8 de dez. de 2011

Doze homens sem sentença, julgam. Enquanto Antônio Niterói bebia com Maiara e Naiara no bar Verde.



Todos eles, sim eles, são frequentes nesse ambiente, nessa função, entediados, menos um que entra cheio de frescor e romantismo. Seu filme predileto é justamente, Doze Homens e Uma Sentença. Pergunta aos outros se já viram o filme. Um pigarreia. Olha para a janela fechada e desenlaça a gravata, retira o paletó, arregaça as mangas e dá por terminado o trabalho. Culpado. Outro diz, até agora não entendi o tal do barômetro, é um treco de medir pressão, sim, mas por que sobre um piano, do mesmo modo que um Cabo no palco, a gente podia estar no Pinguim, a seis reais o chopp! Não dou conta, e você novato? Eu! Para o Pinguim? Não o homicídio! O teatro está na praça, a praça na cidade, a cidade no país, o país no mundo e o mundo é o mundo mundial e o teatro está no mundo, e o mundo é um teatro; aquele imita este? É, este mundo com aquele dentro; e se se mata, se mata neste mundo, que é este, esse teatro no mundo é aquele num mundo teatral. Contudo penso que deveria ser julgado no teatro, nesse que imita o mundo real que também é um teatro, você quer dizer, numa peça de teatro, não numa, mas na mesma peça de teatro, foi nela que se cometeu o crime. Como assim? Igual no futebol. Certo, o futebol tem a sua corte. É isso! O que você quer dizer com isso ? Culpado! Culpado? É! Pensava que ia querer reverter o onze a um. Não, nunca, se não entendo, sequer, por que não pintaram o guarda no cenário, porque iam economizar cachê. Você leu a manchete do A Cidade? Policial figurante de policial, mata dono da casa que pulava o portão da própria casa, no teatro Pedro II. Vamos acabar com isso! Que a realidade só estraga a ilusão! Bem dito! To contigo! Só se for para já! Culpado.
Enquanto isso no bar Verde da José Bonifácio, Antônio Niterói se aborrece com a pouca idade de Naiara e acaba fazendo um poema como se já fosse velho.
lâmina                antes,                   lisa
fria,                   já não                      desliza,
tensa                 pela pele                   gruda
esqui                na grama, como
esticar               a bochecha,             flácida.
                       Com os dedos.                   astucia
                      Não se desespere.
Não cabe                agora um              talho,
que envergonha,
                         mas o pacto com o                 corpo
                         pode ser desfeito,                   esquecido
que ele começou a des
                                  faz 
                                      er 
                                        -se... 

6 de dez. de 2011

Antônio Niterói é testemunha dos três homicídios: do Autor, do Ator e da personagem.





