O
quadro de Van Gogh leva Heidegger a reflexões, nem tão
só acerca da obra que revela sua representação.
Ademais, á Sherlock, deduz, que o par de botinas, pertencem a uma
camponesa. Que talvez, se limite a calçá-las para
enfrentar a terra gelada dos trabalhos labregos... Meier Shapiro
interviu na discussão e disse não se tratar de botinas de labregas, mas sim do próprio Van Gogh, e que Heidegger não
passa (na verdade o próprio Heidegger o demonstra) de porco fascista, que toma o objeto sem
levar em conta o autor, a subjetividade.... Derrida tira uma das
luvas e joga nas caras grandes deles - Heidegger e Shapiro - e diz que eles, sim, são um par
de cenouras, ou nabos, e que as botinas, em questão, nem sequer formam um par e
que o impacto do quadro põe em jogo, para cada observador,
uma miríade de construções pessoais e simbólicas
e iconográficas, destapando, em todo caso, a própria
verdade, a verdade em si.
23 de mar. de 2016
22 de mar. de 2016
A mentira..
Acho que somos a pior idade da humanidade.
Desde que ela se espraiou pelos continentes, tudo era novinho em folha.
Grandes caçadas, dormir em cavernas com morcegos, inventar o fogo, a pedra lascada, o bronze, a roda, o barquinho flutuante.
As grandes batalhas. Singrar os mares.
Era o tempo em que se dizia: “ a mentira tem perna curta,” mas tinha perna, curta.
Hoje, nem perna tem. Já nasce com sua lápide.
Parece uma derrota, mas ela venceu.
A mentira é a verdade e essa a mentira, são a mesma moeda.
Um dado jogado sem acaso e todos seus lados são iguais, e dizem sobre nosso azar. 14 de mar. de 2016
Uma Trupe de Trumps.
É
frustrante não poder estereotipar, não poder criar uma
metáfora do desfile de ontem, já que foi a marcha dos
estereótipos,das metáforas convertidas em carne e osso,
como se a avenida se enchesse de Brás Cubas, Odete Roitman,
Maria de Fátima, Leôncio, Paulo Honório,
Hermógenes, Bentinho. Qual a graça de dizer: Olha, o
Leôncio! Onde? Ali, e é de verdade! Ou alguém
sem ter tomado um porre de vinho doce chatô do papa, pode
acreditar no visto e não sarar a dor de cabeça.
Uma
trupe de Trumps!
A
proto-elite em desfile pelo paulistódromo, a estourar champã,
arrastando babás, exibindo toda a arrogância de
boutique, prepotência mesquinha de canais a cabo, cabeças
feitas em academia com acabamento de haute coiffure do jardim nova
conceição, com apoio da TV que todos vêem, da CBF, Federação Paulista, Carioca de Futebol,
da TV á cabo, dos jornalões e jornalecos, do Metro, da
Policia, da justiça, do ladrão de merenda, da OAécio
construtora de aeroporto, do bolsonaro, do feliciano. Incomodando
mendigos.
- Orra
meo! cê viu o mendigo da CUT!
- Che voglio dire! Bisonho. Não
sei como não encontraram um Prudêncio. Quer dizer,
sei... só havia brancos, tirante babás, acorrentadas ao seu
papel. Metáforas em carne e osso, materializadas.
Se houvesse um
louco para dizer: "seus olhos são dois oceanos", morria toda
gente afogada. Era Brás Cubas sendo Brás Cubas, ao
vivo e em verde amarelo. Denotativo. Realmente, um desfile de
milhões de Brás Cubas, pior, Brás Cubas sabia que estava morto, não tentou reencarnar.
13 de mar. de 2016
Como rebelde, só me resta, por fim, a auto destruição.
Como rebelde, só me resta, por fim, a auto destruição.
No entanto, antes disso, preciso trabalhar para que não se restaure a ordem anterior. A ordem que querem está, por demais, ligada à servidão, ainda que não saibam que a mão que afaga é a mesma mão que apedreja. Da festa para a qual chamam a todos, para alardeá-la, só sentirá o tilintar dos serviços, e o aroma do café, no fim dela. Então, é aí que você entra em cena.
