Como em cada vez que
me apaixonava, sentia naquele exato instante, o gosto do temor de
perde-la, da angustia, o sabor do luto que nascia exuberante dentro
do encantamento. Voltemos para a Canastra, disse, já afogado
nas lágrimas e moco que escorreriam e já se formavam
em suas fábricas em mim. Vá para o hotel que já
venho, tenho que passar no bar e comprar um cigarro. Liguei a
televisão e a estranhei, olhava pra mim e tentava me
encorajar. Desliguei. Deitei olhando o teto com seu ventilador
parado. Peguei um livro, já não sei a quanto tempo o
tenho aberto diante dos olhos. O silencio do hotel expõe suas
entranhas ruidosas, uma descarga, um salto perfurando o teto que
olho, e o salto o vara e se crava no meu peito, a lâmpada
idiota que ascende e apaga e não traz ninguém, noticia,
nunca tinha pensado que os moveis pudessem ser solitários,
mas estes são, um criado de cabeceira vazio, abro a janela e
a avenida é uma foto, aonde não corre o tempo, nenhuma
luz pisca, não pode haver movimento, nada mais passará
por ela, e acordo sentindo o frio de um velório. O bar se
fecha, saio pela avenida rumo ao hotel, posso ver minha janela
aberta, para que entrasse a fresca da madrugada, sem ter que ligar o
barulhento ventilador, pego um livro, adormeço e desperto com
o gosto de uma coroa de flores de velório, é o fim da
viagem. Fazer a barba, maquinalmente, juntar os cacos e comprar uma
coroa de flores.
12 de out. de 2015
Les vacances de monsieur Hulot.
Les vacances de monsieur Hulot.
O sol é de arrebentar mamonas, o corpo exige menos roupas, uma havaiana, uma camiseta cavada, um velho calção de banho, e seguindo, com mais poesia, os ipês já floriram em todas as cores, e latitudes, ouço um latejar, um pum-bum baticundum procurundum, em meio essa primavera verdamarelo sibipirunico, é verão. Os derrotados ainda não aceitaram a derrota, e nem vão. Não querem novas urnas, querem puxar o tapete, não querem concorrência, para o bem e o mal. Isso já me cansa, tento pensar uma filosofia das proximidades. Atento aos que vivem acerca. O ar que respiro, a casa donde vivo. O pedaço de céu que vejo de minha janela, o prato à mesa, o azeite, o pão e o café. O trabalho, ainda que não seja nada de outro mundo. O cotidiano repetitivo, não anódino, por certo, o recolhimento, o resguardo, e no entanto a identificação com tudo que está próximo, ainda que existam fatores dissolventes elementares, as doenças, e o ruído, e hostil como a violência em todos os âmbitos, ambiental, social banalizados. A banalização é o império que nos governa. Um dia o candidato haverá de dançar: na boquinha da garrafa.
Atrás desta contabilidade ficam os dias de férias. A beira mar, ao pé da Canastra. Potentes e vitais. De todos os aromas e sinestesias. 11 de out. de 2015
Sapato Velho, Chihara Shiota.
Sapato Velho, Chihara Shiota.
Umas botas com ponteiras metálicas. Um sapato de salto. Umas alpercatas. Andava convencido com cada um desses sapatos. Aquela fé indestrutível de adolescente nas canções que ouvia. Absurda bota com absurdo cinto afivelado. Necessidade patológica de expressão daquela rebeldia. Vestir uniforme para se sentir único. Não conservei nenhum desses sapatos que usava para arejar meu mundo interior. Me aferro a quase nada, senão que às memórias, e os recordo, não sem indulgência. Me aferrei mais a um brinco de argola em ouro que à maioria das bandeiras. E caminhei pelo mundo com a altivez de espantar medos paralisantes. Um dia, sem aviso, me dei conta do ridículo daqueles disfarces, que já não precisava e era eu apesar de tudo. Era visível sem eles. Mas houve sim um pequeno e portentoso ritual de passagem. Um dia num bar, disfarçado de sedutor, se acercou de minha companhia, um homem vestido de homem, careta. E todo mundo viu a minha insegurança, que brilhava mais que mil punhais de prata, eram as alpercatas, foi ali, em nenhuma outra parte do corpo, que senti fraquejar. A obra de Chihara Shiota, reclamou sapatos usados com história, não as tinha para enviar. A instalação de Shiota é uma teia de recordações, exibidos impudicamente, sapatos acompanhados de histórias como essa. Não fui ver, mas se fosse não leria as histórias, um tipo de pudor. Talvez, pelos sapatos que não guardei, mas com certeza, por saber dessa minha história, aonde já era o homem que queria ser, descalço, inclusive, nem por isso deixarei de seguir caminhando a gastar solas de sapatos.
7 de out. de 2015
Da Midia - Asfixiante Penitencia Imposta ao Livre Pensar.