Em juízo, Antônio Niterói se manteve abstraído na fase protocolar, agora se ajeita na cadeira para ouvir o promotor, sabemos que Cabo Clemente, guarda irlandês, não estava deslocado dentro da peça, conquanto o guarda irlandês também não o fosse, é no caso, o guarda irlandês um elemento que traz realidade, do mundo para o mundo da ficção, aportando realismo, disse-me o autor da peça A Casa Caiu, fundamentado no original aonde, em todos os passos de Leopoldo, a guarda irlandesa se fez presente, como um vaso sobre o piano, na festa onde ninguém sabe sequer ler uma partitura. Protesto meritíssimo, adiante, um barômetro sobre o piano! Não nobre colega, não existe esse deslocamento, pretendido, na Dublim ficcionada havia, protesto, adiante, não se trata da imitação da Dublim real, mantido, não disse imitada, meritíssimo, a Dublim da obra é ficção, não uma existência paralela, ou imitação duplicadora, prossiga, na Dublim ficcionada havia por todas as ruas donde passou Leopoldo a guarda irlandesa, duma Irlanda fictícia e em toda obra a guarda irlandesa ficcionada, numa Dublim idem não comete nem um assassinato, assim não há a menor possibilidade, que a personagem reclame uma interpretação, a si favorável, por hora desvirtuada, posto que a personagem, ainda, que teoricamente possa trazer embarcada um leitor implícito, ainda que, levemos em consideração o que determina vossa Excelência, se tratar de um triplo homicídio, implícita a morte do autor, ainda que, uma vez aceite, ocorre a destempo da peça, concluo pedindo aos senhores jurados a condenação do Cabo Clemente por homicídio culposo do Sr J. Maurício e Aníbal, conquanto o assassinato de Mr Leopoldo, que a critica especializada e o tempo venham a julgar.
A defesa pede que a testemunha Antônio Niterói seja ouvida novamente. Profissão Sr Antônio Niterói? Corretor. O Sr Antônio Niterói vive de porcentagens que cobra aos amigos que vendem imóveis pela MRV, pelo empréstimo de sua carteira do CRECI, protesto meritíssimo, prossiga. A defesa depois de desqualificar a testemunha, induz sem prova a se pensar que a trupe nada mais era que uma banda organizada de traficantes da famosa DMSO – dimetilsulfóxido – que atua como um marcador e borrador de sinapses, que poderia como o SOMA, levar o usuário a agir como títere. Antônio Niterói diz, conheço Camila Dunlop desde os anos setenta, não posso negar que fumamos uns baseados na praça Redonda, olhando o por do Sol, sobre a Vila Virgínia, mas na tarde do crime, ela nada mais fazia que caminhar para espairecer, e me alegava na oportunidade não compreender de modo algum a pertinácia do guarda irlandês, mas cria que não passava de uma alegoria do adaptador do livro para o teatro, uma mimese da galinha imobilizada pela risca de giz em Kasper Hauser, sem sentido e desproporcional, o que é um desproposito? Toda e qualquer ação do Cabo Clemente, não vem ao caso, que um Sr que aluga a identidade profissional, diga que toda a ação policial é um desproposito. Mais alguma pergunta ? Dispensado. O nobre colega quer negar inclusive a existência do mundo real, discutindo literatura, alegando que o crime tenha ocorrido dentro de uma obra de ficção, como se se tratasse de uma embaixada da arte na mundanidade, pois bem, e alegando que a mente do Cabo Clemente, como de toda corporação, desvia de sua função preventiva, agindo como se de fato fosse juiz. Vangloriando a guarda irlandesa. Esse homem agiu seguindo como qualquer leitor atento, seu faro de caçador, sua intuição em nome da sociedade. Peço sua absolvição em nome do dever de personagem realista, imitar o real, e de interprete de uma única moral. Os jurados se recluem. 

5 de dez. de 2011

Antônio Niterói, nesta segunda parte, tentará desvendar o estranho duplo assassinato de único morto, durante a intrigante: A Casa Caiu, estrelada por Camila Dunlop e o duplamente morto J.Maurício Aníbal.






