31 de mai. de 2011

Quando casei uns amigos.

Um dia ele chegou, bonito, como um filho de Apolo. Não digo isso gratuitamente, senão que me a pagava com incerta admiração, por beleza não era, que não a pretendo. Admiração assimétrica. De um fotógrafo desinteressado pela pose. Sem saber o motivo de sua admiração a digo: incerta. Pois bem, ele me disse que ia se casar. Ora vamos, Peteca, você me diga com quem! Sim era ela, bonita, como se fosse filha de Circe, sem as poções. Meus olhos se deleitavam ao vê-la passar por Sousa, eu já me sentia então um fauno espreitando ninfas, garota de Ipanema, se o rio Atibaia fosse o mar aos pés do Corcovado e a Rua Maneco Rosa fosse a Farme de Amoedo. Castaño, um filho de Mallorca, vivia a beira do Atibaia, e dizia que na madrugada, hora em que a bruma se forma sobre o rio, esta esconde sobre as pedras uma Atibaíade, que canta com a voz mais doce que um humano pode produzir, enquanto trata de seus longos cabelos, era ela. O divino Peteca me disse também que eu iria casá-los, eu quis saber se ela sabia quem seria o anti-clérico, ele disse que sim, mas um outro dia veio ela a mim e disse-me: Cidão você vai fazer o meu casamento com o Peteca. Depois chegou ele, beberam bom vinho e comeram boa pizza. Voltaram num domingo, trouxeram as alianças, que não eram desde já alianças comuns, eles não eram comuns e tampouco sou comum, mortais mas, incomuns como aquelas alianças e aquela aliança. Eu me lembro de ter invocado ao grande deus, um deus de letra minúscula que coubesse no meu entendimento e no entendimento deles, e disse: introibo ad altare dei, enfim que entrava no altar de deus, o deus do amor, que é a única coisa que os levava a casar, além de uma casinha pequenina à beira do lago, claro. Disse mais coisas, bendisse a aliança, saudei suas belezas, rendi graças à minha escolha, perguntei-lhe se ele a queria como esposa, ele disse que sim, então perguntei a ela: Lívia quer o Peteca como seu esposo, ela disse que sim, beijaram-se e eu quis dizer uma palavra em hebraico, mas dela só me lembrei agora, שָׁלוֹם עֲלֵיכֶם;.

30 de mai. de 2011

Nulisseu. Nulisses.

Depois de cada aventura matam ovelhas e cabras, preparam um banquete, bebem vinho segundo o paladar de cada um, vinhos tão bons a que podem adicionar vinte medidas de água e cada um a soma a seu gosto. Cansados, adormecem na areia da praia ao som do agitado mar salgado. Poderiam haver se mandado, depois de furar o olho do gigante globolho, mas não, houve-se por bem tripudiar o derrotado.

Diante disso nossa aventura se semelha cada vez mais chinfrim. O inimigo é: o chefe, o inadimplente, o Bolsonaro, o palhaço deputado, o eleitor do palhaço, a música alta do vizinho, o exterminador de gatos, o vereador bêbado ou o mosquito da dengue. Todo mundo come todo mundo e ninguém come ninguém. Para comemorar: um maço de alface, um frango de plástico, a cereja falsa sobre o bolo dietético, a cerveja de tudo: de boca grande, a primeira, a que xinga argentino, enfim tudo: menos cevada, lúpulo e malte e se formos metidos a bestas e com sorte, teremos o vinho aquoso do famoso “custo benefício” e o gosto de frutas silvestres, que nestes trópicos nunca provamos, sabor a bosque profundo, que a tempos devastamos.
Tenho a terrível impressão de que os mortos nos governam. Que a própria aventura individual foi copiada do google. Um google remoto, anterior ao Google and Co. E desde já anuncio: não é a virtualidade que incomoda, ou o veículo, mas a pobreza do festim pela insignificância da vitória.
Por isso não há redenção. Por isso Leopold Bloom é Ulisses. Por isso Circe é uma prostituta e aceita cartão de crédito. Pois todas as batalhas foram travadas, essa é a tragédia.

28 de mai. de 2011

Palocci não é catupiri, ou a língua de pau.

Não defenderei Antônio Palocci Filho, por óbvio, não sou advogado. Tudo que Palocci parece precisar é de advogado ou advogados, peritos e contadores. Sou cozinheiro e o gourmet é Antônio Delfim Neto. Mas me disponibilizo, para ambos, como tal, a preço de mercado. Pratico uma cozinha anti-ética. Que é isso? Pegunta aquele que pergunta. E para você respondo: cozinho confiando na tua língua de pau, na tua língua rugosa queimada pelo excesso de sal do dia-a-dia, conto com tua incapacidade gustativa, com tua fome ancestral, com teus vícios palatais, com tua ansiedade que te faz glutão. Substituo alho e cebola por arisco, coloco mais pimenta, açúcar no molho, umani – pra você eu digo: umani é açúcar, é sal, é azedo e é doce é pra de vez em quando - , encho de cebola e você come sardinha por aliche. Sardinha é ótimo, mas não é aliche. Contra é melhor que filé, até músculo é, mas não o é. O Mestre Golfeto sabe: depois da higiene vêm outras querências. Queira! É só querer.       

26 de mai. de 2011

Rios sem Discurso. João Cabral de Melo Neto.


Rios sem Discurso pertence à coletânea Educação pela Pedra, publicada por João Cabral de Melo Neto no ano de 1966, pela Editora do Autor. Rio de Janeiro.

Começo pelo fim: “em que se tem voz a se ele combate” . Um rio combate a seca, a voz se opõe ao silêncio. seca|mudez rio|voz assim rio|seca mudez|voz. Não é de qualquer rio ou qualquer voz imperativo combater, sim um discurso único. Mas este rio-único-discurso sempre é enfrasado a partir de palavras que se comunicam em frases menores formando sentença-rio.

Mas há o isolamento da água em poças, das palavras em situação dicionário. As poças não se comunicam com outras e definham, evaporam e são tragadas pela seca terra. As palavras em dicionarizadas catacumbas estão mortas, mudas; são todas mas nada podem dizer neste isolamento.



                  Rios sem Discurso.

A Gabino Alejandro Carriedo.

Quando um rio corta, corta-se de vez
o discurso-rio de água que ele fazia;
cortado, a água se quebra em pedaços,
em poços de água, em água paralítica.
Em situação de poço, a água equivale
a uma palavra em situação dicionária:
isolada, estanque no poço dela mesma,
e porque assim estanque, estancada:
e mais: porque assim estancada, muda,
e muda porque com nenhuma comunica,
porque cortou-se a sintaxe desse rio,
o fio de água por que ele discorria.

