Dormira
pouco. O dia seguinte se casaria a uma hora absurda, haveria outras
noivas e mais importantes. Com um vestido de passeio, que
aproveitaria em outros proveitos. Ao fim da cerimonia convidaria uns
quantos para o churrasco no quintal de casa. Quinze para a uma da
tarde findava a festa. Sabia que uma moça como ela não
podia aspirar a mais. Inda mais que os trinta estavam ali a dobrar a
esquina. “Não sonho acordada”, se repetia. Se bem, que
quase, quase. Aqueles dois palmos de véu, negro, lhe davam uma
penumbra acolhedora. Nem queria pensar, mas o brilho do sacrário
á sua frente iluminava um futuro impossível. Se este
pequeno armário não estivesse pintado com uma fina
camada de ouro, ela seria uma noiva de branco. O canto dos lábios num fremir leve e brincalhão. Com vestido de noiva
e tudo.
Festa de buffet no salão social do Bonfinense. Tudo e tudo e mais um. Tudo tão absurdo que reprimiu a vontade de rir.
Talvez chorar. Tempos atrás, noivara com o filho do dono da
venda. O mais velho. Fazia a inveja de todas as amigas. Não
era nem um Marlon Brando, mas ela tampouco Sophia Loren. Aquele
rapaz, “pouca coisa mais velho”, dizia, era a porta de saída
da miséria. Desembrulhou com suavidade o papel que protegia
seu parco enxoval. Ela mesma o havia bordado, quando mais jovem,
quando ainda não sabia com quem compartilharia aqueles
lençóis. Alguém batia à porta. Eram dois
rapazes, os irmãos mais moços de seu prometido. Não
aceitaram café. Nem a pinguinha que seu pai ofereceu. Tinham
mais o que fazer. Disseram a ela que seu irmão mais velho não
estava capacitado para o casamento. Soltaram a bomba H e se
despediram, educadamente da cunhada, que jamais seria. É de se
supor que os irmãos foram mais explícitos com o seu
pai, que os acompanhou da soleira á porteira. Devolver o anel
era feio? Mas não podia ficar com ele. Não queria. O
derreteu. Ali o tinha, à sua frente, enquanto casava com um
outro, a recordar-lhe que esteve a ponto de tocar com os dedos uma
vida melhor, e disse: sim. Tampouco tinha outras opções.
A recordo velha. Enlutada da cabeça aos pés.
Silenciosa, discreta. Indo à igreja com um balde de plástico
cheio de flores. Umas rosas abertas que não combinavam com
aquela cara triste e pálida. Fico a perguntar a quem as
oferecia.
11 de mar. de 2016
10 de mar. de 2016
O Estado, Vargas e Grande Sertão Veredas.Pra quê? Deixa : bobo com bobo – um dia, algum estala e aprende: esperta. Só que, às vezes, por mais auxiliar, deus espalha, no meio, um pingado de pimenta... gsv
Pra quê? Deixa :
bobo com bobo – um dia, algum estala e aprende: esperta. Só
que, às vezes, por mais auxiliar, deus espalha, no meio, um
pingado de pimenta... gsv
Se um dia houver um
Estado ótimo, quer dizer no limite de sua eficácia e
eficiência, seria péssima noticia para os seus
concidadãos, concernente à liberdade. O brado é,
por um lado: Menos Estado, por outro: Estado Eficaz e Eficiente.
As perguntas que
proponho e tento responder são estas: Liberdade (menos estado)
é ruim para quem? Bom (estado eficiente e eficaz) para quem?
Desde a proclamação
da República Federativa do Brasil, jamais tivemos um estado de
fato. Pode-se dizer que a primeira tentativa se deu com Getúlio
Vargas em e partindo de 1930. O Golpe de Vargas sendo possível
justo pela fraqueza do Estado Central. A fragilidade do Estado está
solidificada nas Campanhas de Canudos, na existência de Lampião
e seus congeneres, em Pe Cícero tomando o governo do Ceará,
e o tamanho do caixa da “União” que não assomava
aos 5% do PIB e por fim a guerra do Paraguay, no qual sendo
necessária a união com Uruguai e Argentina e o
endividamento descomunal com Inglaterra. Não havia Estado.
