17 de jun. de 2019

A mão do homem morto!


A mão do homem-morto.

_ Sabe o que acontece quando um cachorro vê um homem pendurado de cabeça para baixo?
Azevedo, Manfredo e eu mesmo dirigimos nossos sonolentos olhos desde nossas cartas para o Nogueira.
_ Pois, o cachorro acredita que é ele quem está ao revés – prosseguiu Nogueira – e dará um grande salto para cima a fim de se por na posição correta.
Ninguém fez comentário. Afinal o que se poderia cometar? As estórias do Nogueira, uma vez contados, ficam tão hermeticamente fechados, parecem ovo de galinha.
Nogueira tem o costume de nos contar estórias que cabem na metade de um twiter. Isso exaspera Azevedo, que pigarreou para amortecer seu nervosismo. Há vinte horas seguidas jogávamos pôquer. Todos estávamos irritados, mais ainda Azevedo que estava numa rixa de horas com o azar, horas!
_ Vou pedir uma pizza. Anunciou Manfredo.
_ Um momento! Engrossou Azevedo – Quem dá cartas agora?
_ Você – respondeu Manfredo.
_ É sempre a minha vez, porra!
_ Vai ficar nervosa? - Manfredo sorria levemente tentando apaziguar Azevedo.
O pedido saiu assim meio de peperone com catupiry meio calabresa acebolada. Manfredo voltou a seu posto enquanto Azevedo soltava fogo pelas ventas, atirava as nossas cartas e não as distribuía.
_ Nogueira, uma.
_ Eu, duas.
_ Manfredo, nada.
_ Eu também quero duas, disse Azevedo que parecia empalidecer de repente, como uma vela, como um peixe do escuro fundo do mar.
_ Vocês sabem qual é a jogada conhecida como “A mão do homem morto?” - Nogueira voltando à carga. - Nem as pigarreadas de fogo do Azevedo surtiram efeito.
_ É uma quadra de ases, que Billie Selvagen, famoso pistoleiro do velho oeste, tinha na mão quando lhe deram um tiro pelas costas…
_ AAAAARRREEi!!!!! Foi o que ouvimos sair da boca do Azevedo. Sua cara vermelha, sua língua saindo por entre os dentes, parecia um aliem, como se a mordesse… caiu para trás com as mãos fechadas sobre o tapete verde levando todas as cartas da mesa, fichas, cinzeiros, xícaras de café, latas de cerveja… ficou estendido no chão. Abrimos a janela. Entrava uma briza fresca da madrugada junto com os primeiros claros do dia. Manfredo colava os ouvidos no peito inerte de Azevedo. Nos assustamos com a campainha. A pizza.
_ Está morto – disse Manfredo – negaceava com a cabeça. Um infarto.
_ Que devemos fazer, nesses casos? Perguntei.
_ Retirar a quadra de ases da mão dele! Disse Nogueira.

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