Cabo Clemente, sim o soldado era Cabo, ligou para os seus superiores diretos, não convidou os subalternos, mas sim, alguns amigos da corporação, ligou ao Capitão da reserva, presidente da Aspomil; e aquilo que as vendas antecipadas anunciavam – fracasso - fracassou, o teatro lotou. Nunca se viu gala tão espartana no teatro D. Pedro II desde a plateia, balcões, galerias e frisas tudo cheio.
Camila na solidão do camarim, branqueava sua pela já clara, será uma buliçosa cantora de ópera. Clemente pronto para brilhar, diante dos seus, na coxia andava muito falador, o contra regra, menos Sr. Clemente, abrindo-lhe uma fenda nas cortinas para lhe mostrar novamente o cenário e o lugar dele nele. Ali Sr. Clemente, onde parece uma rua, com uns postes pintados com lâmpadas amarelas, como se postes de iluminação fossem, ali naquela risca, como se sarjeta fosse, de um lado para outro, sim?. Sim, compreendo. Porque ainda não vestiu seu figurino, Sr. Clemente? Como assim, estou vestido! Não, não é esse o seu! Como não? Sr. Clemente, seu figurino é de um policial irlandês, todo em preto e botões prateados e um cassetete, não usamos mais cassetetes, mas não estamos no mundo real. Por fim, não houve quem fizesse o Cabo Clemente vestir-se de guarda irlandês, mas concordou em usar o cassetete, que ainda na coxia fez estalar na palma da mão. Não Sr. Clemente, não faça esse barulho todo, bata com suavidade. Quando Antônio Niterói foi finalmente localizado, para que interviesse junto ao Cabo Clemente, já soava o terceiro sinal. Seja pardelhas e merda! Disse Camila. Merda! Ressoou. Antônio Niterói zelava por um sujeito impaciente logo após a frisa direita. O pano se abriu.
No primeiro e segundo atos, pouco aconteceu, senão que a ovação recebida por Cabo Clemente de todo a corporação presente, logo que apareceu em cena. Antônio Niterói escorregou na poltrona, escondendo-se atrás do balcão, vergonha pelos outros, Naiara quase a chorar, é tanta emoção! O terceiro ato começa com Leopoldo e Stephen bêbados numa mesa de bar, rodeados de moças alegres, que eles tateiam. Numa cama barulhenta, Camila Dunlop em exígua roupa de dormir, era Moly sonolenta e ciosa do relógio, sem problemas em sentir o calor de Gibraltar, como se esperasse alguém, que não seu marido, sob o rochedo. Leopoldo e Stephen saem do prostíbulo cambaleantes, Mr. Boylan entrava na casa e subia as escadas e fazia sexo anal com ela, numa cama barulhenta. Leopoldo procurava a chave do portão de casa, encontrava tudo, até mesmo um sabonete embrulhado numa folha de jornal, menos a chave em qualquer dos bolsos, resolveu saltar o portão, como outras vezes fizera  quando trocara de calças e esquecera a chave, Stephen se equilibrava melhor com uma bengala. Leopoldo subiu no portão. Cabo Clemente empunhou a arma e fez posição de tiro. A corporação que andava atenta aos movimentos de seu pupilo, deixou vazar junto com o sorriso um rumor de: esse é nosso menino! Cabo Clemente sentiu a energia vinda da plateia, das galerias, mãos na cabeça seu meliante! Leopoldo saltava o portão quando foi atingido por uma bala certeira. Cabo Clemente olhou para o Comandante no balcão nobre, que tudo aprovava com um gesto romano. O amante, a amada, o bêbado Stephen, o contra regras, os maquinistas, a copeira acudiram ao morto, que Stephen havia anunciado: J. Maurício Anibal está morto de verdade! A plateia não entendia, era impossível saber quando findou a ficção que fez-se real. Cabo Clemente era o assassino. Duplo assassinato: J. Maurício Aníbal e Leopoldo estavam mortos.
Continuará... com o julgamento.


3 de dez. de 2011

Antônio Niterói tentará desvendar o estranho assassinato no Teatro D. Pedro II durante a peça com intrigante nome de A Casa Caiu, estrelada por Camila Dunlop.





