7 de mar. de 2015

dA Hipocrisia, dO Farisaísmo, dO Fingimento

Uma das ameaças mais elaboradas e repetidas pelo Estado Islâmico diz textualmente: “Tomaremos Roma, quebraremos suas cruzes e escravizaremos suas mulheres com a permissão de Alá”. Não deve passar batido que conquistar Roma, dito pelo autodenominado califa Abu Bakr-al-Baghdadi, queira dizer a vitória final contra os infiéis, e tal como vão as coisas da guerra contra o EI, não me estranharia porcaria nenhuma, que a profecia se faça realidade ao longo deste século. Os analistas deste fenômeno nos avisam que os jihadistas não estão interessados em petróleo ou diamantes, senão as almas dos homens.
É fenomenal e seus detratores tentam resolver os problemas à base de silogismos éticos e axiomas sociopolíticos. Enquanto milhares de jovens pelo mundo se alistaram aos exércitos do EI para lutar na Síria e no Iraque e praticar as selvagerias horrorosas que temos visto. Fico com umas perguntas: O quê estes recrutas receberam do Estado Democrático de Direito e de Bem Estar Social? O quê aprenderam no nosso sistema escolar? O quê assimilaram dos direitos e liberdades? Quem lhes facilitou ou impediu a integração? Por que não encontraram no mundo ocidental os modelos de convivência, onde foram criados e educados? Nenhum tipo de ideal, de fé, de horizonte, de possibilidade de levar a termo algum projeto de vida? Que modelo pode ser a nossa sociedade, se recheada de corrupção, de dupla moral, incapazes de frear o abismo aberrante que se agiganta entre os ricos e os pobres, incapazes que somos de pôr fim a essa tortura , a essa violação, a essa ignomínia contra os mais fracos? Querem exemplos?

A Hipocrisia, o farisaísmo, o fingimento são termos inventados, praticamente, no nosso mundo ocidental, aonde mais se pratica, e mais tradição se criou, e mais adeptos teve e tem. Tanto que mais ou menos se tornaram virtudes., e na maioria dos casos, estratégia, um mal menor, para evitar o mal maior. Os jihadistas não se inspiram unicamente nas suras do Alcorão, pois há um catálogo em papel couché e com imagens de exemplos na nossa história, remota e recente. Façam as contas. 

6 de mar. de 2015

Senha



Não sei quem não está, mas sempre estou precisando de dinheiro. Fui onde o dinheiro está. No banco. Aliás, na Caixa, no novo Shopping, que é onde minha conta estava. Não está mais. Na minha frente uma grávida. Há uma mocinha que faz uma triagem: Que deseja fazer? Não ouvi o resto, ela tomou da senha e passou pela porta giratória. Fui logo atrás. Senha C 567. Nos separamos. Sim “sem marcação” . Nestes tempos, notei que a Caixa tem todos os tons de Grey. Do azul ao branco, olho meu RG, já descolorido ele também, pelo passar do tempo. A fila foi trocada pela dança das cadeiras. A moça grávida foi para as cadeiras da esquerda, estou nas cadeiras da direita. Ninguém marcou hora. Tanto faz. Tudo conflui no mesmo tíquete, uma letra e um número. Há muitas cadeiras, mas não estranhe não encontrar vaga. Não dá para ler, ou curtir um facebook, não se pode distrair-se. A tela de TV vai passando os números. Não é uma sequência simples, numérica, diria que é alfanumérica, o que não permite calcular o tempo de espera em função da distância da cifra luminosa e a do teu papel. Aqui o 51 pode vir antes do 11, segundo a letra que tem à frente. E todos pendentes daquela tela triste. Hipnotizados. Há um casal com um carrinho de bebê. Sempre há carrinhos de bebê. Uma moça que dá de mamar ao rebento, aproveitando o tempo morto. Um garotinho corre pelo salão, fazendo vento, cansado daquele silêncio tenso e insano. O bebê do carrinho de bebê dorme placidamente. A mãe chora. Discretamente, mas chora. Usa um lenço, que uma vez vi usar minha psicanalista, um triângulo às costas, que serve de dique colorido para frear as lágrimas furtivas. Penso em dar-lhe meu lenço, mas temo que não gostaria que haver sido descoberta. Chega o seu número e sua letra é um tipo de céu, do jogo de amarelinha, e se vão para um outro número. Desaparecem do meu campo de visão, espero que tenham outras cadeiras. Torço. Melhor. Fez me muito mal vê-la naquele estado de desesperança. Um cumprimento inesperado, um artista plástico da cidade, premiado, publicado. Sem perder de vista a tela da TV, falamos e rimos, sobretudo rimos. Passamos um tempo no século XIX. Não descartamos escrever a respeito. Chega a minha vez, vai lá diz ele, nisto a moça grávida, Renata, interpõe-se! Diz que foi num lugar que lhe disseram lá não era, e que era aqui e que não precisaria enfrentar outra fila. Sra.? Renata! Pode ir antes de mim! Recebi minha senha de volta, voltamos a papear. Logo ela também se foi. O amigo me disse: Espere no café, vamos tomar um café! Sim ? Não, meu caro, creio que há um excesso de fluorescentes, e sempre que saio destes lugares irreais, o mundo me parece mais amável e luminoso. Tecnicamente é um banco dentro de um shopping. Mas para mim é uma granja.

