30 de dez. de 2015

Educação. 2015 aprendi que:

Educação.
2015 aprendi que:
a Educação/Escola se converte pouco a pouco num ramo da psicopatologia.
Que se pede à Escola que cure feridas reais e potenciais, da alma.
Que há 40 anos os Pais se preocupavam em dar carinho aos filhos, comida na mesa... A igreja dava uma assistência emocional e o Professor da Instrução.
Hoje a Família vive uma situação curiosa, a Mãe foi trabalhar e o Pai não volta, nunca voltou (convém que se espere?) e a Igreja sumiu, não prove.
A Escola vai assumindo pouco a pouco mais responsabilidades, e como é de se esperar, não dá conta de todas, e tais tarefas são abandonadas, umas mais outras menos. Definitivamente, abandonou a Instrução.


28 de dez. de 2015

Diz que pizza!




Romeu está diante da tv vendo com interesse mórbido o programa de William Waack, enquanto Julieta estica os braços e abre a boca, num misto de fome e sono, diz: “Acho que vou.. mas estou com fome”. Nisso o programa é interrompido por aqueles microfones que giram em torno, acho que de um planeta. Aparece Leila Sterenberg lendo um comunicado. “Atenção!” “Atenção!” Boletim especial. A cidade está em alerta laranja. As autoridades – José Serra e Geraldo Alckmin aparecem ao fundo – e continua Leila: “estamos sob um ataque de Zumbis. Procurem se abastecer de água e alimentos. Não saiam de casa. Repito: não saiam de suas casas”. Romeu e Julieta correm para a geladeira. A paisagem é desoladora, um iogurte grego aberto com prováveis fungos verdes, meio tomate murcho, um ovo com uma rachadura colado naquele seu compartimento, duas azeitonas que devem ter caído da embalagem, já enrugadas.
“Era a tua vez de ter ido ao supermercado”, disse Julieta, “não que não, era a tua” protesta Romeu.
Silêncio... A situação é crítica. Um o gato, dentro do estômago de Julieta, ronrona. A geladeira, um gato gigante, também ronrona. Romeu mira o imã. Disk Pizza Irá Já. 3972 2323. Peço uma pizza? Propõe Romeu. Em vinte minutos tocam a campainha. Romeu abre a porta. À sua frente aguarda um motoboy. Pela viseira levantada do capacete, Romeu, vê dois olhos líquidos que não piscam. O queixo gosmento dependurado suportado pela correia do capacete. Não vê seu braço esquerdo, o direito leva a bolsa térmica de onde sai uma caixa exalando orégano e catupiry. Fumegante. “ A quizzra...” murmura. Suas cordas vocais estão em decomposição e reverberam uma pigarra viscosa. O motoboy foi mordido, está infectado, mas a pizza está intacta. Bom serviço. Romeu dá dez reais de gorjeta. Isso será tema de controvérsias durante o jantar:

“Romeu, Você acha mesmo que foi uma boa ideia dar gorjeta a um zumbi?” com a boca cheia de catupiry, milho verde e frango desfiado. “Aonde ele a gastará?”  

Cinismo e Impotência.




Acredito que do pessimismo não brota nada transformador. Não sou de acreditar em profetas nervosos ou líderes providenciais. Acho que coincido com aquele verso de Caetano Veloso, “quem foi ateu e viu milagres como eu..” . E também porque desconfio das lideranças míticas, que em todo caso as escolas de negócios de certo modo conseguiram popularizar. Tudo junto, tenho cá comigo, mais que isso, estou convencido que ao 'progressismo' lhe restam uns quatro dias, e olha que mal acabava de nascer nessa terra do mais puro sentimento mazombo. Diria à boa gente que não convém perder tempo e tentar outras providências.

Politicamente, nossas decisões pessoais e o impacto que elas têm na dimensão grupal, estão ameaçadas pela impotência e o cinismo. O primeiro advém da constatação que quase nada do que fazemos modifica substancialmente a dimensão coletiva ( já que não escapamos do mundo) que vivemos. E como nada acontece como queremos ( a política nos decepciona, as ilusões não coalham e o esforço não traz resultados...) corremos o risco de buscar compensação, indexados pelo cinismo, o máximo de beneficio pessoal. Já vivi em outros países, e a coisa vai mais ou menos pelo mesmo caminho, com mais ou menos intensidade, nos encontramos ciclicamente cercados por essas duas ameaças. Talvez, tal fato tenha a ver com a nossa história, termos desaproveitado oportunidades. A pergunta é: que faremos? Penso que devemos reflexionar sobre o quê estamos fazendo, cada um de nós... O risco que corremos é acabar nos regendo pela desconfiança doentia na coletividade e esquecermos que o quê realmente conta é o esforço cotidiano e a coerência das nossas ações. A outra alternativa é perder tempo e ilusões discutindo seraficamente sobre quem é mais puro e como será o futuro, quando já estivermos mortos.

27 de dez. de 2015

Museu da Língua Portuguesa.

Museu da Língua Portuguesa.

