28 de abr. de 2015

A Caspa


A caspa.

A Caspa é um ser estranho da fauna brasileira, não há nenhuma exclusividade nisso. Não é, de modo algum, numerosa, tampouco se extingue para nossa desgraça. É o fruto do cruzamento entre a garrulice que sobrevive em certos âmbitos públicos e o retrogosto feudal que ainda lateja na alma de alguma gente que não aceitou sequer o renascimento, quanto mais o iluminismo, o humanismo (sequer entendem o sentido dessa palavra, que em geral confundem com bondosidade). Estão aqui e acolá a molestar, como nunca se propuseram a nada, a fazer nada, pensar menos ainda. Os entendo quando agem como se o sistema fosse a própria natureza das coisas, não pensam que tenha se naturalizado, não é isso, nasceram antes de ontem e o mundo era assim e pronto. No entanto, mesmo nessa selva há que se fazer picadas, para melhor caminhar, e se andam por essas trilhas, é que muito esforço se fez para tê-las, e se alguém cortou uma árvore ao abrir a picada, talvez seja por não ter encontrado outra solução, pode-se até questionar o fato feito quando feito, quando se fazia algo do qual herdamos, humanidade. Afinal, humanismo é o ser humano no centro da governança da própria existência. E humanidade é a qualidade desse ser que busca a emancipação.

27 de abr. de 2015

A mítica camisa da Seleção nas manifestações.

A mítica camisa da Seleção nas manifestações.

Quem pensa se tratar de uma burrice dos dirigentes das manifestações o uso da camisa canarinho, muito se engana. Por que na camisa amarela está a ideia do sincretismo de classes da torcida canarinho, que imediatamente se quer passar à ideia de Nação sincrética.
Se Nélson Rodrigues lança mão da pátria de chuteiras, não é difícil se vestir por completo, como o escrete Canarinho. Há muito que se quer e se dilui o termo Burguês,( mundo afora) não o fato econômico, tão somente a representação. Quem quis e conseguiu diluir-se dentro da Nação é a Burguesia, seja ela qual for ao longo do tempo, a do café, a da industrialização, seus espólios, ela se diluiu e restou a Nação. Tanto é assim, que esses termos só valem para as Elites do tempo histórico, “no tempo do império”, na “cultura do café”, enfim lá atrás no tempo.
A burguesia aceita a presença da esquerda na Nação, digo aceita porque no fundo a nação é ela, porque o regime de propriedade deve permanecer o mesmo, assim como a ordem burguesa e a ideologia burguesa. É muito simples, com essa diluição, ou seja, a impossibilidade do uso da denominação: “Burguesia”, desaparece a possibilidade da denominação de seu caráter ideológico. Assim se faz crescer e florescer a ideia de Nação, o que naturaliza a sua ideologia, aonde a única ideologia é a da Esquerda.
Com esta bandeira, quem se veste de ''Seleção” é a Nação, e não a burguesia, logo quem não se veste de “seleção” é contra a Nação, e irremediavelmente, quando, na verdade, só se é contra a burguesia, porque o termo, a coisa burguesa já não existe, p. ex., no Manual de Redação da Folha de São Paulo consta a proibição do uso do termo Burguesia, e não só ele, mas todos os termos que caracterizam o regime, o sistema e a ideologia, do lugar onde vivemos, como: capitalismo, proletário etc. É como se, com o desaparecimento dos termos os problemas sociais, e mesmo as classes sociais houvessem desaparecido, mas isso é pura ideologia. Assim, vestidos com a camisa da seleção representam a Nação canarinho, os demais são os adversários, não deles, mas da Nação. Desse modo além de diluída, não culpável por nada, e inviabilizando os que não vestem a canarinho.
Assim, a camisa amarela consegue deixar mais uma vez “anônima” a burguesia. E esse anonimato ideológico se dissemina por todas as atividades, judiciais, políticas, artísticas, propagandistas… e finalmente, no escrete que foi tomado de assalto para representá-la.

P.S. Na tentativa de denominação, se passou a usar ou se tentou usar o termo Elite, que imediatamente passou a ser sangrado, cortaram-lhe o pulso para que seu sangue esvaísse, a tal ponto que se pode provocar risos ao usar o termo: as Elites. Criando propositalmente a confusão com as elites intelectuais e do vanguardismo ‘verde’ etc.



23 de abr. de 2015

Me chamo Aristóteles.



