23 de abr. de 2015

Me chamo Aristóteles.



Sou de boa família, já que meu pedigree está nos mais importantes registros de prosápia e premiada ascendência. Ora, também vivo numa casa de categoria, ao menos em aparência. São gentes com estudos, com responsabilidade, com renda, com patrimônio e ostentam um lugar proeminente na sociedade. Ademais, souberam me acolher nesta casa como um dos seus. Gozo de privilégios que muitos seres humanos não podem nem tão somente sonhar. Por consenso me batizaram com o nome de Aristóteles e eu, ufanoso, passeio pelas ruas e praças da minha cidade, mas desgraçadamente me faz mal quando me gritam em voz alta, já que algum possa me identificar como aquele que suja desrespeitosamente a nossa vila. O meu dono não recolhe os frutos das minhas necessidades básicas, me tiram de casa para passear, orgulhosos de minha estampa, empatia e também para evitar que suje a casa, pois não consideram o restante da vila como casa nossa, também. Se tivesse mãos e me dessem tempo e possibilidade os enterraria, como a minha família me ensinou desde pequeno. Quando os meus irmãos e eu nascemos, a nossa mãe comia tudo para não deixar rastro. Fui educado e por isso provei de fazer ver a meu dono que há de se recolher as minhas merdas, por respeito aos demais, e eles mesmos, pela saúde de todos os humanos e dos meus congêneres e, especialmente para evitar os olhares de menosprezo e nojo. Depois de cumprir com a natureza, procuro ficar ao lado das merdas, e olho meu dono com meu olhar mais suplicante e nada mais que um estralo de cinta e uns passos apressados são suas esperadas respostas. Então continuo até nossa casa com a cabeça baixa e com o sentimento de haver sido traído por quem me acolheu, um dono que não me merece.

Está provado que ter um amigo como eu em uma casa melhora a saúde, a felicidade e o bem-estar de toda a família, e está demonstrado que até riscos de infartos diminuem consideravelmente. Agradeço ao Cidão por escrever por mim esta desculpa pública, na qual os mostro a minha mais sincera vergonha e impossibilidade de cumprir com a norma elementar de civismo. Respeitar os demais na saúde e liberdade para desfrutar da cidade.





20 de abr. de 2015

As Abelhas.

As Abelhas.


As abelhas operárias fabricam o mel. Mel que é usado dentro da colmeia. O apicultor colhe o excedente.
Para o apicultor o que interessa é o mel. No entanto, para fazer o mel as abelhas operárias precisam ir de flor em flor para buscar a matéria-prima, o néctar. E nesse ir e vir de flor em flor, polinizam, gerando frutos, que sem a polinização não apareceriam. Quer dizer, para gerar o produto há um trabalho, e para poder fazer este trabalho, faz um outro trabalho. O que seria o produto principal do seu trabalho, o apicultor retira o que seria a mais-valia, o mel. Já do trabalho para trabalhar, nada lhe resta. Quando escrevo isso, trabalho, trabalho para inúmeras empresas. A Facebook é uma delas, que retira desses meus enunciados algo de lucratividade, na rede social estamos polinizando flores, que geram frutos, dos quais nem temos a menor ideia, nem vagamente.


Essa historinha, com as alterações que precisei fazer para a analogia, foi contada numa palestra que assisti, e era de um terceiro, um sujeito francês, que não me recorda o nome, nem para procurar no google.       

A Peste.



No dia 16 de abril, o doutor Rieux caminhava pela galeria de entrada do edifício, procurando as chaves antes de subir para o seu apartamento, quando viu surgir no escuro do fundo do corredor uma ratazana de bom tamanho, toda molhada, que se arrastava sofregamente. O animal parou, em busca de equilíbrio, e começou a correr em direção a Rieux, num golpe para, deu uma cambalhota e caiu, ao fim, lhe saia sangue pelo nariz. No dia seguinte, as oito da manhã o porteiro parou o doutor quando este saia, para dizer-lhe que algum engraçadinho, malintencionado, havia botado três ratazanas mortas ao meio da galeria. Deviam as ter caçado com ratoeiras muito fortes, porque estavam cheias de sangue. O porteiro esteve bom tempo atrás da porta, com as ratazanas penduradas pelas patas, esperando que os culpados se manifestassem, com alguma trapaça. Mas não aconteceu nada.
Essas são as primeiras referências à epidemia de ratazanas mortas com que começa a novela A Peste, de Albert Camus. Os habitantes da cidade de Oran não sabiam que as ratazanas, em vez de morrerem nas ratoeiras, escolhiam morrer em plena luz, nas escadas, nas entradas das casas, e no meio da rua. Rapidamente as ratazanas mortas seriam incontáveis, centenas, milhares… depois das ratazanas, morriam as pessoas….