A existência,
eficiência e eficácia estavam presentes no período
do Brasil colônia. Período no qual conseguiu guerrear e
manter seu território, manter sob a égide de sua força
descomunal o regime escravocrata. Não que as forças da
ordem fossem braços do Estado, mas sim dos Senhores de então,
que agiam em nome próprio e do Estado. Quando os escravagistas
colaboram e participam das ordens vindas de Portugal para que se
extinguisse todo e qualquer Quilombo, tratava-se na verdade de um
desejo partilhado com os dos Senhores de Engenho, Barões do
Café etc, sendo assim uma autorização à
carnificina e não uma ordem. Isso é prova inconteste de
quem era o Estado, a quem ele servia, e esses o servindo numa mão
dupla.
No XIX o Brasil era
federativo. Isso nos diz que havia certa autonomia nos estados
federados. Que também tinha muito pouco poder. Os Coronéis
eram coronéis de verdade, tinham seus pequenos exércitos,
que eram os seus agregados, aos quais se somavam os Jagunços,
para um entrevero e outro. Adrede cito aqui GSV de JGRosa na fala do
tio de Riobaldo.“Ah, a vida vera é outra, do cidadão
do sertão. Política! Tudo política, e potentes
chefias. A pena, que aqui já é terra avinda concorde,
roncice de paz, e sou homem particular. Mas, adiante, por aí
arriba, ainda fazendeiro graúdo se reina mandador – todos
donos de agregados valentes, turmas de cabras do trabuco e na
carabina escopetada! “ Os Jagunços zanzavam entre uma luta e
outra em busca do ódio alheio para vingá-lo pelo outro.
Formavam junto com grupos de Coronéis pequenas regiões
que se protegiam de forma quase autónomas, um exemplo é
a Sedição de Juazeiro, o poder era inclusive para se
usar contra do próprio Estado central.
O Rio de Janeiro
vivia, como capital desse proto Estado, com os 4% de impostos, o que
não dava para ter uma força, e exercer seu poder de
polícia, sobre todo o território. Não vem ao
caso, neste momento, mas isso explica um pouco a vida carioca, até
os dias de hoje. Voltando. Cada lei, praticamente, exige uma polícia.
E o Estado vive de impostos, seja menos de 5% do PIB. A fraqueza fica
explicita na guerra de Canudos. Traçando um paralelo, no
Brasil Colônia, um dos tantos Bartolomeus que houveram no
período, instado pelos proprietários e a Metrópole,
com seus homens arrasaram com 20.000 vidas na região
quilombola compreendida geograficamente toda a região da
Serra da Canastra indo até Formiga em Minas Gerais, de
Desemboque a Cristais, passando por Piumhi, Formiga até Campo
Belo. Dada a imensa geografia, a organização e
população neste episódio sangrento, notamos a
força do Estado no Brasil colônia e a fragilidade do
Brasil independente em Canudos.
A diferença está
em que, no Brasil independente, a partir de determinado momento, as
ordens da Capital, já não era do completo desejo dos
proprietários, era uma tentativa positivista de “modernizar”
o país. GSV “Aquela turma de cabras, tivesse sorte, podia
impor caráter ao Governo ” E o Estado não tendo poder
de implantar a Lei – seja o Estado – dado a força dos
proprietários particulares. Se quisermos, podemos chamar esses
proprietários de empresários, e suas propriedades de
empresas. Isso fica claro na questão Escravocrata, e na
questão da imigração europeia. O Estado, via Rio
de Janeiro, queria distribuir terras aos imigrantes, o que não
se deu devido a força dos proprietários de terra, com
as exceções do sul. De tal modo que os imigrantes
brancos, seguiram vivendo como escravos, nas mesmas senzalas e nos
mesmos trabalhos que os negros. A ponto de países como Itália
e Alemanha, proibirem seu povo de imigrar para o Brasil.
