3 de jan. de 2011

ANO NOVO PLÁGIO VELHO

Faz cinquenta anos que busco ser criativo, mas tudo que tenho conseguido é pequena adaptação de algum plágio; como queria James Joyce: à noite sempre por óbvio, claro quando isto se fazia às escuras e por vezes às expensas dela, hoje holofotes e espelhos, mas a dor... inútil dormir... (Chico Buarque)
Por sorte inventaram o calendário que é a margem a balizar nossas angustias – há indivíduos que não padecem deste mal – que é o sentimento frente a incerteza do que virá. O ano não deixa de ser um labirinto que desaguará no seguinte aqueles que nele entraram exceto os que venham morrer.
Como diz meu amigo Florenci: acaba um ano começa outro a cada dia, pelo simples fato do desejo exigir o futuro, posto que o passado é a dor ou simplesmente um projeto desejado e falhado.
Há entretanto coisas e sentimentos que desconhecem o tempo, pois são na vida ( concretamente é tudo que queremos saber(com plenos sentidos), mas sequer tangencio tal entendimento: ser na vida!).
Em todo caso ser na vida é ser como ela, imutável, continua e essencial. Esta é uma maneira que encontrei para me acercar do objeto e não do objetivo.
Desta maneira o ano que começo é urgência dos meus desejos. Haverá sentimentos que sequer começarei, por não sabê-los, e que não cessarão por não começados. De resto continuo meu projeto de gozar o máximo possível ignorar o mesmo tanto.

19 de nov. de 2010

Sem tempo. Que fale Machado de Assis.

Hoje me tocou fazer bolinhos de feijoada. dezenas, centenas...





A MÃO E A LUVA.

O fim da carta.


- Mas que pretendes fazer agora!
- Morrer.
- Morrer? Que ideia! Deixa-te disso, Estevão. Não se morre por tão pouco...
- Morre-se. Quem não padece estas dores não as pode avaliar. O golpe foi profundo, e o meu coração é pusilânime, por mais aborrecível que pareça a ideia da morte, pior, muito pior do que ela, é a de viver. Ah! Tu não sabes o que isto é?
- Sei: um namoro gorado...
- Luís!
-... E se em cada caso de namoro gorado morresse um homem, tinha já diminuído muito o gênero humano, e o Malthus perderia o latim. Anda, sobe.

17 de nov. de 2010

Racismo não. Sentimento mazombo.

Gostaria de contestar a Gisela Haddad no seu artigo do Jornal A Cidade, de Ribeirão Preto: O que são os clássicos? Não divirjo da “classicidade” de Monteiro Lobato, suas engenhosidades etc. enfim clássico, entretanto vê-se ali o, também clássico, racismo à brasileira. Aturado e atento a isto: Em “Peter Pan”, por exemplo, lê-se: “ -  Só tomo leite -, explicou a linda princesa. - Tenho medo de que o café me deixe morena - . - Faz muito bem - , disse Emília. -Foi de tanto tomar café que tia Nastácia ficou preta assim - ”. A cozinheira negra era o alvo preferido dos insultos racistas de Emília. Em “Reinações”, a boneca falante destila-se em frases como: - Mentira de Narizinho! Essa negra não é fada nenhuma, nem nunca foi branca. Nasceu preta e ainda mais preta há de morrer! -. Diga-se:  talvez, porque à época, o eugenismo vivia o auge de seu prestígio, não só na Alemanha nazista, onde foi transformado em ideologia de Estado, fez-se o mesmo no fictício sitio.
Hoje resta esta estranha necessidade de nutrir alteridade em relação a negros e pobres:
  sentimento mazombo.
 Segundo Evaldo Cabral de Mello é:
 “a sensação de viver expatriado da civilização (Paris) , mergulhado na barbárie da sua própria terra, incapaz de reconhecer os autóctones como iguais”.