Muitas vezes percebo
nas criticas, não só no antiPetismo, uma asfixiante
penitencia auto-imposta, da mesma forma que no passado se usou uma
estrelinha vermelha para se diferenciar no rebanho, hoje usa
esbravejar contra, já sendo o bastante, e como penitente não
percebe que a história do fetiche da estrelinha é que
nos trouxe ao de hoje, pelo vazio de quem a usava nesses termos. Da
critica de hoje asfixiante ao endeusamento da estrela fetichística
no passado, entre um e outro corre e correu um rio, que para navegar
ou nadar, há que se libertar dessa camisa de força e
ampliar as margens.
Há uma expressão
terrível que é a tal massa de manobra. Nunca gostei
delas, mas ela persiste apesar do meu paladar. E por incrível
que possa parecer, a massa de manobra não é a grande
massa popular, porque o povão é paquidérmico,
difícil de manobrar, e como o elefante dentro da lojinha com
qualquer movimento pode causar muito estrago. Portanto a massa
manobrável deve ser mais leve, é a vaca com sininho,
aquela que possa conduzir mansamente o rebanho, sem grandes
movimentos que possam criar problemas maiores do que os que se quer
resolver.
A esquerda pré
PT e Petista, antes do poder, bem que tentaram trazer para o palco
tal paquiderme, afinal, nada se tinha a perder. No entanto, mesmo o
PT lulista, e é o que entrou no poder, soube se livrar da
grande massa, no que diz respeito aos movimentos. Um exemplo de massa
de manobra é aquela das diretas, que com duas ou três
palavras de ordem volta para casa cabisbaixa. O exemplo quase oposto
é a massa enfurecida dos movimentos de 2013, disse quase, pois
ao final viu-se que eram comandadas eletronicamente, e bastou clicar
em algum botão e ela também se escafedeu, mas já
demorava-se mais do que quem a planejara esperava que demorasse.
Outro exemplo de massa de manobra é a do Fora Collor, aonde
se inventou a grife dos caras pintadas, repercutindo sobre ela
mesmas, as imagens televisivas ajudavam a se auto-encher como um
balão, um certo tipo de patrocínio.
O “Fora Collor”
foi bem mais do que isso, foi o balão de ensaio dos Mídias
no exercício de Bloco Oposicionista. O que não é
novo, se historicamente existe o senhor Lacerda. Temos tradição
de políticos que nasceram nestes meios. O rádio já
forneceu uma dezena de candidatos a prefeitos em cidades grandes do
estado de São Paulo, só para constar, o prefeito atual
de Campinas Jonas Donizete, e a prefeita em segundo mandato de
Ribeirão Preto Darcy Vera nasceram nas ondas medias e curtas.
Você se lembrará de tantos outros com certeza. É
notória, a força das mídias faladas e
televisivas por toda parte, creio, mas sem precedentes como em nosso
país.
Penso que
juridicamente, o PT não tem defesa. Como não têm
qualquer outra agremiação partidária que tenha
assumido o poder ou está nele como o PSDB em São Paulo.
O caixa dois é fundamental, até agora, para a
sobrevivência dos partidos, tal como é nossa lei
eleitoral hoje. Mudar essa lei drasticamente é impossível,
democraticamente, e mesmo uma pequena Constituinte para isso não
a mudaria tanto, porque é certo que deveria apear do poder
muita gente em todos os partidos. Que ao fim e ao cabo não são
partidos, a maioria, não têm qualquer ideologia, a não
ser a de se chegar ao poder. Há vários exemplos de
eleições aonde o regime é parlamentarista, que o
um partido obtém certa vantagem nas urnas, mas não
consegue formar um governo, não consegue que outros partidos o
apoiem, por diferenças ideológico-partidárias.
No âmbito partidário o que temos é esse
posicionismo, não importa quem é ou venha ser o
governo, estarei com ele.
No governo FHC os
bancos houveram-se com a globalização rapidamente,
foram os primeiros a crescer ou desaparecerem, FHC fez o PROER , no
entanto abriu a porteira para o capital externo, quem pode cresceu,
quem não pode foi engolido.
Outras áreas
privadas de produção nacionais também sofreram
com a globalização, empresas familiares foram engolidas
vivas, como a Metal Leve, para que conste um exemplo. Assim como
tantas empresas públicas foram entregues ao capital externo.
Sem tecer juízo de valor ao fato.
Mesmo o futebol passou
por isso e ainda sofre. O setor calçadista, que hora se
recupera.
A bola da vez é
a Mídia. Ou cresce ou desaparece. Os capitais globais
mediáticos a reclamam. E havemos de convir que são
muito poderosos frente aos capitais mediáticos nacionais,
mesmo a Globo é café pequeno, frente aos gigantes das
comunicações. É o que está em jogo. Num
momento em que o PT acena com uma regulamentação. E
como defesa ela pretende um governo que a proteja desse ataque
externo. Ainda que custe a nossa recente democracia.
6 de out. de 2015
Manual do Sexo Manual. parte x.
Manual do Sexo Manual.