Como rebelde, não sou sedentário. E não aceito a verdade pelo limite de minhas forças frente ao monstro turbinado. Ele quer provar que o monstro sou eu, sendo ele o paradigma da monstruosidade. A ordem que querem restaurar é a que quero sepultar, no entanto, muito provavelmente, ele será o meu coveiro, mas, jamais o meu pastor.
É hora de lutar. Não farão a verdade pelo meu cansaço, eu não me canso, não me canso para que o meu cansaço não justifique, não transforme a farsa em verdade. E nem à força me faz aceitar seu conceito de vida, e de mundo.
No entanto, antes disso, preciso trabalhar para que não se restaure a ordem anterior. A ordem que querem está, por demais, ligada à servidão, ainda que não saibam que a mão que afaga é a mesma mão que apedreja. Da festa para a qual chamam a todos, para alardeá-la, só sentirá o tilintar dos serviços, e o aroma do café, no fim dela. Então, é aí que você entra em cena.
Como rebelde, não sou sedentário. E não aceito a verdade pelo limite de minhas forças frente ao monstro turbinado. Ele quer provar que o monstro sou eu, sendo ele o paradigma da monstruosidade. A ordem que querem restaurar é a que quero sepultar, no entanto, muito provavelmente, ele será o meu coveiro, mas, jamais o meu pastor.
É hora de lutar. Não farão a verdade pelo meu cansaço, eu não me canso, não me canso para que o meu cansaço não justifique, não transforme a farsa em verdade. E nem à força me faz aceitar seu conceito de vida, e de mundo.
12 de mar. de 2016
Purismo.
Purismo.
Nada
mais tranquilizador para um determinado tipo de brasileiro que
comprovar, ou ouvir dizer que seus inimigos políticos roubam.
É, mais uma vez, o poder que não admite debate.
Cunho
esta palavrona: Puritismo. Subst. Masc. Sing., a convicção
de que – quase – todos os problemas do Brasil atual são
produto da corrupção, em geral, e da corrupção
dos políticos em particular. Ou mais encumpridado: Puritismo
é um produto velho, uma lacra. Diante de certa prepotência
do lulismo, certo jornalismo – à valentona - se dedicou a
procurar os pontos frágeis na corrupção, que
vinha desde a destruição e venda/privatização
do Estado, para ocultar dos seus leitores e não narrar as
mudanças estruturais, decisivas que aquele processo vem
produzindo no Brasil.
A
corrupção é a conduta mais fácil de julgar, e qualquer
um pode condenar sem pensar muito, e mais precisamente, sem pensar.
Isso
é velho. Lembro dos militares, eles começaram a mudar
as estruturas sociais do país, destruindo as organizações
sociais, produzindo divida externa, quais devemos até hoje,
mas os julgam pela morte de Herzog e muitos outros. Terrível
matar jovens, jornalistas... Mas diante do estrago que fizeram ao
país, foi um mal menor. As torturas, os assassinatos,
inclusive, frente ao que fizeram, um mal menor: um espantoso,
limitado mal menor, diante do efeito do estrago geral que se estende
no tempo, que ainda perdura. Mas é muito mais fácil se
lembrar e entrar em acordo com o horror das torturas e roubos que no
estrago estrutural do país – porque entre outras coisas, os
que se beneficiaram com aquilo são, ainda, os donos de quase
tudo até esses dias que correm.
O mesmo aconteceu, mas sem a brutalidade e horror, mas com a mesma eficácia, com a venda/entrega do Estado nos anos FHC.
O mesmo aconteceu, mas sem a brutalidade e horror, mas com a mesma eficácia, com a venda/entrega do Estado nos anos FHC.
A
fúria Honestista já mostrou sua cara na eleição
de Collor, o caçador de Marajás. O grande problema é
que Collor foi um monstro que se rebelou contra seu criador. Quem
votou naquela eleição, deveria – como mínimo –
estabelecer este paralelo, ligar os pontos, afinal o que mais se
ensinou na escola daqueles tempos foi ligar com pontos coisas
parecidas, ou semelhantes.
