Não me diga que se
pode alegrar com a desgraça alheia!
Porra e quanto...! Disse-me o Grilo falante, que isso acontece da
mesma maneira que se pode entristecer com a sorte do outro. Mas,
Grilo, não dizem que a alegria é fruto do bem e a tristeza do mal?
Como é possível, diga-me, que existe uma alegria que tem fundamento
no mal e uma tristeza com origem no bem?
São
os invejosos, segundo aprendi diz o grilo falante, são eles que
experimentam estas emoções paradoxais. Assim há quem sangre de
alegria com o sofrimento alheio, que invejam, do mesmo modo que
sofrem com a alegria.
A
inveja é uma paixão da alma bem louca, estranha, que faz com que as
pessoas que a experimentam tenham reações emocionais contrárias ao
sentido comum. Os romanos, que nisso de botar nome às coisas,
acertavam em cheio, deram-se conta que a inveja tinha muto a ver com
a vista, concretamente com a maneira de ver, por isso o verbo
invejar, e só quer dizer olhar com mais olhos dos que se tem na
cara, malquerer, donde vem a inveja, que significa antipatia, ódio,
má vontade, etc.. É esse olhar maluco, torto que tem o invejoso.
Mas espera ai, não estou só a falar dos outros, eu e você, podemos
ser incluídos sem qualquer dificuldade.
Os
não invejosos, evidentemente, não experimentam estas emoções
morbosas, mortiças e doentes. Os não invejosos se alegram de seu
próprio bem e se entristecem do próprio mal, e o mesmo fazem com o
bem e o mal dos outros, e a intensidade dependendo da proximidade do
outro. Pode ser que a sorte ou a desgraça de pessoas desconhecidas,
nem fedam nem cheiram.
Entretanto,
invejoso que transmuta os termos, e se entristece da alegria dos
outros e se alegra da tristeza deles - outros – , no fundo não
abandona jamais a tristeza própria e constitutiva da inveja.
Digo isso porque não creio na alegria maligna – e não pode ser
qualificada de outra forma – que alguém pode sentir diante da má
sorte ou desgraça dos outros, que fosse uma alegria autêntica,
nascida espontaneamente da abundancia, do bem-estar direto, próprio
e sincero.
Não,
pois se trata de uma alegria falsa, elaborada, doente, como uma flor
murcha que nasce num túmulo.