O primeiro parágrafo é uma tradução literal, que é de minha indústria.  

Vamos abortar.

Vamos abortar.


O modelo do Estado brasileiro, surgido da Constituinte de 88 está sangrando desde lá. Nenhuma das instituições criadas ou reformadas, esteve fora de suspeita, aos olhos dos cidadãos, sequer ele, desde seu advento. O desprestigio da política, acompanhado dos escândalos pessoais de membros destacados de todas, todas as instituições, desde a presidência aos mais mequetrefes prefeito e vereador da longínquas comarcas como a de Manga, na divisa da Bahia-Minas, passando pelos cargos de confiança e servidores com cargos de responsabilidade, parecem não ter fim. Não é de mim pensar a política pela ótica da corrupção, no entanto, me tomo de espanto quando me dou conta, que mesmo os meios de comunicação social - a Mídia - não por ter ideologia, porque isso é obvio, mas por se corromper e corromper o meio, sonegar informações, ou inflar outras, a tal ponto que boto em dúvida todo o passado histórico por ela narrado, e posso dizer sem medo que mesmo o impedimento de Collor de Melo foi sua indústria e atroz. A justiça que haveria de ser um porto seguro para esclarecer demandas, dúvidas, é questionada, se por nada, pela lentidão, meios escassos de investigação pouco eficazes, se mantendo herdeira de um passado pouco edificante, quando agia fora do processo legal contra os que discrepavam ou não se submetiam às diretrizes do poder estabelecido, sua ponta de lança, a PM, hoplitas modernos que matam antes e perguntam depois, e cospem sobre o cadáver para dizer: meu nome é Pecos!  Ao menos os Hoplitas se auto defendiam, enquanto a PM é paga pelo estado, e pelo que vemos, quem paga tributos é justamente o menos defendido por ela.

Sem se bastar, a coisa saiu da esfera do poder público indo mar adentro do mundo privado, corporativo, com suas simulações de CARFs, remessas de dinheiros não declarados, HSBC, Zelotes e por fim à sonegação pura e simples em escala Global…
A cena cômica é a de um senador da república, com seu dedo em riste apontado a seu nobre colega qual fulmina com um: Ladrão! Este mesmo acusador carrega nas tintas contra outro que o difama, e é nomeadamente também inexoravelmente partícipe de negócios milionários...
Nasceu em 1988, e não funciona.

9 de abr. de 2015

A Magrela.



    Na realidade, a primeira máquina que tive relações foi uma bicicleta. Alguém da família me a presenteou, era costume. Dei um nome à bicicleta, desde o primeiro momento, a magrela, por antonomásia e o nome persistiu. Assim aprendi a andar de bicicleta, mas não creio que tenha depositado nisso grande entusiasmo. Cheguei, as duras penas, a um ciclista pequeno. Não soube fazer qualquer filigrana nas rodas e manoplas, coisa quer era, lá por 1972, um sintoma de inteligência. No mais, a magrela tinha seus muitos inconvenientes. Não que tivesse partido a cabeça, ou gastado o nariz no asfalto, ou invadido o bar do Cipó, coisa que era, então, bastante comum. Não, andando de bicicleta jamais estiquei mais o braço que a manga, mas tudo somado me pareceu desagradável. A corrente sempre saia do pinhão ou da coroa, e se fosse numa subida, dava com os genitais no selim, depois com toda aquela dor, ainda havia de lambrecar a mão de graxa para voltar a corrente ao seu lugar, logo o pneu furava, lá longe, bem depois da Canta Galo, e com uma frequência escandalosa. E o freio? O freio, ou freava em demasia ou de menos e tocava tentar fazer a curva da casa do Belarmino a trocentos por hora, quando conseguia, porque se não, entortava tudo, raios, aro e a cara. Se não bastasse, descobri uma coisa que matou minhas ilusões: subir subidas em bicicleta era muito cansativo, além de não ser mais rápido que se fosse a pé. E como em Bonfim para se ir a qualquer lugar, se há de subir sempre uma subida, pareceu-me que a bicicleta não fazia nada por mim. Foi assim que a deixei.

