9 de set. de 2011

Fausto. Mefisto. Marx. Goethe.





 
Fausto é quente como o próprio inferno. Dualidade céu e terra. Um pacto entre deus e o demônio a despeito do homem. A coisa é uma disputa ranheta - pelo humano, frágil Fausto - entre dois dos vértices do universo, que agem como se fossem as pontas das asas de um origami simétrico. Sem querer adiantar analogias, é dizer que, o universo é uma toalha tridimensional, ou um lençol, o livro é um nó nesse pano, aonde somente as pontas estão livres.

Mefistófeles desce a terra para conquistar Fausto. Fausto anda muito angustiado, pois apesar de todo seu conhecimento, não encontra sua razão de ser e de felicidade. Herói fragilizado acaba por aceitar o pacto com o diabo, assinando com o próprio sangue.

Fausto sai em viagem com o Pé-de-pato. Vão em busca do mundo dos prazeres. Que não o mesmo de os prazeres do mundo. Visita um boteco, o mundo da feitiçaria, onde recebe uma poção de rejuvenescimento, plástica esta que o habilita ao amor de Margarida. Mas em algum lugar, no espelho da história, da mitologia talvez, Fausto vê Helena, a mesma de Menelau. Pobre Menelau. Fausto se apaixona por Margarida. Perdidamente. Mefistófeles proporciona-lhe prazer carnal e espiritual. Cria-se então a tragédia de Margarida. Os mancomunados não pensaram na moça.


Que coisa é Fausto? Um novo homem?

Devo partir do seguinte: a arte é autônoma, mas o artista é homem, e como tal tem a autonomia restringida, e para Goethe a restrição é entender o homem.
Eu penso que Goethe se fez uma pergunta e a sua resposta é: Fausto, ao mesmo tempo resposta pergunta. Wood Allem sempre diz que um judeu responde com uma pergunta? É o que você quer saber?
Um dos aspectos dessa resposta é a forma. A forma poética. Dentro da tradição da poesia de Dante, Homero etc que é a linguagem. A linguagem como forma de liberdade, já que a razão tem grilhões, que a linguagem desconhece, tirante a gramática, a sintaxe. Mas suspeito que a poesia libera inclusive o autor. Chego a pensar que a poesia se dá as expensas do autor. De tal maneira que a cada leitura, fazemos novos entendimentos, dos mesmos significantes.
Fausto de Goethe é um homem que tem que tomar decisões dentro. e em conflitos dentro da zona conflituosa, ele mesmo. O homem poético é conflituoso, ao mesmo tempo que é sujeito desse conflito e sua solução. Sujeito de sua própria história e um desconhecido para si mesmo.
Entendo como solução, encontrada por Fausto, a ação em oposição à contemplação.
Nos dias de hoje o equivalente mefistofélico é a técnica. Eu, neste instante prático este pacto, homem diabo, que é homem\técnica, de qualquer forma um charlatanismo, noutras palavras: dominar o processo.

Para que dominar o processo, se não que para ir ao encontro de um desejo. O ponto central é o sentido da existência, se a existência fosse um lugar e nele instalássemos um desejo. Não importa a dificuldade de satisfação do desejo, satisfeito o desejo, o sentido da existência não se satisfaz. O homem deseja, mas deseja o quê?

Fausto o poema, lança uma flecha sem futuro, sem alvo, ou de alvo invisível, ou seja, há limites?
Há limites à satisfação dos desejos? Como o socialismo recepciona essa questão? As vezes penso que são perguntas demais, para uma resposta pergunta.
Se a satisfação do desejo é imposição de sofrimento ao outro, devo, obrigatoriamente, pensar em limites. Moral? Ou dos inseparáveis teológico teleológico medievos impregnados?

