28 de dez. de 2015

Cinismo e Impotência.




Acredito que do pessimismo não brota nada transformador. Não sou de acreditar em profetas nervosos ou líderes providenciais. Acho que coincido com aquele verso de Caetano Veloso, “quem foi ateu e viu milagres como eu..” . E também porque desconfio das lideranças míticas, que em todo caso as escolas de negócios de certo modo conseguiram popularizar. Tudo junto, tenho cá comigo, mais que isso, estou convencido que ao 'progressismo' lhe restam uns quatro dias, e olha que mal acabava de nascer nessa terra do mais puro sentimento mazombo. Diria à boa gente que não convém perder tempo e tentar outras providências.

Politicamente, nossas decisões pessoais e o impacto que elas têm na dimensão grupal, estão ameaçadas pela impotência e o cinismo. O primeiro advém da constatação que quase nada do que fazemos modifica substancialmente a dimensão coletiva ( já que não escapamos do mundo) que vivemos. E como nada acontece como queremos ( a política nos decepciona, as ilusões não coalham e o esforço não traz resultados...) corremos o risco de buscar compensação, indexados pelo cinismo, o máximo de beneficio pessoal. Já vivi em outros países, e a coisa vai mais ou menos pelo mesmo caminho, com mais ou menos intensidade, nos encontramos ciclicamente cercados por essas duas ameaças. Talvez, tal fato tenha a ver com a nossa história, termos desaproveitado oportunidades. A pergunta é: que faremos? Penso que devemos reflexionar sobre o quê estamos fazendo, cada um de nós... O risco que corremos é acabar nos regendo pela desconfiança doentia na coletividade e esquecermos que o quê realmente conta é o esforço cotidiano e a coerência das nossas ações. A outra alternativa é perder tempo e ilusões discutindo seraficamente sobre quem é mais puro e como será o futuro, quando já estivermos mortos.

27 de dez. de 2015

Museu da Língua Portuguesa.

Museu da Língua Portuguesa.

Dizem que havia um poema de cem oitavas no Museu da Língua Portuguesa, chamado Ecos de Nhanderuvuçu ou Tupã, ou Prometeu. Exemplar único, não digitalizado. Alfredo Bosi cria que obra de Santa Rita Durão do final do séc XVIII. Não é a melhor obra da literatura brasileira. Mas de grande interesse, pois apresentava um Prometeu queixoso, tão melancólico que poderia dizer sem aresta: rousseauniano. Roubou o fogo dos deuses e o entregou aos homens. Assim, paga sua filantropia amarrado  à pedra da Gávea, e a cada manhã vêm os urubus comer seu fígado, que à noite se restaura, junto com sua melancolia, o fogo trouxe conforto aos homens, mas nada de bondade.

Este é o lamento de Tupã, que copiei da obra de A. Bosi, História Concisa da Literatura Brasileira, Cultrix, 2005.

Ah! Quanto mais feliz minha sorte fora
se com alma plebeia em vil estado
Entre riscos e palmeiras conduzira
por um tempo minha inocência e gado. 

Festa Sem Fim.

De que vale um bela alma, se não sabe se expressar em palavras, se os flocos de neve se fundem antes de pousar numa árvore.  Haikai de  Hoshino Takashi, quer dizer tudo inclusive que as belas palavras nada querem dizer, ou ainda belas palavras escondendo um vazio interior, que a neve  permanece estática por um instante, que mais sei eu, divago, me distraio um pouco, no meio de uma festa que não quer acabar e por fim morre antes do fim...

26 de dez. de 2015

Jesus.

