6 de jun. de 2011

Os Reinos do Amarelo. João Cabral de Melo Neto.

1.
A terra lauta da Mata produz e exibe
um amarelo rico (se não o dos metais):
o amarelo do maracujá e os da manga,
o do oiti-da-praia, do caju e do cajá;
amarelo vegetal, alegre de sol livre,
beirando o estridente, de tão alegre,
e que o sol eleva de vegetal a mineral,
polindo-o, até um aceso metal de pele.
Só que fere a vista um amarelo outro,
e a fere embora baço (sol não o acende):
amarelo aquém do vegetal, e se animal,
de um animal cobre: pobre, podremente.

2.

Só que fere a vista um amarelo outro:
se animal, de homem: de corpo humano;
de corpo e vida; de tudo o que segrega
(sarro ou suor, bile íntima ou ranho),
ou sofre (o amarelo de sentir triste,
de ser analfabeto, de existir aguado):
amarelo que no homem dali se adiciona
o que há em ser pântano, ser-se fardo.
Embora comum ali, esse amarelo humano
ainda dá na vista (mais pelo prodígio):
pelo que tardam a secar, e ao sol dali,
tais poças de amarelo, de escarro vivo.

      A temática social em João Cabral é explicita ou velada, 

mas antes de mais nada é o espanto do poeta diante da 

realidade. O poeta João Cabral trava com a realidade uma 

luta em que sempre saí derrotado, e o poema é sua derrota, 

ou noticia dessa derrota. Em “Os Reinos do amarelo"

que aparece na 3° parte do livro “Educação pela Pedra” 

apresenta uma tensão onde os contrários criam uma 

cromática em tons  do amarelo. Vai percorrendo os amarelo 
possíveis, do amarelo vivo da 1° estrofe,

“o amarelo do maracujá e os da manga ,

o do oiti e do cajá

amarelo vegetal,alegre de sol livre,”

até:

“tais poças de amarelo, de escarro vivo.” o amarelo biliar e 

ranhoso do homem cozido pelo sol e pelas injustiças, ai o 

escarro é vivo. O homem é excremento. Eu posso dizer, João 

Cabral, não, pois não fazia retórica, essa é artimanha minha. 

Assim chegou (Ele) ao limite do suportável.


 São passagens de realismo brutal, o poema todo é uma 

expectoração. Mas não se trata de menos apreçar o homem e 

sim a passagem daquele homem\amarelo para o 

poema\quadro\pintura\amarelo não há combinações 

possíveis na paleta do poeta, senão o próprio ranho, escarro e 

a bile. 


A realidade era esta, o poema nesse caso não é mera mimese, 


é plágio puro da realidade.


 A primeira estrofe dedicada ao reino vegetal, enfatizando-

lhe o caráter vivificante, que faz do sol a matéria de sua 

exuberância até permite um certo naturalismo "dada"

tropical, se essa coisa é possivel.

 Na segunda o amarelo é outro, “amarelo aquém do vegetal, e 

se animal, de um animal cobre: pobre, podremente.”

A segunda estrofe estropia o amarelo e ele perde o sentido 

vital e nela não só prestará a caracterizar o homem “de ser 

analfabeto, de existir aguado”, mas o materializa com a 

matéria mesma dele homem que rompe-se sobre a tela em 

relevos líquidos, pegajosos de viscosidade assustadora.



























2 de jun. de 2011

Os livro dos menino de rua.


