29 de jul. de 2016

A importância de ser Mané.


(A importância de ser Ernesto)


Joana estava apaixonada por um português chamado Manoel. Viviam no primeiro andar, ao lado de um homem, ou uma mulher, cujo costume de deixar as janelas abertas a irritava. Como todas as manhãs se olhava no espelho, se lavava o rosto, media seu pequeno buço, saia sempre apressada ainda bebendo seu yakult. Tomava o circular, porque odiava conduzir. O escritório ficava a uns trinta quarteirões, mais ou menos. Na volta, aproveitava para fazer pequenas compras, jantava com Mané enquanto lhe contava coisas do seu dia de trabalho.
Nos momentos livres, reflexionava sobre a profundidade do oceano, que nenhum ser humano jamais viu, estranhava que se tivesse ido a lua, mas nunca ter ido ao fundo do Pacífico ou Atlântico; imaginava o mundo visto cada vez mais de longe, até que ela e Mané eram um ponto na cidade, a cidade um ponto na terra, a terra um ponto no sistema solar, o sol um ponto no espaço cheio de estrelas.
Lilian e Mané gostavam de ouvir música suave, bossa nova, e que fosse suave não era razão para que sua vizinha, ou vizinho, não se queixasse de qualquer modo, e o fazia com gosto. Outras vezes iam visitar suas irmãs em Pirassununga, ou comiam maçãs verdes.
Quarta-feira, recebeu um telefonema urgente no trabalho. Quem falava era uma voz feminina ou masculina, e lhe disse que havia escutado ruídos, e que ao que parece haviam forçado a porta e haviam entrado na sua casa. Ela, ou ele. Já se encarregara de chamar a polícia.
Então, Lilian correu, e nem sequer pode sentir o intenso cheiro de pão de queijo da padaria, nem saltar lajotas ausentes na calçada, nem sentir o calor exagerado que fazia no ponto de ônibus, que era um pau fincado, só lhe parecia uma coisa, o caminho era quatro vezes mais longo que sempre.

Já perto de sua casa, uns pedreiros almoçavam sentados na calçada, enquanto assoviavam e lhe dirigiam gracejos. Nesse momento começou a procurar no fundo da bolsa as chaves, mas se deu conta que a porta poderia estar arrombada, seu apartamento estaria todo aberto; foi quando divisou um policial e o senhor, ou a senhora, à espera na porta do edifício. Quiseram tranqüilizá-la, ela subiu as escadas de dois em dois degraus, e de cara o que viu foi que estava tudo remexido, a fechadura arrombada, e que sua habitação estava despojada de sua essência, Mané jazia no chão da cozinha. 

26 de jul. de 2016

Verte Pus a República.

Verte Pus a República.
O Tumor é de Castas.
Pústulas Malignas.
Feridas sem Sutura,
Insultos, Abismos
Abertos desde os Indígenas.
Sangue que se Esvai.
Tal Falaz Lacuna Impregna
de Desprezo as Almas
com Ódio ao Raciocínio.
Sem Entender a Profecia
de Profetas
da Guerra Contra Si Mesmo.
Terra Colorida de Iris Tintas
se Se Aboliu a Escravidão
ao Limbo da História
Por que Somos Escravos Fintas
dessas Inimizades Ilusórias?
Será que Algum Dia
Acenderemos o Sonhado Cachimbo?



25 de jul. de 2016

Hoje, olhando sua foto, me achei frágil,


Hoje, olhando sua foto, me achei frágil,
como um barco de folha de jornal n'água.
Enfeitiçado pelo ouro de seu cabelo vágil.
queria te violar como uma margem mágoa.

Com carvão assinava cadáveres no muro
imprimia palavras mesozoicas, extintas.
Palavras que regressam vivas, juro
asfixiando meu passado, sombras sucintas.

Ontem dormia na minha a tua mão
eramos cavalos impossíveis de atar
trotávamos por cima de nossa razão
beijava teus lábios salgados de mar.

Amanhã, perdido, pensarei teu braço pálido
relincho e esfrego no moerão até sangrar
navegarei no papel machê do jornal lido.
Haverá, quiçá braço desconhecido por singrar.

Não me resta mais presente, dó
parede pintada de umidade
desígnio do destino, voltar ao pó.


