'Sei, que nada sei.'
Vou me gastar na
assertiva: 'Sei que nada sei'.
Poderia dizer que quem
diz: Sei, que nada sei, o faz no meio de um embaraço. E entre se
calar e assumir a nulidade argumentativa – dado que tal afirmação
sempre se faz em meio a calorosos, ou nem tanto, debates. - e diante
do evidente naufrágio do argumento, então e neste caso, uma saída
que parece 'sábia' é: Sei que nada sei.
'Sei que nada sei' tem
sonoridade de 'sabedoria' oriental, e de notória muitos a pensam
irrefutável, mas não é mais que um nenúfar, como aquele de Lao
Tsé: “Quem sabe não fala, quem fala não sabe”. E tão simples
quanto isso: Lao Tsé é mentiroso, porque não sabe, já que diz
saber o que fala.
Os gregos tentaram
estabelecer um mínimo de método à lógica. O
método é matemático e é axiomático. Um axioma é uma proposição
tão evidente que não precisa ser demonstrada. O homem é mortal. Se
se tem este ponto 'indiscutível' pode-se partir para definições
mais complexas derivadas de tal proposição. Sem que sejam
tautologias: 'tudo que é demais sobra', ou sistemas tautológicos
como os que exigem, aos recém-formados, experiência. Ou seja,
pensar 'matematicamente' a lógica. Sem grandes floreios.
Se
disser que todos os Ribeirão-pretanos são mortais, todos os
Bonfinenses são mortais, então todos os Bonfinenses são
Ribeirão-pretanos, isso é uma estupidez, ainda que seja verdade, o
que é uma casualidade. Porque os Bonfinenses são Ribeirão-pretanos
não por serem estes mortais e aqueles também, mas por Bonfim
Paulista ser um distrito de Ribeirão Preto.
Há
situações bastante confusas nesse ambiente. A estupidez é capaz de
chegar a conclusões corretas por caminhos totalmente equivocados.
'Sei que
nada sei' é um paradoxo. Um paradoxo é aparentemente correto, mas
em algo se equivoca.
Epimênides
que era de Creta disse: Os cretenses são mentirosos. Epimênides que
era cretense mentia. Ainda que Epimênides conhecesse todos os
cretenses. É uma estupidez. De tal modo que se se quer concluir
algo, tal será: um ciclo vicioso, uma contradição. Mas isso era
o principio de tudo. O principio da 'sabedoria', provavelmente,
oriental, que criava mais enigmas que os resolvia. De algum modo soa
'oriental', oriental no sentido vulgar, ordinário ou 'mass media'.
Porque o oriente, ou a noção de oriente, não coincide com o
oriente geográfico, ao mesmo tempo que se confunde oriente com
islamismo ou budismo e o que se diz é Lao Tsé querendo se passar
por Confucionismo, sem sabê-lo sequer cético. Certo é que
Austrália nada tem a ver com o oriente, sendo tanto ou mais oriental
que a Índia. E a Grécia tão bem cravada no oriente é quem funda o
pensamento ocidental, por outro lado os ocidentais Egito, Tunísia,
Casablanca, Cairo, Israel ou Palestina tidos como orientais.
Desse
modo um argumento que contenha a palavra Oriente como sujeito, ou
predicado de algum sujeito, deve ser mesurada, ou adjetivada.
Oriente-se.
Se digo
que sei, algo sei.
Platão
presenteou a lógica com um principio banal, o princípio da não
contradição - que os sofistas não usavam pois os sofistas, os
dialéticos de então, o que queriam era confundir o debate e se
saírem vencedores, e não serem lógicos ou verdadeiros -.
