8 de abr. de 2012

Carta a Berta.



'Sei, que nada sei.'

Vou me gastar na assertiva: 'Sei que nada sei'.
Poderia dizer que quem diz: Sei, que nada sei, o faz no meio de um embaraço. E entre se calar e assumir a nulidade argumentativa – dado que tal afirmação sempre se faz em meio a calorosos, ou nem tanto, debates. - e diante do evidente naufrágio do argumento, então e neste caso, uma saída que parece 'sábia' é: Sei que nada sei.
'Sei que nada sei' tem sonoridade de 'sabedoria' oriental, e de notória muitos a pensam irrefutável, mas não é mais que um nenúfar, como aquele de Lao Tsé: “Quem sabe não fala, quem fala não sabe”. E tão simples quanto isso: Lao Tsé é mentiroso, porque não sabe, já que diz saber o que fala.
Os gregos tentaram estabelecer um mínimo de método à lógica. O método é matemático e é axiomático. Um axioma é uma proposição tão evidente que não precisa ser demonstrada. O homem é mortal. Se se tem este ponto 'indiscutível' pode-se partir para definições mais complexas derivadas de tal proposição. Sem que sejam tautologias: 'tudo que é demais sobra', ou sistemas tautológicos como os que exigem, aos recém-formados, experiência. Ou seja, pensar 'matematicamente' a lógica. Sem grandes floreios.
Se disser que todos os Ribeirão-pretanos são mortais, todos os Bonfinenses são mortais, então todos os Bonfinenses são Ribeirão-pretanos, isso é uma estupidez, ainda que seja verdade, o que é uma casualidade. Porque os Bonfinenses são Ribeirão-pretanos não por serem estes mortais e aqueles também, mas por Bonfim Paulista ser um distrito de Ribeirão Preto.
Há situações bastante confusas nesse ambiente. A estupidez é capaz de chegar a conclusões corretas por caminhos totalmente equivocados.
'Sei que nada sei' é um paradoxo. Um paradoxo é aparentemente correto, mas em algo se equivoca.
Epimênides que era de Creta disse: Os cretenses são mentirosos. Epimênides que era cretense mentia. Ainda que Epimênides conhecesse todos os cretenses. É uma estupidez. De tal modo que se se quer concluir algo, tal será: um ciclo vicioso, uma contradição. Mas isso era o principio de tudo. O principio da 'sabedoria', provavelmente, oriental, que criava mais enigmas que os resolvia. De algum modo soa 'oriental', oriental no sentido vulgar, ordinário ou 'mass media'. Porque o oriente, ou a noção de oriente, não coincide com o oriente geográfico, ao mesmo tempo que se confunde oriente com islamismo ou budismo e o que se diz é Lao Tsé querendo se passar por Confucionismo, sem sabê-lo sequer cético. Certo é que Austrália nada tem a ver com o oriente, sendo tanto ou mais oriental que a Índia. E a Grécia tão bem cravada no oriente é quem funda o pensamento ocidental, por outro lado os ocidentais Egito, Tunísia, Casablanca, Cairo, Israel ou Palestina tidos como orientais.
Desse modo um argumento que contenha a palavra Oriente como sujeito, ou predicado de algum sujeito, deve ser mesurada, ou adjetivada. Oriente-se.
Se digo que sei, algo sei.
Platão presenteou a lógica com um principio banal, o princípio da não contradição - que os sofistas não usavam pois os sofistas, os dialéticos de então, o que queriam era confundir o debate e se saírem vencedores, e não serem lógicos ou verdadeiros -.
Como o interesse aqui é ser lógico e partindo de premissas particulares, não estabelecer conclusões generalizantes. Universalizar é possível sim, desde que não se viole uma das leis do silogismo, tão caras a Aristóteles, ou seja não se universaliza partindo das premissas particulares. Leio esta frase:
Toda unanimidade é burra”. É frase cunhada por Nélson Rodrigues, e se tornou um fóssil que de quando em quando se desgarra de sua matéria pedra e volta para assustar os vivos de hoje. Não somos ou não devemos ser unânimes quanto ao governo ao a forma de governo, ao clube do coração, à melhor canção, porque seria nossa alma que ficaria prejudicada na unanimidade é o que Nélson Rodrigues quer dizer, é que seria um desastre para os interesses humanos, aqui não estamos tratando da lógica mas da alma, enquanto interesses humanos, que devem, partindo da frase, ser subversivos, ou discordar no mínimo de qualquer processo 'humano' que seja unânime. No entanto a frase é universalizante. Somos unânimes em crer que dois mais dois resulta quatro. Somos unânimes em nossa mortalidade. Somos unânimes que amanhã será outro dia, independente de nós, e nesse caso só o fim hoje da humanidade seria capaz de impedir o amanhã, da unanimidade. Portanto o que se desdobra é que não devemos ser unânimes cegamente, como diz Nélson Rodrigues “Quem pensa com a unanimidade não precisa pensar”. Não sei se Nélson Rodrigues conhecia o Tratado de Sanhedrin que pertence ao Talmude, à tradição Judaica, porque nele há algo muito próximo, pois que senão:
"A lei, o privilégio concedido à determinada compreensão do que é certo, só se faz legítima na medida em que, dadas as condições necessárias, sua preservação possa até mesmo ser mantida através de sua desobediência." e mais adiante ...”O sentido de tal lei, expressão da alma e obviamente subversiva, é a desconfiança de que um processo possa ser tão bem conduzido que não paire qualquer dúvida quanto a uma leitura diferente da situação. A unanimidade expressa uma acomodação à verdade absoluta que é insuportável à vida e que tem grande potencial destrutivo."
Ou seja, se a lei não postular a desobediência será uma arbitrariedade. Donde conclui-se que a unanimidade é arbitrariedade. O tratado de Sanhedrin estabelece variados tribunais, com três, 23 e chegando a 71 juízes, dependendo da gravidade e abrangência do julgado. Mas deixa claro que se o veredicto for unânime este sera anulado, por que não creem em um processo ou procedimento perfeito, há que se estar atento.
Voltando ao mundo dos vivos.
Sei. Este é um argumento. Um segundo argumento dentro do mesmo pensamento não pode contraditar o primeiro como: Nada Sei.
É uma estupidez:
Sei,
Nada sei.
Logo: ...
Logo é um desadaptação à realidade ocidental. Quem sabe, num outro sistema lógico, nossa estupidez seja sabedoria, neste não. Posto que a realidade ocidental é e foi forjada por um sistema lógico – muito bem poderia ser outro, mas não é – marcado a bala e canhões e bombas atômicas e chibatas e tudo quanto foi necessário, até homilias. E a maior ambição de nosso sistema é definir uma noção aceitável – níveis aceitáveis – de estupidez.
Certo é que, é possível que exista quem saiba nada, e neste caso o sujeito estará condenado a não saber, nem mesmo, da própria ignorância, e não poderá afirmar que não sabe, porque nem sabe o que é saber ou não saber.
Sei. Sei, que sei alguma coisa. E se sei estas, que sei, há nada que impeça outras tantas existirem, quais não saiba. O que tento impedir, que aconteça na minha vida, é vir a sabê-las demasiado tarde, coisa que naturalmente sói não ocorrer. Outra coisa que sei, é que não sei algumas outras coisas, ou muitas quiça, mas se ignorar muitas ou poucas, uma frase, sábia que seja, não me fará sábio, muito menos se se tratar de uma estupidez, ainda que consagrada.



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