29 de mar. de 2015

Corrupção criativa, Fotografia.

Corrupção criativa.
fotografia de Qin Yuhai. Ebb and Flow.

Estamos carecas de saber da corrupção que endêmica e institucionalizada permeia nossa sociedade. Construtora que cria projeto, paga propina a legislador e executivo para construir. Assim de fácil.
Qin Yuhai, chinês de seus 50 anos, filiado ao partido comunista chinês, e converteu-se numa das principais personagens políticas da província de Henan. À sua vocação politica unia o interesse pela criatividade, por meio da fotografia, até o ponto que algumas fotos suas estão nos paineis do metrô de Pequim, pessoa de destaque na Associação de Fotógrafos da China. Suas exposições, em especial, uma em Londres, tinham, ou têm?, crescente valorização. Quem quiser pode ir ao Google e completar a pesquisa.
O caso é que este ano, Qin Yuhai foi exonerado por uma comissão que luta contra a corrupção. A acusação genérica era a que Qin dedicava um tempo excessivo à sua arte, a fotografia, e pouca atenção às suas funções oficiais. Pombas! Podiam dar uns croques nele e o reconduzir ao cargo, mas não, o assunto era mais complexo, Yuhai aceitava subornos, como dizer? Fotográficos. Quer dizer, concedia privilégios em troca de materiais e outros detalhes relacionados. Por exemplo, uma empresa que conseguiu um contrato para promover o turismo na montanha Yuntai, o presenteou com 25 máquinas fotográficas no valor de 179.000 dólares, depois a mesma empresa lhe comprou um álbum com fotos suas por 270.000 dólares. Uma outra empresa gastou 1.000.000 de dólares promovendo a sua obra na China e no estrangeiro… e por ai vai.
O caso é que por aqui sempre apareceria um advogado, e, com certeza, chamaria a isso de mecenato. E esse mecenato, pouco forçado, é claro, contribuiu para que a obra de Qin, um artista genial.

Ebb and Flow, em Londres. Aqui entrevistas e fotos de Qin Yuhai.

Penteando Macaco

Penteando macaco.


O Estado, a Iniciativa privada e as Universidades contam com organismos que realizam pesquisas, estudos de opinião, com custos estratosféricos, para nos comunicar quais são as nossas preocupações. Será que é necessário? Sei perfeitamente o que e o quê de minhas preocupações. Asseguram, estes custosos estudos e pesquisas, que nos preocupa e muito a corrupção, e também a educação, a caristia, o dollar, o pib… Devem servir, creio, para nos explicar. Isso, nos explicam. Isso, mesmo, nos explicam a nós mesmos o quê de nós. Nosso comportamento contraditório e suas razões ocultas, i.e., as razões ocultas do nosso comportamento contraditório nas eleições, por exemplo. Mas me pergunto, sempre consternado, qual a utilidade deles, os estudos, as pesquisas. Principalmente se sabendo que a maioria dos cidadãos dão, a estas pesquisas, respostas falsas, com a solenidade de uma continência militar. Senhor! Sim Senhor! Enquanto os calcanhares batem. Se pergunto a um corrupto se lhe preocupa a corrupção, ele responderá que sim. Qual das duas razões devem se encaixar nas suas preocupações? Que não o descubram ou uma segunda, que os corruptos são os outros. Se pergunto a um casal, se lhes preocupa a educação, sim, sim, sim, sem educação um país .. e blá, blá e blague. E a maioria absoluta e em primeiro turno vota num partido que está a vinte anos à frente do Estado, com fortes indícios de corrupção, de péssimo sistema educacional.