*

O curso de um rio, seu discurso-rio,
chega raramente a se reatar de vez:
um rio precisa de muito fio de água
para refazer o fio antigo que o fez.
Salvo a grandiloquência de uma cheia
lhe impondo interina outra linguagem,
um rio precisa de muita água em fios
para que todos os poços se enfrasem:
se reatando, de um para outro poço,
em frases curtas, então frase e frase,
até a sentença-rio do discurso único
em que se tem voz a seca ele combate.



O manipulador diz ao leitor que as palavras sem contexto não têm valor. E que um texto ainda que falto de uma palavra, é sempre texto. E nesse caso cabe ao manipulado leitor ir ao cemitério de palavras e buscar-lhe a palavra certa para atingir o texto pleno, posto que sem isso será sempre o texto um aleijão. João Cabral não lhe gostam as metáforas, prefere a simetria, o espelho é o maior criador de simetrias, por isso João Cabral insiste no poema objeto não metafórico que através do espelho|leitor se remonte pleno como um rio que se faz discurso partindo das poças interligadas em fios e esses fios como outros fios d´água e a tantos outros muitos, até o rio-sentença.

Acontece porém que há um impedimento heraclitiano aonde o rio cortado não volta a ser o mesmo, cortado, o discurso não se remonta simetricamente, assim esse rio é um discurso vazio. Resta-me enquanto manipulado leitor a metáfora, da união dos esforços, da comunhão possível já que nos falta a palavra ou nos sobra grandiloquências. Como dizia Karl Marx em algum lugar de A Ideologia Alemã: l´impuissance mise in action. O poema é a própria impotência posta em ação. Uma vez que para Jean Duboi discurso é “linguagem posta em ação, a língua assumida pelo falante”, para Massaud Moisés: o vocábulo “discurso” ostenta polivalência de sentido segundo o contexto.
Assim os rios sem discursos são poemas metafóricos, é recife, que sempre é: acumulo de corais que se depositam, mas sempre quer ensinar, comover e entreter.





25 de mai. de 2011

Pagão.

Antes mesmo que ele fizesse suas mãos rastejarem pela mesa, puxada pelo fura-bolo e o mata-piolho, qual caranguejo mal projetado, desviando-se dos copos, da garrafa pela metade e do numerador de mesa, para ao final obter um toque com o mesmo indicador na imensa unha postiça e vermelha da espalmada mão dela sobre a toalha axadrezada – gritando: oriundi (a toalha) -, ela tascou-lhe a pergunta: “Você acredita em Deus?”. Sem exitar ele disse que sim não sem antes pigarrear. Ela disse que “É! Mas não parece! ”. Nem sabia a parecença dos pagões, mas o problema não está em parecer ou não parecer, em crer ou descrer se é que há um problema e de uma vez por todas, em havendo não é um problema meu (dele) sei que as coisas são infinitas, e até o infinito o é; assim  o problema é divino e não meu. Sua pergunta só tenta transferir o problema para mim, onde ele vai se colocar concretamente  meio a  imensidão, para não se transformar em mais um mágico, faquir ou charlatão, já que sua primeira tentativa de aproximação falhara ele disse isso. Ela levantou-se repuxou a minissaia repugnando-o e se retirando "pagão"! Ele que fabricara um ateísmo pessoal com filigranas gregas e vedantas, ficou até terminar o vinho para pagar a conta, sempre paguei essa conta disse, faltava isso pagão! 

24 de mai. de 2011

Tecendo a Manhã.

Tecendo a Manhã é um poema publicado na coletânea Educação pela Pedra de 1966, pela Editora do Autor, Rio de Janeiro. Poema fundamental da poética de João Cabral. A “tecedura” do poema obedece a um rigor estrutural, associando o sentido coletivo de sua construção e a solidariedade das ações humanas.

Tecendo a Manhã.


Um galo sozinho não tece uma manhã:
ele precisará sempre de outros galos.
De um que apanhe esse grito que ele
e o lance a outro; de um outro galo
que apanhe o grito que um galo antes
e o lance a outro; e de ouros galos
que com muitos outros galos se cruzem
e os fios de sol de seus gritos de galo,
para que a manhã, desde uma teia tênue,
se vá tecendo, entre todos os galos.

                         2.

E se encorpando em tela, entre todos,
se erguendo tenda, onde entrem todos,
se entretendendo para todos, no toldo
(a manhã) que plana livre de armação.
A manhã, toldo de um tecido tão aéreo
que, tecido, se eleva por si: luz balão.

Se texto é tecido e o tecido é produto da tecedura da linha, a linha aqui é a união de todos os gritos de todos os galos, uns acordados pelos outros, para que despertem o próximo. João Cabral quer o poema|tecido como uma tenda e ela deve abrigar a todos. (a manhã) é também amanhã livre de amarras, de esqueletos, leve e luminosa como um balão. Os galos em uníssono tecem a manhã, já os homens (operários que tecem) unidos tecem o amanhã. O poema é um manifesto, e como tecido é um pano, um lenço (vermelho por suposto) que deve ser agitado, entretendido, esticado, por e para todos. Pode-se, se se quer, ouvir o grito do manifesto comunista: “operários de todos os povos, uni-vos.   

Felicidade.

Felicidade.

Moroso, mais lento que o adagio. Se a urgência, o faz patinar o aperto errar, demora-se. Extrovertido secreta sua marca brilhante, prova de destemor e caráter. Resoluto. Sua certeza. Carregar-se,coisa pouca, mínima e exata. Essa bastança, obra salomônica, secreção ao dispor da necessidade. Não desperdiça além do caminho e de si. Imprescindível, nem míngua ou sobra além do próprio ser. Sua timidez orgulhosa. Sem alegrias ou tristezas. Vai lento, moroso, adágio. Urgente e duradouro seguir. Sempre. Lento e vagaroso. Inadiável seguir. Sempre feliz o caracol recolhe-se à mínima vibração. Tímido, enche-se daquilo que é, e lá dentro da concha, precisa, conforme, tem-se feliz, aceite, nada maior que ele próprio. Um santo.


23 de mai. de 2011

Fábula de Anfion. João Cabral de Melo Neto.



Fábula de Anfion


  1. O deserto.
( Anfion chega ao deserto)

No deserto, entre a
paisagem de seu
vocabulário, Anfion,

ao ar mineral isento
mesmo da alada
vegetação, no deserto

que fogem as nuvens
trazendo no bojo
as gordas estações

Anfion, entre pedras
como frutos esquecidos
que não quiseram

amadurecer, Anfion,
como se preciso círculo
estivesse riscando

na areia, gesto puro
de resíduos, respira
o deserto, Anfion.

* O deserto

(Ali, é um tempo claro
como a fonte
e na fábula.

Ali, nada sobrou da noite
como ervas
entre pedras.

