29 de mar. de 2012

Locupletemo-nos todos.



Não sou ambientalista, mas compreendo os que reivindicam a preservação, e por não ser do contra, aceito suas teses. Todavia acredito que chegaríamos mais longe pela via obliqua da estética e da elegância que pela obtusa demagogia. Ninguém ama ninguém ou belo, talvez o esplendor erótico.
Todo esse nhenhenhém se deve ao fato de existir lei, já velha, que regulamenta o uso do solo às margens de rios, córregos e riachos. Não sei a quantos metros devem estar, as obras, do leito do rio. De orelhada sei que juntando a lei federal com a municipal chega a quase 100 metros. Entretanto o novíssimo condomínio Olhos d'Água, se avizinha ao olho d'água que corre rumo ao ribeirão Preto. Certo é que terraplenou à 25 centímetros dele, na verdade jogou terra no olho d'água, autorizados por duas placas, que plantadas no local, exibem alvarás e o que mais servir com álibi. Inútil espernear. Por isso adianto que a campanha publicitária na hora da venda louvará o verde, por meio de uma verde montagem, que do verde, saibam os amantes do verde, só os olhos rasos d'água!

27 de mar. de 2012

Flor de plástico


Teoria social da conspiração... é uma consequência da desaparição de Deus como ponto de referência, então fica a pergunta: Quem O há relevado? Karl Popper.


Por que o capitalismo é isso: feito da própria impossibilidade, seu eixo fundamental é: daquilo que há e querem que todos compremos, não dá para todos. Em suma o desejo de todos é a todos insaciável, não há iPad para todos, se todos o quiserem. Não há ruas para todos os carros, ainda que não exista carros para todos os que os desejam, não há leitos hospitalares para todos, ainda que os Planos de Saúde insistam em vendê-los. Um dos sintomas de nosso tempo é a fatal falta de verdades. Embora existam verdades em excesso e excessivas, difundidas em todo e qualquer suporte e forma, apesar disso, não as temos o quanto baste, e essas que temos, temo que se tornaram impronunciáveis. Declaro antes de mais nada, não ser adepto de qualquer teoria da conspiração, e este 'impronunciável' nada mais, ser, que a impossibilidade do interlocutor. Por que todos nos tornamos pastores, radiologistas, cozinheiros, artistas, médicos, críticos políticos, sociólogos, filósofos, ignorantes e substituímos o não crer em deus para acreditar em tudo. Assim defendemos os cães, mas não queremos subtrair deles os carrapatos gordos como feijões. Queremos encher o azul do céu de filhotes, como se fossemos sanhaços e que encontraremos, por todo o sempre, um papaia em qualquer parte. Queremos subir no mais metálico dos carros, por um estribo, e que este seja o mais distante possível do chão, e enquanto isso desejamos esquecer que haveremos de apear, e então ser o atropelável, por incauto, mas sempre furibundo.
Não há duvida que não existimos individualmente, senão que partindo da tribo ou sociedade na qual vivemos, assim o indivíduo é uma abstração ridícula. Isso não diz mais do que isso: somos parte do todo, que pode sim individualizar-se, mas sempre carregando consigo as marcas da sua tribo, que a cada dia não é outra senão a própria humanidade. Assim o cubano não é o cubano de outro planeta, mas o vizinho de Miami, e uns e outros necessários entre si. O que não quer dizer que não se possa suprimi-los. Mas a supressão de uns fará ausência aos outros, que por isso mudarão e mudaremos todos, e se nos individualizarmos depois da supressão de uns ou outros, seremos distintos do que seríamos se antes o fizéssemos.
Não cabemos no mundo da maneira que pensamos. Cada um por si, já que deus não revelou seu sucessor. Falta espaço e ouvimos “Quero uma casa no campo”, estamos assustados com a cidade e o multitudinário que isso implica. Um circense terá dito que lá em Piracicaba saltava de uma sarjeta a outra uma rua de treze metros! A resposta deve ser: aqui é Piracicaba, salte. Não há volta possível ao campo, à natureza ao bucolismo. Não entraremos nesse rio por segunda vez. Aqui é o campo e havemos de tocar muitas peças, aplanar arestas, chafurdar muita lama, jogar o palito do sorvete numa lixeira e o celofane do cigarro em outro, recolher a merda dos cães, assim como castrá-los junto aos gatos até quase sua extinção, saber muitas senhas, parar em muitos semáforos e ver muita TV ou Internet para que não tenhamos tempo de pensar no sentido disso tudo, para só então poder dormir com todo o ruido de fundo que sempre resta, como a torturante torneira a gotejar.
O 'não' poderia ter sido uma opção, mas já se extinguiu o tempo desta possibilidade, logo será obrigatório. A menos que insistamos na paranoia do ser Eleito entre milhões de enjeitados, somente para que permaneça a possibilidade, impossibilitada, que atende por esperança, essa loteria diuturnamente fraudada.
As vezes posamos de flor e rapidamente aparecem as abelhas, mas sabemos tratar-se de uma calêndula de plástico com umas gotas de água com açúcar.             

