Camões era um gênio,
quando se enfadava conosco, nos chamava caterva, ou catréfia não tenho certeza. Camões fazia Faculdade de Farmácia na FOF da Usp-RP. Não
tinha nada a ver com ele. Barbudo , cabeludo, sandálias de pescador
e tiracolo de couro, de onde saiam as raridades, que disputávamos
com nosso parco dinheiro. Ele ganhou o apelido, Camões, por ter
escrito uma boa hora, sem parar, o Canto I de Os Lusíadas de Camões,
numa prova de química orgânica, creio. Tinha memória privilegiada
da qual abusava a nos recitar Rajneesh.
Mas não era essa a sua genialidade, qual estava em
não nos cansar, em particular sempre andei embasbacado pela sua
conversa mole, sempre a conta-gotas, que até hoje não a
apreendi desde a sua construção. Enfim Camões jogava xadrez de
costas para o tabuleiro, e vencia a toda gente, exceto os grandes
campeões da cidade daquele então. Ganhava dinheiro revendendo
livros que trazia dos sebos paulistanos. O primeiro a me falar em
Jorge Luís Borges foi Wilson Giacon, mas o primeiro Aleph me trouxe
Camões.Me explicava Schrödinger e seu gato.
Uma noite na Cantina do
Toninho na Via do Café, provocou um cena insólita, cena de Cinema
Novo. Camões estava com uma colega da psicologia e pouco a pouco a
foi incentivando a ir fundo na própria ''loucura''. Era um
encantador de serpentes. Ela primeiro chorou. Depois chorou para toda
a gente da cantina ouvir. Depois subiu na mesa, tirou a roupa, fez discurso, falando
do tempo que havia perdido, do seu puritanismo, sua virgindade
inútil, berrou, sapateou... Camões permanecia sentado, olhando-a,
como se todo o resto não existisse, e não existia, éramos
catréfia, ele sabia Wittgenstein.
Não se usava esta palavra, mas
ela surtou, surtou mas pagou a conta e destrambelhou de vez.
Nenhum comentário:
Postar um comentário