Sigamos.
Muitas campanhas políticas se baseiam nesse Puritismo, muitos
políticos aproveitam seu enraizamento popular para centrar
seus esforços, seus discursos na denuncia da corrupção
e deixar de lado definições políticas, sociais e
econômicas. O Puritismo é a tristeza mais insistente da
democracia brasileira: a ideia de que qualquer análise deve se
fundar na pergunta criminal: quem rouba? Quem não rouba?. Como
se não pudéssemos ir alem disso. E creio que não
podemos. Infelizmente.
É
terrível que os políticos eleitos para gerir o estado o
roubem, nos roubem. Estamos todos de acordo com isso. Esse é,
precisamente, o poder do discurso contra a corrupção: é
muito difícil não estar de acordo. É, sem
vontade alguma de desmerecer ninguém, um lugar comum, aonde
todos podemos nos encontrar. Ninguém defende a corrupção
e os corruptos. Não digo: está bem que afanem minha
gaita. Talvez diga: esse filho da puta que está denunciando é
um perverso que passa creme de chantilly na sua cadela. Há
quem diga que o partido precisa de dinheiro para construir o poder,
dizem, para fazer política, sem parar para pensar – eba
pensar – que ao dizer, dizem bastante sobre a ideia do que é
fazer politica.
A
corrupção existe e é daninha. Mas também
existe e faz tanto mal quanto, essa tendência generalizadora de
atribuir à corrupção todos os problemas. A
corrupção se transformou em algo útil, ela acaba
com qualquer debate.
Se
as empresas estatais foram vendidas a preço de banana a outras
estatais estrangeiras – Telefonica, por exemplo, Telecom Portugal,
por exemplo - não foi porque havia uma dívida de
bilhões que obrigou o Brasil a fazer o que queriam os
credores, mas porque um punhado de ministros de FHC gostavam de
apartamentos em Paris.
Se
há tantos pobres -e se lhes cuida tão mal e porcamente
– a causa é menos da redistribuição de renda e
o abandono das obrigações do Estado que no desvio de
certos fundos. E assim sucessivamente. A discussão política
é o tema que o show da corrupção sabe evitar.
A
Honestidade é o grau zero da atuação política,
é óbvio que deve-se exigir a qualquer político –
como a qualquer empresário, faxineira, engenheiro, jornalista,
caçador de sapo, domador de cachorro – que seja honesto.
É
óbvio que a maioria dos políticos brasileiros não
são, ou não parecem honestos, é óbvio que
é necessário conseguir que sejam. Mais isso, em
política, não serve para nada, que um político
seja honesto não define, em absoluto, sua linha de atuação.
Porra! O fato de Tiririca ser honesto nos dá a dimensão
do abandono político em que nos meteríamos se todos
fosse iguais a ele.
A
honestidade deveria ser o mínimo denominador comum MDC, a
partir do qual pergunta-se: Que fazer com as terras indígenas?
Como resolver a questão energética? O que pensa do
aborto?
Não
argumento que a corrupção não seja um problema
grave. Mas, também é grave quando todo debate político
a ela se redunda. O debate sobre o poder. Sobre o poder da mídia.
Sobre o super acumulo de riquezas. Sobre o acumulo de pobreza. Sobre
a questão ambiental. Sobre a Amazônia. Sobre os rios.
Tudo está fora do debate, em nome da corrupção.
A
honestidade pode não ser de direita ou de esquerda, mas os
honestos com certeza são.
Podemos
ser honestos de esquerda e muito honestamente de direita, é a
partir disso que devemos buscar a diferença. Quem administra
honestamente a favor dos que têm menos – dedicando
honestamente o dinheiro público aos hospitais, ás
escolas... - será mais de esquerda, ou quem administre
honestamente a favor dos que mais têm – dedicando
honestamente o dinheiro público na melhoria das autopistas, ao
redor dos shoppings centers, os bairros nobres... este será
mais à direita. Baixando imposto ao pão, esquerda.