Ali, é uma terra branca
e ávida
como a cal.

Ali, não há como pôr vossa tristeza
como a um livro
na estante).

*
Sua flauta seca

Ao sol do deserto e
no silêncio atingido
como a uma amêndoa,
sua flauta seca:

sem a terra doce
de água e de sono;
sem os grãos do amor
trazidos na brisa,

sua flauta seca:
como alguma pedra
ainda branda, ou lábios
ao vento marinho.
*
O sol do deserto

(O sol do deserto
não intumesce a vida
como a um pão.

O sol do deserto
não choca os velhos
ovos do mistério.

Mesmo os esguios,
discretos trigais
não resistem a

o sol do deserto,
lúcido, que preside
a essa fome vazia)

*
Anfion pensa ter encontrado a esterilidade que procurava.
Sua mudez está assegurada
se a flauta seca:
será de mudo cimento,
não será um búzio

a concha que é o resto
de dia de seu dia:
exato, passará pelo relógio,
como de uma faca o fio
2 O acaso
O encontro com o acaso

No deserto, entre os
esqueletos do antigo
vocabulário, Anfion,

no deserto, cinza
e areia como um
lençol, há dez dias

da última erva
que ainda o tentou
acompanhar, Anfion,

no deserto, mais, no
castiço linho do
meio-dia, Anfion,

agora que lavado
de todo canto,
em silêncio, silêncio

desperto e ativo como
uma lâmina, depara
o acaso, Anfion.


*
o acaso ataca e faz soar a flauta.

Ò acaso, raro
animal, força
de cavalo, cabeça
que ninguém viu;
ó acaso, vespa
oculta nas vagas
dobras da alva
distração; inseto
vencendo o silêncio
como um camelo
sobrevive à sede
ó acaso! O acaso
súbito condensou;
em esfinge, na
cachorra de esfinge
que lhe mordia
a mão escassa;
que lhe roía
o osso antigo
logo florescido
da flauta extinta:
áridas do exercício
puro do nada.

*
Tebas se faz

Diz a mitologia
(arejadas salas, de
nítidos enigmas
povoadas, mariscos
ou simples nozes
cuja noite guardada
à luz e ao ar livre
persiste, sem se dissolver
diz, do aéreo
parto daquele milagre:

Quando a flauta soou
um tempo se desdobrou
do tempo, como uma caixa
de dentro de outra caixa.

  1. Anfion em tebas
Anfion busca em tebas o deserto perdido

Entre tebas, entre
a injusta sintaxe
que fundou, Anfion,

entre Tebas, entre
mãos frutíferas, entre
a copada folhagem

de gestos, no verão
que, único, lhe resta
e cujas rodas

quisera fixar
nas, ainda possíveis,
secas planícies

da alma, Anfion,
ante Tebas, como
a um tecido que

buscasse adivinhar
pelo avesso, procura
o deserto, Anfion.
*






Lamento diante de sua obra.

“Esta cidade, Tebas,
não a quisera assim
de tijolos plantada,

que a terra e a flora
procuram reaver
a sua origem menor:

com já distinguir
onde começa a hera, a argila,
ou a terra acaba?

Desejei longamente
liso muro, e branco,
puro sol em si

como qualquer laranja;
leve laje sonhei
largada no espaço.

Onde a cidade
volante, a nuvem
civil sonhada?
*
Anfion e a flauta.

Uma flauta: como
dominá-la, cavalo
solto, que é louco?

Como antecipar
a árvore de som
de tal semente?

Daquele grão de vento
recebido no açude
a flauta cana ainda?

Uma flauta: como prever
suas modulações,
cavalo solto e louco?

Como traçar suas ondas
antecipadamente, como faz,
no tempo, o mar?

A flauta, eu a joguei
aos peixes surdo-
mudos do mar.

Poema de João Cabral de Melo Neto. A Fábula de Anfion, publicado junto com Psicologia da Composição e a Fábula de Antiode, em “ O Livro Inconsútil”, Barcelona, 1947.

Anfion, de acordo com a mitologia grega, era filho de Júpiter e Antíopa. Dotado de talento para a música, Anfion recebeu uma lira de Apolo. Ao som dessa lira, construiu a muralha de Tebas; as pedras iam-se colocando umas sobre as outras, sem qualquer esforço. João Cabral substituiu a lira por uma flauta rústica e interpretou o mito com liberdade de criação, associando os motivos temáticos “pedra”|”palavra”.

A Fábula de Anfion é um poema narrativo onde o herói procura despojar a poesia de sua afetividade. O poeta persegue a objetividade da palavra escrita. “... ar mineral isento mesmo da alada vegetação” “... entre pedras... frutos esquecidos... gesto puro de resíduos, respira o deserto...”



e não “estados de alma”. “ Ali, não há como pôr vossa tristeza como a um livro na estante”. O sol do deserto não faz crescer o pão, nem faz a vida vaidosa. O sol do deserto não gera mistérios onde não os há. O sol do deserto vê, compreende, ilumina, por fim preside ele próprio a fome. O sol do deserto é o poema pedra, diz aos românticos.

Anfion se depara com esqueletos no deserto, são esqueletos do velho vocabulário, esqueletos de um vocabulário que tentou seguir Anfion pelo deserto, mas Anfion sabe que é inútil fugir, mesmo ativo como uma lâmina, ele se depara com o acaso. O acaso é o instinto, a vida biológica inescapável, ineludível é a velha sintaxe do mundo, posta no poema como o acaso.


Ó acaso, raro...”
O acaso frustrou o projeto de Anfion ( depuração, mineralização dos objetos), por aparecer inexplicavelmente com toda vitalidade biológica.
O acaso é uma força instintiva. Anárquica. O acaso instintivo e anárquico rompe com a aridez da vida ascética ( deserto) perseguida pelo poeta.

A flauta, eu a joguei aos peixes surdo-mudos do mar”

A flauta como casualidade, fluidez descontrolada, é recusada pelo poeta, pois continuará a persecução ao rigor criativo. Só o poeta disciplina as palavras, palavras-coisas, palavra-pedra. Rigor e formalidade.
A busca pelo poema|parede|muro de inexpugnável aridez é frustrada. A flora|sentimento acaba por ocupar o muro|poema|cidade e nele já não se pode divisar onde começa a hera e termina mineralização objetivada.
O Herói lamenta-se diante da obra, recusa o sentimento|flauta, pois este sentimento colhido ainda em semente|cana|bambu enlouquece e se transforma numa poderosa árvore sonora, e por não poder dominá-la atira-a ao mar para os que não falam e não ouvem.

