A pequena Isadora
passou as últimas férias escolares, nos seus finais de tarde desse
tórrido verão, sentada na calçada com suas amiguinhas. Seus shorts
sempre acabavam por ficar avermelhados pelo pó da terra roxa. Ela
sempre batia a poeira com a palma da mão, mas talvez a umidade dela,
muito provavelmente devida ao constante manuseio do celular, mais
emporcalhavam que espanavam. Corriam, saltavam e gritavam quanto
passava uma saveiro com o seu te pego ai ai... Chegou o carnaval e
Isadora desfilou fantasiada de libélula, alguns adereços, uma tiara
azul, transparências e um fio dental, também ele invisível. A pele
brilhante e dourada da exuberância de seus quatorze anos, o seu
bumbum empinado, substituíam com folga os incipientes seios, talvez
por isso, mais tapados que o resto do corpo, seduziram uma plateia de
marmanjos que se emborrachavam na escadaria da praça e gritavam:
gostosa, quando ela passava, e ela retribuía com um triste samba no
pé, sobre o salto plataforma. Sua mãe, hoje dona de par de braços
tão gordos, na parte posterior que se dobram sobre o cotovelo, como
se fossem outras duas barriguinhas na inflexão de seus trinta e dois
anos; ouvia os gritos que ecoavam de um passado não muito distante,
como se fossem para ela, numa época em que suas nádegas destruíam
famílias, e fizeram por aumentar o consumo de cachaça em todo o
distrito.
Hoje Isadora quando
caia a tarde, saiu com seu short mais apertado. Os pobres demoram a
se desvencilhar da moda, sendo que a última moda é o shorts mais
airado, leve e solto, como se tratasse um tecido de seda, em cores
discretas, para contrapor a sensualidade quase erótica que pode
causar o movimento do pano, as vezes colando suavemente nas partes
mais íntimas, normalmente sem outra peça por baixo, esse é o
propósito, ou abrindo fendas e gerando perspectivas e
possibilidades de exploração visual, que o pano grosso e colado não
permite. Como dizia, Isadora portava o mais apertado dos shorts,
onde as duplas costuras do cós punham em risco sua virgindade.
Isadora foi caminhar. Foi ali para os lados dos condomínios, onde
dizem que chegará a João Fiúsa. O rapaz da saveiro passou
lentamente e seu escudeiro, botando meio corpo para fora, disse
coisas que não ouvi, e seguiram caminho, lentamente. Isadora olhava
por cima dos ombros, num exercício impossível, dobrando a espinha,
alçando o bumbum para cima, sim, creio que ela o via.