Vejo você andando pelas ruas com seus ombros caídos. Não é verdade, muitos meninos têm os ombros caídos e não são meninos de rua. Tem muito adulto com os ombros caídos, tanto os há, que inventaram ombreiras para disfarçá-los, ombros e seus donos. Enfim, vai você com suas orelhas de abano. É outra mentira. Vai você sujo atrás da orelha. Menino nenhum sabe lavar-se atrás da orelha. Nem os adultos. Todos botam perfume atrás da orelha. Não para esconder o perfume. Muito pelo contrário. Perfume custa caro. Há perfumes baratos verdadeiros assassinos do olfato, mas todos nós os outros temos que sentir e consenti-lo. Mas passam atrás da orelha por não lavá-las direito. O atrás da orelha secreta olor esquisito. Vai vendo! Vai você pardo. Mais uma. Você negro, branco. Tudo mentira. Todos somos ou pretos, ou pardos, ou brancos e temos um que outro orelhas de abano e ombros caídos. Mas uma coisa você precisa saber. Você cometerá um crime. Anda pelas ruas a pedir. Pede dinheiro. Então dizem que você precisa de escola. Como? Se anda pelas ruas para aprender! Dizem, de outra, escola. A rua é má escola. Nada! A rua é o hipermercado. Há à sua disposição um gondola cheia deles. Crimes. Você escolhe. Na Câmara se comete muitos crimes. Nos hospitais. No mundo forense. Universitário. Sim plágio. Na média. Sim fazer média na mídia, é crime. Estes você não vai cometer. Reserva de mercado. Diploma. Diploma que você não terá. Ainda que escolado. É! Mas o MEC não reconhece a rua. Reconhece coisas de gênio, mas terá outros a sua escolha. Qualquer um. Não vale escolher o crime gramatical, pois esses todos cometemos. Os livro ninguém diz, já que ninguém se refere a eles. Quem lê? Dizem: o óculos, por óbvio, os de sol. Quatro carro na garagem. Ou nas garage. Quatro pão. Comprá um óculos di sol nu shopein. Saiba que o seu crime é necessário. É o único crime natural. O crime por necessidade, as vezes, nem sempre, mas o crime frontal, sem elipses, direto, crime de autor. Pois existe um monstro que devora toneladas de dinheiro que se chama judiciário. Ele precisa de crimes como os teu, quer dizer, aquele que você cometerá, é inescapável, que cometa. Se não cometê-los, sim podem vir a ser “pluralidade”, vai da sua especialização. Sim é louco, uma pluralidade de um ato singular é um ato plural e não plurais. Não se importe em saber quantos advogados vivem dos crimes, oficiais de justiça, carcereiros, juízes togados ou não, promotores, o parquet, a doutrina e as facul, fábricas de Vossas Excelências e OAB para fazer o recall de suas más formações. Saiba, a maioria deles não sabe o que é entropia, caos ou ordem. Depois temos os narradores de crimes. São vestais da moralidade. Castidade exemplar. É! Nesse seu crime, não há nada de espetacular. Pois esse é um mundo de ladrão que rouba ladrão. Mas o único que não se esconde por traz da lei é o seu. Você pode por casuísmo tirar-me a vida. O casuísmo não está em apagar alguém e sim, quem. Eu, por exemplo. Esse crime, sendo eu ainda moço, diminuirá a expectativa de vida de todos os patrícios. Aumentará o trabalho daquele povo supra citado. O que você precisa saber é: peça sempre Dinheiro. Claro que alguns objetos também, pois podem a Ele se converter. Mas ouça uma coisa: esse negócio de ong! caia fora. Desenho! Música? Carinho? Ouça as músicas que fazem! Ninguém sabe música! E carinho! Não caia nessa, meu broder, essa gente tá beijando cachorro e gato, e você não os é! Cometa seus crime, que os crime compensa. Se você levantar a mor grana,
os livro e a doutrina tão ai pra defendê-lo. Senão leia o livro que não dá para dormir com essa pia Fraus. 

Homo-caricatus.


Alguns “héteros”, em particular aqueles que pagavam para “ver” duas “mulheres” em “ação”, não suportam isso “gratuitamente”. Caricatura de pudor.
Na vida real e em particular na literatura há um tipo de mulher com gestual exageradamente delicado, fútil, caricatural. Que em muitos homossexuais de origem masculinos se tornou sua essência, caricatura da caricatura. Dessa dupla caricatura às vezes se tem vontade de fazer troça, na verdade se torna quase obrigatório, praxe.
Dentro da mesma linha da caricatura, algumas homossexuais coçam o terceiro testículo, parodiando Chico Buarque, coçar um membro que já se perdeu ou nunca teve, ter dor de dente na prótese, mascam fumo e cospem no escorpião e o matam, sem o cinismo “far” “cool” de Clint Eastwood.

31 de mai. de 2011

Quando casei uns amigos.