No palco, Camila Dunlop andava de um lado para o outro, soltando fogos pelas ventas, há nada mais que uma tarde e um princípio de noite da estreia, e para ela, a personagem desnecessária do policial não estava de todo no seu agrado, sempre que olhava para o fundo do cenário, lá estava ele a incomodá-la, quando deveria ser um vaso sobre uma mesa, era um barômetro sobre um piano. Perguntava de si para si, qual seria a loucura do diretor em exigir o policial, lhe era inacessível o entendimento e o melhor a fazer era relaxar, tentando passar-se  incognitamente, na cidade que nascera disfarçada embaixo de um lenço escuro e cabisbaixa, saiu  rumo a praça Sete, que há tempos fora o coração pulsante da noite ribeirão pretana. Antônio Niterói ocupava a mesa do Dr. Sócrates, quando Sócrates bebia, e bebia no Empório Brasília. Antônio Niterói e Camila Dunlop, um dia fizeram amor, loucamente, há anos que não se viam. Cada um para um lado. Antônio Niterói, com seu lado apagado, em exposição, era o próprio disco de Odin em comparação a Camila Dunlop, um ser para ser todo visível e de todos os lados iluminada. Meu deus! quanto tempo! Pois é! quanto tempo! Ah Nit estou um trapo, eu sou um, você está bem, e você mais moça, desde aquele ob ridículo, nem lembrava, muita coisa passou e passei, casou? Casei! Descasou ? Descasei! Me diga uma coisa Nit, tá com pressa, tô, toma umazinha, não tenho tempo tenho que ir, ainda procuro um policial, policial policial? Sim policial, policial ator? só policial, tipo boa praça, não precisa ser boa pinta, conheço uns camaradas no corpo, para que quer ? É para fazer o papel de policial, daqueles hollywoodianos, sim, aqueles que giram o cassetete? sim e caminham para um lado e outro, sim isso, isso mesmo, pode ser gordinho ? Pode! Pode! Você continua gracioso! Para quando? Hoje à noite. Hoje? Hoje! Antônio Niterói, nem me lembrava mais do ob e ligou imediatamente. E ai Clemente? Que manda Niterror? Quer fazer uma ponta numa peça de teatro? Quê que eu levo? Trabalhar com a Camila! Pitanga? Não! Dunlop! É boa? Pneu, cê quer ou não quer? Quê que eu levo? Porra Clemente! Só pensa em dinheiro! Deixa de ser leviano Niterror, cê também é assim, não é! E ai Camila! sai algum para o policial? Poxa Nit, e o amor a arte, aparecer no Teatro Pedro II, dou uns ingressos para a família dele, tá bem? Cê ouviu Clemente? Reconheci a voz, é ela mesmo? Claro! Eu vou de graça! Manda um ingresso pra dona da pensão e tá certo! E o ensaio? E ai Camila, ensaio! Não tem ensaio, vai direto, ele nem precisa abrir a boca. Certo? Certo! Certo ouvi tudo pensa que sou burro, porra! Né isso não Clemente! Eu sei o que é! Tudo combinado e Camila Dunlop não quis ficar para uma cerveja. A Antônio Niterói restou-lhe um par de ingressos, e passar mão pelo rosto, que não tinha mais aquela pele triunfante de quando conhecera a estudante de artes cênicas, mas que tinha ao menos uma vantagem que era a de barbear-se sem o cuidado de olhar-se no espelho, uma vez ainda lisa, mas já calejada, pelos incontáveis se afeitar, nunca mais se cortou. Sorriu; sorria sempre para uma câmera imaginável, na vigília ou no bar, donde fosse, fazendo uma tomada bem fechada no ancacondo sorriso; por ainda não haver passado pelo que costumava dizer ser a eclusa dos sessenta, onde só cabe os que seguirão a envelhecer. Ficou mais a olhar para a cerveja que a bebê-la, e quando Naiara chegou, chegou também a desculpa para não seguir com ela toda aquela noite, o Teatro, que Naiara, pensava ele, recusaria. Não recusou.
Continua...

1 de dez. de 2011

Antônio Niterói depois de revisitar Aristóteles e os sofistas, descobre o porquê de Oração ao Tempo está na boca das Maiaras e de quebra reafirma Borges e Marx, quando dizem que o espelho também reproduz e a história se repete. Primeiro aquele depois este.