Há uma busca por libertar-se da sintaxe do mundo. Da injustiça mesma, da ordem das coisas, da vida. Sintaxe injusta “Entre Tebas, entre a injusta sintaxe que fundou...”, mas o poeta é lúcido e percebe a impossibilidade de construir com uma sintaxe outra, isenta e depurada e mineralizada. Afinal construímos partindo do “vocábulo esqueleto” que rebrota como a hera e toma a obra.  

22 de mai. de 2011

Educação pela Pedra. João Cabral de Melo Neto.

Educação pela Pedra extraída da coletânea de 48 poemas de mesmo nome do ano de 1966. Pela Editora do Autor, Rio de Janeiro; É da mesma coletânea: Tecendo a Manhã. O poema “Educação pela Pedra” é o núcleo temático da coletânea.
A abordagem da realidade exige um continuo processo de educação. Os poemas para João Cabral devem ser trabalhados de forma rigorosa e sistemática; visando um poema com resistência e consistência de pedra.
Não há metáforas.
Há busca por simetria entre linguagem (estrutura) e realidade.

A realidade dura do Sertão x a dureza da pedra.
O poeta Sertão x poema pedra.
O Sertão sertão x Pedra pedra.
O Sertanejo x Pedra.


Uma educação pela pedra: por lições;
para aprender da pedra, frequentá-la;
captar sua voz inenfática, impessoal
(pela dicção ela começa as aulas).
A lição de moral, sua resistência fria
ao que flui e a fluir, a ser maleada;
a de poética, sua carnadura concreta;
a de economia, seu adensar-se compacta:
lições de pedra (de fora para dentro,
cartilha muda), para quem soletrá-la.
'
Outra educação pela pedra: no Sertão
(de dentro para fora, e pré-didática)
No Sertão a pedra não sabe lecionar,
e se lecionasse, não ensinaria nada;
lá não se aprende a pedra: lá a pedra,
uma pedra de nascença, entranha a alma.

No primeiro e segundo verso a aliteração de “p” remete a talhar a pedra, lapidar. Ao mesmo tempo que é empedrar, endurecer obter da palavra-objeto palavra-coisa resistência de pedra, não sentimental. Tal palavra poesia maleável feito a carne dos homens, porem dura concreta como pedra. No Sertão o ser\poema não “fala barato” não fala pelos cotovelos, o ser\poema é carne-pedra-compacto, econômico, deve ser uma pedrada educadora e muda, que ao lê-la (soletrar) o leitor sinta esta força deste golpe\poema, eduque, como um poema\pedra se educa. João Cabral quer o poema pedra, o poema objeto, aprendido (aprender é imitar a pedra) da pedra; assim acentua a existência do objeto e o talha e sendo pedra lasca-a para intervir na realidade. Esse é o processo dialético da natureza. Onde o homem\poema se faz ao fazer da pedra\poema, lança.
João Cabral não deseja ser nem espontâneo nem acadêmico mas sim intelecto\autoconsciência adquirida nesse processo dialético, vigilante e lucido, entre palavra-coisa e o seu trabalho de transformação em poema\coisa. Não se trata de poética do simples fluir, mas no que flui é poética maleável. Tudo isso de fora para dentro, da pedra para o poema\homem\lição, pela observação e intervenção, pois para aprender pela pedra há de intervi-la, trabalhá-la, lascá-la, poli-la e isto refletirá em conhecimento.

A segunda parte é árida: a pedra é pedra, nada ensina, mas ocupa e entranha, transformando homem em pedra. Ou seja a primeira parte é metalinguagem de como fazer um poema. E a segunda estrofe é o poema.

Matagato.

Um bom exercício para compreender o outro, é sê-lo. Não é difícil. É expertise nacional. A Novela. Exemplo: matador de gatos. Quem mata gatos, os odeia. Eu não odeio gatos. Mas sempre odeio alguma coisa, exemplo: a música “alta” do vizinho. O sentimento é o mesmo. Começa por ser uma rabugice.”Poxa véio! Quero ler” Atormenta.”Cera no ouvido”. Cresce a irritação. “190”. Inútil. Chega um momento que quero explodir seu saveiro.
 O mesmo se dá àquele que odeia gatos. Há em demasia, gatos e cães, por óbvio, gatas e cadelas. Se nós humanos proliferamos à beira do descontrole, multiplique-se quanto aos bichos domésticos. As ninhadas são lindinhas. Mas sobra bicho. Se abandonamos bebês... que diremos de bichanos! Por suposto, quem odeia bichos domésticos não os tem, e não tê-los é não sabê-los e suprasumo: é não abandoná-los. Quem os abandona, paradoxalmente, os ama. O estado – município - ou o odiador deve cuidar do fruto desse “amor”, ou do seu abandono. Para arregrar a coisa proponho uma Des(ONG)ato, já que a Nã(ONG)cão se auto nega e afirma o estado.
 Outra? Assim como, quem vende em embalagens descartáveis deveria cuidar dos envases, o mesmo para quem vende animais de “estimação”: cuidar dos descartes. Outra expertise? O cinismo.

21 de mai. de 2011

Queneau: execício sobre plágio.

Foi na vigília, num  pesadelo, que te revelaste, como alma penada, abrindo a porta, intrusa e oferecida, não te esperava. Não tenho tanto caráter, mas não dissimulo para ti minhas piores caras e resmungos, que por vezes beiram a ofensa. Mas você é repetitiva e se impõe,  sei que me repito, em brutalidade, em ranhetice quase infantil, mas mais que sempre, não te esperava, desesperadamente não te quero. E agora quanto mais te evito mais te enroscas em mim, me envolves  apesar do hálito ganhado à noite e na sua véspera precedida de tarde alcoólica em empapuçado churrasco, meu deus! mesmo dos gases, me desculpas! E vens, sensual, loira e radiante como quer Hitchicok, vestida com este véu qual névoa transparente que vai se abrindo e mostrando teu sol, radiante. Quanto mais me indisponho, mais brilhas, nem reclamas do gosto  de café com leite e pão com manteiga ou do cigarro de minha boca. Me queres mesmo sem a chuveirada restauradora, ainda que um trapo, um farrapo e me envolves com tua volúpia e me entregarás ainda pior à terça.   

exercício de estilo, idealizados por Queneau sobre um texto de Julio Cortázar.  