19 de mar. de 2012

Uma impressão d'O Artista. O filme.


Estava lendo o conto Mensagem na Garrafa de E. A. Poe; lá pelas tantas e totalmente submergido naquele mundo sobrenatural, o barco do narrador sossobrava depois de engolfado por uma onda gigante e espumosa, naufragava de proa. Narrador e um velho sueco estavam 'a salvos' em lugar exato, mas ignorado por mim, todavia descrito por ele; desconhecia da exatidão, por simples desconhecimento dos nomes das 'coisas' de um barco, certo é que era na popa. Eu tinha esta imagem, na verdade estava dentro dela, eu vivia a cena que se completava assim: o movimento das ondas produz cristas e abismos, pois do barco estando no abismo podíamos ver um imenso navio singrando a crista da onda, sabia antes de ler que aquele navio baixaria ao abismo e tocaria justo na proa do nosso barco que afundava começando por ela e este movimento de alavanca nos arremessaria justo ao outro navio.
Até então a narrativa era angustiante, acelerada e cheia de socavões. Deste movimento em diante ganhou uma terrível suavidade. Os tripulantes do grande navio não nos viam, sim a mim e a Poe, pois o velho sueco, como já sabia antes mesmo dos acontecimentos fantásticos, por que o narrador nos dava a saber que aquele homem não sairia daquele barco, daí que não nos acompanhou. E eu ali a vê-lo e ele não me via, nem sequer me imaginava, mas tampouco era visto por aqueles velhos, tão velhos que até as rugas se haviam gastado. De imediado me metia em A Invenção de Morel, qual o personagem tampouco é visto pelos hologramas. Então, eu discutia que fim teríamos? Ao mesmo tempo que sabia que Poe viera antes de Bioy Casares. E que Bioy Casares tratava da parte luzente da vida, das indiferenças decorrentes, fortuitas e gratuitas enquanto Poe nos leva a lado oposto por imanência fosco e inexorável. A balada final é a imagem fatal. O barco a girar num remoinho sempre rumo ao centro, ao fim. Há muito disso tudo que se transformou em cenas eternas de Hollywood.
Hollywood não brinca. Usa todos os truques da literatura. Principalmente da Literatura. Todas as figuras e imagens da Literatura da sinédoque à metalinguagem, passando pela intertextualidade.
O Artista de Hazanavicius é pura metalinguagem. Ainda que não exatamente uma produção de Hollywood é Hollywood falando de si e para tanto é também intertextual. Muito do filme talvez só faça sentido não só para mim, por que todos já o tenhamos visto desde os seus pressupostos. Para mim desde antes que Roberto Nóbile – era o operador - me mostrou a cabine de reprodução no Cine São Roque em Bonfim Paulista como a coisa se passava, e seu desespero quando exibia o mesmo filme que algum cinema de Ribeirão Preto - que começara um rolo antes sua exibição - e se angustiava com a espera da chegada do segundo rolo, que por vezes atrasou e ficamos, por isso, a ver a tela completamente branca. Falo disso por que foi naquela época que nos entupimos de um Kino mais próximo a 'O Artista' de M. Hazanavicius, e um pouco de nostalgia, claro ninguém é de ferro, e é disso que se trata N' “O Artista”. Daí que a presença do cãozinho se torna obrigatória, e é intertextual, e o é, por se tratar de presença recorrente no cinema mudo, um arquétipo. A batata da perna desconhecida e a singela tela que oculta à sua dona o galã, e ela a este, que lhe é desconhecida, mas a nós não, nunca são, pois este cinema nos permite saber mais e adiantado, e por vezes de forma exasperante, o que vai acontecer, como que nos preparando, nos cozinhando para a lágrima da qual não se pode fugir, pois começamos a dirigir as cenas e acabamos vivendo; e nossa vida amorosa é sempre de chorar. O cinema mudo nos dá esta liberdade, e criamos os diálogos, que sabemos de cor e interpretamos todo o tempo a nós mesmos e choramos às bicas, pois sabemos o que vai acontecer. E choramos de arrependimento, quando nos toca na cena ser o malvado, ou por haver sofrido a malvadeza. O final feliz também nos faz chorar, talvez mais ainda, pois é exatamente o que queríamos que acontecesse conosco, o melhor dos Happy endes, menos que se acenda a luz!

