Reconheço, sou
um estraga prazeres, um chato, um pé no saco, mesmo que
Débora, minha esposa, diga isso de outra maneira; ' Você
é um hipocondríaco egocêntrico que dá
muito ouvido a si mesmo'. 'Tá'...! Tirante isso, tenho
acessos de melancolia que enfezam a Débora como agora, que
estamos na varanda, tomando uma cerveja, esperando pelo sudoeste, que
já vem vindo, e me boto a falar sobre a morte. Não
me deixe viver em estado vegetativo, digo a Débora, não
suportaria viver dependendo de uma máquina, daquelas bolsas
de soros e remédios ligados diretos na veia. Se algum dia
estiver nesse estado, por favor, meu amor, desligue estes artefatos
que me mantém vegetando, prefiro morrer. Débora se
levantou, me olhou com uma admiração que até
então não havia sentido. Me senti um menino mentiroso,
que crê que a mentira colou, roda a saia e desliga a tv, o
computador, o roteador, o ipod e por fim, me retira o copo e a
garrafa de cerveja.
17 de dez. de 2015
16 de dez. de 2015
Eu não gosto de cebola....sendo que talvez a cebola é quem pudesse dizer que não gosta de mim.
Eu Não Gosto de
Cebola.
Outro dia ouvi uma
menina dizer, “Antigamente...”, nada mais ouvi, sou curioso, mas
não pude ser intrometido, por muito muito que quisesse saber o
que vinha depois. Desse modo, antigamente pode ser ontem. No entanto,
antigamente, para mim, é quando não havia nem eu, nem
rádio, nem tv, nem gramofone... se lia partituras, se contavam
contos, a volta do parafuso começa assim. Frankstein de
Shelley nasceu assim. Dizem que num verão suíço,
na Vila Diodati, havia muito talento debaixo do mesmo teto, Lord
Byron, seu médico John Polidori, John Shelley e Mary Shelley,
chovia há dias, o tédio andava rondado a casa, então,
Byron sugeriu que escrevessem cada um um conto de medo. Dizem que
John preferiu continuar matando o tédio com absinto. Byron
deixou o conto no meio do caminho, sobre mulheres vampiros da Grécia.
Polidori sem mais escreveu O Vampiro, não perdeu tempo para um
título, história do dandy irresistivelmente atrativo e
perverso manipulador, deixando claro que refletia sua relação
de amor e ódio com Byron. Mary Shelley escreveu O Moderno
Prometeu, o famoso Frankenstein.
Zequinha de Abreu
vendia partituras de Tico-Tico no Fubá, fazendo quem quisesse
ouvi-la, ler partitura, tocar algum instrumento. Disse Zequinha, mas
havia muitos compositores, como Chiquinha Gonzaga, para ficar nos
mais populares. A relação com a arte, em particular com
a música era corpóreo-espiritual, exigia todo o corpo e
a alma. Essa relação mudou drasticamente, fazendo do
ouvinte uma mera orelha manipulável. O tema é imenso,
mas fico nisso, que não estou preparado para um ensaio, fico
nessa crônica. Mas a coisa se deu da mesma forma que na relação
homem-natureza. Há pessoas tão jovens que não
têm antigamente, que não sabem de onde vem o bife, tanto
menos o Baião. Os livros se transformaram em imagens, filmes.
A música vem da saveiro que passa toda noite pelo bairro a
despertar galinhas, assustar gatos. Suponho que uma família
rica de antigamente tivesse umas 100 partituras e um piano. Hoje, no
pen drive do meu fusca tem todas as músicas que ouvi e
gostaria de ouvir nos próximos dois mil anos.
É neste ponto,
quando se disse que tudo quanto fosse sólido se desfaria no
ar, que chegamos. Qualquer relação entre nós e a
arte, ou qualquer outra atividade, nada nos esclarece sobre nós,
senão que nos obscurece, posto que todos os complexos sentidos
que tivemos para apreciar qualquer coisa se reduziu ao gosto
preguiçoso e irremediavelmente ignorante. Eu não gosto
de cebola....sendo que talvez a cebola é quem pudesse dizer que
não gosta de mim.
receita.
Cebola empanada.
Dissolva fermento
biológico em sal, acrescente água gelada, pode até
botar umas pedras de gelo, acrescente farinha de trigo, faça
uma massa espessa. Passe por ela as rodelas de cebola. Não
deve escorrer facilmente. Leve a uma frigideira com abundante azeite.
Frite. Coloque para escorrer excessos num papel absorvente.
Microconto.
“Quando acordei, o
dinossauro ainda estava ali”.de Augusto Monterroso.