20 de mai. de 2011

A utopia de Charles Bukowiski: a volta ao útero. Ou, a paz, a volta à natureza

Dois homens numa encruzilhada olhavam o mesmo escudo, para um, sua face era de prata, o outro a via dourada. Um daroês lhes mostra que ambos estão certos e errados. Concomitantemente. Essas duas caras, quando poucas, de uma verdade é o que fascina e aniquila. Fascina sempre que o dervis não tem exército, pois em tê-lo este acaba por obrigar-nos a uma delas.
Existem alguns métodos de interpretação da narrativa humana, qual seja, a vida. O que mais me encanta é materialismo histórico e dialético, onde a dialética pressupõe, na verdade, confronta contradições materiais. Evolui pelo atrito. O homem coisa, a coisa e a coisa feita|transformada pelo homem no tempo e o homem que se transforma ao transformar a coisa; isso é história. Não há quem narre a história senão o homem (e há bastantes dúvidas da existência do objeto, quando ao objeto não cabe papel de sujeito da ação – a pedra rolou ou a gravidade rolou a pedra!), foi necessário que a pedra e o caminho fossem anunciados pelo poeta: tinha! Pois bem esta hermenêutica, este instrumento interpretador anuncia que este homem se faz no contato com a coisa e sua natureza, se faz ao transformar a coisa. Se transforma dependente que é do modo de produzir a mudança na coisa, esta opera nele alterações que a ele se incorpora. Que seja: o modo de produzir e o ato produzem o homem, a coisa e a história. A história se dá quando da inclusão da variante tempo na produção e reprodução do homem, a natureza – geografia, clima, fauna e flora etc - a coisa e a natureza da coisa – objeto não sensível, produto da atividade e sensibilidade humana - e do homem, objeto, sujeito e predicado.
É muito simples, se não existe propriedade não existe ladrão. Assim só a propriedade é capaz de justificar o roubo e o assassinato, posto que as armas foram inventadas para proteger a propriedade. Imagino a dificuldade que seria matar – desarmado - a um semelhante, se facilmente se exaurem nossas forças, já que roubar a vida de outrem é impossível, podemos matar o outro, mas de sua vida nada podemos reter. Assim mata-se por não haver recebido o equivalente a uma pedra de crack. É certo que dir-se-ia: se não houvesse a arma o homicídio seria dificultado, posto que implicaria num encontro corporal, numa briga onde se medem as forças até a morte de um dos oponentes. Não vi nenhum filme que tenha conseguido mostrar o horror, a tragédia que isso encerra. Digo das pelejas de minha adolescência, que não traziam implícitas o fim último. Com a arma de fogo se facilitou, por higiênica, o homicídio. Não há esse contato violento de pele, de suor, de cheiro e de pavor que se estampa no gesto do outro. Poder-se-ia dizer: banalizou-se o homicídio. É notório que não. Banalizou-se a produção e o comércio de armas, sim, ao mesmo tempo que o homem é banalizado. Não é a vida que está banal. Pois a vida é o homem, vivo ou morto. Banal o homem, banal a vida, banal a morte.
A minha pergunta é: onde começa a vulgarização do homem. A minha resposta é: no modo de produção. Não deve-se esquecer que o modo de produção acarreta em produzir|consumir onde há um consumo de produção que é anterior ao produto, o consumo do produto que implica em nova produção, que remete ao consumo das forças vitais do homem e de sua natureza e da relação do homem com a natureza. Deve-se dizer que o homem já foi natureza. Foi natureza quando estendia a mão e colhia o fruto, neste momento a natureza – flora (planta) e fauna (homem) – não terminava na banana, continuava através do homem. Não há como separar da natureza, como ato da natureza, uma traíra comendo um bagre. O rio, o bagre e a traíra “é” natureza independente do que façam. Mas um homem comendo uma banana, nada tem a ver de natural. É uma relação estética, no seu lado mais pedante que é parecer natural. Uma banana é no mínimo o envelhecimento precoce de um homem outro que a produz dentro duma relação de apropriação das forças vitais da bananeira e do homem. A banana vulgarizada faz o homem vulgar, esse homem vulgarizado não adquire nem o valor daquilo que produz. Citado por Marx, Ricardo diz: reduzi o valor da cesta básica e assim se reduzirá o valor do homem. Marx acrescenta que o cinismo não está em Ricardo, mas na "coisa" em si, no modo de produção.
A terra gira e até as utopias, inclusive, pia fraude. Mas a utopia é a geografia prometida, que foge de nós os mesmos passos que damos na sua direção. 
O retorno a natureza é a utopia. Poder-se-ia dizer: é um modismo. Não é. É uma súplica desesperada. Começar de novo, de uma maneira diferente. Coisa que o capitalismo, que é o modo de produção, o sistema engendrador de tudo que é bom e ruim, bem e mal, parece não oferecer saída. É a busca máxima de Charles Bukowiski poeta imprestável, proletário e bêbado: o útero.          

15 M: Vai vendo! vá vendo!

Em Espanha e pelo resto de Europa os cidadãos em praça pública reclamam protagonismo, é o 15 M. No centro da questão está que o sistema político caiu de joelhos diante do sistema financeiro, este no genuflexório almofadado de catedrais góticas travestidos de Bancos Centrais a “humilhar-se” para que se esfole mais a todo um povo. O governo, qual seja, tem medo da simples possibilidade de que algo se lhe escape o controle. Podemos julgar a qualidade e orientação deste controle, desde já o controle implica não em imposição, mas que não exista a necessidade de impor-se pela força, em suma que aceitemos as condições, a citar: desemprego, baixos salários, altas exigências, falta de perspectiva para jovens de inserção no mercado de trabalho, alta de juros etc. Para que se não lhe escape ao controle termina por assumir, diga-se, os prejuízos causados pelo descontrole do sistema financeiro. É notório que os governos não têm esse controle, sequer o completo entendimento do funcionamento dele. O analista econômico têm feito; e pessimamente; contabilidade. Trabalha no microcosmo e quando parte para o macro, faz o que em estatística se chama extrapolar; um terço ciência, já que nem a estatística em si o é, dois terços avemarias e padrenossos, enfim, pejorativamente, extrapola exorbitantemente. Nem mesmo o famoso economês lhe serve mais de escudo como dantes a seu obscurantismo pedante, sua calça rasgou, e o fundo esta todo mundo vendo. O pobre analista encosta o nariz na vitrine e vê o reflexo dos próprios olhos incrédulos. Mas sempre dirá qualquer coisa canônica: o governo “vai subir os juros” e blá, blá inflação blá, blá e eu ligo o rádio e blablá... pois o seguro morreu de velho.   

19 de mai. de 2011

Preguiça, requer que se expulse! Ilhe.

Quer motivo mais fútil que ser expulso de algum sitio, por uma maçã! E saber que a cobra de cabo a rabo – filologia barata: cabo do latim caput = cabeça – pois essa cobra, todinha, foi escolhida por deus para permanecer. A senhora fique, disse. Coisas de deus, que ressuscitou Lázaro e não sabemos seu paradeiro. Caim, outro estrangeiro, se mandou com sua mulher sem nome para o leste do paraíso, fundou uma nação – Enoque - vitima do primeiro tsunami, o dilúvio. Noé preteriu-os ao casal de... hipopótamos, que sei eu! A crônica, melhor digo, a cronicidade das expulsões depois de qualquer diatribe está entranhada. Nos fez a todos estrangeiros e é a primeira pena noticiada. Talmente, segundo o delito, além de deus, o Rei Roberto não oblitera, quer sumariedade. É patético , pois, depois ficam por ai tecendo cachecóis no pier até o regresso do herói que não bota cera nos ouvidos, ao primeiro canto de sereia.  