16 de mar. de 2012

Liberdade de pensamento e expressão, segundo Albert Camus.



Lucidez; Ironia; Desobediência; obstinação.

Lucidez. A lucidez supõe a resistência ao culto do ódio e da ira e o culto da fatalidade.

Estupidez. Frente à maré crescente da estupidez, se faz necessário alguma desobediência, mais ou menos isto: por menos caráter que tenhamos, não podemos aceitar ser desonestos, ou ainda, rechaçar o que nenhuma força consegue nos obrigar; numa palavra: não servir à mentira.

Ironia. A ironia é uma arma sem precedentes contra os muito poderosos, pois completa a rebeldia, não só esculachando o que é falso, como também a miúde apontando o que é certo.

Obstinação. Uma certa obstinação para não se desanimar diante de certos obstáculos a citar: a constância na tontice, bobeira, a abulia organizada e a estupidez agressiva. Camus escreveu este manifesto há 73 anos, originalmente orientado à imprensa francesa, por ocasião da possível capitulação dos franceses frente aos avanços do terceiro Reich. 























15 de mar. de 2012

Pizza de Línguiça com Pimiento, morron, amarillo!


Errei ao publicar aqui, quis postar no Bistro Rural. Mas, quinze, quinze, já que tá que fique!!
Este era o brado dos torcedores do Nho Quim, como era conhecido o XV de Piracicaba, nos tempos em que o futebol do interior importava alguma coisa.
Uma boa linguiça fina de pernil. Pimentão amarelo assado no forno a lenha e pelado. Cebola roxa assada no forno a lenha e cortada em lágrimas. Mussarela. Uns raminhos de erva doce e forno.
estes fiapinhos que se vê são de erva doce.




11 de mar. de 2012

Deixar para lá um olhar de cachorro.



Eu prefiro sangue no 'zóio' e coração peludo a olhar e ser olhado qual cão sem dono, como quem de dentro da animalidade, quer dizer, que a vida é coisa inútil, mais ainda, inglória. Ora, ora, ora! Se queremos paz. Há que se partir para o entendimento, e para tanto não posso me furtar a discussão de cada desarranjo meu ou do outro. Defender com clareza, até com fúria, se de fúria se tratar. De matreiro olhar de cachorro sem dono, já fui mordido algumas vezes, demorei a aprender, mas nunca mordi, não sem antes ensinar os dentes, rosnar ou mesmo latir. Verbos para cães e não gente nesta inversão fabular. Temo os olhos caídos, porque fazem com que abrandemos o coração, portanto direis; mas digo, não tem nada a ver com o coração, é a guarda que baixa, e não vigilantes: nhac!
No dia 'da mulher' – não me detive a discutir seu caráter contraditório, um dia especial, porque levaria a vida toda, não um dia – pois naquele dia o mundo se fez cor de rosa, alem de colorido, florido; em tudo quanto li, muitas homenagens, algumas picardias, como uma moça que comparava mulheres flores naturais com mulheres flores de plástico, mas aquilo era guerrinha interna, que sem mergulhar, bastava um escafandro, e se veria a nebulosa de veneno.
Não sou besta, loei, mecanicamente, aliás como todos, isso é um arquétipo comportamental, sei o nome da figura, mas nem sequer isso direi. Fico imaginando, se faço um texto com um mínimo de questionamento, toda essa gente afaimada sairia atrás de mim, como um exército brancaleônico, faminto e esfarrapado. Digo o mundo está lindo. A vida é bela. Irreparável. Se alguma reticencia... deixe pra lá, o tempo cuida de tudo, entretanto tome calmantes, sorria amarelo ou mesmo abaixe o olhar, murche as orelhas. Como dizia um louco de viola em punho, numa véspera de ano novo em Picinguaba: Tá ruim pá mim\ tá ruim pá ti\ vou fumar um...