23 de jul. de 2016

Emagreça com Kant.

Emagrecer com Kant, pode parecer uma ideia de jerico, mas não é, além disso a sua prática nos torna mais éticos e livres. Em todo caso, e na verdade,  não se pode levar os fundamentos, os imperativos kantianos às últimas consequências, que senão o consumismo diminui e muito, e não sei o que aconteceria, caso isso acontecesse, e não sei se quero isso.
 Basicamente, Kant nos diferencia dos animais pela razão ( que é uma lei autoimposta)  e pela dignidade humana. Introduz para isso  o conceito de  Autonomia versus o de Heteronomia. Onde autonomia é fazer segundo a lei autoimposta que é a razão, e heteronomia é fazer pelo outro, pelos fins, ou uma inclinação – incluso você –  assim exige, indica, sugere. O problema, que na verdade é a solução da obesidade, entra aqui: ser autônomo é fazer o que você quer e é moralmente um dever   e não o que quer os desejos as inclinações e impulsos e instintos e os fins sugerem, exigem, indicam. É o ser racional e moral, em pleno gozo e uso da razão e da moralidade que diz “não” aos impulsos, instintos, aos fins animalescos que o habita.  Roberto Carlos está parcialmente correto ao dizer que … o que mais gostamos ou é imoral ou engorda. Na verdade engorda por imoral, assim todo gordo é imoral. A obesidade é uma imoralidade do ser. Atente para o fato de que exceções, neste caso patológicas, sempre estão contempladas em toda generalização.  Assim não há porque comer, se não se tem fome. Pode-se dizer e diz-se que estava agoniado, ansioso, mas isto já não é você, um ser racional e livre, diz sim, de um animal que foi abandonado – no ocidente, que não sei onde começa e acaba  realmente, há vários ocidentes – antes e com a tragédia grega, muito antes da Liga de Delos. Há uma ligação entre moralidade e liberdade. Há o dever que se refere à dignidade humana, assim devemos agir segundo este dever, e quando se fala em dignidade humana, é bom se lembrar do humano que cada um é. Assim devo respeitar a minha dignidade. E como humano e respeitador da minha dignidade e a dos outros humanos, me torno livre, e como ser livre não posso me sujeitar, por respeito a minha dignidade, aos apelos externos e internos do consumo imoral. Porque se uma barra de chocolate me sujeita, se uma cerveja me sujeita, um bibelô me sujeita já não sou livre. O importante é adiantar que ser moral pra emagrecer, diria Kant, se tratar de uma moralidade com fundamento hipotético. Não de todo boa. A Faço X para obter Y. kakakakk

22 de jul. de 2016

Viver

A morte é um final...  nada mais... por que então viver uma existência plana, rasa, serena, útil e funcional, seguindo como um animal a cenoura, cada vez maior, perfeita e suculenta que se nos põem à frente, para – que não seja tarde –  em dado momento perceber, que o mais importante da vida é justamente, com o nascimento, a poesia que se esperava ser, nada é mais prosaico, se o que se quer é viajar nas fronteiras dos próprios sentimentos, aonde se odeia e se ama desmedida e sem razão, e não ficar encravado nesta geografia construída, nesta bolha de ar sem ar...

18 de jul. de 2016

Wang-Fo

Wang-Fo

Naquele conto, o velho pintor Wang-Fo acabava de ser capturado pelo Imperador, que havia passado toda a infância e parte da adolescência trancado num quarto lotado de quadros do velho pintor; onde o então garoto havia descoberto um esboço do que para ele seria a maior obra do velho; Wang estava ali retido porque o garoto quando libertado, para se tornar Imperador, descobrira um mundo extremamente inferior ao mundo das pinturas de Wang-fo; agora exigia o termino do esboço, antes do cumprimento da sentença, a morte.


Wang-fo pinta um barco, e pinta Wang-fo dentro do barco com seu ajudante, pinta remos nas mãos de seu ajudante, pinta um mar, e pinta o barco indo, indo, indo e indo e lá longe pinta rochedos, e o barco se esgueirando por eles; o Imperador já não consegue ver o barco de Wang-fo já sumido por detrás dos rochedos e se libertando...