28 de jan. de 2010

A pia pende.

O barulho da pia.

Gosto muito de cozinhar. Qualquer coisa. Transformar qualquer ingrediente ou uma série deles em algo verdadeiramente diferente do que parti. Eu fiz, digamos, um estágio ( em castelhano: una Pasantia, gosto da palavra pois me remete a uma passagem e não um ponto final, pois passei também por isto.) no restaurante Alqueria no ElBulli Hotel em Sevilha. Trata-se de um restaurante duas estrelas Michelin, ligado a Ferran Adrià. Estive raros e curtíssimos minutos com Ferran. Ferran tem a língua-presa como o Lula e o Palocci. Disse-me ele, que o importante, se isso fosse importante para mim, é a filosofia ElBulli, mais que a técnica. A técnica caso eu fosse minimamente criativo, interessado e suasse o bastante, desenvolveria a minha. Bom por se acaso, aprendi a cortar, fatiar, limpar, tempos, tipos e formas de cozimento. Adestrei-me com a faca e a faquinha. Faço hoje sem pestanejar cubinhos de legumes, quais sejam, de 1 mm de aresta. A filosofia é obter das matérias primas, primeiras tudo o que elas podem oferecer, seja o id, ego e superego. O que ela é, o que pensa que é e o que esconde. Cozinho a cada dia. A cada dia faço o almoço para mim e dona Lucinda minha mãe e comensais esperados ou não. A tal filosofia implica também em concentrar sabores. Noutras palavras sujar panelas. Logo; lavar panelas e coisas e tais e tantas ou nem. Deveria estar contente. Mas sentia antes algo que me irritava. Não sabia o busilis. Já havia tomado umas providências, tais como; comprar um rodinho de pia que me ajudaria a manter-la ademais de limpa, seca, enquanto dura o processo, limpar, secar, queimar, adicionar, deglaçar, fritar, adicionar, trocar de panela... Secar a pia. A pia pende. A água escorre sempre para aquele canto embaixo do escorredor de pratos. Removo os utensílios, removo o escorredor de utensílios, removo a água com o rodinho de 1 real. Mamãe me diz que já teve um rodinho, se cansou, chamara um pedreiro para colocar a pia no nível. O pedreiro veio e disse: Dona Lucinda! Quem foi o meia-colher (é assim que se chamam os maus pedreiros) que fez isso? Depois de maldizer tanto o meia-colher, removeu a pia e fez os ajustes e por fim a recolocou.
- Não dona Lucinda, ainda não está seca. Temos que esperar secar para depois jogar.
- Que mal fará, se a água fica na pia e não no cimento que está sob a pia? Teimosa como qualquer espanhol, deixou correr ali um copinho d’água.
A pia ainda pendia. Dona Lucinda travou uma batalha com o pedreiro, tudo para mostrar-lhe o ululante fato. Pende a pia.
Dona Lucinda arranjou um namorado. Pedreiro. Pedro, pedreiro, garboso. Pedro olhou a pia e de debaixo de seu bigodinho fino disse zombeteiro: Quem foi o meia-colher que colocou essa pia Lu?
- O primeiro foi o... A Lucinda não queria falar, pois se tratava de um antigo namorado, também ele pedreiro. Pensou e pensou.
- Foi o Vicente meu irmão que... Mediu o Pedro, a pia pensa. E soltou “ pedreiro é tudo igual”.
A água não corre para o ralo.

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