Um dia ele chegou, bonito, como um filho de Apolo. Não digo isso gratuitamente, senão que me a pagava com incerta admiração, por beleza não era, que não a pretendo. Admiração assimétrica. De um fotógrafo desinteressado pela pose. Sem saber o motivo de sua admiração a digo: incerta. Pois bem, ele me disse que ia se casar. Ora vamos, Peteca, você me diga com quem! Sim era ela, bonita, como se fosse filha de Circe, sem as poções. Meus olhos se deleitavam ao vê-la passar por Sousa, eu já me sentia então um fauno espreitando ninfas, garota de Ipanema, se o rio Atibaia fosse o mar aos pés do Corcovado e a Rua Maneco Rosa fosse a Farme de Amoedo. Castaño, um filho de Mallorca, vivia a beira do Atibaia, e dizia que na madrugada, hora em que a bruma se forma sobre o rio, esta esconde sobre as pedras uma Atibaíade, que canta com a voz mais doce que um humano pode produzir, enquanto trata de seus longos cabelos, era ela. O divino Peteca me disse também que eu iria casá-los, eu quis saber se ela sabia quem seria o anti-clérico, ele disse que sim, mas um outro dia veio ela a mim e disse-me: Cidão você vai fazer o meu casamento com o Peteca. Depois chegou ele, beberam bom vinho e comeram boa pizza. Voltaram num domingo, trouxeram as alianças, que não eram desde já alianças comuns, eles não eram comuns e tampouco sou comum, mortais mas, incomuns como aquelas alianças e aquela aliança. Eu me lembro de ter invocado ao grande deus, um deus de letra minúscula que coubesse no meu entendimento e no entendimento deles, e disse: introibo ad altare dei, enfim que entrava no altar de deus, o deus do amor, que é a única coisa que os levava a casar, além de uma casinha pequenina à beira do lago, claro. Disse mais coisas, bendisse a aliança, saudei suas belezas, rendi graças à minha escolha, perguntei-lhe se ele a queria como esposa, ele disse que sim, então perguntei a ela: Lívia quer o Peteca como seu esposo, ela disse que sim, beijaram-se e eu quis dizer uma palavra em hebraico, mas dela só me lembrei agora, שָׁלוֹם עֲלֵיכֶם;.

30 de mai. de 2011

Nulisseu. Nulisses.

Depois de cada aventura matam ovelhas e cabras, preparam um banquete, bebem vinho segundo o paladar de cada um, vinhos tão bons a que podem adicionar vinte medidas de água e cada um a soma a seu gosto. Cansados, adormecem na areia da praia ao som do agitado mar salgado. Poderiam haver se mandado, depois de furar o olho do gigante globolho, mas não, houve-se por bem tripudiar o derrotado.

Diante disso nossa aventura se semelha cada vez mais chinfrim. O inimigo é: o chefe, o inadimplente, o Bolsonaro, o palhaço deputado, o eleitor do palhaço, a música alta do vizinho, o exterminador de gatos, o vereador bêbado ou o mosquito da dengue. Todo mundo come todo mundo e ninguém come ninguém. Para comemorar: um maço de alface, um frango de plástico, a cereja falsa sobre o bolo dietético, a cerveja de tudo: de boca grande, a primeira, a que xinga argentino, enfim tudo: menos cevada, lúpulo e malte e se formos metidos a bestas e com sorte, teremos o vinho aquoso do famoso “custo benefício” e o gosto de frutas silvestres, que nestes trópicos nunca provamos, sabor a bosque profundo, que a tempos devastamos.
Tenho a terrível impressão de que os mortos nos governam. Que a própria aventura individual foi copiada do google. Um google remoto, anterior ao Google and Co. E desde já anuncio: não é a virtualidade que incomoda, ou o veículo, mas a pobreza do festim pela insignificância da vitória.
Por isso não há redenção. Por isso Leopold Bloom é Ulisses. Por isso Circe é uma prostituta e aceita cartão de crédito. Pois todas as batalhas foram travadas, essa é a tragédia.

28 de mai. de 2011

Palocci não é catupiri, ou a língua de pau.

