Não é costume meu,
ser evasivo; porque nisso reside a arte, não tenho inclinação
artística, senão que desejos. Entretanto como tentativa de me
revitalizar como indivíduo, por vezes sou levado à falsidade, ao
plágio e mesmo a reinventar minha própria biografia. Pode parecer o
que for, desde já, mas tem o propósito último de ser a mim um
passatempo de mim. Uma problematização metalinguística de mim
mesmo que buscará solução em qualquer parte. Haverá aquele que
entenderá como um ceticismo epistemológico, ainda que estime muito
a religião e a filosofia, mas tão só no que tange valores
estéticos, no que encerram de singularidade e de maravilha. O que
poderia se chamar ou identificar como um ceticismo essencial. Não
tenho nenhuma teoria do mundo, embora possa usar a metafisica como
sistema, ou o materialismo como religião, mas isso não deve passar
de um aproveitamento necessário à solução de problemas
específicos. Não creio que o conhecimento seja possível. E se
poderá dizer agnóstico de seu praticante. Como dizia H.G.Wells:
intercalar doutrina nos pensamentos e escritos é deplorável. No
específico das mundanidades fui levado a conhecer o que alguns
poucos conhecem e desconhecer o que é de todos conhecido, quer dizer
sou uma lacuna vergonhosa. Confesso que gostaria de ser facilmente
localizado no platonismo, ou num panteísmo a la Espinosa, ou mesmo
um niílico panteísta. Mas dada a minha admiração pela
metafisica, sou mesmo é um caipira perdido na metafisica, que é uma
terra fértil que não serve à cana-de-açúcar, e apesar de ser
completamente incapaz de entendê-la é por meio dela que me
ocorre de um tudo, urticárias ou bicho de pé ideológico, menos a
fimose intelectual, que não passa de um aprisionamento de todo o
pensamento por uma corrente ideológica, ou como já o disse antes, é
a deplorável necessidade de intercalar doutrina por todas as partes
do orbe.
Cada uma a sua maneira,
certas canções, atingem um tipo de perfeição, e há estudos
profundos ligados à linguística, mais precisamente à linguística
generativa de Noam Chomsky que coloca no centro de tudo a sintaxe.
Antes de Noam Chomsky se cria que a linguagem era, por completo,
adquirida por associação e ou aprendizagem, o que digo para
linguagem vale para qualquer destreza humana, a música por exemplo.
Depois da publicação de 'Estruturas Sintáticas', que atacava os
pressupostos básicos do estruturalismo e da psicologia condutivista,
onde Chomsky postula a existência de um dispositivo inato, quase um
'órgão da linguagem', que permitiria aprender e usar a linguagem
de um modo quase instintivo. Basicamente é assim, há os que pensam
que o cérebro de um bebê é vazio e deve-se enchê-lo, já Chomsky
pensa que o bebê nasce com todos os dispositivos no cérebro
especializados e inatos.
Dessa maneira há
canções, como todas, existiam antes, isto é: 'Ai se te pego',
existia ou estava no limbo, como Michel Teló existia no limbo, e
foi no limbo que Michel encontrou 'Ai se te pego' que eram a peça e
o vazio ou espaço falto do quebra-cabeças. O grande valor de
Michel Teló e vislumbrar o que existia, coisa que nós a maioria dos
mortais não vemos. Vemos muito menos coisas do que as coisas todas
que existem, e para disfarçar acreditamos em coisas inexistentes,
afim de parecermos inteligentes, ou parecermos insatisfeitos com o
mundo. Podemos explicar esta união cabalisticamente, sem
necessariamente sermos especialista no Talmude, porque a Cabala é
necessariamente precisa e justifica todos os acontecimentos do
mundo, e suas necessidades últimas, onde os acontecimentos não se
dão ao azar. Ou seja, a contingência do azar é zero. Veja você
que o dito vai de encontro à famosa frase o poema mallarmaico: 'a
coup de dés jamais n'abolira le hasard' que contraria toda a cabala,
sendo que institui como mínimo uma possibilidade extra. O que
levaria Borges a dizer que Mallarmé e seu poema está incluído, por
conseguinte, em todos os acontecimentos do mundo, o abraço se fecha
sobre tudo. Assim sendo 'Ai se te pego' e Michel Teló são tão
necessários e não casuais como o faisão azul de bromotimol ou
tornassoleado, como preferirem. Porque Michel é Mich (alemão eu) e
el ( espanhol ele) então EuEle, e Teló é antes de tudo Tê-lo é
'tela' 'telon' espanhol e Teló 'tela catalão' e uma outra vez 'el'
e 'elo' 'eloé' e recorda de pronto Telavive e 'ai se te pego' tem
o ritmo marcado exato, melhor dito na melhor frequência para se
'fazer amor' muito parecido ao Bolero de Ravel.
E desta
maneira sem conseguir uma linha de fuga, acabo por me agarrar a
determinadas ideologias que não dirão nunca: matematicamente se
poderia conseguir a conjunção: canção e cantor(voz) (veículo)
perfeita e agrada a toda a gente, mas o que realmente não queremos,
nem sequer parecer, quanto menos ser igual a toda a gente.