Não sou negro, poderia defendê-los? Não posso. Antes faço oposição ao ideal da cartilha branca, de olhos verdes. Certo é que não se trata dos mesmos interesses.
 A “Preta” na cozinha é a isonomia ficcional proposta e reinante no mundo ficcionista televisivo brasileiro, aonde há certos autores que só “ se dão bem ” ali, com a “preta-na-cozinha”. Em linguagem de sitio: é uma arapuca que teima em estar armada. Monteiro Lobato escreveu o: Presidente Negro, sonhando em abrir mercado nos EUA, em cujo desfiou toda a alcatifa de barão do Café, os americanos lhe deram uma banana, pois mesmo lá, nisso havia limites.
Lobato, como grande escritor que foi, pode tudo dentro da obra, tanto que fez o sabugo falar, (o que me encantava) a boneca de pano recheada de macela reinar, a amiga Narizinho num eterno abri-la e refazê-la.  Poderia ter feito de tição um "Principezinho Bundo", " O príncipe Senegalês", mas, enfim não os criou. Ingratidão vária de Monteiro Lobato, que se inspirou numa Anastácia real e pajem de seus filhos. Incorporou graciosamente o Saci desde o folclore, e hoje o trocamos por uma abóbora estadunidense, povo este que não permitia que os negros sentassem à frente nos ônibus, lá havia os assentos e os ônibus, aqui, a coisa não dá para todos.

Vão meter a boca sem ler o parecer do MEC, CLIQUAQUI

16 de nov. de 2010

Bovinamente rumino.

O caráter monolítico do paladar brasileiro leva toda gente a comer carne bovina. Avança-se sobre este rebanho nacional como se do mesmo se tratasse. É coisa viciosa desde tempos remotos. Assim comemos todo o palmito da Mata-Atlântica. Como se fossemos formigas de correição, que por onde passa não sobra arbusto com folha. Não choro pela diminuição do rebanho decrescente. Eu como de um tudo. Mas voltando ao hábito da unanimidade, esta é um vício que leva a outros. Um deles é o completo desaparecimento de pequenos produtores de hortifrúti e pequenos granjeiros nos arredores da cidade. Tudo há que ser em grande escala. De tal maneira que hoje temos quase que tão-só umas poucas marcas de calabresa, e ruins, umas piores. Não havendo diferença entre paio e estas.( Note isto: exceções não invalidam a regra ) Conseguem custar mais que o file mignon suíno, sendo que tais tripas ou tubos de plástico são recheadas com todo tipo de goma e uma lista infinita de “E-“ seguidos de números, e é o nome dado a acidulantes, aromatizantes, espessantes, conservantes, etc. Dessa maneira não criamos excelências culinárias. Não escapando deste defeito a nobre picanha, sendo a boa a excelente é Uruguaia, Argentina. Diferenças de qualidade e preço como o que acontece com o azeite ( sempre estrangeiro)poderiam ensejar uma vontade de níveis de excelência do nosso óleo de soja, girassol, milho, etc., mas não ensejam. Só há óleos com excessivos resíduos ácidos, devidos à sua extração, pouco diferindo do biocombustível. Assim vamos, um pais inteiro temperando tudo e mais alguma coisa com glutamato monossódico. Como queria Oswald de Andrade partimos do tomate pera seco ao sol italiano a qualquer tomate, nem tão-somente maduro, seco ao micro-ondas e, quando a coisa chegou ao populacho a se transformou numa massa, há tomates secos marrons! Há “Alice” sardinhas anchovadas que parecem um pente fino, para pentear-se ao passar brilhantina.Isso é antropofagia. O pior é que há comensais que não o diferenciam de uma acciuga, achoa, sardela, etc..
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15 de nov. de 2010

A classe média vai ao parque refletir.

