A mão do homem-morto.
_ Sabe o que
acontece quando um cachorro vê um homem pendurado de cabeça para
baixo?
Azevedo, Manfredo e
eu mesmo dirigimos nossos sonolentos olhos desde nossas cartas para
o Nogueira.
_ Pois, o cachorro
acredita que é ele quem está ao revés – prosseguiu Nogueira –
e dará um grande salto para cima a fim de se por na posição
correta.
Ninguém fez
comentário. Afinal o que se poderia cometar? As estórias do
Nogueira, uma vez contados, ficam tão hermeticamente fechados,
parecem ovo de galinha.
Nogueira tem o
costume de nos contar estórias que cabem na metade de um twiter.
Isso exaspera Azevedo, que pigarreou para amortecer seu nervosismo.
Há vinte horas seguidas jogávamos pôquer. Todos estávamos
irritados, mais ainda Azevedo que estava numa rixa de horas com o
azar, horas!
_ Vou pedir uma
pizza. Anunciou Manfredo.
_ Um momento!
Engrossou Azevedo – Quem dá cartas agora?
_ Você –
respondeu Manfredo.
_ É sempre a minha
vez, porra!
_ Vai ficar nervosa?
- Manfredo sorria levemente tentando apaziguar Azevedo.
O pedido saiu assim
meio de peperone com catupiry meio calabresa acebolada. Manfredo
voltou a seu posto enquanto Azevedo soltava fogo pelas ventas,
atirava as nossas cartas e não as distribuía.
_ Nogueira, uma.
_ Eu, duas.
_ Manfredo, nada.
_ Eu também quero
duas, disse Azevedo que parecia empalidecer de repente, como uma
vela, como um peixe do escuro fundo do mar.
_ Vocês sabem qual
é a jogada conhecida como “A mão do homem morto?” - Nogueira
voltando à carga. - Nem as pigarreadas de fogo do Azevedo surtiram
efeito.
_ É uma quadra de
ases, que Billie Selvagen, famoso pistoleiro do velho oeste, tinha
na mão quando lhe deram um tiro pelas costas…
_ AAAAARRREEi!!!!!
Foi o que ouvimos sair da boca do Azevedo. Sua cara vermelha, sua
língua saindo por entre os dentes, parecia um aliem, como se a
mordesse… caiu para trás com as mãos fechadas sobre o tapete
verde levando todas as cartas da mesa, fichas, cinzeiros, xícaras de
café, latas de cerveja… ficou estendido no chão. Abrimos a
janela. Entrava uma briza fresca da madrugada junto com os primeiros
claros do dia. Manfredo colava os ouvidos no peito inerte de Azevedo.
Nos assustamos com a campainha. A pizza.
_ Está morto –
disse Manfredo – negaceava com a cabeça. Um infarto.
_ Que devemos fazer,
nesses casos? Perguntei.
_ Retirar a quadra
de ases da mão dele! Disse Nogueira.
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