6 de abr. de 2011

Bolsonaro. O mártir do arco-íris em preto e branco.

Bolsonaro abriu as portas midiáticas para uma grande discussão. Racismo e preconceito. Uma oportunidade rara para a ampliação e aprofundamento de assuntos tão importantes como pendentes em nossa agenda de compromissos democráticos. Mas é certo que tudo foi atirado pela janela. Resumir-se-á a um pedido de cassação e outro de indenização por danos morais. Bolsonaro não disse mais do que a maioria dos pais deste país dizem diariamente na frente da TV, no intervalo do trabalho, na mesa de butiquim, sinuca, baralho e principalmente diante dos interessados. Estas questões têm suas urgências, mas se há liderança envolvida, é cobra de cem cabeças. Sem prejuízo às punições cabíveis, Jair Bolsonaro fala por muitos, deveria ser instado ao debate, sua opinião é importante, tem representatividade em todos os setores da sociedade. As comunidades envolvidas carecem deste debate. Não é por ser um parlamentar que o cara deixa de ser tacanho como nós. Muitos(muitíssimos) dos interessados escondem o fato a próprios pai e mãe, e estes são votos “do contra” (contra a própria prole) quando pedidos a manifestarem-se, publicamente. É tudo muito estranho, parece brincadeira de esconde-esconde e é só o Jair que não sabe brincar.

31 de mar. de 2011

Gaiola das loucas: Ópera do froterismo.





Fui para o ponto um horário antes, queria passar no Extra e comprar café. Quinze para as três, a lata não passou, três, três e dez, três e quinze, a lata não passou, três e quarenta, dois horários depois passa o busão. Cheio. No primeiro condomínio, treslota, com todas as domésticas que faltavam, no seguinte só pedreiros e serventes, todos do Piauí. Todos falam alto. Muitos celulares soam estridentes, competindo com a gritaria de Ivete Sangalo com seu bonezinho de maquinista no busvideo. Uma moça gorda encavala sua ausência no meu ombro. Fora da geladeira e esse calor! Hum... digo. Que! Diz ela. Nada! Digo. Um piauiense aumenta o espaço com seu froterismo. Chega ao Shopping. Embarcam meia duzia de jovens homossexuais. Um deles, mais desbravador, cruza a catraca e avança até o fundo, outros estacam ali mesmo, junto ao motorista. Um cearense encosta-se no moço. O moço grita para os amigos que ficaram na catraca. Juliete, “vem! aqui tá booom”! “ Sei!” diz minha vizinha encaixada no meu ombro. A plateia delira. Cê tá desesperada!Suzy! Grita Juliete. A galera vai a loucura. A gaiola para noutro ponto. “Nem sobe querida, to entalado até a garganta” grita Juliete. “ Vai vendo!” diz uma moça. Desci, quatro e dez, atrasado para o trabalho.

30 de mar. de 2011

INTERVIEW




Movia-me cavilosamente entre o verso e o anverso de uma folha de papel amassada feito bola.


Viajante?

Com Ulisses o grego Simbad o marujo Homero o mero Kadafi o muezim Hugo o chaves Obama o ladem Kirchner o cozinheiro Bin o bush embusteiro Li Ju a jujubeta Lula o cefalópode Kenji o jigoleta Machado o rameiro José o carpinteiro Jesus o pregoeiro.

Quais direções?

Norte sul leste oeste onde a chupeta fosse o terço de cinquenta.

Onde?

Boulevard Bonfim Berlin Benfica Betin Buritizal.

Repouso?

Um filó para impedir as moscas nas partes desvestidas e vento de ventilador de repartição porque sua filantropia nunca chegou ao baixo ventre não dentro de casa me convertendo ao celibato coisa que a bondosa mãe sempre sonhara para o seu primogênito confessor da vizinha que não sabia comer e gostava da coisa al dente assim comia o molho depois da pasta depois esfregava sua gosmenta mata úmida nas fuças e a chamava de cadelinha e deixava suas nádegas vermelhas de palmadas ela urrava com sua boca entupida depois pedia que a amarrasse como o homem vitruviano de Leonardo da Vinci me xinga vadia eu dizia cadelaça depois ia ao dentista para que lhe limpasse os dentes e a candidíase bucal .

Movimento?

Colar os selos de uma carta escrita e reescrita a papai Noel pedindo o fim da discriminação oral anal nasal e um aspirador de caspas portátil para os seborreicos e uma macaca catadora de lêndeas e um tamanco para fazer em pé com pernaltas.

Postura?

Decúbito dorsal ligeiramente lateral para ela.

Porque?

Ela nunca tinha feito a coisa assim e creio que ela era piedosa apesar de tudo merecia o de melhor coisas fora da rotina e tinha passado a vida a pensar nos outros passei a pensar um pouco por ela e dar-lhe coisas boas e chegava a botar o Tango la Comparsita na vitrola ela só conhecia o Bolero de Ravel eu gostava do bolero mas o via muito mecânico o Tango permitia outros malabarismos.