Fernando Pessoa dizia: coisa intangível é entender o outro, pois para tanto haveríamos de sê-lo. Pode-se partindo de tal pressuposto chegar à nossa condição esquizofrênica. Outros dirão que o “Split” advém do desmame, somados com o modo de produção contraditório e o aprofundamento da separação do homem em relação à natureza. Certo é que esquizofrênicos, diversos da natureza e contraditórios; escolhemos o cachorro como melhor amigo pelas razões acima e sem prejuízo das esquecidas. É notório que o canino está mais próximo da natureza que o humano, muito pela desumanidade intrínseca deste. Assim o parque mais que qualquer lugar: é local para cães, gatos, periquitos, sabiás, aranhas e suas teias. Além das árvores, é claro! . O humano a visitar o parque é o torturador a levar flores ao torturado.” Viver é muito perigoso” dizia Riobaldo “desconfio de muita coisa, Sr. concedendo eu digo”. Local seguro é a granja moderna de ar-condicionado, aquecedor e telas postos impedindo a invasão de insetos. Há galinhas para todos os galos. O único risco é atingir o peso ideal. Kierkegaard não disse poderia ter dito que a vida é uma alcachofra. Sua carapaça dura, os espinhos e o coração. Para chegar-se ao âmago e descartar os espinhos e desfrutar da terna base, a vamos roendo pelas brácteas coriáceas, com azeite, limão e pouco alho. Por isso deveríamos “naturalmente” comê-la em regozijo, genuflexos e agradecidos à natureza, nunca para emagrecer. Aliás, uma bruta contradição, comer algo para emagrecer, um pleonasmo do avesso, subir para baixo.

13 de nov. de 2010

Felicidade.

... se ele vai querer comprar primeira classe para mim ele podia querer fazer no trem dando uma gorjeta ao guarda oh acredito que vao ter os idiotas de sempre dos homens olhando a gente com os olhos deles de estúpidos... trecho do monólogo de Moly Bloom em Ulisses de J. Joyce.



A felicidade é o exercício do poder sobre si mesmo, bastando com eliminar da vontade todo o fetiche. Isto implica: vida errante e instintiva, como a dos lobos. Suspender, descrer ou no mínimo duvidar das conquistas da “civilização” - modo de produção, suas estruturas politicas e jurídicas, religiosas e sociais - é essencial se estas implicam em juízo; que é a razão de ser da tragédia humana. Assim o prazer está na atividade em si, no comer, beber, ver, sentir na pele, ler, transar ou beijar. O amor e o ódio são estruturas sociais e psíquicas; geradas no atrito dialético do ser com a natureza e a circunstância – época, modo de produção, clima etc. - em que se encontra inserido. Assim amor e ódio se confundem na sempiterna tentativa de apropriação do outro e, de tal modo corrompidos são inúteis - espasmódicos e aflitivos - como instrumentos de presentear felicidade, já que a posse é juízo, contrato e no mínimo uma relação de poder. Isto me lembra do sofrimento de Luísa no Caetés de Graciliano Ramos e seu amante, quando a relação se despoja dos impedimentos.
A felicidade é o gozo do prazer imediato. Aí entra o Chico Buarque: se só lhe fizesse o bem\ talvez fosse um vício a mais... é a perfeita medida que se busca. É certo que há razões igualmente fortes para afirmar ou negar qualquer teoria. Mas não me nego o gozo desta retórica contorcida e espinhosa.

12 de nov. de 2010

Direito a preguiça.

Voltei para casa e o último trem, não voltou ou não partiu. No lugar da estação ferroviária, um imenso jardim sem nenhuma reminiscência. Fico com a estação que é de minha lembrança. Não se pode partir de um jardim. Não se retorna a um jardim. Minha estação. Digo minha, mas ela é universal. O logos de partir e chegar e retornar. Já vejo o trem serpenteando pelos subires e desceres levando minha estação. Quando a vi pela primeira vez, senti essa coisa. Essa separação. Esse retorno. Esse Manuel Bandeira. Essa nossa união. Ir e volver nunca à mesma estação. Hoje já nem preciso de sua arquitetura rústica de grandes tijolos avermelhados. Minha estação aos poucos quer se transformar em sintaxe. Em poesia. A estação dos sentimentos universais. Inapeláveis