Antônio Niterói se desperta no grande quarto de pensão ouvindo uma voz feminina, cantarolando uma canção linda e assustadora, .. tempo\tempo\tempo..., que se confunde com o chuá continuo de seu Lorenzeti. Faz um exercício, físico mesmo, com a cabeça, dobrando-a para trás do travesseiro fixado na nuca, com olhos fechados, quer saber quem é, mas não se lembra, uma estranha que canta Caetano Veloso. Interessante! Muito interessante! Sim mas se fosse tão interessante, não a esqueceria! Ruminava. Subitamente o canto parou e ele ouviu: Porra Niterror, você não tem nem uma merda de um xampu!? Puts grila! Dormi outra vez com a Maiara! Mas de chofre, já não pensava em Maiara, pois ela tem semancol e não ficara para o café da manhã, tendo que abrir o bar Verde, agora pensava mesmo como é que a Maiara lhe ocorrera cantarolar Caetano, e não aquele Caetano, que queria saber se seus fiéis o aguentariam a cantar Peninha, uma vez que seus fiéis, não ouviam Peninha. E foi então que Caetano pode saber que seus fiéis eram fiéis a ele, não à sua música. Maiara é, até onde sei, ouvinte de músicas sertanejas, onde entra, Oração ao Tempo é que não sei! Ouço na novela das oito. Disse Maiara, você gosta? Completa. Gosto mas me perturba. Disse Antônio Niterói. Você e suas encanações, vou indo, foi bom hein! Vai lá depois! Fazendo um olhar de sedutora, com uma plasticidade duvidosa, emprestada de algumas caras e bocas da mesma novela.
Quando Antônio Niterói escanhoado, desceu para tomar café, Sebá, já havia se aboletado no Facebook.
-muitos amigos Sebá?
- tenho 900 amigos. Disse Sebá, acrescentando que haviam postado um vídeo pornô invisível no seu perfil.
-Como é um vídeo invisível? Sebá? Perguntou Antônio Niterói, pois é, se eu tivesse visto não seria invisível, como não o vi é invisível, claro, mas também como se pode saber que postaram se é invisível, se postaram e não o vemos é invisível, e é invisível porque é pornográfico, já que na rede não permite vídeos pornográficos, e se não fosse pornográfico poderia ser visível, nossa sorte Sebá é que Aristóteles dialogou com os Sofistas, assim os digeriu e você sabe como funciona o metabolismo, do quê você tá falando Niterrror? Tô falando que se você parte da conclusão, gerando um argumento, sem ser tautológico, podendo ser verdadeiro, ainda que absurdo, como um vídeo invisível, esse verdadeiro pode muito bem ser irreal. Sebá havia abandonado momentaneamente o notebook e mostrava bem de perto seu descontentamento e desentendimento. Niterror! Cê não tá querendo dizer que não acredita em mim? Tá? Tô! E mais, muito me espanta e também não entendo, como é que consegue acreditar na postagem de um vídeo invisível e não crer no que os olhos que tem na cara estão a te mostrar! E Antônio Niterói seguia ruminando enquanto soltava argolinhas de fumaça, que tardavam a atingir o alto forro da cozinha, onde provavelmente formavam uma nuvem de nicotina, a vida se repete, como a história se repete, em qualquer âmbito, micro ou cósmico, os seres reproduzem e se reproduzem, sendo o que quer que eles sejam, e o quê que venha a ser o real. Não só isso, é claro, mas também, muito, ou nem tanto, mas sim, algo sim.  

29 de nov. de 2011

O traumático caso do porquinho da Índia, donde Antônio Niterói, se descobriu um detetive com a morte de um poeta que começava o desabrocho..




De tudo o que sabia Antônio Niterói em seus onze anos de idade, era que se dependesse de algum acontecimento, que por sua vez não dependesse de sua ação, ele não aconteceria, por lhe ser alheio. Dito de outra maneira para Antônio Niterói a sorte não existia, mas muito corriqueiramente o azar não faltava. Como acontece no caso do porquinho da Índia que havia ganhado do tio Farias. Como havia ficado combinado iria com sua irmã buscar o casal de porquinhos naquele sábado pela manhã. Escolhera o caminho que passava diante da casa de Neide. Antônio Niterói previa que justamente quando passasse diante da casa, Neide estaria dentro da casa, e não o veria, nem ele a ela que era o que a ele mais importava, vê-la, pois o outro dependia muito de Neide. Neide não estava dentro da casa como previra Antônio Niterói, mas estava agachada de costas para a rua. E nem o fato de estar assoviando a canção O Bom Rapaz de Wanderlei Cardoso, adiantou. Ela continuou agachada de costas para rua.
Na casa de tio Farias, chuparam jabuticabas e manga espada, e ficaram com os dentes cheios de cabelos de manga, e Antônio Niterói limpou o sobre lábio na manga da camisa, deixando-a amarela, coisa que lhe renderia um belo puxão de orelha mal chegar em casa, de resto tudo correu bem, os porquinhos guinchavam, mas logo se acalmaram com uma folhinha comprida de capim-gordura. Já a meio caminho de volta, sua irmã que o acompanhava, notou seu entristecer, e quando ela quis saber o motivo, já que ele queria tanto os porquinhos da Índia, por haver lido um poema, que eles eram tímidos, e que não sabia o que era ser tímido, mas logo a professora explicou e ele havia entendido que os porquinhos eram absolutamente iguais a ele, ele se escondia debaixo da cama. Quando a irmã insistiu, Antônio Niterói chorou. Presumia que quando passasse diante da casa de Neide ela estaria no portão e iria lhe pedir um dos porquinhos e ele iria acabar dando um deles e foi o que ela fez e ele timidamente lhe estendeu um que era pedrês.     

