Tudo aconteceu tão
rápido, que vou contar do mesmo modo
Quando ofereceram a
Luiz Fernando o cargo de gerente da agência de Belém do
Pará, aceitou sem pestanejar, estava em Sobral, no Ceará,
com seu calor de mascar. Em poucas semanas conheceu Neide, foi amor a
primeira vista, se casaram no mesmo mês. Neide era indígena
por parte de mãe, que era uma feiticeira. Isso soube numa
tarde em que se refugiou do aguaceiro recorrente num bar que
simpaticamente imitava uma Oca com sua decoração feita
de objetos indígenas. Pediu uma caipirinha de cupuaçu,
antes uma pura curtida em sexo de boto, que desceu queimando. La
fora o aguaceiro. Um velho se sentou a seu lado ao balcão.
Luiz Fernando lhe ofereceu uma dose de pinga. O velho respondeu: cada
um com seu cada um. O velho conhecia a família de Neide.
Contou a Luiz que a mãe dela era uma bruxa conhecida por toda
a redondeza. Luiz não se surpreendeu ao recordar aquela velha
de pele cinza tisnada em partes e com verrugas no queixo e nariz.
“Ande com cuidado, rapaz” advertiu o velho com um sorriso que
parecia um corte de melancia, vai que tua Iara também seja.
“Sabem o que fazem quando suspeitam que seu marido é
infiel?, enterram sua cueca no jardim, e nunca mais vai sair de
casa.” Luiz soltou uma gargalhada que parecia uma taquara rachando.
Acabou sua caipirinha. No fundo estava inquieto com aquela conversa.
Como se tivesse deixado o gaz aberto sem fogo no queimador, e aquele
velho cheirava mercaptana.
Uma noite de lua cheia,
estavam jantando, de repente, Neide lhe deu uma olhada, a queima
roupa, suas pestanas se moviam como serpentes, então cravou:
“Se um dia souber que me enganou, escondo sua cueca e nunca mais
sairá de casa.” Luiz se enregelou ao ver como distorcia os
lábios de modos a formar uma lemniscata.
Tudo aconteceu muito
depressa, assim que farei o mesmo. Pouco depois, em 7 de setembro,
houve a festa na empresa. Luiz estava bebaço, e foi com sua
secretária a um sala deserta do seu escritório e lá
foi infiel a sua esposa sobre uma fotocopiadora. Luiz voltou para
casa sigiloso, como um ladrão de antigamente, esgueirando
pelos muros, paredes,se assustando com a própria sombra, e
tombou vestido ao lado de Neide, que parecia dormir profundamente. No
meio da noite, Luiz se despertou, inquieto. Longe latia um cachorro e
no silêncio da noite, aquele latido parecia um sino tinindo
depois das badaladas, entrando nos ouvidos. Olhou para o lado,
ninguém. “Se foi”, pensou confuso. Quando comprovou que
Neide não estava em casa, supos que fora andando, pois não
sabia dirigir. Deve ter ido para a Rodoviária, a alcanço
de carro. Tentou sair de casa e não conseguiu. Tudo aconteceu
tão de pressa que contarei do mesmo jeito. Cada vez que abria
a porta não encontrava o jardim, senão que a sala de
visitas que é de onde tentava sair. Tentou mais uma vez, abriu
a porta, tudo estava escuro, foi apalpando a parede procurando o
interruptor. Sem sucesso. Mas encontrou a televisão. Voltou
para a sala, de onde acabava de sair e estava de costas para a porta
da rua. Então correu para o guarda-roupa. Abriu uma gaveta.
Faltava uma cueca. Compungido, Luiz suspirou: Justo a Boxer! .
lemniscata: o infinito, mais ou menos isso. uma cobra se engolindo pelo rabo, formando um oito na horizontal.
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