“Sabia que estava
sozinha no mundo, de repente, batem na porta”.
São contos
brevíssimos bastante conhecidos. Gostei também do conto
gótico de G.L.Frost, ainda que li em algum lugar que não
queria, mas esqueci, aonde atribuíam - esse de bater a porta - sua autoria a Borges.
Como sou leviano tomei a liberdade de mudar um pouco o começo,
o meio e o final. E gostei mais desse jeito: Um disse para outro:
Esse lugar dá calafrios. Você acredita em fantasmas?
Pergunta o um, enquanto o outro diz não e desaparece.
Fechou o bar do Mané ou Hitler não fumava, Médici não fumava, Geisel não fumava, mas a cobra fumou
Fechou o bar do
pernambucano Mané. Meu bar. A verdade é que me sinto
desamparado, é mesmo uma sensação de desamparo.
Me sinto um Homer, se o Moe fechar. Um ET apontando com o dedo para
onde estava o bar – agora um açougue gourmet, pode? - e
exclamo 'meu bar, meu bar' com voz lastimosa. Lembro de quando
começou a lei antitabagista, e Mané, que fumava, me
perguntou, eu que fumava, o que dizer àqueles, digamos manés, que queriam um cartaz de proibido fumar, eu disse que
fizesse um aonde constasse o nome dos merdas metidos a bestas
bonfinenses que morreram antes por pura sovinice e ignorância e não fumavam e
fui dando nome aos bois. Não seria nem louco de botar o nome de algum aqui, ainda que saiba dos herdeiros analfabetos, mas tem sempre os puxa-sacos que leem para os patrões, escrevem para os patrões, vigiam pelos patrões, chacoalham para seus amos... Então para não correr risco de morte, ficaria assim transportando da ideia
paroquiana inicial: Hitler não fumava, Médici não
fumava, Geisel não fumava, mas a cobra fumou. Vou parando por
aqui que comecei a misturar nostalgia com horror.
Para que serve um amigo?
Para que serve um
amigo?
Imagino que algum
purista dirá que a amizade não serve, que cada um há
de servir a ela, ou algo assim, aparentemente sublime, mas falso.
Quero que meus amigos me sirvam. Quero, ademais, que sejam a medida
de meu valor. Quero me conhecer conhecendo a eles. Quero, ainda,
confirmar neles – já que me concedem sua amizade - que algo bom
vêem em mim. Pois bem, entre os amigos que mais me valem está o entranhado José Carlos..
Zé, como sinto
saudades, de nossas conversas sobre o ser e o nada pelas ruas de
Sousas ou sobre o divino do humano e o humano do divino pelas noites
de segunda junto ao fogão. Se alguma vez nos esquecermos de
que somos amigos, encontrarei em nosso esquecimento um sinal
inequívoco de que perdi valor.
15 de dez. de 2015
Quando eu vi Deus.
Todos sabem que sou
ateu, de poltrona reclinável. Mas nunca contei que numa de
minhas subidas de Ubatuba, pela estrada das curvas, me apareceu Deus.
Subia a serra, estava completamente nublado lá embaixo, no
entanto, de repente toda neblina desapareceu, o céu se vestiu
de azul homogêneo, luminoso e próximo. Parecia que se
quisesse sair do carro e subir na ponta dos pés, poderia com o
braço levantado com a mão alcançaria o cosmo,
inteiro. Tocava isso Soneto de Petrarca 104 liszt E foi o que fiz, foi incrível, me sentia parte de
todo o universo, como se estivesse no meio de uma floresta, ou dentro
do mar, perto da lua, ao lado de marte, da Ursa Maior, da Via Láctea.
Sentia a expansão, a velocidade e a música universal.
Maurice Tillet, o Ogro em carne e osso.
Se chamava Maurice
Tillet, apesar de seu aspecto tosco, falava 14 idiomas, era poeta,
ator e um grande enxadrista, mas se fez famoso como peso pesado no
Pressing Catch, aonde foi campeão mundial.
Aos 20 anos desenvolve
a enfermidade da pituitária(hipófase), conhecida como
acromegalia, - como Rondo Hatton –
que desfigura as feições,
dando ao sujeito aparência ogro simiesca. Maurice decide
interromper os estudos de direito e imigra para os Estados Unidos
atrás de uma profissão mais de acordo com seu físico.
Se converte em lutador profissional, O Anjo Francês, ou o Ogro
do quadrilátero. Seu 'abraço de urso' não
encontra rival na lona. Em 1944 derrota Triturador Casey, e se torna
campeão mundial pela AWS.
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