Diminuindo impostos sobre o lucro. Direita. Tudo muito honestamente
feito. Acatar as proibições eclesiásticas será
honestamente de direita. Quem facilite o uso de anticoncepcional
honestamente de esquerda. Quem invista na educação dos
jovens para retirá-los da rua, será honestamente de
esquerda. Quem enche a rua de policiais e de armas será
honestamente de direita. Em suma, a honestidade junto com a vontade,
a capacidade e a eficácia, quando existirem, atuarão
obrigatoriamente com um programa de esquerda ou de direita.
É
isso que o Puritismo evita discutir. A ideologia que certa direita
sempre insiste em postular que não há ideologias, e que
o que importa é a eficiência e a honestidade. Essa frase
´poderia muito bem ter saído da boca da doutora Dilma.
Tamanho o disparate. Esses direitas pensam que a política é
um capricho, uma vaidade.
Uns
dizem que a corrupção mata. Sem dúvida que mata
e é terrível. Mas o que mais mata é a falta de
hospitais, a desnutrição, a falta de educação
para a saúde, a violência, e a vida de merda que levam
uma grande parte da população, e isso é mais um
problema de participação política que de
corrupção.
Há
quem diga que se os políticos não roubassem, muitas
coisas seriam melhores, saúde, educação, por
exemplo.
Pode
ser que melhorassem, marginalmente. Mas o que define a saúde
ou a educação brasileiras não é a
participação em 10%, 20% ou até 30% no dinheiro
de quem delas se ocupam. O que as define é que - graças
á ditadura militar e seus continuadores pseudo-democráticos
– os brasileiros que podiam correram para os planos de saúde
e educação particular, e os pobres ficaram com essa
educação e essa saúde publicas que os políticos
corroem – . E dessa forma, a esquerda anda muito de direita. Ou
ainda, a esquerda é absolutamente de direita. Esse é o
problema.
Se
todos os políticos fossem honestos, ainda deveríamos
decidir se queremos ou não uma educação de
primeira, de segunda, de terceira. O mesmo valendo para a saúde.
O mesmo valendo para a segurança pública. O mesmo para
o trabalho. Ainda haveríamos de decidir se queremos que um
rico tenha muitíssimas outras possibilidades de sobreviver a
um infarto que um pobre. Ou não.
Deveríamos
decidir se saber matemática é um direito de jovens
cujos pais ganham menos de dois ou três salários
mínimos. Ou não.
Todas
essas decisões deixaram a mesa de negociação
política, pela corrupção.
Muitos
políticos e muitos cidadãos evitam essa discussão
e falam da corrupção, que é mais fácil e
não quer dizer absolutamente nada. Quem é louco de ser
a favor do câncer?
Tal
Puritismo é a forma de não pensar em certas coisas, um
modo safado de calar a boca. Quando não há ideologia, a
ideia da decência e da ética parece um refúgio
possível. É curioso, não houve no Brasil
contemporâneo um governante mais decente, mais refratário
a acumular riqueza pessoal, que um senhor que viveu até há
pouco num apartamento em San Conrado e que o seguem a chamar-lhe de
volta, apesar de tudo: General João Figueiredo.
Não
digo, para que fique mais claro o que penso, que não devemos
nos ocupar de descobrir todos os roubos e corrupções
que se possa. Pelo contrário – aplaudo e agradeço a
quem o faça. Mas digo, também, que se não
pensarmos a política para além disso, e se a pensarmos
em termos de honestos e desonestos, se a pensarmos com um assunto de
polícia, corremos o risco de voltar a eleger a um Fernando
Collor de Mello.
11 de mar. de 2016
Foi por amar...
Dormira
pouco. O dia seguinte se casaria a uma hora absurda, haveria outras
noivas e mais importantes. Com um vestido de passeio, que
aproveitaria em outros proveitos. Ao fim da cerimonia convidaria uns
quantos para o churrasco no quintal de casa. Quinze para a uma da
tarde findava a festa. Sabia que uma moça como ela não
podia aspirar a mais. Inda mais que os trinta estavam ali a dobrar a
esquina. “Não sonho acordada”, se repetia. Se bem, que
quase, quase. Aqueles dois palmos de véu, negro, lhe davam uma
penumbra acolhedora. Nem queria pensar, mas o brilho do sacrário
á sua frente iluminava um futuro impossível. Se este
pequeno armário não estivesse pintado com uma fina
camada de ouro, ela seria uma noiva de branco. O canto dos lábios num fremir leve e brincalhão. Com vestido de noiva
e tudo.