17 de mai. de 2011

palocci

Palocci ficou rico. Não era pobre, Palocci, fez medicina. Não parece óbvio que foi o uso do placebo que o fez ter saúde financeira, invejável. Invejo-o. Mas deus não gosta de ricos ou invejosos. Deus dizia, dizem que dizia: Não cobiçai blá, blá, blá... e é mais fácil um camelo passar pelo buraco de uma agulha... - fazendo filologia barata: veio dai o verbo camelar - . Busílis; tampouco deus sabe como Palocci endinheirou-se. Trapalhadas. Deus também se atrapalha, imagine, criou o dia antes de criar o sol. Mas Palocci é discípulo de Lao: Sabe e não quer dizer. Ouçamos Lao Tsé: quem fala não sabe, quem sabe não fala. Fácil. Palocci! Não fala. Lao pode que  odiasse ensinar, ou tange a isso se range a rede. Mesmo, mesmo, Lao Tsé soia ser enigmático, pois falando não sabia, e mesmo assim o tomamos como sábio. Palocci não é enigma, que nos devore. O jovem Palocci já tinha poder, poder de liderar, conseguia com que o quinto e sexto ano de medicina fizessem greve! É muito! Mas, “O poder tende a corromper. O poder absoluto corrompe”. Ouçamos outros deuses – Maquiavel e Hobbes – : o homem é mau por natureza, há que domesticá-lo. Não se espante, por que alguns traços permanecem; se somos ingratos, volúveis, simuladores, covardes ante o perigo e ávidos de lucros. O bastante neste particular quesito, é que temos grandes mestres, “ganhando” muito, e pasmem: esta ótima escola: é publica!  

15 de mai. de 2011

Agora quem dá bola é o alvo e negro.

         Chamam branco mas é o preto que buscam. Miram no centro onde está o  negro do alvo. Já o alvinegro praiano é o novo campeão. Faz por onde. O time é leve, é assim que dá bola o alvinegro praiano, os jogadores correm leves, quase não tocam o chão, como se a lei da gravidade lhes foi dividida por dois, mudam de direção com um soslaio, correm esguios, abrem os braços para frear, piscam os olhos para fintar, braços! os colam ao corpo para aumentar aerodinâmica, como Pelé corria, chegam na bola perpendiculares, sobrando humanos, como Pelé chegava, de peito estufado, como Pelé estufava, chutam sem esforço, como Pelé chutava, chutar era só mais um atrevimento do seu pas de basque, pois sobrava, jogam sem amor ou ódio, só com o orgulho de saber jogar, fácil, eficiente, eficaz; eficácia também poderia ser outro apelido do alvinegro praiano, de Pelé, mas não é plástico, fácil, leve, simétrico e curto como; onde a segunda silaba se diz por dizer, para relaxar o esforço do “p” como Pelé, peixe, ou “b” buli, boli, bola pé bola olé. O alvinegro praiano não tem coisa especial dessas conservadoras e espartanas, como garra, pegada, sangue suor e lágrima, não tem! tem bola, não é exército! Para que estratégia, tática e arte da guerra, ninguém gosta de guerra, só os que odeiam a arte amam a guerra e dormem com seu catecismo ridículo. Alvo seu negro centro.  

STF: Onze Capitus.

                   Outro dia a câmara municipal de Rib. Preto ganhou mais uma Adin. É a enésima, que só vem confirmar sua inaptidão. Na mesma semana o STF concede aos pares homoafetivos certa equivalência aos pares héteros. Como se diz ali na pracinha:" tava caindo de maduro", é costume e se tanto deve ser lei.
                O fato intrigante é o STF ocupar o vazio que deixa o legislativo federal. Parece que estas câmaras foram atingidas por algo, que as deixou catatônicas; empacaram como o Sete Copas, e não há o quê faça o muar mover-se.

14 de mai. de 2011

A criação do perverso.


 O acaso favorável quando ocorre em sequencia finita acaba por desgraçar-nos a vida. A sorte de. modo geral, é a grande engendradora de monstros. Essa sorte que recai sobre o indivíduo com reiteração finita, acaba por voltar-se, contra todos, sempre, na hora do azar e para o mesmo às vezes. Se todavia o azar lhe for fulminante, acabamos por nos salvar de suas ações, caso contrário, seremos vítima do monstro. Um sujeito com tom voz – sorte - que cai ao gosto do auditório. Note-se que ser ouvinte é a priori é um desastre, e ao emprestar sua atenção à voz, dá ao dono dela poderes insondáveis.
Antes do golpe de sorte o indivíduo empenha-se, profundamente na sua industria, para ser digno de nota. Uma vez conquistada a primeira fortuna, este passa agir como senhor dos direitos de glória adquiridos e ouvintes atentos podem perceber pequenos rasgos de perversidade do ególatra recém-empossado. Os pequenos desvios são notados logo que o improviso substitui a intuitividade conscienciosamente estudada, trabalhada, industrializada e à sorte buscada que o tornou protagonista. A partir deste momento toda a empresa é defender o golpe inicial como propriedade natural, já que no geral a intuição é falta, é sempre falta sem o conhecimento devidamente aprofundado. Intuição como talento requerem uma certa ingenuidade. Por vezes o assenhoramento da situação é tão gritante, que o desleixo se transforma em perversidade. Este descurar-se é também em parte fruto de passividades alheias, que corroboram à ideia “de genuíno” do perverso.   

13 de mai. de 2011

ÆticaѼÆstética


A estética se afasta da ética! O homem disse. Eu discordo como sempre. A Ética&Estética do nosso tempo é a do homem&circunstâncias&produção-de-vida&toda-atividade-humano-sensível do mundo em que vivemos.

 Sumário: a relação de trabalho cínica faz homens cínicos.

Das pedras que não rolam no leito do rio não tenho seixos! Poesia. 

 Há pedras pontiagudas em meio a cachoeiras e cascatas, lembra quando escorreguei lá no ribeirão Preto, perto do Brejinho, deus do céu! Que dor! narrativa em prosa. 

