O começamento traz algo de finado, é um intercambio, dizem. E nisso estou certo em dizer: aquele era um dia tal que não se esquece. Nem faria falta no futuro a profusa fotografação a que todos se expunham para lembrarem-se da formatura. Paulão e Marcola tomavam em sério os brindes erguidos para as devidas poses. Cada formando fazia uma foto. As namoradas, deles, Patricia e Ludmila retocavam-se, a maquiagem. Eles e os demais se embriagavam. Aquela amizade germanal remonta de princípio do curso e muito já haviam discutido sobre algum futuro. Diziam-se de vez em quando “amanhã” e ali em meio a festa de despedidas de rosas fechadas e cravos nas lapela, como se manhã de primavera; entre um gole e outro se perguntavam: “Que fazer?”. Não haviam se destacado no plantio. “Ora vamos”, dizia Marcola, “é só uma ferramenta”, continuava. “Sei”, dizia Paulão, “temos intuição e um pouco de ciência e temos iniciativa”. Todavia temiam a possibilidade de se tornarem professores do Estado. “Não há dignidade” dizia Marcola, “que vamos fazer com um curso de letras?” “Cavar poesias!” Dizia o outro. “Sacudir o dicionário como se fosse o saco do Arcebispo Tillotson e dele tirar um livro que ensine milagres”. Tornava o um. “Batear sintagmas para uma grande Literatura!” retornava o outro. “Se tivéssemos feito mecânica, seriamos mecânicos!” Disseram em uníssono. Uma luz brilhou nos olhos vivos e verdes de Paulão. Sentia o paraquedas abrindo a meio caminho de esborrachar-se, daquilo que lhe parecera um salto no escuro, a necessidade a iluminar o ponto final da queda; o solo, a rocha o asfalto; mas o medo do choque a l abrir-lhe asas. Marcola esboçou um sorriso em lábios finos de negociante, sentindo na ponta do aquilino; cheiro do sucesso; soergueu a cabeça que jazia entre as palmas das mãos, qual candelabro sustido por cotovelos plantados, entre copos, no tampo duro da mesa.” Mecânico de Letras” “Gramáticos” sibilou Marcola labial, linguodental...” Ah! Não!”É muito maquinal, automático!” Analisou Paulão.”Pensava algo mais artesanal, humano.” “Ah! Isso Não! Tá muito gasto esse negócio de Artesão, Oficina... tem até oficina da pizza! Hahaha! Estamos discutindo a forma”, ralhou Marcola e adicionou, que “é pela imagem que vamos vender, mas que vamos vender? Consertos! Consertos ?” “É! Consertos de palavras!” Disse Paulão silabando. “Espera um pouco... deixe... pensar... consertador... concertador é isso meu amigo, presta atenção, estou pensando como Haroldo, Augusto de Campos e Décio Pignatari e em vez de arranjar, dar um jeito nas palavras para que funcionem melhor, podemos concertá-las, harmonizá-las, que parece? Já estou vendo o neon”...
- Não quero apagar o luminoso, velho, mas esse papo agora é sério, é o único coelho que tenho para tirar. Disse Paulão. Haviam matado muitas aulas para bebê-las e chorá-las. Muitas industrias haviam nascido nas saideiras e não despertaram, nem cronicamente como as segundas-feiras de dietas e caminhadas.
- Você quer consertar palavras, consertaremos, você tira o seu coelho que iluminarei a ambos!
- Tá bem! Sócio. Reunião amanhã! Feito!
- Domingo! E a Pati? Sócio.
- Domingo! Dá um jeito, velho, e não lhe diga nada ainda, até a coisa ficar nos trinques. Quando Pati e Ludmila voltavam da toalete foram guindadas à pista de dança pelos concertadores de palavras.