De que vale um bela alma, se não sabe se expressar em palavras, se os flocos de neve se fundem antes de pousar numa árvore. Haikai de Hoshino Takashi, quer dizer tudo inclusive que as belas palavras nada querem dizer, ou ainda belas palavras escondendo um vazio interior, que a neve permanece estática por um instante, que mais sei eu, divago, me distraio um pouco, no meio de uma festa que não quer acabar e por fim morre antes do fim...
27 de dez. de 2015
26 de dez. de 2015
Jesus.
O mais divertido é
que tudo ao redor do herói é trágico.
Simplificando dos dois lados da equação, sem tragédia
nada de heróis, e isso não quer dizer: ao se instaurar
a tragédia e surge o herói, não, basta com
aparecer um herói e tudo ao seu redor se reduz à
tragédia. Se especulo, aonde há um Deus há um
mundo, seguindo o fenômeno heróico. E como há
quem necessite de herói os há que crêem em Deus e
é a estes que o mundo, com Deus, se põe a rodar. Não
precisamos ir muito longe para saber que cada povo tem ou teve seu
deus. Havendo ainda aquele povo que escolhido por deus, ultrapassa as
fronteiras e se faz povo em qualquer geografia, não se
dissolve. Não preciso mudar de calçada para saber que
há deuses dividindo uma família, digo isso para tentar
responder a mim mesmo, se uma nação pode ter mais que
um deus. Penso que deus, assim como os heróis, tiveram o seu
tempo, e têm seu tempo, uma naturalidade temporal, porque
sempre nos submetemos ao que admiramos naturalmente. Mas o que é,
hoje, Natural? Quem é, hoje, nosso Deus? Para os povos
indígenas os deuses são elementos da natureza, o sol, a
lua, a água, o fogo... seja, uma continuidade natural, árvore,
chuva, sol, fruto, comida... quaisquer desses substantivos naturais
pode ser e é deus. Para mim este encadeamento natural se
rompeu, em qualquer ponto dessa enumeração se pode
intercalar adubo, pesticida, transgenia, bolsa de valores, sacola
plástica, inflação, moedas, entre a árvore
e a comida. Se pensarmos no mudo escrito, narrado, e quando estas se
deram, aquele mundo estava muito próximo da criação,
era um mundo ainda virgem, um mundo que não se conhecia
global, então, nada mais natural que um criador.
Assim
desarticuladamente, isso que escrevo, vejo Jesus como uma
especificidade cristã. Um acontecimento raro, o nascimento de
um Deus, isso é o que se comemora, seu aniversário, a
encarnação de um Deus na fragilidade de um bebê
que precisava de um jumento e uma vaca para que lhe dessem calor e
uma estrela que apontasse o caminho àquele que quisesse o
visitar, uma estrela no céu, mas a luzinhas coloridas e
decorativas das ruas só fazem ofuscar qualquer estrela no
céu.
18 de dez. de 2015
Enquanto houver vida há esperança, dizem. É a última que se perde
Enquanto houver vida há
esperança, dizem. É a última que se perde. São
palavras que não me confortam, não creio nem no emissor
nem no receptor da mensagem. A esperança é uma virtude
teológica que requer outra: A Fé.
Nunca cri no
“futuro-natureza-morta”, ainda que bem pintado. E a Fé tem
que ser Cega. Como crer em algo bom no futuro que parta desse
desassossegado presente, se todo otimista é quase um Paulo
Coelho, pueril? Todo profeta deve ser bem vigiado, e o profeta do
otimismo idem, e suas profecias deveriam ser tratadas no âmbito
da vigilância sanitária: A overdose, especificamente, de
Otimismo é nociva à saúde. Não é
possível ser feliz sem ter passado por boas desgraças.
Não vindico a dor, só constato. Em toda a história
há muito desespero e pouca esperança, particularmente
na arte.
Deixo repousar a
tristeza. Destilo o dramatismo. Fico nu. Apago os rastros do
sentimentalismo. Escrevo isso desde uma primavera que não
existe nesses trópicos, uma primavera verão invisível.
O Natal não ilumina as sombras sigilosas. Selvagem e
histriônico canto:
Oh Caridade,
desde um latão
de cobre
esperança dá
ao pobre
e ao rico fiança
oh Caridade te peço
se me alcança
essa bondade
dê ao rico
esperança
e a mim estabilidade..
Para que conste, nem
que um exército de otimistas corra atrás de mim, isso
não me fará ter esperança, porque esperança
é de desesperados, nem mesmo o ano novinho em folha, todo
vincado, pronto para “estreiar”, são muitos os
naufrágios e poucas as encostas para aportar.
17 de dez. de 2015
Hipocondríaco Egocêntrico.
Reconheço, sou
um estraga prazeres, um chato, um pé no saco, mesmo que
Débora, minha esposa, diga isso de outra maneira; ' Você
é um hipocondríaco egocêntrico que dá
muito ouvido a si mesmo'. 'Tá'...! Tirante isso, tenho
acessos de melancolia que enfezam a Débora como agora, que
estamos na varanda, tomando uma cerveja, esperando pelo sudoeste, que
já vem vindo, e me boto a falar sobre a morte. Não
me deixe viver em estado vegetativo, digo a Débora, não
suportaria viver dependendo de uma máquina, daquelas bolsas
de soros e remédios ligados diretos na veia. Se algum dia
estiver nesse estado, por favor, meu amor, desligue estes artefatos
que me mantém vegetando, prefiro morrer. Débora se
levantou, me olhou com uma admiração que até
então não havia sentido. Me senti um menino mentiroso,
que crê que a mentira colou, roda a saia e desliga a tv, o
computador, o roteador, o ipod e por fim, me retira o copo e a
garrafa de cerveja.