 Creio que isso já delimita bastante a coisa, as pedras paradas e o rio corrente, as pedras arrastadas, roladas pela corrente do rio, quero ver nisso razões estéticas e éticas, rolam e isso é possível, não é feio – é ético – são redondas – nem bonitas ou feias – estética formas arredondadas - , enquanto outras ficam paradas, o que é permitido, não é feio estarem paradas – é ético - apesar do aquoso lustre mantêm arestas insofismáveis – estética agressiva, pontiaguda – acho que o humano está em movimento no tempo (note como tempo é espaço em movimento, viajar no tempo é ir junto com o tempo, é ter a mesma velocidade do tempo, a mesma geografia do tempo, é ter o tempo como parceiro) ou está parado no tempo ( é estar na estação entre o passado e o futuro, mas não é o presente, o presente não anda a destempo, assim a estação é à margem do tempo, a espera de uma volta do tempo, não um corte, mas um dobrar-se sobre si) e é desse seu movimento – relação homem\natureza onde a natureza é o local de trabalho, habitats, o sofá, enfim neste mundo ( natureza&mundo inventada, imitada, construída, organizada) e homem&trabalho&produção versus homem&capital&produção, homem&consumo & homem&desejo e desejo é necessidade&vontade&ignorar&não ter versus homem&mercantil. Separo produção de consumo por puro vício, pois uma coisa é a outra, se não há consumo sem produção, nem produção sem consumo. Há uma capacidade tão grande, que ociosa, capaz de transformar todos e tudo em algo plasticamente anódino (estética de massa&ética de massa para produção&consumo massivo, transporto a dúvida íntegra: esse cheiro não é de merda mas, Pardelhas! Parece-se. Faz haver um nivelamento massivo (escassez do bom, tudo é escasso, não há para todos!) e se, sempre por abaixo do mínimo e muito inferior ao possível, e a estas categorias estéticas não as discute, quer é que ande na lama sem que se suje os pés. 

LE MANINE VAGANO!

Le manine scoincidono nel nostro paese con la primavera. Sono delle manine di cui che girano, vagano qua e vagano anche là. Sorvolano il cimitero di cui tutti riposano in pace. Sorvolano il lungomare come i tedeschi... datesi che il freddo non lo sentono loro. Ai... Al... Vagano, vagano. Girolanz... Gironzano... Gironzalon... Vagano, vagano, vagano! clique no azul para ver Aristide Caporale
le manine vagano girozalanz.... vagano vagano Giudizio ( Aristide Caporale) em Amarcord anuncia a primavera seguida de um carrilhão e Nino Rota. Quanta inveja sentia deste ritual de passagem, falto a casa nossa. Nada anuncia o inverno, a primavera.. tampouco temos manines ou flores de amendoeira, mas tudo muda, e de um momento para o outro, descubro: Tudo é ponto de vista. O mundo, a cultura e essa ideia imposta pela Europa. Le manine, a neve, as folhas outonais... ouro sobre azul,  basta desse mito da caverna, este imperialismo cultural! Já podemos anunciar o inverno: Caem as primeiras Fuligens, da palha queimada da cana-de-açúcar, e o fez com fartura; forrou ruas, quintais e telhados de preto. Vamos fazer bonecos de fuligem, convocar nossos poetas e cineastas; só sei plagiar: A fuligem vagueia, gira e gira , vagueia voa voa, roda e roda como urubus!

10 de mai. de 2011

filme argentino.

Rapaz tímido. Designer competente. Apaixonado pela filha do patrão. Ela estuda desenho nos EUA, onde ficou noiva de megaempresário do ramo. Ela elabora um projeto, aplaudido pelo futuro marido. Ela conhece a competência do rapaz tímido. Propõe ao noivo criar uma equipe de trabalho para desenvolver o projeto. O noivo antenado na modernidade incentiva sua industria. O rapaz tímido tem que ir ao aeroporto buenairense de Ezeiza a recebê-la. O rapaz entra em pânico em função da paixão que sente por ela, somada a sua timidez. Não vai só, vai com um amigo do peito, que sabe da paixão e compreende seus cagaços. Em Ezeiza há uma multitudinária manifestação gay .
Câmaras de TV e repórteres por toda parte. Ele ensaia o que dirá à moça para impressioná-la. Aparece de repente um repórter que lhe questiona sobre o movimento. Ele pensa na moça, e diz: o tempo é agora, nem ontem ou amanhã, agora, e , é agora que ele quer viver seu amor ou desamor. O dito é visto e ouvido por todo o Ezeiza. A multidão boquiaberta, a moça boquiaberta, o noivo da moça, enfim. O rapaz tímido aparece em canal nacional fazendo sua declaração de princípios. A comunidade o transforma em líder. Já na festa aonde seria homenageado e empossado: presidente, sem que ele soubesse, que só aproveitava da estadia no bar para discutir com o patrão, sua filha, o noivo de sua filha, e mãe da moça, os planos dele dentro da nova empreitada. Não ouve como  pusilânime, um ataque do patrão ao comportamento homossexual. Seguido de perto por verdadeiros fãs, defende o gênero brilhantemente. Agradando a moça, o noivo, a mãe e toda a gente presente. Aplaudido de pé ao sair, passando por um  corredor polonês, alguns tocavam-no como se de uma divindade se tratasse. O rapaz tímido, agora é visto pela moça como um brilhante designer e um líder natural e competente e manifesto da causa. Aprova-o e incentiva-o. Ele se da conta que: atuando como gay, seus pensamentos saem límpidos e brilhantes, e contraproducentes como um macho tímido. A coisa lhe agrada enquanto interpretação,  teatralidade ademais da facilidade que lhe brota para criar e expor pensamentos incisivos e assertivas inabaláveis.  mas continua apaixonado pela moça. Ela tem casamento marcado. Ele tentará tudo e mais um pouco para mostrar-lhe primeiro o mal-entendido e depois que a ama.
É um filme argentino que não lembro o nome.  

9 de mai. de 2011

Arcanjos.

Obama chegou à Casa Branca montado em extraordinários discursos, e estes cavalgavam nos valores da tradição norte-americana. Interesse de Estado. Dizia que o legado dos “antigos” não era bolinha de sabão; e é, justamente, desta aparente fumaça que se fez concreto o sonho, a verdade e o progresso dos EUA. Interesse de Estado. Bush inventou o USA Patriot Act e Obama vai mais fundo e “chega onde os EUA querem que ele chegue”. Interesse de estado. Diante disso não podemos cair na bonomia e arcangelismo de criticar Obama, ou o outro. Se chegamos à tortura, é que os fins justificam os meios, e a tortura tem dado resultado, como qualquer outros meios e outros fins. Assim vamos: um erro atrás do outro , cochilo depois de cochilo. Despertamos só para ver a prevaricação em público, um peculato ao vivo, o casamento real. Vivemos numa sociedade que dormita enquanto assiste passiva a todos os descalabros que entretecem a nossa vida global, e se ladramos é por necessidade retórica.    