Festa de buffet no salão social do Bonfinense. Tudo e tudo e mais um. Tudo tão absurdo que reprimiu a vontade de rir.
Talvez chorar. Tempos atrás, noivara com o filho do dono da
venda. O mais velho. Fazia a inveja de todas as amigas. Não
era nem um Marlon Brando, mas ela tampouco Sophia Loren. Aquele
rapaz, “pouca coisa mais velho”, dizia, era a porta de saída
da miséria. Desembrulhou com suavidade o papel que protegia
seu parco enxoval. Ela mesma o havia bordado, quando mais jovem,
quando ainda não sabia com quem compartilharia aqueles
lençóis. Alguém batia à porta. Eram dois
rapazes, os irmãos mais moços de seu prometido. Não
aceitaram café. Nem a pinguinha que seu pai ofereceu. Tinham
mais o que fazer. Disseram a ela que seu irmão mais velho não
estava capacitado para o casamento. Soltaram a bomba H e se
despediram, educadamente da cunhada, que jamais seria. É de se
supor que os irmãos foram mais explícitos com o seu
pai, que os acompanhou da soleira á porteira. Devolver o anel
era feio? Mas não podia ficar com ele. Não queria. O
derreteu. Ali o tinha, à sua frente, enquanto casava com um
outro, a recordar-lhe que esteve a ponto de tocar com os dedos uma
vida melhor, e disse: sim. Tampouco tinha outras opções.
A recordo velha. Enlutada da cabeça aos pés.
Silenciosa, discreta. Indo à igreja com um balde de plástico
cheio de flores. Umas rosas abertas que não combinavam com
aquela cara triste e pálida. Fico a perguntar a quem as
oferecia.
10 de mar. de 2016
O Estado, Vargas e Grande Sertão Veredas.Pra quê? Deixa : bobo com bobo – um dia, algum estala e aprende: esperta. Só que, às vezes, por mais auxiliar, deus espalha, no meio, um pingado de pimenta... gsv
Pra quê? Deixa :
bobo com bobo – um dia, algum estala e aprende: esperta. Só
que, às vezes, por mais auxiliar, deus espalha, no meio, um
pingado de pimenta... gsv
Se um dia houver um
Estado ótimo, quer dizer no limite de sua eficácia e
eficiência, seria péssima noticia para os seus
concidadãos, concernente à liberdade. O brado é,
por um lado: Menos Estado, por outro: Estado Eficaz e Eficiente.
As perguntas que
proponho e tento responder são estas: Liberdade (menos estado)
é ruim para quem? Bom (estado eficiente e eficaz) para quem?
Desde a proclamação
da República Federativa do Brasil, jamais tivemos um estado de
fato. Pode-se dizer que a primeira tentativa se deu com Getúlio
Vargas em e partindo de 1930. O Golpe de Vargas sendo possível
justo pela fraqueza do Estado Central. A fragilidade do Estado está
solidificada nas Campanhas de Canudos, na existência de Lampião
e seus congeneres, em Pe Cícero tomando o governo do Ceará,
e o tamanho do caixa da “União” que não assomava
aos 5% do PIB e por fim a guerra do Paraguay, no qual sendo
necessária a união com Uruguai e Argentina e o
endividamento descomunal com Inglaterra. Não havia Estado.
