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Em algum lugar de Marx, que não posso precisar no mundo não haveria fronteiras, e
eu pensei que a ideia era boa e era jovem sem limites e Bonfim pequeno,
levei meu espirito para passear. Tudo para que a alma crescesse.
Como bom bonfinense e por conseguinte brasileiro, carregava comigo o embornal de desconcertos diante das leis, descobri que o mundo tinha mais cercas
que os sítios na Estradinha do Cantagalo, cheia de mourões
e arames farpados, estas a gente varava por uma manga, já aquelas....
As fronteiras, europeias, eram cruéis, mas descobri que as
fronteiras são mais rígidas para uns que para outros.
Um amigo, melhor contar isto antes: No trem que ia de Milão a
Munique e cruzaria a Suíça havia um batalhão
de policiais. Com o comboio ainda na estação veio a
verificação dos bilhetes. Logo a trupe dos passaportes,
pois esse amigo, um recém formado jornalista, com sua
cabeleira negra, seus olhos negros e a tez mourisca, se tornou o
preferido deles. Na primeira visita, tomaram meu passaporte, mas
olhavam para ele, assim que ao me devolver o passaporte, o policial
quase o deixou cair ao colo de um terceiro, estendia o braço
alhures mentre se fixava em Ulisses - não pela viagem, mas por
não esquecer jamais sua descendência mineira alojada na
rua Marechal Deodoro em Ribeirão - quanto ao seu passaporte, este foi vasculhado por todas as patentes que no trem estavam lotadas.
Em algum lugar entre tuneis e sopés de montanhas com picos
nevados estava a fronteira suíça e lá o trem
parou para a troca da guarda, entravam os suíços, saiam
os italianos. E a história se repetiu com com agravantes, uma era a língua, outro, cada guarda
dizia olhando nos olhos de nosso Odisseu: Visum Erforderlich. Ân! Trucava o mineiro. Sie benötigen ein Visum für Deutschland. E
se iam, mas logo vinha outro, alem do sotaque, e da cor dos
uniformes, nada diferente do que havia se passado em La Junquera, na
fronteira de Espanha com França. E assim foi até Munique. Ele
voltou para sua Itaca. Eu fui ficando, até que um dia dei umas
marretadas no muro de Berlin, com emoções confundidas, e o mundo universalizou, o
mercantilismo, as mercadorias, tal como previra o touro mouro, mas para os homens as fronteiras permaneceram e permanecerão em continuo
encurtamento dos raios de seus círculos, a ponto de cada um
estar completamente cercado para o outro. Tanto que as vezes chego a
me sentir como um mourão de canto de cerca, grosso e arrodeado
de arame farpado e a alma pequenina, enquanto a vaca vem em mim coçar seu berne.
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