Um dia abri a caixa
do correio e lá estava ela, a carta. Diria que a li de trás para
frente e de frente para trás infinitas vezes. Estava bem escrita –
não esperava menos dela – e era muito interessante. Mas não
entendia nada. Falava de tudo e nada. Tentei ler entre as linhas
alguma mensagem, que fosse única e para mim, onde explicasse por
qual razão, entre todos os habitantes da terra, me tinha escolhido
como destinatário. Não soube encontrar. Na minha livre
interpretação, aquela carta dizia: “ Meu! Foi só uma trepada!”.
No entanto, não
sabia que aquela seria a primeira de muitas, muitas cartas. Tantas
que geraram uma necessidade nova, abrir religiosamente a caixa de
correio. Verdadeiros tesouros literários, mas “O que queriam me
dizer?” me perguntava.
Insistia em procurar algum indício, pequeno que fosse, sem sorte.
Conclui que havia se encontrado com o seu perfeito leitor, e de
passagem me compensava da usa desaparição.
Não
respondi nenhuma carta. Mas no dia que ela fazia 30 anos, lhe enviei
um buquê de rosas. Então ela me telefonou e saímos.
Na
primeira carta depois deste encontro, me disse que negaria tudo,
inclusive negaria que houvesse me explicado os seus segredos, me
beijado ou acariciado. Por fim diria que havia sido um sonho. Mas eu
estava ali, e recordo de tudo, perfeitamente, e até uma frase dela
que sempre quero encaixar em alguma conversa, “ tenho muita sorte
dentro do azar”...