Sou de boa família, já que meu pedigree está nos mais importantes registros de prosápia e premiada ascendência. Ora, também vivo numa casa de categoria, ao menos em aparência. São gentes com estudos, com responsabilidade, com renda, com patrimônio e ostentam um lugar proeminente na sociedade. Ademais, souberam me acolher nesta casa como um dos seus. Gozo de privilégios que muitos seres humanos não podem nem tão somente sonhar. Por consenso me batizaram com o nome de Aristóteles e eu, ufanoso, passeio pelas ruas e praças da minha cidade, mas desgraçadamente me faz mal quando me gritam em voz alta, já que algum possa me identificar como aquele que suja desrespeitosamente a nossa vila. O meu dono não recolhe os frutos das minhas necessidades básicas, me tiram de casa para passear, orgulhosos de minha estampa, empatia e também para evitar que suje a casa, pois não consideram o restante da vila como casa nossa, também. Se tivesse mãos e me dessem tempo e possibilidade os enterraria, como a minha família me ensinou desde pequeno. Quando os meus irmãos e eu nascemos, a nossa mãe comia tudo para não deixar rastro. Fui educado e por isso provei de fazer ver a meu dono que há de se recolher as minhas merdas, por respeito aos demais, e eles mesmos, pela saúde de todos os humanos e dos meus congêneres e, especialmente para evitar os olhares de menosprezo e nojo. Depois de cumprir com a natureza, procuro ficar ao lado das merdas, e olho meu dono com meu olhar mais suplicante e nada mais que um estralo de cinta e uns passos apressados são suas esperadas respostas. Então continuo até nossa casa com a cabeça baixa e com o sentimento de haver sido traído por quem me acolheu, um dono que não me merece.

Está provado que ter um amigo como eu em uma casa melhora a saúde, a felicidade e o bem-estar de toda a família, e está demonstrado que até riscos de infartos diminuem consideravelmente. Agradeço ao Cidão por escrever por mim esta desculpa pública, na qual os mostro a minha mais sincera vergonha e impossibilidade de cumprir com a norma elementar de civismo. Respeitar os demais na saúde e liberdade para desfrutar da cidade.





20 de abr. de 2015

As Abelhas.

As Abelhas.


As abelhas operárias fabricam o mel. Mel que é usado dentro da colmeia. O apicultor colhe o excedente.
Para o apicultor o que interessa é o mel. No entanto, para fazer o mel as abelhas operárias precisam ir de flor em flor para buscar a matéria-prima, o néctar. E nesse ir e vir de flor em flor, polinizam, gerando frutos, que sem a polinização não apareceriam. Quer dizer, para gerar o produto há um trabalho, e para poder fazer este trabalho, faz um outro trabalho. O que seria o produto principal do seu trabalho, o apicultor retira o que seria a mais-valia, o mel. Já do trabalho para trabalhar, nada lhe resta. Quando escrevo isso, trabalho, trabalho para inúmeras empresas. A Facebook é uma delas, que retira desses meus enunciados algo de lucratividade, na rede social estamos polinizando flores, que geram frutos, dos quais nem temos a menor ideia, nem vagamente.


Essa historinha, com as alterações que precisei fazer para a analogia, foi contada numa palestra que assisti, e era de um terceiro, um sujeito francês, que não me recorda o nome, nem para procurar no google.       

A Peste.



No dia 16 de abril, o doutor Rieux caminhava pela galeria de entrada do edifício, procurando as chaves antes de subir para o seu apartamento, quando viu surgir no escuro do fundo do corredor uma ratazana de bom tamanho, toda molhada, que se arrastava sofregamente. O animal parou, em busca de equilíbrio, e começou a correr em direção a Rieux, num golpe para, deu uma cambalhota e caiu, ao fim, lhe saia sangue pelo nariz. No dia seguinte, as oito da manhã o porteiro parou o doutor quando este saia, para dizer-lhe que algum engraçadinho, malintencionado, havia botado três ratazanas mortas ao meio da galeria. Deviam as ter caçado com ratoeiras muito fortes, porque estavam cheias de sangue. O porteiro esteve bom tempo atrás da porta, com as ratazanas penduradas pelas patas, esperando que os culpados se manifestassem, com alguma trapaça. Mas não aconteceu nada.
Essas são as primeiras referências à epidemia de ratazanas mortas com que começa a novela A Peste, de Albert Camus. Os habitantes da cidade de Oran não sabiam que as ratazanas, em vez de morrerem nas ratoeiras, escolhiam morrer em plena luz, nas escadas, nas entradas das casas, e no meio da rua. Rapidamente as ratazanas mortas seriam incontáveis, centenas, milhares… depois das ratazanas, morriam as pessoas….