24 de fev. de 2015

Coisa Nossa


Coisa Nossa.
Paulie Gatto escolhe dois homens a soldo da família Corleone e os dá instruções precisas: Nada de golpe na cabeça – na cara sim – para evitar a morte das vítimas. Mas no que diz respeito à boca do estômago, têm liberdade de ação. Outra coisa: Se os castigados saírem do hospital antes de um mês, perdem os favores da organização.
Gatto é capodecime, tem dez homens, como os antigos decuriões romanos e recebeu o mandato diretamente de Clemenza, um dos caporegimes comissionados cuperiores, o qual ao seu turno, está atado ao comando do consiglieri, no caso Tom Hagen. O conselheiro é o único de toda a organização a que Don dá ordens. Este é o esquema, a estrutura do clã mafioso, presidido por Vito Corleone, The Godfather de Mario Puzo. Uma grande família onde os laços de sangue se misturam aos de amizade formando uma pirâmide de fidelidade garantida pelo proveito pecuniário, o interesse comum e a necessidade de segredo. Tudo se sustenta por vínculos de lealdade e medo. A lealdade vem do sangue e o afeto, por isso todos os clãs praticam o nepotismo e os lugares principais da organização são da família, irmãos, filhos, cunhados e genros do capo. E onde não há este vínculo, existe o medo: a traição se paga com a morte e com o extermínio da família desleal. Para garantir, afinal, existe a omertá. Lei do silêncio. Se um ''soldado'' da organização, que é quem comete os assassinatos ou as ilegalidades, ao ser detido pela polícia, permanecer calado, sua família será protegida, sua mulher continuará a receber o soldo, e ele, ao sair da prisão, será recebido com todos os louvores e honrarias.

O Poderoso Chefão, o padrinho, o Don, o chefe da organização, jamais será preso. Entre ele e os executores de suas ordens há muitos elos, se um falha, elimina-se. O Don, da mesma forma que os imperadores romanos, só caem por uma conspiração interna ou por traição ou denúncia do seu consigliere, a sua pessoa de confiança, a sua mão direita. Só neste caso, o Don poderá dizer como Júlio César diante dos que o apunhalavam nas escadarias do senado romano: “Até tu Brutus, meu filho?”

15 de fev. de 2015

Oitavo dia.

Oitavo dia.


