6 de dez. de 2012

Educação: Economistas versus Educadores.




I - Educação e Desenvolvimento.


A educação é assunto para longa e profunda abordagem, para abstrair, senão tanto, rarefazer leviandades. Há muita literatura a respeito, como, por exemplo, a Revista de Sociologia da USP onde encontrei alguns artigos (ver bibliografia abaixo).
Minha intenção é mostrar de algum modo, que é a absoluta prática do Mercado, que nos coloca, no âmbito educacional, na situação atual. Sendo que tudo foi intencional e premeditado, não posso dizer planejado, porque os economistas agem a posteriori, sendo seu maior instrumento a estatística, e a estatística se aplica sobre o passado – banco de dados – e partindo dela extrapola entendimentos visando futuro. Sendo leviano, os economistas não previram nenhuma das crises do 'mercado', embora tenham imensa habilidade para nos explicá-las, fato ocorrido.

Nos anos 70, mais precisamente em 1971, deu-se a tentativa de profissionalizar todo o ensino médio no país. Roberto Campos, Mário Henrique Simonsen etc.
Nos anos 90, no governo F.H.C., tiveram como ministro da educação o economista Paulo Renato, Paulo Renato de Sousa é economista e docente da Unicamp.

Voltando no tempo, anos 20 do século 20, a ABE, Associação Brasileira de Educação foi criada em 1924, em conferências nacionais ocorridas em1927, 1928 e 1929 substancialmente vinha dizer ao público que educação é coisa de especialista. Educadores, que à época eram os bacharéis-educadores.
Em 1930, Vargas recorreu à ABE à busca de solução à organização do Estado, quando a ABE então discutia: gratuidade e laicidade do ensino público, o Estado então patrocina a IV Conferência Nacional, e em seguida diante da discussão necessária do anteprojeto de Plano Nacional de Educação, dá-se a V Conferência Nacional, era 1932. Ocorre que, com a própria ABE dividida quanto ao financiamento estatal às escolas confessionais e ensino religioso nas escolas públicas e diante da força extremada da clivagem da Igreja Católica, o governo incorpora diretamente segmentos da ABE aos quadros do governo, e estes acabam por criar o Inep, Instituto Nacional de Estudos Pedagógicos. A participação desses educadores na politica educacional, fizeram do Estado o responsável, único, pelas diretrizes educacionais e a obrigatoriedade de escolarização. Devemos saber que isso supunha: 'politica pública educacional' para “uma cultura comum, unificação linguística e interiorização do pertencimento à nação”, porque estava em jogo a construção do indivíduo, que deve sobrepor a lealdade à pátria em detrimento da família e religião.
As leis orgânicas chegavam a indicar um preocupação em reduzir a influência da família, da Igreja, ou outro tipo de socialização, e aumentar a influência da escola como fonte de propaganda de valores nacionais.
A substituição de educadores por economistas traduz a lógica de uma educação voltada para o desenvolvimento econômico contra a construção da nação e do cidadão.
Mas não pense que isso se deu 'naturalmente', mas sim como fruto de uma disputa, onde os vencedores foram os economistas nacionais, apoiados no tripé: um economistas estadunidenses, dois os europeus – ambos vinculados a Unesco – e o pé mais forte: Fundação Ford. Basicamente visando um planejamento educacional para suprir as necessidade de “ mão-de-obra ” para o desenvolvimento.
Teoria do "Capital" Humano, criado pelo departamento de economia da Universidade de Chicago, ainda que, ao menos intuitivamente, educação e produção de riqueza já andavam presentes há muito em Adam Smith e David Ricardo.
Anísio Spinola Teixeira, educador entre outras, difusor da Escola Nova – anos 30 – que tinha como princípio a ênfase no desenvolvimento do intelecto e na capacidade de julgamento, em preferência à memorização, foi “cooptado” e acabou por ser um dos personagens centrais na efetivação do vínculo entre o planejamento e a distribuição de recursos na LDB, Lei de Diretrizes e Bases, são suas estas declarações
“não podemos deixar de fazer planos. Não há nisso qualquer mistério. Basta agir coerentemente, sistematicamente, levando em conta os objetivos, os meios e as consequências desses meios” 
ou 
“era moda, estava no ar. Não só os economistas começavam a ter certa influência mas nós mesmos considerávamos que, se contribuíssemos com o desenvolvimento, outras coisas viriam inexoravelmente”
Na verdade Anísio foi devorado pela esfinge, para não ficar de fora, entretanto perdeu cacife nesse jogo de estatísticas e econometrias do planejamento “moderno” dos economistas.
O golpe de 1964 acelera o afastamento e o pontapé nos “fundilhos” se deu num seminário organizado pelo Ipes - Instituto de Pesquisas e Estudos Sociais – em 1968 na PUC-Rio, onde o conferencista era o ex-ministro do planejamento, Roberto Campos e encarregado do tema “Educação e desenvolvimento Social ”, com intervenções de Mário Henrique Simonsen e com Anísio Teixeira presente e calado na plateia. Roberto Campos diante dos “defeitos do sistema educacional” propõe o “planejamento de mercado”, não posso deixar de ser leviano, planejamento de mercado é “nenhum planejamento”.
 Para cúmulo das ironias e cinismos o seminário se intitulou “A Educação que nos convém”.
A construção desse poder obtido pelos economistas pode-se ter uma ideia aqui: [...] um grande projeto de cooperação internacional com recursos do Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (Pnud) e envolvendo todas as agências das Nações Unidas: Unesco, OIT, FAO, OMS com o objetivo de alocar peritos dessas organizações na secretarias gerais dos ministérios setoriais [...] na época consideradas o órgão central de planejamento de cada ministério (Depoimento de Edson Machado em Ferreira e Moreira, 2003, p. 110).
É nesse contexto que a discussão sobre a relação entre educação e desenvolvimento foi apreendida no Brasil. Mário Henrique Simonsen, o “matemático humanista” na descrição de Roberto Campos, foi um dos agentes fundamentais desse processo, como bem o demonstra a discussão que apresenta em 1969 sobre “Educação e desenvolvimento” no seu livro Brasil 2001. Nisso foi auxiliado pelo próprio Roberto Campos e por João Paulo dos Reis Velloso, ambos também autores do mesmo tipo de análise sobre o papel da "educação" para o "desenvolvimento econômico".
Tanto a reforma educacional que transformou o ensino médio em ensino técnico, como a implementação do “Mobral” - Movimento Brasil Alfabetizado - são exemplos de política pública gestada nos anos de 1960.
Com isso a questão educacional, interpretada pela teoria do “capital humano” -  ainda vige como revolucionária por conferencistas país afora - , passou a ser utilizada por uma fração dos economistas dirigentes como um instrumento de compreensão dos processos econômicos que se desenrolavam no período.
Na sequencia - próximo post - tentarei chegar mais longe na dicotomia distribuição de renda – concentração – e a educação. Educação|Renda.

Alguma bibliografia:
- Tempo Social, revista de sociologia da USP, v. 20, n. 1
- CAMPOS, Roberto de Oliveira. (1969), “O investimento humano ou os insumos invisíveis (I, II, e III)”. Ensaios Contra Maré. Rio de Janeiro, Apec.
- (2001), Lanterna na popa. 4 ed. revista. Rio de Janeiro, Topbooks.
- IPES. (1969), A Educação que nos Convém. Rio de Janeiro, Apec.


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