Modorrentos uni-vos.



        A letargia é um sono anormal, profundo, contínuo; onde a respiração e a circulação parecem suspensas. Quando perguntamos ao ser e por ele; acometido de letargia, suas respostas são vagas, e este não se desperta para as responder, nem guarda recordação, alguma, se despertado. Isso é definição que se encontra em dicionários, e  para arrematar, buscando pela sinonímia, a coisa aponta para a ideia de inanição, indiferença, modorra, indolência extrema e apatia.
         A modorra é coisa parecida à hibernação, quando as condições climáticas são extremas, os ursos hibernam. Há um particípio, muito bonito, que é aletargado, do verbo aletargar e há ainda: amodorrar, que está entre os paralelismos e simetrias acima, e ainda,  e também há, o, aferrar-se ao ... letargo.  Em qualquer caso, temos aqui um belo embornal cheio de conceitos, como queria o Arcebispo Tilotson,  com os quais as vezes penso em descrever o estado de choque em que se encontra, parte da,  nossa sociedade civil. 
         Muitos de nós há alguns anos, dez, vinte, trinta anos, estávamos bastante despertos, coisa oposta a esse letargo, éramos  esquerdistas alegres, festivos e orgulhosos em ostentar tal esquerdismo, ainda que verossímil e literário, cresciam pelos cafonas no sovaco das meninas, meio maoistas, meio marvada carne cheguevarista: hay que endurecerse pero perderse la ternura jamas, paredón y besos,  stalinistas disfarçados em batas indianas, e tiracolos em couro cru trançadas em ombros trotskystas interessados em Andrè Breton, o futurismo de chinelinhas de couro em  Mayakovystas de folhinhas linhas zibelinhas libelinhas sozinhas, Wilhelm Reich no escuro para comer a Aninha, o formalismo de Jakobson, bebo coca cola, babo coca cola, a poética Brechtiana und so weiter, inocentes e culpados, lírios pirados, irresponsáveis, ignorantes em Das Kapital, Ideologia Alemã, do Anti-Durhing, Heiliege Familie, a os fatos se repetem, hizuzufingen, tragédia e comédia e pornochanchada  e Was tun? Quehacer ? Quefazer ? 

                      " Faça Tudo, tudo mesmo, menos permanecer aletargado". 

         Em  dias de hoje a mídia, a grande e a infinitesimal, dia sim outro também, nos agouram. Os meios, ditos: médias, são verdadeiras encruzilhadas, com suas marafas, galinhas mortas, velas vermelhas e pretas.
Custo a crer no que vejo, se não fosse pelo abatimento dos valores acima assinalado, nós que sempre propusemos a cabeça erguida,  contra o: " come ananás e mastigas perdizes" dos neófitos, não temos coragem de alçar a nossa "acima da manada".
          Não podemos deixar na mão de um “fascismo” incipiente ou encanecido (sim, com certeza, o exagero é meu, meu caldo é exagerado e transborda), por uma burra direita, claro que pode haver dela e nela coisas lindas e melhores ideias das que temos visto, mas não podemos estar  amortecidos e torporizados. Somos nós que devemos dar o passo adiante. Posto que, nas mãos deles, volta-se sempre a uma doença cronica, o golpe.
          A decadência da economia familiar, se alastra pelo mundo, e paradoxalmente, isto é, assemelha aos incautos que o seguinte faz oposição, mas é coisa que encerra o seguinte: o fulgurante progresso de certas economias privadas,  e a corrupção. Tudo fazendo supor os primeiros degraus rumo à decadência moral e por conseguinte a um meio hostil, que tão só alimenta o exercício da individualidade, que sempre nos chega como: fazer sacrifícios. É esta prática, cínica, sabemos por experiência, e sempre desemboca, tão somente, em sociedades caducas e condenadas ao fracasso, e a extinção de direitos,  por extrapolação, que é de onde viemos e partimos e não queremos retornar. Chuta que é macumba! E um passo adiante, no processo de libertação...