Dizem que havia um poema de cem oitavas no Museu da Língua Portuguesa, chamado Ecos de Nhanderuvuçu ou Tupã, ou Prometeu. Exemplar único, não digitalizado. Alfredo Bosi cria que obra de Santa Rita Durão do final do séc XVIII. Não é a melhor obra da literatura brasileira. Mas de grande interesse, pois apresentava um Prometeu queixoso, tão melancólico que poderia dizer sem aresta: rousseauniano. Roubou o fogo dos deuses e o entregou aos homens. Assim, paga sua filantropia amarrado  à pedra da Gávea, e a cada manhã vêm os urubus comer seu fígado, que à noite se restaura, junto com sua melancolia, o fogo trouxe conforto aos homens, mas nada de bondade.

Este é o lamento de Tupã, que copiei da obra de A. Bosi, História Concisa da Literatura Brasileira, Cultrix, 2005.

Ah! Quanto mais feliz minha sorte fora
se com alma plebeia em vil estado
Entre riscos e palmeiras conduzira
por um tempo minha inocência e gado. 

Festa Sem Fim.

De que vale um bela alma, se não sabe se expressar em palavras, se os flocos de neve se fundem antes de pousar numa árvore.  Haikai de  Hoshino Takashi, quer dizer tudo inclusive que as belas palavras nada querem dizer, ou ainda belas palavras escondendo um vazio interior, que a neve  permanece estática por um instante, que mais sei eu, divago, me distraio um pouco, no meio de uma festa que não quer acabar e por fim morre antes do fim...

26 de dez. de 2015

Jesus.

O mais divertido é que tudo ao redor do herói é trágico. Simplificando dos dois lados da equação, sem tragédia nada de heróis, e isso não quer dizer: ao se instaurar a tragédia e surge o herói, não, basta com aparecer um herói e tudo ao seu redor se reduz à tragédia. Se especulo, aonde há um Deus há um mundo, seguindo o fenômeno heróico. E como há quem necessite de herói os há que crêem em Deus e é a estes que o mundo, com Deus, se põe a rodar. Não precisamos ir muito longe para saber que cada povo tem ou teve seu deus. Havendo ainda aquele povo que escolhido por deus, ultrapassa as fronteiras e se faz povo em qualquer geografia, não se dissolve. Não preciso mudar de calçada para saber que há deuses dividindo uma família, digo isso para tentar responder a mim mesmo, se uma nação pode ter mais que um deus. Penso que deus, assim como os heróis, tiveram o seu tempo, e têm seu tempo, uma naturalidade temporal, porque sempre nos submetemos ao que admiramos naturalmente. Mas o que é, hoje, Natural? Quem é, hoje, nosso Deus? Para os povos indígenas os deuses são elementos da natureza, o sol, a lua, a água, o fogo... seja, uma continuidade natural, árvore, chuva, sol, fruto, comida... quaisquer desses substantivos naturais pode ser e é deus. Para mim este encadeamento natural se rompeu, em qualquer ponto dessa enumeração se pode intercalar adubo, pesticida, transgenia, bolsa de valores, sacola plástica, inflação, moedas, entre a árvore e a comida. Se pensarmos no mudo escrito, narrado, e quando estas se deram, aquele mundo estava muito próximo da criação, era um mundo ainda virgem, um mundo que não se conhecia global, então, nada mais natural que um criador.
Assim desarticuladamente, isso que escrevo, vejo Jesus como uma especificidade cristã. Um acontecimento raro, o nascimento de um Deus, isso é o que se comemora, seu aniversário, a encarnação de um Deus na fragilidade de um bebê que precisava de um jumento e uma vaca para que lhe dessem calor e uma estrela que apontasse o caminho àquele que quisesse o visitar, uma estrela no céu, mas a luzinhas coloridas e decorativas das ruas só fazem ofuscar qualquer estrela no céu.



18 de dez. de 2015

Enquanto houver vida há esperança, dizem. É a última que se perde




Enquanto houver vida há esperança, dizem. É a última que se perde. São palavras que não me confortam, não creio nem no emissor nem no receptor da mensagem. A esperança é uma virtude teológica que requer outra: A Fé.
Nunca cri no “futuro-natureza-morta”, ainda que bem pintado. E a Fé tem que ser Cega. Como crer em algo bom no futuro que parta desse desassossegado presente, se todo otimista é quase um Paulo Coelho, pueril? Todo profeta deve ser bem vigiado, e o profeta do otimismo idem, e suas profecias deveriam ser tratadas no âmbito da vigilância sanitária: A overdose, especificamente, de Otimismo é nociva à saúde. Não é possível ser feliz sem ter passado por boas desgraças. Não vindico a dor, só constato. Em toda a história há muito desespero e pouca esperança, particularmente na arte.
Deixo repousar a tristeza. Destilo o dramatismo. Fico nu. Apago os rastros do sentimentalismo. Escrevo isso desde uma primavera que não existe nesses trópicos, uma primavera verão invisível. O Natal não ilumina as sombras sigilosas. Selvagem e histriônico canto:
Oh Caridade,
desde um latão de cobre
esperança dá ao pobre
e ao rico fiança
tua mulata bondade
oh Caridade te peço
se me alcança essa bondade
dê ao rico esperança
e a mim estabilidade..

Para que conste, nem que um exército de otimistas corra atrás de mim, isso não me fará ter esperança, porque esperança é de desesperados, nem mesmo o ano novinho em folha, todo vincado, pronto para “estreiar”, são muitos os naufrágios e poucas as encostas para aportar.