Cido Galvão ama as gentes de Bonfim, como gostaria que nos amasse deus, nos deixando livres, mas nos cuidando, se acaso uma pedra no caminho, nos poupando tropeços. Quase como os amaria, se acaso fosse deus.
Em Bonfim vivem homens e rapotos ( sobre o que venham a ser estes seres há controversas versões, sem qualquer coincidência), há também gambás que se fingem de mortos para.comer os ovos às galinhas ( bruta construção) e eu, quando estou de visitas. E numa dessas visitas, me contaram que no ano passado, um russo se perdeu em Bonfim. Dizem que desceu do carro para fotografar alguma coisa e já não voltou. Sua mulher, mais luminosa que a árvore de natal do Shopping ( meu deus! Como são luminosas as russas!Aonde encontram os russos, mulheres tão belas?) começou a chorar, enquanto todos os Cachaceiros a rodeavam tentando acalmá-la. Um policial aposentado, cujo pai havia lhe deixado de herança um cachorro, um fusca e uma casa com chaminé, foi procurar o russo, e o encontrou chupando cana não longe dali. Quando voltou com o russo, percebeu que todos os homens haviam desaparecido… com a russa. Enquanto o policial aposentado procurava a russa e os homens, o russo tratava de encher os pneus, que os moleques - marrons como chocolate de tão sujos - haviam esvaziado, colocando palitos de fósforo nos bicos dos pneus. Quando um pai tem a sorte de ter um filho assim de sujo o chama de “meu pequeno João de barro “. Em Bonfim não há russas, há sim umas quantas mulheres mal encaradas, que desde sempre as chamam fofoqueiras, que quando brigam entre si se ofendem chamando uma a outra de fofoqueira. Bonfim é cortada pelo ribeirão Preto. Que é um riacho que traz muitas ideias que o povo de Cravinhos joga na água. No entanto, nenhuma dessas ideias se adaptam à latitude e clima de Bonfim, muito provavelmente porque quando alcançam Bonfim ou já estão mortas ou se desmancharam. Os vizinhos do ribeirão, sim que podem sentir seus cheiros e, por vezes, no silêncio da noite ouvem suas barrigadas. Certa vez um desses vizinhos do riacho, descobriu pegadas no barro das margens, eram de alguém que foi beber água na fonte central da praça, aonde o russo se perdeu. Dizem que naquela época o chafariz da fonte no meio da praça eram dois seios de mulher, e que esguichavam jatos de água. É possível que aquele que bebeu água da fonte e deixou pegadas na lama da margem do rego, tenha acariciado os seios do chafariz. Dizem que os curiosos seguiam as pegadas de barro do chafariz ao rio a cada ano na mesma data. Há quem diga que fosse um vampiro aquático, ainda que estivessem longe da Transilvânia. Vivia no córrego, mas a água deste não era suficiente para aplacar sua sede, quando a água do riacho era potável. Hoje só transporta lixo, que os bonfinenses também lhe dedicam. As vezes os bonfinenses e os cravinhenses vão ao Mercadão Municipal, em Ribeirão Preto, para apontar seus sapatos velhos, gostam de apontar com os dedos desde a margem com palmeiras imperiais: a lá meu sapato velho, já chegou aqui” e dão grandes gargalhadas, que fazem voar pequenos pedaços de massa quebradiça de pastel.
Devo acrescentar, que nos bares de Bonfim, os violeiros costumam cantar todo o repertório de José Rico e Milionário, no começo da tarde tocam para os cachorros vira-latas que se aquecem ao sol, e para mim até essas horas, que ouço, sem os querer, mas não vejo, sinceramente, nada melhor para fazer.