Volto a pergunta: Fausto está descontente com os limites. O pacto com o diabo lhe dá um plus, ultra, como um bônus, uma sobrevida; coisa por demais comum em videogames, onde dependente da ação; ganha-se: vida .
O pacto é uma maneira de escapar da teologia medieval, e assim ganhar autonomia em relação a deus.
Mas independente da ampliação do limite, ele está ai. Fausto percebe à sua volta que o infinito é impossibilidade na concretude dos limites, no amor, no poder, mas ele quer ir além e ai está a tragédia.
O real é inacessível e incontornável, é heideggeriano. Mas e o pacto? O pacto dá a Fausto uma autonomia em relação a Deus, que é uma forma de se atingir o real, mas atingir o real é chegar à morte, à tragédia. O raio de luz. Isso faz da coisa algo irracional, sendo que de todos os reinos, o animal racional é justamente aquele que assim age: irracionalmente,
E apesar de dono do destino, conhecedor dos processos e dominador das técnicas, é sentimental. Duas almas, uma com e outra sem limites. A cultura, o ancestral confronta o prazer.
Há uma certa busca por uma conciliação da dualidade vida e morte.

Em qualquer momento pode-se interpenetrar Mefisto de Klaus Mann, do filme de mesmo nome, de István Szabó, com Klaus Maria Brandauer, que vi no cine Cauin (Lafaiete) a long time ago, sem pipoca.

Dialogo constante entre Fausto e Mefistófeles. Duas almas, uma com limite, outra sem limite. Uma que se apaixona pelo simples pudoroso, ancestral.
E a outra pelo prazer, a traição, o sem limites etc.

O que existe não existe para ser contemplado, mas para ser transformado. É uma fonte qual bebeu Karl Marx. Teses sobre Feurbach. Ideologia Alemã.

Uma pala.

Os filósofos têm apenas interpretado o mundo de maneiras diferentes; a questão, porém, é transformá-lo. Porque, kann die Welt nicht bleiben wie sie ist. Por isso, deswegen muss sie verandert werden. Se, o mundo não pode ficar assim, para tanto deve ser transformado in einer Art und Weise, in die alle Menschen einbezogen sind. De maneira includente. Assim o filósofo não pode proibir mais que ninguém... deveria proibir menos, talvez, se também imaginar mais coisas que o ser acomodado. Dessa maneira Schließlich finalmente gibt há es nichts nada, was dem Philosophen, sowenig wie dem Bourgeois, verbietet, zur Veränderung der Welt mit beizutragen



Mas transformar para que?
Responde Goethe, Fausto e Marx:Transformar por transformar, o processo independente do resultado, o resultado como acidente. Como na História Infinita, não se passa da ficção à ação, ou do ficcional ao real sem que se perda o cerne.  É o paradoxo.

É tudo com o homem. Não há teleologia, nem natureza humana, nem natureza, nenhuma ordem.
Onde a única certeza é o vazio e a insegurança nos âmbitos internos e externos respectivamente.

Fausto é:
Tudo fazer para responder quem sou eu.
Tudo fazer pelo amor.
Tudo fazer para transformar sob o comando humano.
Tudo sem medo do caos.








3 comentários:

Regina Baptista disse...

Gostei dessa hipótese de duas almas, uma com limites e outra sem.
Na sua origem Fausto não sabia que tinha esse lado sem limite. Fazendo o pacto, achava que estava se livrando de amarras e que daria conta do conhecimento maior do que lhe era permitido. O Fausto do século XXI sofre o drama de descobrir essa alma sem limite (o inconsciente, na minha opinião). E embora lhe pareça mais fácil aprofundar o conhecimento - porque não há mais um deus a lhe censurar - ele sabe que é movido por forças do próprio ser... forças que ele desconhece em sua completitude.

Regina Baptista disse...

Uma coisa que me chama atenção no Fausto é a sua inclinação anti-dialética.

cidoGalvao disse...

jocosamente ( só há o inconsciente).
e dialeticamente: a centopeia caminha assim, qualquer coisa que saltar de um ponto a outro, é falto de dialética. em suma Fausto, queria isso. Seduzir por direito adquirido. Fausto é a preguiça, mas que fique em segredo.