O primeiro parágrafo é uma tradução literal, que é de minha indústria.  

Vamos abortar.

Vamos abortar.


O modelo do Estado brasileiro, surgido da Constituinte de 88 está sangrando desde lá. Nenhuma das instituições criadas ou reformadas, esteve fora de suspeita, aos olhos dos cidadãos, sequer ele, desde seu advento. O desprestigio da política, acompanhado dos escândalos pessoais de membros destacados de todas, todas as instituições, desde a presidência aos mais mequetrefes prefeito e vereador da longínquas comarcas como a de Manga, na divisa da Bahia-Minas, passando pelos cargos de confiança e servidores com cargos de responsabilidade, parecem não ter fim. Não é de mim pensar a política pela ótica da corrupção, no entanto, me tomo de espanto quando me dou conta, que mesmo os meios de comunicação social - a Mídia - não por ter ideologia, porque isso é obvio, mas por se corromper e corromper o meio, sonegar informações, ou inflar outras, a tal ponto que boto em dúvida todo o passado histórico por ela narrado, e posso dizer sem medo que mesmo o impedimento de Collor de Melo foi sua indústria e atroz. A justiça que haveria de ser um porto seguro para esclarecer demandas, dúvidas, é questionada, se por nada, pela lentidão, meios escassos de investigação pouco eficazes, se mantendo herdeira de um passado pouco edificante, quando agia fora do processo legal contra os que discrepavam ou não se submetiam às diretrizes do poder estabelecido, sua ponta de lança, a PM, hoplitas modernos que matam antes e perguntam depois, e cospem sobre o cadáver para dizer: meu nome é Pecos!  Ao menos os Hoplitas se auto defendiam, enquanto a PM é paga pelo estado, e pelo que vemos, quem paga tributos é justamente o menos defendido por ela.

Sem se bastar, a coisa saiu da esfera do poder público indo mar adentro do mundo privado, corporativo, com suas simulações de CARFs, remessas de dinheiros não declarados, HSBC, Zelotes e por fim à sonegação pura e simples em escala Global…
A cena cômica é a de um senador da república, com seu dedo em riste apontado a seu nobre colega qual fulmina com um: Ladrão! Este mesmo acusador carrega nas tintas contra outro que o difama, e é nomeadamente também inexoravelmente partícipe de negócios milionários...
Nasceu em 1988, e não funciona.

9 de abr. de 2015

A Magrela.



    Na realidade, a primeira máquina que tive relações foi uma bicicleta. Alguém da família me a presenteou, era costume. Dei um nome à bicicleta, desde o primeiro momento, a magrela, por antonomásia e o nome persistiu. Assim aprendi a andar de bicicleta, mas não creio que tenha depositado nisso grande entusiasmo. Cheguei, as duras penas, a um ciclista pequeno. Não soube fazer qualquer filigrana nas rodas e manoplas, coisa quer era, lá por 1972, um sintoma de inteligência. No mais, a magrela tinha seus muitos inconvenientes. Não que tivesse partido a cabeça, ou gastado o nariz no asfalto, ou invadido o bar do Cipó, coisa que era, então, bastante comum. Não, andando de bicicleta jamais estiquei mais o braço que a manga, mas tudo somado me pareceu desagradável. A corrente sempre saia do pinhão ou da coroa, e se fosse numa subida, dava com os genitais no selim, depois com toda aquela dor, ainda havia de lambrecar a mão de graxa para voltar a corrente ao seu lugar, logo o pneu furava, lá longe, bem depois da Canta Galo, e com uma frequência escandalosa. E o freio? O freio, ou freava em demasia ou de menos e tocava tentar fazer a curva da casa do Belarmino a trocentos por hora, quando conseguia, porque se não, entortava tudo, raios, aro e a cara. Se não bastasse, descobri uma coisa que matou minhas ilusões: subir subidas em bicicleta era muito cansativo, além de não ser mais rápido que se fosse a pé. E como em Bonfim para se ir a qualquer lugar, se há de subir sempre uma subida, pareceu-me que a bicicleta não fazia nada por mim. Foi assim que a deixei.