I - Educação e Desenvolvimento.
A
educação é assunto para longa e profunda abordagem, para abstrair,
senão tanto, rarefazer leviandades. Há muita literatura a respeito,
como, por exemplo, a Revista de Sociologia da USP onde encontrei
alguns artigos (ver bibliografia abaixo).
Minha
intenção é mostrar de algum modo, que é a absoluta prática do
Mercado, que nos coloca, no âmbito educacional, na situação atual.
Sendo que tudo foi intencional e premeditado, não posso dizer
planejado, porque os economistas agem a posteriori, sendo seu maior
instrumento a estatística, e a estatística se aplica sobre o
passado – banco de dados – e partindo dela extrapola
entendimentos visando futuro. Sendo leviano, os economistas não
previram nenhuma das crises do 'mercado', embora tenham imensa
habilidade para nos explicá-las, fato ocorrido.
Nos
anos 70, mais precisamente em 1971, deu-se a tentativa de
profissionalizar todo o ensino médio no país. Roberto Campos, Mário
Henrique Simonsen etc.
Nos
anos 90, no governo F.H.C., tiveram como ministro da educação o
economista Paulo Renato, Paulo Renato de Sousa é economista e
docente da Unicamp.
Voltando
no tempo, anos 20 do século 20, a ABE, Associação Brasileira de
Educação foi criada em 1924, em conferências nacionais ocorridas
em1927, 1928 e 1929 substancialmente vinha dizer ao público que
educação é coisa de especialista. Educadores, que à época eram
os bacharéis-educadores.
Em
1930, Vargas recorreu à ABE à busca de solução à organização
do Estado, quando a ABE então discutia: gratuidade e laicidade do
ensino público, o Estado então patrocina a IV Conferência
Nacional, e em seguida diante da discussão necessária do
anteprojeto de Plano Nacional de Educação, dá-se a V Conferência
Nacional, era 1932. Ocorre que, com a própria ABE dividida quanto
ao financiamento estatal às escolas confessionais e ensino religioso
nas escolas públicas e diante da força extremada da clivagem da
Igreja Católica, o governo incorpora diretamente segmentos da ABE
aos quadros do governo, e estes acabam por criar o Inep, Instituto
Nacional de Estudos Pedagógicos. A participação desses educadores
na politica educacional, fizeram do Estado o responsável, único,
pelas diretrizes educacionais e a obrigatoriedade de escolarização.
Devemos saber que isso supunha: 'politica pública educacional' para
“uma cultura comum, unificação linguística e interiorização do
pertencimento à nação”, porque estava em jogo a construção do
indivíduo, que deve sobrepor a lealdade à pátria em detrimento da
família e religião.
As
leis orgânicas chegavam a indicar um preocupação em reduzir a
influência da família, da Igreja, ou outro tipo de socialização,
e aumentar a influência da escola como fonte de propaganda de
valores nacionais.
A
substituição de educadores por economistas traduz a lógica de uma
educação voltada para o desenvolvimento econômico contra a
construção da nação e do cidadão.
Mas
não pense que isso se deu 'naturalmente', mas sim como fruto de uma
disputa, onde os vencedores foram os economistas nacionais, apoiados
no tripé: um economistas estadunidenses, dois os europeus – ambos
vinculados a Unesco – e o pé mais forte: Fundação Ford.
Basicamente visando um planejamento educacional para suprir as
necessidade de “ mão-de-obra ” para o desenvolvimento.
Teoria
do "Capital" Humano, criado pelo departamento de economia da
Universidade de Chicago, ainda que, ao menos intuitivamente, educação
e produção de riqueza já andavam presentes há muito em Adam Smith
e David Ricardo.
Anísio
Spinola Teixeira, educador entre outras, difusor da Escola Nova –
anos 30 – que tinha
como princípio a ênfase no desenvolvimento do intelecto e na
capacidade de julgamento, em preferência à memorização, foi
“cooptado” e acabou por ser um dos personagens centrais na
efetivação do vínculo entre o planejamento e a distribuição de
recursos na LDB, Lei de Diretrizes e Bases, são suas estas
declarações
“não podemos deixar de fazer planos. Não há nisso
qualquer mistério. Basta agir coerentemente, sistematicamente,
levando em conta os objetivos, os meios e as consequências desses
meios”
ou
“era moda, estava no ar. Não só os economistas
começavam a ter certa influência mas nós mesmos considerávamos
que, se contribuíssemos com o desenvolvimento, outras coisas viriam
inexoravelmente”
Na
verdade Anísio foi devorado pela esfinge, para não ficar de fora,
entretanto perdeu cacife nesse jogo de estatísticas e econometrias
do planejamento “moderno” dos economistas.
O
golpe de 1964 acelera o afastamento e o pontapé nos “fundilhos”
se deu num seminário organizado pelo Ipes - Instituto de Pesquisas
e Estudos Sociais – em 1968 na PUC-Rio, onde o conferencista era o
ex-ministro do planejamento, Roberto Campos e encarregado do tema
“Educação e desenvolvimento Social ”, com intervenções de
Mário Henrique Simonsen e com Anísio Teixeira presente e calado na
plateia. Roberto Campos diante dos “defeitos do sistema
educacional” propõe o “planejamento de mercado”, não posso
deixar de ser leviano, planejamento de mercado é “nenhum
planejamento”.
Para cúmulo das ironias e cinismos o seminário se
intitulou “A Educação que nos convém”.
A
construção desse poder obtido pelos economistas pode-se ter uma
ideia aqui: [...] um grande projeto de cooperação internacional
com recursos do Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento
(Pnud) e envolvendo todas as agências das Nações Unidas: Unesco,
OIT, FAO, OMS com o objetivo de alocar peritos dessas organizações
na secretarias gerais dos ministérios setoriais [...] na época
consideradas o órgão central de planejamento de cada ministério
(Depoimento de Edson Machado em Ferreira e Moreira, 2003, p. 110).
É
nesse contexto que a discussão sobre a relação entre educação e
desenvolvimento foi apreendida no Brasil. Mário Henrique Simonsen, o
“matemático humanista” na descrição de Roberto Campos, foi um
dos agentes fundamentais desse processo, como bem o demonstra a
discussão que apresenta em 1969 sobre “Educação e
desenvolvimento” no seu livro Brasil 2001. Nisso foi auxiliado pelo
próprio Roberto Campos e por João Paulo dos Reis Velloso, ambos
também autores do mesmo tipo de análise sobre o papel da "educação"
para o "desenvolvimento econômico".
Tanto
a reforma educacional que transformou o ensino médio em ensino
técnico, como a implementação do “Mobral” - Movimento Brasil
Alfabetizado - são exemplos de política pública gestada nos anos
de 1960.
Com
isso a questão educacional, interpretada pela teoria do “capital
humano” - ainda vige como revolucionária por
conferencistas país afora - , passou a ser utilizada por uma fração
dos economistas dirigentes como um instrumento de compreensão dos
processos econômicos que se desenrolavam no período.
Na
sequencia - próximo post - tentarei chegar mais longe na dicotomia distribuição de
renda – concentração – e a educação. Educação|Renda.
Alguma
bibliografia:
-
Tempo Social,
revista de sociologia da USP, v. 20, n. 1
-
CAMPOS, Roberto de Oliveira. (1969), “O investimento humano ou os
insumos invisíveis (I, II, e III)”. Ensaios Contra Maré. Rio de
Janeiro, Apec.
-
(2001), Lanterna na popa. 4 ed. revista. Rio de Janeiro, Topbooks.
-
IPES. (1969), A Educação que nos Convém. Rio de Janeiro, Apec.
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