Há um episódio,
narrado por um intelectual francês, ocorrido depois da Semana
de Arte Moderna, aonde tal intelectual, saindo do salão da
casa grande, onde se cantava, tocavam obras da vanguarda européia,
se recitava poesia de vanguarda, e tomavam licores também
europeus – diz ele que estavam presentes Mario de Andrade, Oswald
de Andrade etc. - indo fumar na grande varanda, viu como vinham, à
tardinha, os colonos da lavoura para seus casebres, acompanhados por
grande número de capatazes, por se acaso, seja, o país
ainda era escravocrata.
9 de mar. de 2016
Humildemente, NÓS! Talvez, no dia que começarmos a fazer história melhor do que lendas e mitologia. No dia que começarmos a usar o humilde pronome “nós”, na hora de contabilizar as culpas, então teremos diante de nós e nosso país algum porvir.
Humildemente, NÓS!
Talvez, no dia que começarmos a fazer história melhor do que lendas e mitologia. No dia que começarmos a usar o humilde pronome “nós”, na hora de contabilizar as culpas, então teremos diante de nós e nosso país algum porvir.
Ateísmo, Machismo e Racismo Meus.
Não
sei se não sou machista e tampouco se sou. É muito
provável, apesar de todos os esforços, que seja, pois
não tenho, em absoluto, ideia do que é não
se-lo, completamente. Há muita coisa que queria ser, e muitas
deixar de ser. Muitas estão alem da simples vontade. Por
exemplo, queria ser ateu. Mas não é assim tão
fácil. Nasci e logo fui batizado. Fui batizado com o nome da
virgem. Com um segundo nome do padre milagreiro de Tambaú,
quem me batizou. Fui crismado. Fui coroinha. Lia a bíblia
antes de ir para a cama. Lia o novo testamento durante a celebração
da missa. Mesmo culturalmente, fui domesticado a visitar igrejas,
como representação cultural e de movimentos artísticos,
Gótico, Barroco etc. As vi ás pencas em Salvador, Rio,
Sampa, Barcelona e mundo afora. Algumas góticas, quais admirei
suas rosáceas; catedrais
com arcos rampantes sem contrafortes, arcos ogivais com intenções
verticalistas,
plantas planas na forma de cruz latina. Diz-se que é um agente
didascálico... estava nesse caso, orientado pela leitura do
Mistério das Catedrais de Fulcanelli.
Assim
por mais que saiba da solidão humana na responsabilidade –
isso é Nietzsche - não há como não
dizer: Graças a Deus! Que seja num ato falho, que sai do fundo
do oceânico inconsciente, porque não basta a vigilância,
não sou, muito, por não saber o que é ser
ateu. Penso, se ser ateu depende da negação de deus, é
uma negação, que o supõe. O mesmo se dá
com o racismo. É uma luta tremenda.
Não
basta ter amigos, namoradas, colegas e inimigos negros. É
necessário também que os veja como vejo qualquer outro
amigo, namorada, colega e inimigo branco. Simplesmente como o outro.
Mas não creio que os veja desta forma, como não vejo
um japonês, chinês. Ao fim e ao cabo, os vejo partindo
de como fui feito, moldado, daquela matéria que eu era, já
que não sou, simplesmente, o que quero ser, sou muito o que
fizeram de mim, nesse caminhar com dois passos adiante e logo um
atrás, ou ao contrário.
Da
mesma forma ocorre o meu machismo. Está no princípio,
no colo materno, no lar patriarcal, e se estende por toda a família,
até os primos mais longínquos, e permeia a sociedade.
