da estação Catedral da linha-1 verde. Quando chega, desconcertado, está na Estação Pinguim/D.Pedro linha 2 lápis-lazúli. Então bate o desespero, Ribeirão não tem Metrô nenhum.... o trem despressuriza, e Renan vê o sorriso dos lábios de cabra da condutora...



6 de abr. de 2016

O Mundo tá Lotado.

O mundo tá lotado.

Tá lotado de bandido.
Também de promotor.
Tá lotado de doente.
Lotado  tá é de dotô.
Tá lotado de te Ódio.
Tá lotado de meu amô.
Lotado de vagal e trabalhador.
Lotado de banho de bica
E rosas no Ofurô.
De quem quer se libertá
De quem quer ser sinhô.
Tá lotado de cadê mamãe
E de papá chegou.
Tá lotado de triplex.
De mocó e mocozou.
Ta lotado é de nada
De quem muito se achou.

5 de abr. de 2016

Globocracia. Minha Novela, Minha Vida.

Globocracia.

    De alguma forma a TV sempre esteve no centro da vida política. Mas de uns tempos para cá, o país vive sob o regime – e ao ritmo - dos estúdios televisivos. Mais concretamente, vive-se sob o que transmite a Globo und konsorten. A qual encontrou um filão de audiência na espetacularização da política, e de sua banalização, é disso que se trata na realidade; a banalização. A plenária do STF é um exemplo do que chamam, no jargão, de externas. Não serei quem os critique, cada um ganha a vida como pode, mas não me encontrarão no bando dos seus entusiastas. De fato, como espectador ou telespectador carrego muito pouca paciência no meu embornal. Consigo ver um jogo de futebol, um programa de geografia, um turismo feito de avião...desligar a tv, totalmente, ainda não pude. Talvez não devesse dizer, digo, me são fastidiosos os debates circulares em que estamos mergulhados, nunca fui muito chegado a novelas, a maioria são de tamanha pobreza, que nem Lula as pode mandar para a classe média, com uns roteiristas cubanos, ou minha novela minha vida. Acontece que esta não está baseada em fatos reais, mas parte de muitos fatos irreais e os torna reais e verdadeiros. Com o amparo dessa tv, determinadas figuras adquiriram proporções gigantescas, como Sérgio Moro, Eduardo Cunha, Luiz Inácio, Zé Dirceu, seus próprios âncoras, a corrupção, o Lava-jato objeto que virou personagem, o impeachment sim porque sim. Por quê? Simplesmente, porque a corrupção, principalmente, como vem sendo tratada, não terá fim. Assim botam o impeachment como clímax. Experimentada em novelas, a Globo, entende de roteiro, as outras acompanham com facilidade. O telespectador idem. O próprio Sérgio Moro, criado nessa lide, como todos nós, tem se mostrado um grande roteirista, para “meio de novela”, mas tem mostrado dificuldades jurídicas para botar fim ao enredo, devido ao entrelaçamento, que se deixa, sem querer, transparecer, como se fosse uma metalinguagem, aonde a barafunda é tanta, que mesmo o veículo está envolvido no conteúdo da trama. O espectador de novela é desta consumidor há muito tempo, a ponto de fazer harmonização de ingredientes, como muitos enólogos de ultima safra, mas só aprendeu uma forma de final, o de sempre, o esperado, aquele que lhe arranque lágrimas dos olhos, de cumplicidade, felicidade, ou mesmo de prazer. Como o Lava-jato não tem fim, o vilão, odiado por uns, que gritam: Golpe, amado por outros, pode fazer acontecer um gran finale, mesmo que tenha que sair algemado do seu set de filmagens. 

4 de abr. de 2016

Luz, Desejo, Ação.

Luz, Desejo, Ação.

De repente mudou o roteiro. Um olhar, um gesto, um modo de falar, de comer de viver, de rir e algo para. É outro capítulo. É outra dicção.  O narrador sumiu. Esquece coisas. Abandona coisas. Elimina coisas. Não há coisa alguma de interesse. Nasce um desejo. Fácil. Parece que esteve sempre ali. Não há receita. Não há plano. Missão. Tática.  O tempo fazendo redemoinho.  Passam os dias e a grande dúvida será descobrir quem aguentará mais tempo sem se jogar pra cima do outro. 

Nem Cultura ou Agricultura, só Agre-cultura.

Nem Cultura ou Agricultura, só Agre-cultura.

lavrador de café, Portinari.