A Humbert Humbert não
passava pela cabeça ser um criminoso. Muito menos por aquilo
que mais lhe dava prazer. O sexo. Estudante de uma faculdade
periférica de um curso idem, do campus da Medicina da USP. No
busão lotado de juventude e libido os olhares se cruzavam, se
procuravam e se encontravam, se desviando de outros, de soslaio, e os
corpos se chamavam, se buscavam se encostavam, as curvas, as formas
arredondadas, pontiagudas, se sentiam, se ajeitavam. Humbert se
acasalava. De fato haviam se escolhido. Tudo começou por um
olhar, estavam distantes e foram se aproximando. Era muito fácil
avançar, mas Humbert Humberto esperava. Ela, por fim, se
desvencilhara de uma amiga, fazia o mesmo com a bolsa tiracolo, um
meneio de cabelos e estavam colados. O percurso não era longo,
e em todo ele atados. Por fim ela descia. Nem um olhar. Nada. Em
outras situações parecidas, Humberto Humb havia
sussurrado algo ao ouvido, e tudo ruía. Então com Lole,
é assim que a chamava de si para consigo, Lole, seria
diferente. Mudava a momento de entrar no ônibus, para se
assegurar do desejo dela, e se punha adiante dela, e ela vinha
sorrateira, e de repente, estavam lá. No refeitório, a
buscava, mas ela não o via. Os olhos dela o varavam e não
o viam. Certa vez, a encontrou numa festa. Pensou em falar-lhe.
Desistiu. Esperava ao menos um sinal, e nada. No dia seguinte, já
um tanto entediado, resolveu entrar a tempo de conseguir um lugar
sentado e acabar com aquilo. E lá foi, fez isso, sentou.
Passado uns minutos o ônibus parou no ponto em que ela subia.
Ela subiu. E não tardou muito para ela estar esfregando no
ombro dele o objeto desejado. Era uma nova posição.
Naquele dia ela levava jeans. No dia seguinte ela vestia minissaia.
Humb Humberto passava sua mão por dentro de sua camisa, até
alcançar o ombro, e com a mão invisíveis
tocava-lhe com suavidade.
Do Futebol.
Do Futebol.
A filosofia do futebol
é a dialética.
A tese é de
Parmènides. O que é, é.
A antítese é
de Heráclito: O porco se alegra com a lama.
A síntese é
tripla:
Um a de Tim Maia:
Futebol é futebol, outra coisa é outra coisa.
Dois autor
desconhecido: mas parmenídica: O ser é redondo.
Três (como também
desconheço autor) digo que é minha: A verdade é
esférica.
Aos Mestres Com Carinho.
Já olhou os
olhos de um grupo de 30 a 40 crianças ou adolescentes por
quase uma hora, seguidamente? Se não é o caso, nunca
foi professor. Mas, imagina o que deve ser um mestre?
Pense que você é
um médico, advogado, um vendedor, um balconista, e que tenha
o consultório, o escritório, o balcão cheio,
vazando pacientes, compradores, usuários, clientes, cada um
com suas necessidades, capacidades e interesses... diferentes. É
de bom augúrio lembrar que alguns não têm a
minima intensão, vontade de estar ali e que ainda uns tantos
façam um certo rebuliço, e você está só,
sem nenhuma assistência e os tem de atender a todos e ao mesmo
tempo, e com profissionalismo, e até certo ponto com algum
grau de excelência. Tudo juntado com mais essa: cinco dias por
semana e nove meses do ano, e muita das vezes oito vezes ao dia. Como
seria um médico tratando dessa maneira, ou o advogado, o
balconista, o vendedor? Pois assim seria o exercício aparente
da docência em classe.
Disse aparente, porque
a tudo isso tem que se somar, que um professor, seja qual for o
âmbito educacional do seu exercício, há que
preparar aula. Não é como o ser pedreiro, que uma vez
que se saiba levantar paredes e todas sobem da mesma maneira. Cada
grupo de alunos é diferente. Cada aluno individualmente tem um
ritmo e necessidade particular. Preparar o material escolar, manter
o consenso nos critérios de avaliação com os
colegas de trabalho, as adaptações curriculares, a
metodologia especifica que cada grupo requer, ainda pensar nos casos
individuais. E no fim, à noite e durante os fins de semana,
preparar as aulas – já que não há tempo de se
fazer durante o horário de trabalho, já que nestes
momentos há que se dar aulas - corrigir exercícios,
preparar exercícios, preparar e corrigir provas. E também
fora do horário de trabalho – já que os país
não querem perder um dia de trabalho para falar dos seus
filhos – atender as famílias...
Quem não é
capaz de imaginar tudo isso, também não se dá
conta da responsabilidade que se põe, aos professores, saber
que os proprietários dos olhos que os olham não se
fixam apenas nas palavras, signos, equações da lição.
É que se trata de um mestre ele inteiro, uma lição
cada um dos seus gestos, cada olhar seu. Ensina com o que diz e
exemplifica com o que é, como uma vela que se consome enquanto
ilumina o caminho dos outros. É justa compensação
que têm? ...
O que posso dizer-lhes
é que, os olhos que os olham, um dia e outro mais, enquanto
vocês, os mestres, envelhecem, renovavam-se a cada ano na sua
juventude.
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