Não defenderei Antônio Palocci Filho, por óbvio, não sou advogado. Tudo que Palocci parece precisar é de advogado ou advogados, peritos e contadores. Sou cozinheiro e o gourmet é Antônio Delfim Neto. Mas me disponibilizo, para ambos, como tal, a preço de mercado. Pratico uma cozinha anti-ética. Que é isso? Pegunta aquele que pergunta. E para você respondo: cozinho confiando na tua língua de pau, na tua língua rugosa queimada pelo excesso de sal do dia-a-dia, conto com tua incapacidade gustativa, com tua fome ancestral, com teus vícios palatais, com tua ansiedade que te faz glutão. Substituo alho e cebola por arisco, coloco mais pimenta, açúcar no molho, umani – pra você eu digo: umani é açúcar, é sal, é azedo e é doce é pra de vez em quando - , encho de cebola e você come sardinha por aliche. Sardinha é ótimo, mas não é aliche. Contra é melhor que filé, até músculo é, mas não o é. O Mestre Golfeto sabe: depois da higiene vêm outras querências. Queira! É só querer.       

26 de mai. de 2011

Rios sem Discurso. João Cabral de Melo Neto.


Rios sem Discurso pertence à coletânea Educação pela Pedra, publicada por João Cabral de Melo Neto no ano de 1966, pela Editora do Autor. Rio de Janeiro.

Começo pelo fim: “em que se tem voz a se ele combate” . Um rio combate a seca, a voz se opõe ao silêncio. seca|mudez rio|voz assim rio|seca mudez|voz. Não é de qualquer rio ou qualquer voz imperativo combater, sim um discurso único. Mas este rio-único-discurso sempre é enfrasado a partir de palavras que se comunicam em frases menores formando sentença-rio.

Mas há o isolamento da água em poças, das palavras em situação dicionário. As poças não se comunicam com outras e definham, evaporam e são tragadas pela seca terra. As palavras em dicionarizadas catacumbas estão mortas, mudas; são todas mas nada podem dizer neste isolamento.



                  Rios sem Discurso.

A Gabino Alejandro Carriedo.

Quando um rio corta, corta-se de vez
o discurso-rio de água que ele fazia;
cortado, a água se quebra em pedaços,
em poços de água, em água paralítica.
Em situação de poço, a água equivale
a uma palavra em situação dicionária:
isolada, estanque no poço dela mesma,
e porque assim estanque, estancada:
e mais: porque assim estancada, muda,
e muda porque com nenhuma comunica,
porque cortou-se a sintaxe desse rio,
o fio de água por que ele discorria.

*

O curso de um rio, seu discurso-rio,
chega raramente a se reatar de vez:
um rio precisa de muito fio de água
para refazer o fio antigo que o fez.
Salvo a grandiloquência de uma cheia
lhe impondo interina outra linguagem,
um rio precisa de muita água em fios
para que todos os poços se enfrasem:
se reatando, de um para outro poço,
em frases curtas, então frase e frase,
até a sentença-rio do discurso único
em que se tem voz a seca ele combate.



O manipulador diz ao leitor que as palavras sem contexto não têm valor. E que um texto ainda que falto de uma palavra, é sempre texto. E nesse caso cabe ao manipulado leitor ir ao cemitério de palavras e buscar-lhe a palavra certa para atingir o texto pleno, posto que sem isso será sempre o texto um aleijão. João Cabral não lhe gostam as metáforas, prefere a simetria, o espelho é o maior criador de simetrias, por isso João Cabral insiste no poema objeto não metafórico que através do espelho|leitor se remonte pleno como um rio que se faz discurso partindo das poças interligadas em fios e esses fios como outros fios d´água e a tantos outros muitos, até o rio-sentença.

Acontece porém que há um impedimento heraclitiano aonde o rio cortado não volta a ser o mesmo, cortado, o discurso não se remonta simetricamente, assim esse rio é um discurso vazio. Resta-me enquanto manipulado leitor a metáfora, da união dos esforços, da comunhão possível já que nos falta a palavra ou nos sobra grandiloquências. Como dizia Karl Marx em algum lugar de A Ideologia Alemã: l´impuissance mise in action. O poema é a própria impotência posta em ação. Uma vez que para Jean Duboi discurso é “linguagem posta em ação, a língua assumida pelo falante”, para Massaud Moisés: o vocábulo “discurso” ostenta polivalência de sentido segundo o contexto.
Assim os rios sem discursos são poemas metafóricos, é recife, que sempre é: acumulo de corais que se depositam, mas sempre quer ensinar, comover e entreter.