Mostrando postagens com marcador infância. Mostrar todas as postagens
Mostrando postagens com marcador infância. Mostrar todas as postagens

28 de jun. de 2016

Apolo XI.

Apolo XI.

Fui criado na rua larga, onde as guias eram as traves para jogar bola. Na rua passávamos a noite tomando a fresca, os adultos bem sentados em cadeiras, bancos e a molecada correndo para cima e para baixo, a estrada e a velha estação da Mogiana, lá no fim da descida da rua da Igreja eram os nossos limites. A luz mortiça dos postes nos propiciavam conversas a voz baixa, novidades, piadas, desgraças se compartiam, enquanto pelas janelas e varandas fugia o calor acumulado nas casas durante o dia.
- Vaga-lume tem tem, seu pai tá aqui, tua mãe também e corríamos com um tição em brasa na ponta, rodopiando no ar, traçando círculos que sumiam na noite, só voltariam a aparecer quando fechasse os olhos para dormir.
- Um dois três... Migrilo, Tigriça, Toin podem voltar, eu vi quando se mexeram.... Protestos, discussões... a brincadeira voltava a começar, e quando alguém se metia na rua, a mãe da rua o tocava... tocou, não tocou... Se nos cansávamos, íamos para as escadarias da igreja a contar histórias, mula-sem-cabeça, mãe-d'água, mãe-da~lua, o Pe Canuto; o medo invadia pouco a pouco e cruzávamos as árvores do pequeno bosque, pisando leve, mas se alguém pisasse num graveto, e ele quebrasse, o barulho nos fazia correr, de por o coração pela boca.

- O pai do Zé Luiz comprou uma televisão! Sim, compraram uma igual ao do seu Humberto Toni. Na hora do recreio a noticia se espalhou pelo bairro, e logo depois da janta, veio gente até do morro do Canequinha, o Barbuzano. Cada um trouxe sua cadeira, o pai do Zé Luís botou a TV na varanda. Aquela noite soube do calor que fazia no Rio de Janeiro, suas praias, vimos Bonanza...
O pai do Zé explicou que comprará a prestação, no carnet. Em poucos meses quase todos tínhamos nosso próprio aparelho, fomos substituindo as cadeiras, os banquinhos na calçada pelo sofá, a mesa do jantar, pelo sofá, e as conversas sussurradas pelo psiu, ” Assim não posso ouvir o que dizem”.

Enquanto víamos ao vivo, cada uma na sua casa, a chegada da Apolo XI à lua, morria a dona Isildinha. Ninguém sentiu sua falta antes da manhã do dia seguinte, quando ela não saiu para varrer a frente de sua casa.Apolo XI.