Ele foi para um bar na rodoviária, que era o único que não fechava, e por vezes o sol saia no meio das trevas, fez-se o pequeno ajuste. O esforço fora imenso, dar vida à Terra, ao rio, ao mar, os pássaros... Necessito mais anarquia paisagística, pensou, mais sombras... deve ser uma questão de origens... girava no tamborete e a visão do mundo... a falta de humor em diferentes cores, a insistência do chinês em sua tese repetida com apresentações diferentes a cada dose de cachaça... tudo é excessivo, mas é mesmo um grande engenho, com o qual poderia recriar seu próprio espírito, mais agudo, tirar peso das preocupações. Cheguei ao extremo, mas não fiz falar as árvores, nem os animais conversassem com pessoas, ou que rissem, nem fiz que os pássaros falassem, para que não brigassem em pleno voo... Ah! Está bom assim!

Plagio.

Plagio.

Os escritores de hoje querem ser originais, e todo mundo sabe que a originalidade é materialmente impossível. Há nesta obsessão, nesta ideia fixa, um ponto de hipocrisia que o atual sistema econômico deu a nossa vida social. Jamais o plágio foi considerado coisa criticável. Hoje é. Porque o escritor que o faz é considerado pelos companheiros como um homem que quebra as leis da cavalaria comercial. Cervantes foi o maior, plagiou todos os romances de cavalaria de sua época, sem contar o ''estilo''. Mas o argumento é inútil, já que se compreende que a única sina de um escritor é plagiar, e se demonstra com isso se tiver sobre o seu ofício umas ideias tão claras e seguras, que por força vencerá sempre os seus suscetíveis companheiros. Os antigos não faziam outra coisa senão plagiar-se mutuamente e sem trégua. E se o faziam, por que não podemos fazer? Não pode haver, me parece, algo mais agradável para um escritor sentir-se plagiado. No entanto, hoje, e em todos os ramos artísticos dominam ideias contrárias, e quem dá o tom são os ''coxinhas'', classe médias, analfabetos que sabem ler e escrever.
Essa é a degeneração geral a que chegamos, sem paradeiro, para constar e demonstrar a insanidade da literatura atual, não se encontra em lugar algum, algum troço digno de ser plagiado.

Eu procuro este troço faz tempo e por todos os rincões, e não encontro nada. Tudo é monotonia e dum tédio pantanoso, e eu, particularmente, nasci com pouca força para empreender um plágio de uma obra antiga, de um clássico. Sou obrigado, como os outros, a ser um terrível e desenfreado original. É não resta dúvida, lamentável e revoltante... 

13 de fev. de 2015

Famíliona


Familionã.

Casarei comigo Eu
Como filhos da mãe a mesma
Incesto, canhestro, a esmo
Economizaremos roupas e anéis
Chantilis e morangos
Gastaremos palavras palmas bem molhadas
Vinhos, cervejas, cachaças, cuspe e um bombom de rum
Camisas da Vénus! A incerta? Nunca!
Nem as dos dias seguintes
Nos livraremos de deputados e das putadas
Do congresso, da súmula,
Quê simula o STF?
O tabelião não verá um tostão
O gato fica pra mim,
se você morrer.
Já se eu morrer,
O gato fica sozinho.
Não tripudiaremos sobre cadáveres
A menos que deem vida a esses girinos,
Sa meleca
Que sem testemunha e
Se lavo bem a unha
E troco de cueca!




Plim! Plim!



Sortudos que somos,
tudo se demonstrou
que tudo, amanhã, será
bem demonstrado.

Nem molina nem peritos.
Não farão laboratórios,
papagaiada de periquitos
com ou sem repertórios
nem falatórios de sabujas.
Porca, gritaremos
chulas palavras sujas
para limpar esses nojentos
estes sábios fedorentos.

Sorte a nossa, se demostrou
que amanhã tudo será
demonstrado.

Estamos fartos de sabedorias
que no fundo, basbaquices
nos fazem crer teorias
nada senão manias
e disfarçam suas cagadas
pondo a culpa na manada
com plin plim de fadas

mas sorte nossa sorte
é que tudo se demonstrou
que amanhã se mais tardar
será bem demonstrado.