A maior parte desses termos são usados para insultar: “Você é um caipira”. A frase pode aludir a um indivíduo rústico, que veste mal ajambradamente, simplório, inculto, mal educado ou tudo junto e misturado.
O que muita gente ignora, agora mesmo, é que a palavra cultura originalmente significava exatamente o mesmo que o termo agricultura, que é aquilo que precisamente faz o caipira.
Com efeito, agricultura, que é uma palavra que procede do latim, significa cultivo da terra, e um caipira, lavrador, agricultor é quem cultiva ou lavra a terra, profissão quem entre os antigos romanos gozava de grande prestigio. Eles sabiam que se tratava de um ofício essencial para a sobrevivência da comunidade. Foi Cicero quem primeiro usou o termo cultura de forma autônoma, sem vinculação direta com o trampo no campo.

Assim, falou do
“excolere animum” no sentido literal de cultivar o espirito, de lavrar o espirito com estudos e leituras para que frutificasse, igual o que se faz com a terra, trabalhar. Então, nos encontramos a um aparente paradoxo, que com o termo com o qual originalmente designávamos os lavradores, agora designamos a cultura. Ao mesmo tempo, os ignorantes – aqueles que não cultivaram seu espirito – se permitem menosprezar aqueles que cultivam a terra.

O êxodo rural superlotou as cidades. A grande maioria dos caipiras não eram donos de suas terras. Um problema que me dá ojeriza só em pensá-lo. Tanta terra e ao longo do tempo, preferimos criar favelas. Amontoar ignorantes rústicos, que com o tempo, só pioraram, sem nenhuma identidade. Sem poder ser agricultores, lavrar a terra encostados com os que não cultivam o espirito. Qualquer cultura, seja da terra ou do espirito, sem nenhum labor, vai se tornando agre-cultura. Não é possível qualquer entendimento.   

3 de abr. de 2016

Queda de braço.

Queda de braço.

Vale tudo,  cara feia, se zangar e mesmo romper.
Com Collor foi fácil, a mídia o alocou, a mídia o desalocou; Não tinha base partidária, nenhuma, se não a já citada. Contavam com o PT, posto que a eleição havia sido um golpe Mediático. Todos sabem.
No entanto, Dilma não foi colocada lá pela mídia, mas também, apesar dela. Tem base partidária, que andava s sentir dores no cotovelo sobre a mesa. No entanto, num golpe de azar, do acaso intempestivo do Juiz, reanimou Lula. Luiz Inácio quase uniu a esquerda, coisa rara. Ficou de fora o PSOL e o PSTU. Bingo. A turma do PMDB se compra, se pechincha, não se discute programa de governo. Os demais, continuam picaretas, mais que trezentos, também têm preço.
Diante do cenário, a FSP lança, com dores no tríceps, teme perder tudo, pede a Renúncia.
Tentaram o TSE, o TCU, o Juiz, a prisão de Lula, Lisboa, o triplex,os pedalinhos, a canoa não virou.
Cunha está mais sujo que pau de galinheiro. Temer quando se substantiva, o faz com temeridade. É sabe-se que a coragem é filha da prudência e não dá temeridade. Assim o sonho neoliberal começa a evaporar, sem antes se tornar sólido, não sublima.
Os braços se tocam nos punhos. E nenhum tocou as costas da mão na mesa.
Não adianta cara feia, nem adianta se zangar. 

reservado o direito de atender.


Para mim a ética não é uma lista de protocolos. É um contrato de condutas dentro de um grupo de pessoas. Não existe ética alguma no código de Ética Medica, De engenheiros, de lixeiros, de uma empresa versus seus “colaboradores”, uma vez que um dos envolvidos - o paciente, o colaborador, o contratante etc- não opinou. Poderia se chamar Código de Conduta. Mas Ética, definitivamente, não tem nada a ver.
No mais, essa discriminação já existe quando se fala na forma de pagamento, SUS, Planos de Saúde, dinheiro.
O petismo - e assemelhados - é, sem dúvida, mais uma forma para se discriminar, assim como o antiperismo.
Uma consulta ao médico é um produto, que pode e, em geral, se reduz, por um lado, a minutos e dinheiro, e saúde por outro.
Nunca resolvemos bem essa relação, nem na compra de mortadela fatiada na padaria, quanto menos, na relação médico-paciente. Quando ficamos nervosos recorremos ao dinheiro: “Eu tô te pagando”. “Meu paí é quem paga teu salário”. Só mostra que as relações afetivas desaparecem imediatamente.
É uma relação nebulosa, nem meramente capitalista, nem afetiva. E somos assim em tudo que fazemos. De um lado queremos o Capital, mas não queremos as relações “frias” dele e as tensões que ele gera. Não aceitamos, tranquilamente, ser objeto por meio do qual alguém obtém, meramente, lucro, e muito menos ser descartados por alguma qualidade que não temos.
Dito isso, o comum seria pregar uma placa na entrada, não aceitamos Petistas.
Nós bares da Espanha há uma placa que deixa claro que a admissão do freguês é faculdade do dono do bar.