5 de mai. de 2011

Os homossexuais vencem aos porteiros da Lei.

Italo Calvino diz: “Os clássicos são aqueles livros que chegam até nós trazendo consigo as marcas das leituras que precederam a nossa e atrás de si os traços que deixaram na cultura ou nas
culturas que atravessaram”. Ou seja Dickens está em mim e sequer o tive às mãos. Lembro-me da enormidade que era ter a mão Vor dem Gesetz:

Vor dem Gesetz steht ein Türhüter. Zu diesem Türhüter kommt ein Mann vom Lande und bittet um Eintritt in das Gesetz. Aber der Türhüter sagt, daß er ihm jetzt den Eintritt nicht gewähren könne. Der Mann überlegt und fragt dann, ob er also später werde eintreten dürfen.
«Es ist möglich», sagt der Türhüter, «jetzt aber nicht.»
«Wenn es dich so lockt versuche es doch, trotz meines Verbotes hineinzugehn. Merke aber: Ich bin mächtig. Und ich bin nur der unterste Türhüter. Von Saal zu Saal stehn aber Türhüter, einer mächtiger als der andere. Schon den Anblick des dritten kam nicht einmal ich mehr ertragen.»
A palavra kafkiano ocupava em mim a prateleira das, aterradoras. Meu alemão de rua, de baustellen, de turco de quase nada servia, senão que a confirmar ignorâncias. Como foi difícil aceitar, acatar que antes da Lei está o porteiro. Que um homem da terra, do interior, pede que seja admitido às leis. O porteiro diz que agora não concede entradas. O Homem rumia e pergunta se poderia entrar mais tarde.
“ é possível” diz o porteiro, “ mas agora não”
Acaso insista, apesar de meu veto à sua entrada, ouça com atenção: Sou poderoso. E apenas o menos poderoso. À cada sala haverá um porteiro mais poderoso que o outro, tanto que do terceiro sequer suporto avistá-lo.
Eu também fiquei como o Homem da terra interior parado no primeiro porteiro. Posto que sabia sem ler Vom dem Gesetz, que havia de acatar que o mundo era kafkiano, principalmente para aquele que não ignora o porteiro e para este que está ali justamente para o que, antes de mais nada, o respeita, quando há de torná-lo invisível.
Mas há em Wenn es dich so lockt ( se você permanece tentando), versuche es doch( mas ainda experimente, procura, tenta), trotz meines (apesar de minha) Verbotes ( veto, proibição) hineinzugehen. (entrar, vir para dentro) é a linguagem mínima e essencial de um guarda-porta e o caipira.





3 de mai. de 2011

Osama. Obama. Oh! lama!

Não existo como Eu. Pois este teclado e esta tela e todas as outras estão sempre a exigir o meu olhar, o meu palpite, meu sim e meu não. Palpito sobre coisas, aparentemente, alheias a mim. Osama. Que coisa é Osama Bin Laden? Poderia ser um velho barbudo dando milho aos pombos na praça de San Marco ? E o pombo a trazer a morte e a mensagem dela a destempo! Que coisa é o aparelho de guerra norte-americano? Um menino que ganhou um guarda-chuva, mas nunca chove! Na verdade; não me comovem ou me interessam! Ainda que por suas criações de fatalidades venha a ser vitimado. São grandiloquências infinitas e e por isso não cabem, compreendidas, no meu saco de despistes. Não concebo, nem por que minha namorada me deixou, ela que odiava sushi, agora não come outra coisa.
Como narrativa, é uma morte que, por fora de hora, estropia o romance. Como se depois de baixar o pano há um desenlace, e em lugar de catarse gere o sarcasmo,  primo da descrença,  uma esperança masculina travestida em saia e meias três-quartos, escocesas,   a depilar-se os sovacos nalgum cabeleireiro de shopping center.    

Barça! Barça!

Dos que moram em Barcelona, nem todos são culés - culé vem de cola e cola é rabo e culo é cu. Assim culés: os últimos, não são todos os que vivem em Barcelona, mas paradoxalmente, todos vivem o Barça, contras e favoráveis. Os contras em geral são merengues, doce de clara de ovos que enfeita os bolos, em geral brancos, como o Madrid. Mas o catalão é por força; culé, do contrário alega questões políticas, quer dizer e não diz, mas dizem que o Barça está ligado ao separatismo, e quem não é separatista, não é culé. Ser catalão e não ser culé exige folego e retórica; um verdadeiro labirinto só para  dizer que não é culé  e é e que não é merengue e é, ou de esconder que é perico, e perico é periquito e é o que se diz do torcedor do Espanyol, em geral anti-separatistas, eram os proprietários do Sarriá, palco da derrota do Brasil de Tele Santana, Sócrates, Zico, Eder, Junior etc para a Itália de Rossi – Rossi que foi o bastante -, o Barça de hoje é um arremedo daquele Brasil 82, apesar de apresentar em alguns pontos mais qualidade. Basicamente a aplicação tática. E o fulminante ataque à primeira e segunda bola, quando o oponente mantem a posse de pola para a terceira, esta chegará sempre como um tijolo, oblonga e quicando irresponsavelmente já no meio de campo; exigindo assim muita técnica para o domínio e execução de passe, sem espaço e sem tempo; geralmente de um jogador com poucas habilidades – centro-avantes e similares; no caso de hoje Higuain, Aldebaior, outros intrusos etc, assim a defesa culé trabalha aparentemente aberta à base de antecipações e de bolas sobradas e vadias.
No mais o Messi – livre do tango - não cai, Dani Alves – longe da globo - já não faz tantas caras e bocas e todos de modo geral cospem o mínimo possível. É a eficácia do politicamente correto, da solidariedade e da fraternidade. Tirante Lionel Messi – que tem o centro-de-massa abaixo da pélvis, isso quer dizer que ele é mais pesado da cintura para baixo, por tanto aumenta a dificuldade em derrubá-lo; além do caráter, é claro! - , toda a espetacularidade possível é a do passe fácil; dadas a condições: muita movimentação, todos se oferecendo sabedores que outros se oferecerão, mesmo nos recantos mais espinhosos do campo de jogo. Enquanto o adversário, praticamente tem que se inventar a cada minuto, o Barça entra em campo com sessenta por cento da posse de bola e o que fazer com ela – mirem que não pensam grandes coisas, os outros trinta ou quarenta porcento o contrincante com a bola desgovernada nos pés, se dedica a esperar uma indicação divina, mas deus por vezes mostra que está de saco cheio dos merengues. Hoje é um bom dia para comer uma parrillada de frutos do mar em algum bar\restaurante de La Barceloneta e fechar a noite no Luz de Gas e sentir um pouco do catalanismo e sua verve polida.