O mais divertido é que tudo ao redor do herói é trágico. Simplificando dos dois lados da equação, sem tragédia nada de heróis, e isso não quer dizer: ao se instaurar a tragédia e surge o herói, não, basta com aparecer um herói e tudo ao seu redor se reduz à tragédia. Se especulo, aonde há um Deus há um mundo, seguindo o fenômeno heróico. E como há quem necessite de herói os há que crêem em Deus e é a estes que o mundo, com Deus, se põe a rodar. Não precisamos ir muito longe para saber que cada povo tem ou teve seu deus. Havendo ainda aquele povo que escolhido por deus, ultrapassa as fronteiras e se faz povo em qualquer geografia, não se dissolve. Não preciso mudar de calçada para saber que há deuses dividindo uma família, digo isso para tentar responder a mim mesmo, se uma nação pode ter mais que um deus. Penso que deus, assim como os heróis, tiveram o seu tempo, e têm seu tempo, uma naturalidade temporal, porque sempre nos submetemos ao que admiramos naturalmente. Mas o que é, hoje, Natural? Quem é, hoje, nosso Deus? Para os povos indígenas os deuses são elementos da natureza, o sol, a lua, a água, o fogo... seja, uma continuidade natural, árvore, chuva, sol, fruto, comida... quaisquer desses substantivos naturais pode ser e é deus. Para mim este encadeamento natural se rompeu, em qualquer ponto dessa enumeração se pode intercalar adubo, pesticida, transgenia, bolsa de valores, sacola plástica, inflação, moedas, entre a árvore e a comida. Se pensarmos no mudo escrito, narrado, e quando estas se deram, aquele mundo estava muito próximo da criação, era um mundo ainda virgem, um mundo que não se conhecia global, então, nada mais natural que um criador.
Assim desarticuladamente, isso que escrevo, vejo Jesus como uma especificidade cristã. Um acontecimento raro, o nascimento de um Deus, isso é o que se comemora, seu aniversário, a encarnação de um Deus na fragilidade de um bebê que precisava de um jumento e uma vaca para que lhe dessem calor e uma estrela que apontasse o caminho àquele que quisesse o visitar, uma estrela no céu, mas a luzinhas coloridas e decorativas das ruas só fazem ofuscar qualquer estrela no céu.



18 de dez. de 2015

Enquanto houver vida há esperança, dizem. É a última que se perde




Enquanto houver vida há esperança, dizem. É a última que se perde. São palavras que não me confortam, não creio nem no emissor nem no receptor da mensagem. A esperança é uma virtude teológica que requer outra: A Fé.
Nunca cri no “futuro-natureza-morta”, ainda que bem pintado. E a Fé tem que ser Cega. Como crer em algo bom no futuro que parta desse desassossegado presente, se todo otimista é quase um Paulo Coelho, pueril? Todo profeta deve ser bem vigiado, e o profeta do otimismo idem, e suas profecias deveriam ser tratadas no âmbito da vigilância sanitária: A overdose, especificamente, de Otimismo é nociva à saúde. Não é possível ser feliz sem ter passado por boas desgraças. Não vindico a dor, só constato. Em toda a história há muito desespero e pouca esperança, particularmente na arte.
Deixo repousar a tristeza. Destilo o dramatismo. Fico nu. Apago os rastros do sentimentalismo. Escrevo isso desde uma primavera que não existe nesses trópicos, uma primavera verão invisível. O Natal não ilumina as sombras sigilosas. Selvagem e histriônico canto:
Oh Caridade,
desde um latão de cobre
esperança dá ao pobre
e ao rico fiança
tua mulata bondade
oh Caridade te peço
se me alcança essa bondade
dê ao rico esperança
e a mim estabilidade..

Para que conste, nem que um exército de otimistas corra atrás de mim, isso não me fará ter esperança, porque esperança é de desesperados, nem mesmo o ano novinho em folha, todo vincado, pronto para “estreiar”, são muitos os naufrágios e poucas as encostas para aportar.  

17 de dez. de 2015

Hipocondríaco Egocêntrico.