Inescapável. Nunca fui uma ilha. Sempre cozinho, lavo e
passo, e até passava a roupa da ex quando era o caso, ela não
sabia, não tão bem como eu, mas isso não muda
nada, se disso me lembro como uma exceção, como um fato
não corriqueiro. Muitos dos meus mais próximos, botam a
culpa de minha separação, nesse meu pretenso não
machismo. Eles querem dizer com isso, que algum machismo seja
necessário, e nesse “eles” sujeito da frase anterior, há
muito de 'elas', então me pergunto por que não
coloquei o sujeito, 3ª do plural no feminino? Machismo?
26 de fev. de 2016
Amigo.
Amigo.
Amigo, para mim, verdadeiro amigo, amigo do peito, não é aquele das horas difíceis, que faz intercâmbio de ajudas, que me ouve os meus desgostos. Isso para mim é escambo, mercantilismo…. Amigo é aquele que gosto de contar a melhor piada, o meu melhor pensamento. Que gosto de conversar até fechar o bar, e sair procurando outro bar que nos aceite para mais uma história, e quando vemos o dia clareou… e dizemos em uníssono: será que a padoca abriu?
Ovo de Páscoa, o Ouro de Tolo do Pascácio.
Ovo de Páscoa, o
Ouro de Tolo do Pascácio.
O preço que se
paga por um ovo de chocolate, nem sempre de chocolate, sempre mais
açúcar, sempre mais gorduras, sempre mais leites, dá
a dimensão da nossa capacidade de influência no chamado
mercado. Nenhuma, positivamente. Total, negativamente. Aqui, a famosa
lei da escassez, seja, nada do que se produz é para todos. Se
todos quiserem não haverá para toda gente. E nessa luta
pelo equilíbrio do produzido versus sua procura, se faz o
preço. O mercado, em outros países, é composto
pela oferta e a procura. Mas não somos outros países. E
o mercado aqui é o que se vê. Sobram ovos de Pascoa,
todos os anos, tanto que se pode comprá-los por ''buon
mercato'' como dizem os italianos, lá por “Corpus
Christi”, com o risco de
ranço, se fosse de chocolate. No entanto, chegamos ao super ou
hiper, e o firmamento de ovos está lá. Toda gente a
olhar para aquele céu. Umberto Eco faria grande proveito, no
mercado da escrita, do semiótico dessa imagem, mas eu ainda
busco eco e não economizo, dei tá dado. Pois o preço
também, em equivalência a sua exposição ao
alto, assim é praticado, nas nuvens. E nós, o
consumidor? Compramos. Pagamos. O que pedirem? O que pedirem!
No cartão, em 10x etc. Somos pascácios.
Atropelou-a Sobre a Faixa.
+ ou - 10h da manhã. 26/2/16
Estavam de mão
dadas, esperaram o verde da Florêncio de Abreu. Veio o Verde.
Ele mais apressado largou primeiro, ela veio puxada pela mão.
Vamos, bem! O Honda Civic silencioso na Olavo Bilac. Viraria à
esquerda. O verde veio para o Honda Civic prata. O Honda saiu como
se fosse besta. Sendo máquina. Como máquina, pensa como
besta. Como besta atropelou-a sobre a faixa. Parou como máquina.
De dentro do Honda Civic prata saiu um senhor de cabelos prateados,
incivilmente, ....”Mas estava verde para mim!”, No entanto,
estava verde para eles.
Ilustres Senhores
Engenheiros da Transerp. Está cada dia mais evidente, nossa
incapacidade de governar os Hondas civicamente e outros possantes. Já
que não temos no Palácio Rio Branco, nada, nem ninguém
com visão para os problemas urbanos, digo: O Semáforo
com Três Tempos é para isso. Um tempo para o pedestre.
Porque é completamente sem juízo e sem equivalência,
um ser de carne e ossos, disputar a travessia de uma rua com um
Civic incívico. Porque não dá para confiar na
consciência. Aliás foi por isso que os Norte-americanos
o inventaram, para deixar claro, a cota de cada um. Agora, essa cota
é com os Senhores. Civilmente.
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