A existência,
eficiência e eficácia estavam presentes no período
do Brasil colônia. Período no qual conseguiu guerrear e
manter seu território, manter sob a égide de sua força
descomunal o regime escravocrata. Não que as forças da
ordem fossem braços do Estado, mas sim dos Senhores de então,
que agiam em nome próprio e do Estado. Quando os escravagistas
colaboram e participam das ordens vindas de Portugal para que se
extinguisse todo e qualquer Quilombo, tratava-se na verdade de um
desejo partilhado com os dos Senhores de Engenho, Barões do
Café etc, sendo assim uma autorização à
carnificina e não uma ordem. Isso é prova inconteste de
quem era o Estado, a quem ele servia, e esses o servindo numa mão
dupla.
No XIX o Brasil era
federativo. Isso nos diz que havia certa autonomia nos estados
federados. Que também tinha muito pouco poder. Os Coronéis
eram coronéis de verdade, tinham seus pequenos exércitos,
que eram os seus agregados, aos quais se somavam os Jagunços,
para um entrevero e outro. Adrede cito aqui GSV de JGRosa na fala do
tio de Riobaldo.“Ah, a vida vera é outra, do cidadão
do sertão. Política! Tudo política, e potentes
chefias. A pena, que aqui já é terra avinda concorde,
roncice de paz, e sou homem particular. Mas, adiante, por aí
arriba, ainda fazendeiro graúdo se reina mandador – todos
donos de agregados valentes, turmas de cabras do trabuco e na
carabina escopetada! “ Os Jagunços zanzavam entre uma luta e
outra em busca do ódio alheio para vingá-lo pelo outro.
Formavam junto com grupos de Coronéis pequenas regiões
que se protegiam de forma quase autónomas, um exemplo é
a Sedição de Juazeiro, o poder era inclusive para se
usar contra do próprio Estado central.
O Rio de Janeiro
vivia, como capital desse proto Estado, com os 4% de impostos, o que
não dava para ter uma força, e exercer seu poder de
polícia, sobre todo o território. Não vem ao
caso, neste momento, mas isso explica um pouco a vida carioca, até
os dias de hoje. Voltando. Cada lei, praticamente, exige uma polícia.
E o Estado vive de impostos, seja menos de 5% do PIB. A fraqueza fica
explicita na guerra de Canudos. Traçando um paralelo, no
Brasil Colônia, um dos tantos Bartolomeus que houveram no
período, instado pelos proprietários e a Metrópole,
com seus homens arrasaram com 20.000 vidas na região
quilombola compreendida geograficamente toda a região da
Serra da Canastra indo até Formiga em Minas Gerais, de
Desemboque a Cristais, passando por Piumhi, Formiga até Campo
Belo. Dada a imensa geografia, a organização e
população neste episódio sangrento, notamos a
força do Estado no Brasil colônia e a fragilidade do
Brasil independente em Canudos.
A diferença está
em que, no Brasil independente, a partir de determinado momento, as
ordens da Capital, já não era do completo desejo dos
proprietários, era uma tentativa positivista de “modernizar”
o país. GSV “Aquela turma de cabras, tivesse sorte, podia
impor caráter ao Governo ” E o Estado não tendo poder
de implantar a Lei – seja o Estado – dado a força dos
proprietários particulares. Se quisermos, podemos chamar esses
proprietários de empresários, e suas propriedades de
empresas. Isso fica claro na questão Escravocrata, e na
questão da imigração europeia. O Estado, via Rio
de Janeiro, queria distribuir terras aos imigrantes, o que não
se deu devido a força dos proprietários de terra, com
as exceções do sul. De tal modo que os imigrantes
brancos, seguiram vivendo como escravos, nas mesmas senzalas e nos
mesmos trabalhos que os negros. A ponto de países como Itália
e Alemanha, proibirem seu povo de imigrar para o Brasil.
Há um episódio,
narrado por um intelectual francês, ocorrido depois da Semana
de Arte Moderna, aonde tal intelectual, saindo do salão da
casa grande, onde se cantava, tocavam obras da vanguarda européia,
se recitava poesia de vanguarda, e tomavam licores também
europeus – diz ele que estavam presentes Mario de Andrade, Oswald
de Andrade etc. - indo fumar na grande varanda, viu como vinham, à
tardinha, os colonos da lavoura para seus casebres, acompanhados por
grande número de capatazes, por se acaso, seja, o país
ainda era escravocrata.
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