A barata diz que tem\ sete saias de filó\ é mentira da barata\ ela tem é uma só.

A barata diz que tem\ sete saias de filó\ é mentira da barata\ ela tem é uma só.


Cantiga popular.



Vira e mexe a Miloca sai lá de onde estava e zanza. Eu falava com Joana Darque, assim de frente para ela sentada, já não me apaixono a tempos, nem sei se sei, então pousei primeiro as mãos sobre a mesa do bar, depois o antebraço, ela parece que fez o mesmo, fiz que não vi, mas por vezes as levantava, ajeitar uma meia, verificar um brinco, depois baixa só uma a outra ata o bíceps da uma, donde eu via um quatro. As minhas rastejavam imperceptíveis como uma centopeia, mas deixando espaço para que pudesse estender suas mãos e braços sobre a toalha quadriculada sem tocar as minhas. Esse toque deve ser fatal como uma linguada de sapo numa libélula despretensiosa. Quando por fim Joana Darque pousou suas mãos, estava todo prevenido, olhava para o copo de cerveja, para tirar peso e não demonstrar a avidez que a avizinhava. Quero mas não quero. Torno a repetir: quero mas não quero. Lá fora a rua deserta úmida ainda da chuvada passageira. Mas olhava a Joana para Joana, prestes a entrar em Joana por seus olhos negros, por sua boca, eu aprendi com o Ednilson que não se pede um beijo, se beija. E sua boca diria não, se perguntada, mas seus lábios entreabertos não queriam perguntas, queriam beijos. Mas havia as mãos, e subir o olhar do colo a boca sem quebrar o biscuit, mas depois do seu ombro vi vagar um vulto, era Miloca mudando de dimensão, não há vi, ouvi seu zuzo suave, não sei se Joana Darque viu o que eu não vi, ou só viu que via algo que me desconcentrou.

29 de mar. de 2011

Lágrima ou Olhos negros cruéis tentadores.


Me devora o tempo que ora para, ora acelera, fragmenta-se ou pega direções estranhas que não sei a qual universo vai dar: se vivo, se olvido ou lembranças... vejo e não vejo, mas sinto ver, e o que era deixa de ser e volta e teima ser, e não é. Ora, se retrato a rua realidade, mas... à cabeça cabeceiam coisas, outras: sombras e cavernas. Rumino o entardecer que neon ilumina com rodízio indigesto de limalhas perfurantes de músicas, digiro-as na lenta insônia, tripaperfuradoras a digerirem-me sonâmbulo, atado a anéis entrelaçados duma interminável corrente, que não se rompe, encadeado os vejo saltitantes, num jogo de faz e desfaz, indecifráveis.



Sempre que ouço este frevo rasgado de Moraes Moreira, choro.

Desta vez não chorei e saiu isso ai acima escrito.



Chão da praça.



Olhos negros cruéis tentador

das multidões sem cantor.



Eu era menino

menino

um beduíno

ouvido de mercador.

Lá no oriente

tem gente

de olhar de lança

na dança do meu amor.

Tem que dançar a dança que a nossa dor é que balança o chão da praça.

28 de mar. de 2011

amimais de estimação

Os sobrinhos queriam um animalzinho. Pesamos pós e contras. Eu não o queria, pois meu animalzinho de estimação sempre foi ostra fresca, pimenta do reino branca, limão e champanhe ou sidra. Tive a ideia de ler-lhes um poema de Manoel Bandeira. Eles toparam na hora: porquinhos-da-índia. Ela Capitu, ele Casmurro. Ouvimos dizer que se socializam melhor, quando lhes falamos. Inventamos uma língua. Acho ridículo usar o vernáculo. Assim Pedro dizia: Capitu! Du bist ço xoene xivaine mere, poverina, pur troppo. Capitu soltava um “esquinche”. Comia capim e fazia bolinhas iguais a pinóis, verdes. Tudo se desenvolveu: nossa língua, nossa amizade e nossas preocupações com a ninhada de filhotes. Mas Josefine, a siamesa da vizinha, levou-nos o vermelho e preto, depois a malhadinha, o todo branco, por fim Capitu, o último a ser levado, Casmurro, que deixou marcas de sangue no quintal de sua luta com a gata. Josefine ainda costuma assustar-me, caminhando sobre o telhado de casa. Às vezes me irrita com seus namoros demorados e barulhentos. Mas é só uma gata. e seu dono! Seu dono: só mais um idiota.

27 de mar. de 2011

produto|consumo

Do homem que sonhava algo que não existia - se não o vazio e a necessidade de criar - ao objeto que criou o homem-consumidor para si à sua imagem e semelhança.