Como o
interesse aqui é ser lógico e partindo de premissas particulares,
não estabelecer conclusões generalizantes. Universalizar é
possível sim, desde que não se viole uma das leis do silogismo, tão
caras a Aristóteles, ou seja não se universaliza partindo das
premissas particulares. Leio esta frase:
“Toda
unanimidade é burra”. É frase cunhada por Nélson Rodrigues, e se
tornou um fóssil que de quando em quando se desgarra de sua matéria
pedra e volta para assustar os vivos de hoje. Não somos ou não
devemos ser unânimes quanto ao governo ao a forma de governo, ao
clube do coração, à melhor canção, porque seria nossa alma que
ficaria prejudicada na unanimidade é o que Nélson Rodrigues quer
dizer, é que seria um desastre para os interesses humanos, aqui não
estamos tratando da lógica mas da alma, enquanto interesses humanos,
que devem, partindo da frase, ser subversivos, ou discordar no mínimo
de qualquer processo 'humano' que seja unânime. No entanto a frase
é universalizante. Somos unânimes em crer que dois mais dois
resulta quatro. Somos unânimes em nossa mortalidade. Somos unânimes
que amanhã será outro dia, independente de nós, e nesse caso só o
fim hoje da humanidade seria capaz de impedir o amanhã, da
unanimidade. Portanto o que se desdobra é que não devemos ser
unânimes cegamente, como diz Nélson Rodrigues “Quem pensa com a
unanimidade não precisa pensar”. Não sei se Nélson Rodrigues
conhecia o Tratado de Sanhedrin que pertence ao Talmude, à tradição
Judaica, porque nele há algo muito próximo, pois que senão:
"A
lei, o privilégio concedido à determinada compreensão do que é
certo, só se faz legítima na medida em que, dadas as condições
necessárias, sua preservação possa até mesmo ser mantida através
de sua desobediência." e mais adiante ...”O sentido de tal
lei, expressão da alma e obviamente subversiva, é a desconfiança
de que um processo possa ser tão bem conduzido que não paire
qualquer dúvida quanto a uma leitura diferente da situação. A
unanimidade expressa uma acomodação à verdade absoluta que é
insuportável à vida e que tem grande potencial destrutivo."
Ou seja,
se a lei não postular a desobediência será uma arbitrariedade.
Donde conclui-se que a unanimidade é arbitrariedade. O tratado de
Sanhedrin estabelece variados tribunais, com três, 23 e chegando a
71 juízes, dependendo da gravidade e abrangência do julgado. Mas
deixa claro que se o veredicto for unânime este sera anulado, por
que não creem em um processo ou procedimento perfeito, há que se
estar atento.
Voltando
ao mundo dos vivos.
Sei.
Este é um argumento. Um segundo argumento dentro do mesmo pensamento
não pode contraditar o primeiro como: Nada Sei.
É uma
estupidez:
Sei,
Nada sei.
Logo: ...
Logo é
um desadaptação à realidade ocidental. Quem sabe, num outro
sistema lógico, nossa estupidez seja sabedoria, neste não. Posto
que a realidade ocidental é e foi forjada por um sistema lógico –
muito bem poderia ser outro, mas não é – marcado a bala e
canhões e bombas atômicas e chibatas e tudo quanto foi necessário,
até homilias. E a maior ambição de nosso sistema é definir uma
noção aceitável – níveis aceitáveis – de estupidez.
Certo é
que, é possível que exista quem saiba nada, e neste caso o sujeito
estará condenado a não saber, nem mesmo, da própria ignorância, e
não poderá afirmar que não sabe, porque nem sabe o que é saber ou
não saber.
Sei. Sei,
que sei alguma coisa. E se sei estas, que sei, há nada que impeça
outras tantas existirem, quais não saiba. O que tento impedir, que
aconteça na minha vida, é vir a sabê-las demasiado tarde, coisa
que naturalmente sói não ocorrer. Outra coisa que sei, é que não
sei algumas outras coisas, ou muitas quiça, mas se ignorar muitas ou
poucas, uma frase, sábia que seja, não me fará sábio, muito menos
se se tratar de uma estupidez, ainda que consagrada.