Reconheço, sou um estraga prazeres, um chato, um pé no saco, mesmo que Débora, minha esposa, diga isso de outra maneira; ' Você é um hipocondríaco egocêntrico que dá muito ouvido a si mesmo'. 'Tá'...! Tirante isso, tenho acessos de melancolia que enfezam a Débora como agora, que estamos na varanda, tomando uma cerveja, esperando pelo sudoeste, que já vem vindo, e me boto a falar sobre a morte. Não me deixe viver em estado vegetativo, digo a Débora, não suportaria viver dependendo de uma máquina, daquelas bolsas de soros e remédios ligados diretos na veia. Se algum dia estiver nesse estado, por favor, meu amor, desligue estes artefatos que me mantém vegetando, prefiro morrer. Débora se levantou,  me olhou com uma admiração que até então não havia sentido. Me senti um menino mentiroso, que crê que a mentira colou, roda a saia e desliga a tv, o computador, o roteador, o ipod e por fim, me retira o copo e a garrafa de cerveja.
Me invade uma sensação, que, uma por não conhecer e a outra não haver sentido,  chamo de paz e abandono. Ao meu redor tudo vai pouco a pouco escurecendo.... e lá no fundo do corredor vejo um led vermelho... ela se esqueceu da play station... rs

16 de dez. de 2015

Eu não gosto de cebola....sendo que talvez a cebola é quem pudesse dizer que não gosta de mim.

Eu Não Gosto de Cebola.

Outro dia ouvi uma menina dizer, “Antigamente...”, nada mais ouvi, sou curioso, mas não pude ser intrometido, por muito muito que quisesse saber o que vinha depois. Desse modo, antigamente pode ser ontem. No entanto, antigamente, para mim, é quando não havia nem eu, nem rádio, nem tv, nem gramofone... se lia partituras, se contavam contos, a volta do parafuso começa assim. Frankstein de Shelley nasceu assim. Dizem que num verão suíço, na Vila Diodati, havia muito talento debaixo do mesmo teto, Lord Byron, seu médico John Polidori, John Shelley e Mary Shelley, chovia há dias, o tédio andava rondado a casa, então, Byron sugeriu que escrevessem cada um um conto de medo. Dizem que John preferiu continuar matando o tédio com absinto. Byron deixou o conto no meio do caminho, sobre mulheres vampiros da Grécia. Polidori sem mais escreveu O Vampiro, não perdeu tempo para um título, história do dandy irresistivelmente atrativo e perverso manipulador, deixando claro que refletia sua relação de amor e ódio com Byron. Mary Shelley escreveu O Moderno Prometeu, o famoso Frankenstein.
Zequinha de Abreu vendia partituras de Tico-Tico no Fubá, fazendo quem quisesse ouvi-la, ler partitura, tocar algum instrumento. Disse Zequinha, mas havia muitos compositores, como Chiquinha Gonzaga, para ficar nos mais populares. A relação com a arte, em particular com a música era corpóreo-espiritual, exigia todo o corpo e a alma. Essa relação mudou drasticamente, fazendo do ouvinte uma mera orelha manipulável. O tema é imenso, mas fico nisso, que não estou preparado para um ensaio, fico nessa crônica. Mas a coisa se deu da mesma forma que na relação homem-natureza. Há pessoas tão jovens que não têm antigamente, que não sabem de onde vem o bife, tanto menos o Baião. Os livros se transformaram em imagens, filmes. A música vem da saveiro que passa toda noite pelo bairro a despertar galinhas, assustar gatos. Suponho que uma família rica de antigamente tivesse umas 100 partituras e um piano. Hoje, no pen drive do meu fusca tem todas as músicas que ouvi e gostaria de ouvir nos próximos dois mil anos.

É neste ponto, quando se disse que tudo quanto fosse sólido se desfaria no ar, que chegamos. Qualquer relação entre nós e a arte, ou qualquer outra atividade, nada nos esclarece sobre nós, senão que nos obscurece, posto que todos os complexos sentidos que tivemos para apreciar qualquer coisa se reduziu ao gosto preguiçoso e irremediavelmente ignorante. Eu não gosto de cebola....sendo que talvez a cebola é quem pudesse dizer que não gosta de mim.

receita.


Cebola empanada.
Dissolva fermento biológico em sal, acrescente água gelada, pode até botar umas pedras de gelo, acrescente farinha de trigo, faça uma massa espessa. Passe por ela as rodelas de cebola. Não deve escorrer facilmente. Leve a uma frigideira com abundante azeite. Frite. Coloque para escorrer excessos num papel absorvente.