9 de mar. de 2012

Urubus.



Tinha cinco anos de idade e morava em Pirassununga. A uma quadra de minha casa formou-se um ajuntamento de pessoas, porque um urubu andava tonto pelo chão, por haver trombado, segundo diziam todos, com o fio de alta-tensão. Especulava-se ainda que, devido sua maior massa, ele levava choque, coisa que não acontece aos pássaros menores. Óbvio que quem dizia isso, nem sequer tinha ideia de como ocorre o choque elétrico. Só vim a saber, numa aula de Artes e Música no colegial. Não devido à disciplina, mas pela indisciplina do Luiz. Luiz, japonês, segurando dois fios de cobre, enfiava um na tomada que havia na sala, enquanto o descuidado professor estava atento às pernas da Diva. O truque estava justamente em não introduzir ambos os fios, um em cada furo da tomada, mas tão somente um. Assim não formava o curto circuíto. Dá-se o mesmo com os pássaros que pousam nos fios de energia elétrica. A outra possibilidade é enfiar os fios em ambos os furos, mas estar isolado da terra, que é por onde se descarregaria a energia. Dessa maneira o urubu, ou qualquer outro pássaro leva choque.
Naquele momento, infantil, não estava preocupado com a história do choque; somente olhava para a imensidão do bicho, seu bico volteado e sua capacidade de se defender a bicadas, ainda que tonto, de todo aquele mundaréu de gentes que ali se juntara.
O que sei é que passei a ter sempre uma atenção especial para com os urubus. Uma admiração muito grande pelo seu voo. Sua capacidade irretocável de tomar as termas e subir. Esta é a parte bonita e que me interessa, ainda que saiba da maldade dos urubus, que o primeiro que fazem ao se depararem com sua presa, que ainda vive, por qualquer motivo imobilizada, atacam-na justo nos olhos. Numa palavra, os urubus cegam suas presas, quando vivas; só então começam a desfrutar do pasto, ainda que estejam vivas. Julgo que julguem uma falta de ética, comer a quem ainda pode vê-lo comendo-o. Li recentemente uma fábula, escrita por Ruben Alves, que não gostei. Ruben Alves chamava os urubus de seres naturalmente becados, fazendo analogia à beca de formatura, ou a indivíduos graduados. Na fábula, Ruben coloca os urubus querendo e estabelecendo cursos de canto. Penso que Ruben poderia ter escolhido qualquer outra ave. A galinha por exemplo, por indigna, mas os urubus não. Os urubus se isolaram deste mundo de grandezas, são silenciosos e tímidos e sabem que a vida só tem mesmo valor em estado putrefato. Portanto é justo o contrario do que pensamos, quando toda a grandeza se esvai é que o bicho descobre nela o grande valor nutritivo. Enquanto isso flana incansável. Seu voo é um jogo de paciência e disciplina. Ele sabe que a ordem é o aumento da entropia, a perda de informações importantes e o consequente caos e a deterioração, a plenitude é circunstancial. Coisas interessantes e embaraçosas acontecem, os aeroportos estão sempre muito próximos dos pontos de concentração de urubus. Tanto que vira e mexe há trombadas entre aviões e urubus, com perda total pare estes e parciais para aqueles. A diferença é que vamos para algum lugar desde o aeroporto, enquanto o urubu permanece a espreita dos que ficaram, é inexorável, não há fuga possível. Se se quiser traçar um paralelo, partimos como urubus e chegamos como carniça.