Quando menino, malhei o
Judas. Por ignorância, confundia Judas com Judeu, malhava a ambos
Judeus.
Que beijo! Nenhum outro
beijo – real ou fictício - amealhou tanto reconhecimento, para
o bem ou mal, que o dado por Judas Iscariotes. Para o cristianismo
foi fundamental, porque numa quinta-feira como hoje e por trinta
moedas Jesus foi traído por Judas, e por esse beijo, é até nossos
dias Judas é maldito e vilipendiado. Há uma leitura possível que
é a de que esse beijo forjou a glória de Jesus, ao mesmo tempo é
episódio dos mais novelescos que se encontra na Bíblia. Judas é
sem dúvida a personagem fundamental para a existência do
Catolicismo, um oximoro. Oximoro é uma figura de linguagem que
mistura palavras contraditórias: bondade cruel, sol negro, luz
escura e o beijo de Judas, que é a traição glorificante.
A tese de traição
glorificante é de Nils Runeberg e é descrita por J.L.Borges em
Tres versiones de Judas, em Artificio de 1944. Segundo Borges, De
Quincey defende que Judas quis forçar Jesus a assumir sua divindade
e ascender uma rebelião contra Roma. Já Runeberg sugere que sendo
Jesus O Mestre predicador e operador de milagres aos olhos das
multidões, não faltava o tal beijo denunciador, e completa que o
beijo não foi casual, foi premeditado, mas premeditado por Deus e
tem caráter misterioso na industria da redenção.
Relata Borges nos
dizeres de Nils: “ O verbo feito carne, passou da ubiquidade ao
espaço da eternidade”. E para operar esta transformação foi
necessário o sacrifício de um homem em nome da humanidade. O homem,
Judas Iscariotes, foi quem intuiu o terrível propósito de Jesus. A
tese é: se Deus se rebaixou a ser mortal, Judas discípulo do Verbo
feito carne se rebaixou a delator. Porque Jesus não poderia partir
para a morte de forma voluntária. A delação em si é imensa
infâmia, mas se somarmos a ela as trinta moedas, mais ainda se
reprova o traidor, e com isso ganha direito ao fogo eterno.
Nils Runeberg termina
com uma conclusão macabra, ou seja, que O Verbo feito carne ter
padecido somente uma tarde na cruz é uma heresia uma blasfêmia,
pois seria somente um momento atroz na eternidade, assim que Deus se
fez carne, totalmente, e totalmente homem, homem até a infâmia, até
a delação e o abismo, e para salvar a humanidade escolheu o pior de
todos os destinos: foi Judas. Deus poderia eleger qualquer outro
destino na trama da história e ser: Pitagoras, Cesar ou mesmo Jesus.
Dizem que Nils seguiu
errante pelas ruas de Malmô, mas que estava contente por dividir com
Deus um pedacinho do Inferno.
pinturas: acima Judas de da Vinci, e abaixo o beijo de Caravaggio.
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