16 de dez. de 2015
Eu não gosto de cebola....sendo que talvez a cebola é quem pudesse dizer que não gosta de mim.
Eu Não Gosto de
Cebola.
Outro dia ouvi uma
menina dizer, “Antigamente...”, nada mais ouvi, sou curioso, mas
não pude ser intrometido, por muito muito que quisesse saber o
que vinha depois. Desse modo, antigamente pode ser ontem. No entanto,
antigamente, para mim, é quando não havia nem eu, nem
rádio, nem tv, nem gramofone... se lia partituras, se contavam
contos, a volta do parafuso começa assim. Frankstein de
Shelley nasceu assim. Dizem que num verão suíço,
na Vila Diodati, havia muito talento debaixo do mesmo teto, Lord
Byron, seu médico John Polidori, John Shelley e Mary Shelley,
chovia há dias, o tédio andava rondado a casa, então,
Byron sugeriu que escrevessem cada um um conto de medo. Dizem que
John preferiu continuar matando o tédio com absinto. Byron
deixou o conto no meio do caminho, sobre mulheres vampiros da Grécia.
Polidori sem mais escreveu O Vampiro, não perdeu tempo para um
título, história do dandy irresistivelmente atrativo e
perverso manipulador, deixando claro que refletia sua relação
de amor e ódio com Byron. Mary Shelley escreveu O Moderno
Prometeu, o famoso Frankenstein.
Zequinha de Abreu
vendia partituras de Tico-Tico no Fubá, fazendo quem quisesse
ouvi-la, ler partitura, tocar algum instrumento. Disse Zequinha, mas
havia muitos compositores, como Chiquinha Gonzaga, para ficar nos
mais populares. A relação com a arte, em particular com
a música era corpóreo-espiritual, exigia todo o corpo e
a alma. Essa relação mudou drasticamente, fazendo do
ouvinte uma mera orelha manipulável. O tema é imenso,
mas fico nisso, que não estou preparado para um ensaio, fico
nessa crônica. Mas a coisa se deu da mesma forma que na relação
homem-natureza. Há pessoas tão jovens que não
têm antigamente, que não sabem de onde vem o bife, tanto
menos o Baião. Os livros se transformaram em imagens, filmes.
A música vem da saveiro que passa toda noite pelo bairro a
despertar galinhas, assustar gatos. Suponho que uma família
rica de antigamente tivesse umas 100 partituras e um piano. Hoje, no
pen drive do meu fusca tem todas as músicas que ouvi e
gostaria de ouvir nos próximos dois mil anos.
É neste ponto,
quando se disse que tudo quanto fosse sólido se desfaria no
ar, que chegamos. Qualquer relação entre nós e a
arte, ou qualquer outra atividade, nada nos esclarece sobre nós,
senão que nos obscurece, posto que todos os complexos sentidos
que tivemos para apreciar qualquer coisa se reduziu ao gosto
preguiçoso e irremediavelmente ignorante. Eu não gosto
de cebola....sendo que talvez a cebola é quem pudesse dizer que
não gosta de mim.
receita.
Cebola empanada.
Dissolva fermento
biológico em sal, acrescente água gelada, pode até
botar umas pedras de gelo, acrescente farinha de trigo, faça
uma massa espessa. Passe por ela as rodelas de cebola. Não
deve escorrer facilmente. Leve a uma frigideira com abundante azeite.
Frite. Coloque para escorrer excessos num papel absorvente.
Microconto.
“Quando acordei, o
dinossauro ainda estava ali”.de Augusto Monterroso.
“Sabia que estava
sozinha no mundo, de repente, batem na porta”.
São contos
brevíssimos bastante conhecidos. Gostei também do conto
gótico de G.L.Frost, ainda que li em algum lugar que não
queria, mas esqueci, aonde atribuíam - esse de bater a porta - sua autoria a Borges.
Como sou leviano tomei a liberdade de mudar um pouco o começo,
o meio e o final. E gostei mais desse jeito: Um disse para outro:
Esse lugar dá calafrios. Você acredita em fantasmas?
Pergunta o um, enquanto o outro diz não e desaparece.
Fechou o bar do Mané ou Hitler não fumava, Médici não fumava, Geisel não fumava, mas a cobra fumou
Fechou o bar do
pernambucano Mané. Meu bar. A verdade é que me sinto
desamparado, é mesmo uma sensação de desamparo.
Me sinto um Homer, se o Moe fechar. Um ET apontando com o dedo para
onde estava o bar – agora um açougue gourmet, pode? - e
exclamo 'meu bar, meu bar' com voz lastimosa. Lembro de quando
começou a lei antitabagista, e Mané, que fumava, me
perguntou, eu que fumava, o que dizer àqueles, digamos manés, que queriam um cartaz de proibido fumar, eu disse que
fizesse um aonde constasse o nome dos merdas metidos a bestas
bonfinenses que morreram antes por pura sovinice e ignorância e não fumavam e
fui dando nome aos bois. Não seria nem louco de botar o nome de algum aqui, ainda que saiba dos herdeiros analfabetos, mas tem sempre os puxa-sacos que leem para os patrões, escrevem para os patrões, vigiam pelos patrões, chacoalham para seus amos... Então para não correr risco de morte, ficaria assim transportando da ideia
paroquiana inicial: Hitler não fumava, Médici não
fumava, Geisel não fumava, mas a cobra fumou. Vou parando por
aqui que comecei a misturar nostalgia com horror.
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